Acórdão nº 112/15.6GAPNC.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 18 de Janeiro de 2017
Magistrado Responsável | VASQUES OS |
Data da Resolução | 18 de Janeiro de 2017 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam, em conferência, na 4ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra I. RELATÓRIO No Tribunal Judicial da Castelo Branco – Fundão – Instância Local – Secção Criminal – J1, o Ministério Público requereu o julgamento, em processo comum, com intervenção do tribunal singular, da arguida A...
, com os demais sinais nos autos, imputando-lhe a prática, em autoria material, de um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo art. 143º, nº 1 do C. Penal.
A assistente B.... deduziu pedido de indemnização civil contra a arguida, com vista à sua condenação no pagamento da quantia de € 2.000, por danos não patrimoniais sofridos.
Por sentença de 16 de Junho de 2016 foi a arguida condenada, pela prática do imputado crime, na pena de cento e oitenta dias de multa à taxa diária de € 7, perfazendo a multa global de € 1.260 e no pagamento à assistente da indemnização de € 600.
* Inconformada com a decisão recorreu a arguida, formulando no termo da motivação as seguintes conclusões:
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Por douta sentença, a arguida foi julgada autora de um crime de ofensa à integridade simples, previsto e punido pelo artigo 143º, nº 1 do Código Penal e condenada a Pena de Multa.
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O n.º 2 do artigo 32º da CRP estipula o seguinte: "Todo o Arguido se presume inocente até ao trânsito em julgado da sentença de condenação …".
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Ou seja, no Processo Penal cabe à acusação provar, acima de qualquer dúvida razoável que o Arguido é culpado.
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Sucede porém que, no caso sub judice existiu uma inversão do ónus da prova.
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Inversão essa que é assumida, totalmente, pela Meritíssima Juiz a quo na decisão ora recorrida.
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Senão vejamos: "Quanto às declarações da Arguida: A qual negou a prática dos factos que lhe vinham imputados na acusação pública referindo que é a Assistente que a persegue constantemente, SEM NO ENTANTO CONVENCER ESTE TRIBUNAL, POR FALTA DE SUPORTE PROBATÓRIO …".
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Assim sendo, segundo a douta sentença cabia à Arguida convencer o Tribunal da sua inocência.
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Como não o conseguiu e face às declarações da Queixosa é condenada.
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Com o devido respeito, mas esta interpretação viola, claramente, o princípio do in dubio pro reo e consagra o princípio da in culpa para o reo.
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Ora, conforme supra exposto a decisão viola, bastando ler as palavras da Meritíssimo Juiz a quo o n.º 2 do artigo 32° da CRP.
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O que invoca e obrigará a uma renovação total da prova.
I) Acresce que, a sentença ora recorrida é nula, nos termos do nº 2 do artigo 374º e al. a) do n.º 1 do artigo 379º do CPP.
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Com efeito, dão-se como provados todos os factos constantes da acusação.
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Todavia no que concerne à motivação da desta decisão, a mesma não passa de uma análise ligeira e não concisa das declarações das testemunhas. Apenas referindo que as testemunhas da defesa não viram nada, sem fundamentar, minimamente, essa conclusão.
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Ora, a fundamentação dos factos provados e provados é a essência de uma sentença, que concerne à matéria de facto dada como provada ou não provada.
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A referência genérica a depoimentos não nos permite impugnar, especificadamente e cumprir o vertido no artigo 412º do CPP n.º 3.
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Pensamos que, no caso em apreço caberia à Juiz a quo fundamentar, concisamente, expondo, de forma completa, os motivos de facto e direito que fundamentam a decisão, além de indicar e examinar criticamente as provas que serviram a convicção do Tribunal.
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Ora, no caso sub judice a Meritíssima Juiz a quo apenas plasmou para justificar as suas conclusões meras generalidades. O que desde logo impedem a ora recorrente de cumprir o vertido no n.º 3 do artigo 412º.
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Na verdade, como vamos indicar as concretas passagens que fundam a impugnação, quando a matéria a impugnar é genérica e sem qualquer precisão.
