Acórdão nº 300/14.2GCTND.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 13 de Julho de 2016
Magistrado Responsável | FERNANDO CHAVES |
Data da Resolução | 13 de Julho de 2016 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam na 4ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra I – Relatório 1.
No processo comum singular n.º 300/14.2GCTND, que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca de Viseu – Tondela – Instância Local – Secção de Competência Genérica – J1, realizado o julgamento, foi proferida a sentença de fls. 232 a 254 com o dispositivo seguinte: «Por tudo o exposto o tribunal julga parcialmente procedente, porque apenas em parte, provada a acusação pública formulada contra os arguidos A... e B... , bem como a acusação particular formulada contra o arguido A... , e, em consequência disso: I. Condena o arguido A... , pela prática de um crime de ofensa à integridade física simples, previsto e punido pelo artigo 143º, nº 1 do Código Penal, na pessoa de G... pena de 30 dias de multa, à taxa diária de €15,00, o que perfaz um total e €450,00, e que corresponde à pena de 20 dias de prisão subsidiária; II. Declara que o arguido A... , praticou um crime de injúria, na pessoa de G... , previsto e punido pelo artigo 181º, nº 1 do Código Penal e isenta-o de pena.
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Absolve o arguido B... da imputação da acusação; IV. Condena o demandado A... a pagar ao demandante G... a quantia de €120,10 a título de indemnização pelos danos patrimoniais, absolvendo o demandado do restante pedido.
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Absolve o demandado B... do pedido de indemnização civil, contra si formulado.
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Fixa as custas penais fixadas em 4 UC para o arguido e em 4 UC para o assistente.
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Condena o demandante e demandado A... a pagar as custas cíveis, na proporção da sucumbência.
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Declara cessadas as medidas de coacção aplicadas ao arguido B... .
*** Notifique e proceda a depósito na secretaria (artigo 372º, nº 5 do Código de Processo Penal).
*** Após trânsito remeta boletins ao registo criminal.» 2.
Inconformado, o assistente G... recorreu da sentença, terminando a sua motivação com as seguintes conclusões (transcrição): «1. A discordância do recorrente reside no erro de apreciação sobre a matéria de facto, que o Tribunal recorrido deu como provados os artigos 4º, 8º e 9º da sentença.
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Não provados os artigos supracitados, erradamente, inquinou e condicionou a justeza do arguido A... ser condenado pelo crime de injúria.
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Pois, ao contrário do concluído pelo Juiz do tribunal recorrido o Assistente sempre percorreu, enquanto estava a ser injuriado, por caminhos públicos e ou do domínio público.
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Logo, nunca o Assistente teve comportamentos que infiram a aplicação ao caso concreto do nº2 do artigo 186º do CP para não condenar o arguido.
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À luz do senso comum, ninguém que ande simplesmente em caminhos públicos ou do domínio público, provoca alguém.
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O Juiz não teve em consideração que o arguido nunca provou em Tribunal que os terrenos que o Assistente pisou lhe pertenciam.
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O Juiz do Tribunal recorrido baseou a sua decisão apenas nas declarações do arguido, afastando as do Assistente e testemunhas.
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Por tudo isto e, consequentemente, ponderadas as circunstâncias do caso, a intensidade da culpa, e a gravidade dos factos, reúnem-se os pressupostos da aplicação ao arguido do crime de injúria.
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Ao decidir como decidiu, o Juiz decidiu erradamente pela não condenação do arguido no crime de injúria que comprovadamente cometeu.
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O Juiz a quo violou a norma jurídica do artigo 181º do Código Penal, que refere que “Quem injuriar outra pessoa, imputando-lhe factos, mesmo sob a forma de suspeita, ou dirigindo-lhe palavras, ofensivos da sua honra ou consideração, é punido com pena de prisão até 3 meses ou com pena de multa até 120 dias”.
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O Juiz interpretou erradamente o nº2 do artigo 186º do mesmo diploma, e em face dos factos que deu também erradamente como provados, isentou de pena o arguido A... do crime de injúria.
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O arguido não pode ter uma sanção de multa de €450,00, porque é insuficiente para as finalidades das penas perante dois crimes que comprovadamente cometeu, e tendo em consideração a sua condição económica e financeira.
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Condenar o arguido no pagamento, também da importância de €1500,00, relativamente ao pedido de indemnização cível.
Nestes termos deve ser julgado procedente o presente recurso, revogando-se a decisão recorrida e, em consequência, declarar que o arguido A... cometeu o crime de injúria previsto e punível pelo artigo 181º do Código Penal com as legais consequências. Assim se fazendo a costumada JUSTIÇA.» 3.
O Ministério Público e o arguido A... responderam ao recurso, pugnando pela manutenção do julgado.
