Acórdão nº 71/16.8GBLMG.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 08 de Fevereiro de 2017

Magistrado ResponsávelVASQUES OS
Data da Resolução08 de Fevereiro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, na 4ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra I. RELATÓRIO No Tribunal Judicial da Comarca de Viseu – Lamego – Instância Local – Secção Criminal – J1, o Ministério Público requereu o julgamento, em processo comum com intervenção do tribunal singular, do arguido A...

, com os demais sinais nos autos, imputando-lhe a prática, em autoria material, de um crime de violência doméstica, p. e p. pelo art. 152º, nºs 1, b), 2, 4 e 5 do C. Penal.

No processo nº 54/16.8GBLMG, cuja apensação aos presentes autos foi determinada por despacho de 13 de Setembro de 2016 [fls. 160 a 161], o Ministério Público requereu o julgamento do arguido, em processo comum com intervenção do tribunal singular, imputando-lhe a prática, em autoria material, de um crime de violência doméstica, p. e p. pelo art. 152º, nºs 1, a), 2, 4 e 5 do C. Penal.

Por despacho proferido no início da audiência de julgamento de 30 de Setembro de 2016 [fls. 188 a 194], foi deferida a promoção do Ministério Público no sentido de ser o arguido julgado por tribunal singular, nos termos do disposto no nº 3 do art. 16º do C. Processo Penal.

Por sentença de 7 de Outubro de 2016, foi o arguido absolvido da prática do crime imputado no processo apensado, e condenado pela prática do crime de violência doméstica, p. e p. pelo art. 152º, nºs 1 e 2 do C. Penal, imputado nos presentes autos, na pena de 2 anos e 4 meses de prisão e na pena acessória de proibição de contactos com a ofendida B... , pelo período de seis meses, sem prejuízo de futuros e eventuais contactos necessários para efeitos do exercício das responsabilidades parentais da filha menor de ambos.

Mais foi o arguido condenado no pagamento da quantia de € 400 à ofendida.

* Inconformado com a decisão, recorreu o arguido, formulando no termo da motivação as seguintes conclusões:

  1. Foi negado à ofendida o direito de se recusar a prestar declarações.

  2. Não se valorando assim uma união de facto que dura há mais de 27 anos, da qual têm 4 filhos e que ainda hoje perdura só porque à data dos factos não coabitavam, até porque não podiam uma vez que o arguido estava impedido de contactar a ofendida por ordem judicial C) Não pode uma união de facto de quase 30 anos com 4 filhos que ainda hoje perdura ser desconsiderada por o casal estar desavindo poucas semanas numa altura que até estavam impedidos de se contactar por imperativo de uma ordem judicial D) No meio onde vivem poucas são as pessoas que sabem que não são casados, dado a longevidade da união de facto e ao facto de terem 4 filhos em comum E) De acordo com o nº 2 do Artº 134º do CPP e não tendo sido dada a ofendida a faculdade de se recusar a prestar depoimento que lhe assistia tem de ser considerado nulo.

  3. Os factos que condenam o arguido estão todos baseados no depoimento da ofendida.

  4. A ofendida por diversas vezes mesmo sem lhe ter sido dada a faculdade a que alude o art° 134º nº 2, manifestou a intenção de não prestar depoimento.

    Assim, devem os Exºs Srºs Juízes Desembargadores deste Tribunal, perante estes factos, entender nulo o depoimento da ofendida em sede de audiência de discussão e julgamento e em consequência dar como não provados os factos assinalados nos pontos 3, 6, 7, 8 e 9 dos factos dados como provados na mui douta sentença ora recorrida e absolver o arguido.

    Ou, caso assim não se entenda, anulando audiência de discussão e julgamento e ser a mesma repetida dando a faculdade de a ofendida se recusar a prestar depoimento caso assim o entenda.

    Termos em que, deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando a decisão proferida na Sentença recorrida e em consequência, ser substituída por douto Acórdão que absolva o Recorrente da prática do crime de violência doméstica.

