Acórdão nº 258/13.5PBLMG.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 16 de Dezembro de 2015
Magistrado Responsável | MARIA PILAR DE OLIVEIRA |
Data da Resolução | 16 de Dezembro de 2015 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Coimbra: I. Relatório No processo comum singular 258/13.5PBLMG da Comarca de Viseu, Instância Local de Lamego, Secção Criminal, J1, após realização da audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença com o seguinte dispositivo: Nestes termos o Tribunal decide: a) condenar o arguido A...
pela prática, como autor material, de um crime de ofensas à integridade física simples, previsto e punido pelo artigo 143.º, n.º 1, do Código Penal, dispensando-se o mesmo da pena, nos termos dos artigos 74º e 143º, nº 3, al. b), do Código Penal; b) absolver o arguido do pedido de indemnização cível que contra o mesmo foi formulado pelo demandante, ficando a cargo deste as respectivas custas, sem prejuízo da isenção de que beneficia; c) condenar o arguido no pagamento das custas do processo fixando a taxa de justiça em 2 UC’s – artigos 513º e 521º, do CPP.
Inconformado com esta decisão dela recorreu o Ministério Público, rematando a correspondente motivação com as seguintes conclusões: 1. O arguido A... foi condenado pela prática, como autor material, de um crime de ofensas à integridade física simples, previsto e punido, pelo artigo 143º n.º 1 do Código Penal, dispensando-se o mesmo de pena, nos termos dos artigos 74º e 143º n.º 3 al. b) do Código Penal.
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Entendeu o Tribunal a quo que se verificou retorsão, por parte do arguido ao ter empurrado a ofendida, projectando-a contra a parede e lhe ter apertado o pescoço, após esta lhe ter dito “põe-te no caralho, que a conversa não foi contigo”.
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No entanto, e como facilmente se alcança dos factos provados, não se verifica a existência de qualquer retorsão, por parte do arguido.
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“Para se poder falar em retorsão é preciso que o agente se limite a “responder” a uma conduta ilícita ou repreensível do ofendido (e ao mesmo tempo agressor) empregando a força física, exigindo-se, em suma, reciprocidade, ou seja, um “pagar na mesma moeda” ou de modo análogo ou semelhante ao recebido”.
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Tal reciprocidade, pura e simplesmente, não existe nos autos.
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A mesma não se pode considerar verificada quando apenas existe uma troca de palavras, por parte da ofendida, a título de provocação verbal e neste seguimento o arguido a empurra e lhe aperta o pescoço.
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Nunca poderia o arguido, sem qualquer tipo de agressão prévia causar na ofendida B... lesões determinantes de 15 dias para a cura, conforme resulta do ponto 2 dos factos provados e assim, sem mais, se entender que actuou de forma semelhante aquela, como assim decidiu o Tribunal a quo.
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E mesmo que, assim, não se entendesse, sempre não estariam verificados os pressupostos da dispensa de pena.
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No que se refere ao art. 143º n.º 3 do Código Penal estamos perante uma dispensa facultativa de pena, relativamente à qual se tem entendido que depende da verificação dos requisitos gerais de dispensa de pena previstos no artº 74º nº 1 do Código Penal.
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Dos factos dados como provados não se considera existir uma culpa diminuta por parte do arguido, pois para além de ter empurrado a ofendida contra a parede, não satisfeito, o arguido ainda lhe agarrou no pescoço.
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A conduta do arguido, para além de ter causado lesões à ofendida, as mesmas foram de tal forma que determinaram um período de 15 dias para a cura.
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A este respeito, nada refere o Tribunal a quo, fazendo apenas referência a estarem verificados os pressupostos que as normas – art. 74º e 143º n.º 3 do C.P. – fazem depender para uma eventual dispensa se pena, já que a ilicitude e a culpa não são muito graves, não se podendo perder de vista o circunstancialismo em que os factos foram praticados.
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Assim, a sentença recorrida deverá ser substituída por outra que condene o arguido como autor material de um crime de ofensa à integridade física, p. e p. no art. 143°, do Código Penal, numa pena de multa, nos termos do art. 71º e 47º n.º 1 do Código Penal.
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Foram violadas as normas dos artigos 143º n.º 3 e 74º, ambos do Código Penal.
Nestes termos, os Exmos. Senhores Desembargadores do Tribunal da Relação de Coimbra melhor decidirão, fazendo-se justiça.
O recurso foi objecto de despacho de admissão.