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Ou seja, o tribunal transformou, inovou, criou um texto diverso, inventou factos diferentes.
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Deste modo, a sentença é nula – nº 2 do artigo 374º e al. a) do n.º 1 do artigo 379º do CPP.
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Face ao exposto, é manifesto que a sentença sub judice é ilegal, já que viola o direito de defesa do Arguido, além de não ter qualquer sustentação legal.
Termos em que, deve ser dado provimento ao presente Recurso, determinando V. Exas. a modificabilidade da Sentença.
Assim, se fará a costumada Justiça.
* Respondeu ao recurso o Digno Magistrado do Ministério Público, formulando no termo da contramotivação as seguintes conclusões: 1. O tribunal a quo fez uma adequada valoração dos preceitos legais, tendo andado bem ao condenar a arguida pela prática de um crime de ofensa a integridade física simples, p. e p. pelo art. 143º, nº 1 do CP, na pena de 180 dias de multa, a taxa diária de 7,00 €.
2, N a verdade, o tribunal a quo fez uma adequada e acertada valoração da prova e uma correcta subsunção dos factos ao Direito, que não merece qualquer reparo, nem existe qualquer nulidade que a invalide.
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A arguida tenta descredibilizar os depoimentos da ofendida e da testemunha C..., todavia estas prestaram um depoimento isento, objectivo e rigoroso de todos os factos que presenciaram, sendo por isso credíveis.
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Ao invés, a arguida apresentou testemunhas de compromisso, que se apurou não terem presenciado os factos sob julgamento.
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Face ao exposto, concluímos que, a douta decisão recorrida deve ser mantida, por não ter violado quaisquer preceitos legais ou constitucionais, não devendo merecer provimento o recurso interposto pela arguida.
V. Ex.as, Senhores Juízes Desembargadores, no entanto, decidirão e farão JUSTIÇA.
* Respondeu também ao recurso a assistente, afirmando a correcção e prudência da sentença recorrida, e concluiu pelo não provimento do recurso.
* Na vista a que se refere o art. 416º, nº 1 do C. Processo Penal, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer, acompanhando a resposta do Ministério Público, pronunciando-se no sentido da suficiente fundamentação da sentença recorrida, da não violação do princípio in dubio pro reo, e da não inversão do ‘ónus da prova’, e concluiu pela integral manutenção da sentença recorrida.
* Foi cumprido o art. 417º, nº 2 do C. Processo Penal.
Colhidos os vistos e realizada a conferência, cumpre decidir.
* II. FUNDAMENTAÇÃO Dispõe o art. 412º, nº 1 do C. Processo Penal que, a motivação enuncia especificamente os fundamentos do recurso e termina pela formulação de conclusões, deduzidas por artigos, em que o recorrente resume as razões do pedido. As conclusões constituem pois, o limite do objecto do recurso, delas se devendo extrair as questões a decidir em cada caso.
Assim, atentas conclusões formuladas pela recorrente, as questões a decidir, sem prejuízo das de conhecimento oficioso, são: - A inconstitucionalidade da sentença, pela inversão do ónus da prova; - A nulidade da sentença por falta de fundamentação; - A impossibilidade de cumprimento do ónus previsto no art. 412º, nº 3 do C. Processo Penal.
* Para a resolução destas questões importa ter presente o que de relevante consta da sentença recorrida. Assim:
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Nela foram considerados provados os seguintes factos: “ (…).
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No dia 11/07/2015, pelas 10H00, a ofendida B... estava na Rua Direita, em Salvador, a conversar com uma cunhada.
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Nessa altura, a arguida A... muniu-se de um pau com uma moca na ponta e abeirou-se da ofendida, por trás, e, de forma injustificada e inopinada, desferiu vários golpes com o referido pau na cabeça, tórax e braços da ofendida B... .
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Na sequência de tal agressão, a ofendida B... sofreu lesões, dores e incómodos.
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Com efeito, a ofendida sofreu as lesões descritas e examinadas a fls. 20 a 23, que aqui se dão por...
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