    JUSTIÇA.

    * Respondeu ao recurso a Digna Magistrada do Ministério Público, alegando que as declarações da ofendida apenas foram valoradas probatoriamente quanto aos factos ocorridos entre 11 de Maio e 28 de Julho de 2016, período em que não existiu entre ela e o recorrente uma relação análoga à dos cônjuges e isto, não apenas porque o recorrente estivesse impedido, por força da medida de coacção decretada, de contactar a ofendida, mas porque esta quis por termo á coabitação, como claramente resulta, além do mais, da circunstância de ter dado o seu consentimento á aplicação da medida de coacção de proibição de contactos, razão pela qual o depoimento da ofendida não se mostra ferido de nulidade, por inobservância do disposto no art. 134º, nº 1, b) do C. Processo Penal, e concluiu pela integral manutenção da sentença recorrida.

    * Na vista a que se refere o art. 416º, nº 1 do C. Processo Penal, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer, aderindo à argumentação contida na resposta do Ministério Público, e concluiu pela improcedência do recurso.

    * Foi cumprido o art. 417º, nº 2 do C. Processo Penal.

    * Colhidos os vistos e realizada a conferência, cumpre decidir.

    * II. FUNDAMENTAÇÃO Dispõe o art. 412º, nº 1 do C. Processo Penal que, a motivação enuncia especificamente os fundamentos do recurso e termina pela formulação de conclusões, deduzidas por artigos, em que o recorrente resume as razões do pedido. As conclusões constituem pois, o limite do objecto do recurso, delas se devendo extrair as questões a decidir em cada caso.

    Assim, atentas as conclusões formuladas pelo recorrente, as questões a decidir, sem prejuízo das de conhecimento oficioso, são: - A nulidade do depoimento da ofendida; - A modificação da decisão proferida sobre a matéria de facto, relativamente aos pontos 3, 6, 7, 8 e 9 dos factos provados e consequente absolvição.

    * Para a resolução destas questões importa ter presente o que de relevante consta da sentença recorrida. Assim:

  5. Nela foram considerados provados os seguintes factos: “ (…).

    1. O arguido e a ofendida B... , viveram juntos, cerca de 27 anos até 11 de Maio do presente ano, como marido e mulher, partilhando a mesma mesa, cama e habitação, na residência sita na Rua (...) , Lamego.

    2. Desta relação nasceram quatro filhos, C... , D... , E... , maiores, e F... , actualmente com 17 anos de idade.

    3. A vivência da ofendida tem sido marcada por comportamentos agressivos por parte do arguido, sendo consumidor de bebidas alcoólicas, em excesso.

    4. O arguido foi já condenado pelo crime de violência doméstica no âmbito do processo 169/15.0GBLMG, sendo ofendida B... , por sentença transitada em julgado, na pena de três anos de prisão suspensa na sua execução, com regime de prova, assente num plano individual de readaptação social, executado com vigilância e apoio durante o tempo de duração da suspensão da execução, dos serviços de reinserção social, o afastamento da vítima, da sua residência ou local de trabalho e a proibição de contactos, por qualquer meio, durante o período da suspensão; e ainda o dever de o arguido se sujeitar a tratamento ao consumo imoderado de bebidas alcoólicas.

    5. Mais foi o arguido condenado na pena acessória de proibição de contactos com a ofendida B... (por qualquer meio e em qualquer local, incluindo a residência daquela), pelo período de 12 meses, sem prejuízo de futuros e eventuais contactos que se vierem a revelar necessários para efeitos do exercício das responsabilidades parentais da filha menor de ambos, a qual deverá ser fiscalizado por meios técnicos de controlo à distância, ou seja, de vigilância electrónica.

    6. No dia 03 de Julho de 2016, pelas 11h00, o arguido telefonou várias vezes para a ofendida com o número...

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