O arguido respondeu ao recurso, concluindo o seguinte: 1º - O Tribunal a quo entendeu que se verificou o instituto da reversão por parte do arguido ao ter empurrado a ofendida, projectando-a contra a parede e lhe ter apertado o pescoço, após esta lhe ter dito “põe-te no caralho, que a conversa não foi contigo”.
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- Com efeito, para a formação da sua convicção, não foi alheio ao Tribunal a quo, a omissão por parte da ofendida da sua própria atuação, bem como da notória animosidade desta para com o arguido, durante todo o seu depoimento.
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- Trata-se de situações nas quais o agente se limita a “responder” a uma conduta ilícita ou repreensível do ofendido (e ao mesmo tempo agressor) empregando a força física. (…), o que é o caso dos autos.
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- Pelo exposto, o arguido limitou-se a “responder” à conduta ilícita da ofendida, pelo que se encontra verificado o instituto da reversão por parte do arguido A... .
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- Para além da reversão prevista na ali. b) do n.º 3 do art. 143 do Código Penal, também se encontram verificados os pressupostos da dispensa de pena.
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- Na verdade as exigências de prevenção geral e especial são mínimas e de valor insignificante, sendo também certo que ficou provado que o arguido não tem antecedentes criminais e está social, profissional e familiarmente integrado.
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- Em face da factualidade dada como provada, perfilhamos a tese vertida na Douta Sentença de que se encontram verificados os pressupostos previstos nas normas dos artigos 74º e 143º, n.º 3, al. b), ambos do Código Penal., pelo que nenhuma violação ocorreu na aplicação das mesmas.
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- A Douta Sentença recorrida encontra-se devidamente fundamentada e constitui um bom exemplo de total acerto jurídico.
9 º - Assim, mantendo-se a decisão recorrida farão V.
as Ex.
as JUSTIÇA Nesta Relação, o Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que o recurso não merece provimento.
Cumprido o disposto no artigo 417º, nº 2 do Código de Processo Penal, não ocorreu resposta.
Efectuado o exame preliminar e corridos os vistos teve lugar conferência, cumprindo apreciar e decidir.
*** II. Fundamentos da Decisão Recorrida A decisão recorrida contém os seguintes fundamentos de facto e de direito: II – DA AUDIÊNCIA DE JULGAMENTO RESULTARAM PROVADOS OS SEGUINTES FACTOS: 1.
No dia 13 de Agosto de 2013, cerca das 11h12, na Rua da Olaria, comarca de Lamego, após uma troca de palavras com B... , o arguido abordou aquela, e empurrou-a projectando-a contra a parede que ali se encontrava, sendo que, após, lhe apertou o pescoço.
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Em consequência da conduta do arguido, sofreu B... as lesões descritas e examinadas no relatório médico-legal de fls. 12 e ss, que aqui se dão por integralmente reproduzidas para todos os efeitos legais, designadamente: Face – há pequena escoriação retro-auricular direita; Pescoço - na face lateral direita há duas escoriações: uma com 7,5 cm de comprimento, arciforme, e outra mais pequena e mais distal com 2 cm oblíqua; Membro Superior Esquerdo - Braço (1/4 inferior) e cotovelo: na face posterior em área de 6,5 cm x 4 cm, há diversas escoriações, com edema na vizinhança; além de dores, que determinaram 15 dias para cura, sem afectação da capacidade de trabalho geral e profissional.
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O arguido agiu de forma livre, voluntária e consciente, com o propósito de molestar fisicamente a ofendida, provocando-lhe lesões e dores o que conseguiu, designadamente, apesar de saber a sua conduta proibida e punida por lei.
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O arguido praticou os factos descritos em 1. após a ofendida lhe ter dito: “o que é que tu queres, põe-te no caralho, que a conversa não foi contigo”.
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O arguido não tem antecedentes criminais.
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O arguido é vigilante da escola de hotelaria em Lamego, aufere um vencimento de cerca de € 680,00; a esposa é assistente operacional e aufere um vencimento de cerca de €500,00; têm dois filhos, um menor e outro maior estudante universitário; vivem em casa arrendada pela qual pagam €300,00 de renda.
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Quer arguido, quer a sua esposa têm o seu vencimento penhorado devido a terem sido fiadores da aqui ofendida, sendo que as relações entre eles não eram as melhores.
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Como consequência directa e necessária da conduta do arguido a ofendida foi admitida no serviço de urgência da demandante CHTMAD no dia 13.08.2013.
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O episódio de urgência orçou na quantia de €31,98.
* III- FACTOS NÃO PROVADOS: Inexistem factos não provados com relevância para a decisão da causa.
IV – MOTIVAÇÃO DA DECISÃO DE FACTO: A prova é apreciada segundo as...
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