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Nesta instância, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta, na intervenção a que se refere o artigo 416.º do Código de Processo Penal([1]), emitiu parecer no sentido de que o recurso deve improceder.
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No âmbito do disposto no artigo 417.º, n.º 2, não houve resposta.
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Colhidos os vistos, o processo foi presente à conferência para decisão.
* II - FUNDAMENTAÇÃO 1. A sentença recorrida 1.1. Na sentença proferida na 1ª instância foram dados como provados os seguintes factos (transcrição): «1. O arguido A... é dono e possuidor de uma propriedade, composta de vários prédios e com vários hectares, sita no Lugar de Pisões, limite de Nandufe, área deste concelho de Tondela, a qual se encontra vedada com rede.
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Nessa propriedade o arguido A... explora a criação de vacas.
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Em data não apurada o arguido A... , decidiu colocar uma ponte sobre o rio Dinha que bordeja a propriedade no sentido de as vacas poderem passar para a outra margem do rio onde possui pastagens.
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Nessa propriedade encontra-se uma antiga central hidroeléctrica, outrora propriedade da K..., Lda.
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Para acesso à dita Central existe um caminho que atravessa desde o caminho que provém de Nandufe, encimado por um portão.
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Tal portão costuma estar fechado com um arame ou cordão.
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Em tal portão encontram-se dizeres, com um número de telefone, para contacto dos funcionários da EDP, com o aqui arguido A... .
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No dia 10 de Outubro de 2014, antes das 18H00m, o assistente, munido de um alicate e uma máquina fotográfica, entrou na propriedade de A... sita em Lugar de Pisões – Nandufe.
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Dirigiu-se, pelos caminhos interiores da quinta à Central Hidroeléctrica dos Pisões.
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Nesse momento B... , neto do arguido A... , que reside numa das casas da quinta ao avistar G... , telefonou ao arguido A... dando-lhe conhecimento de que o assistente se encontrava no interior da quinta.
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De imediato o arguido A... se abeirou da zona onde o caminho asfaltado do interior da quinta cruz com o caminho proveniente do portão referido em 5, tendo solicitado a presença de uma patrulha da GNR.
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Ao avistar o assistente, pessoa com quem tem um diferendo há anos, não tolerando a sua presença no interior da quinta, dirigindo-se a ele, em voz alta, disse-lhe: Ó cabrão, ó filho da puta, não te quero aqui, sai das minhas terras, isto não é público.
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Ante isso, G... dizia para o arguido A... que se dirigia para a margem do rio.
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O arguido A... , em resposta, em voz alta, disse a G... : Ó cabrão, ó filha da puta, se o teu pai fosse vivo morria de vergonha de ti. Ó vigarista. Não te quero a pisar as minhas terras, vai pagar o roubo que fizeste à Misericórdia, porque fizeste lá um desfalque.
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Perante tal o assistente continuou a caminhar junto à margem direita do Rio Dinha, no sentido da ponte e de uma casa de habitação de um dos filhos do arguido que pretendia realizar uma reportagem fotográfica do local em que existe um diferendo, de um grupo de pessoas.
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Nas imediações da referida ponte, os arguidos B... e A... conseguiram alcançar o assistente G... .
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A dada altura, o arguido B... que pretendia tirar a máquina fotográfica que o assistente trazia ao pescoço, puxou-a e, por o terreno e encontrar enlameado, este caiu no solo desamparado.
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O arguido A... ao aperceber-se que o assistente G... se encontrava caído no chão, de barriga para cima, dirigiu-se ao mesmo, tendo-lhe desferido vários pontapés que o atingiram em diversas partes do corpo, para depois o pisar, na barriga, costas e joelho esquerdo.
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O assistente, para se livrar das agressões a que estava a ser sujeito, largou a máquina fotográfica e telemóvel, o que surtiu efeito.
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De seguida, o assistente levantou-se, pegou numa pedra, o que fez com que os arguidos fugissem levando os referidos objectos, para mais tarde os devolverem.
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Devido à actuação do arguido A... sofreu o assistente G... equimose da grelha costal esquerda e equimose da face interna do joelho esquerdo com 2X2 cm, que foram causa directa de um período de 10 (dez) dias de doença, sem afectação da capacidade de trabalho geral e profissional, conforme relatório médico de fls. 13-14 e 22-23, que se dão por integralmente reproduzidos para os legais efeitos.
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O arguido A... actuou de forma deliberada, livre e consciente, pretendeu e consegui, atingir e lesar o corpo e saúde do ofendido G... .
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Bem sabia o arguido que a sua conduta era proibida e punida por lei como crime.
Do PIC provou-se que: 24. O demandante despendeu em medicamentos e taxas moderadoras €18,10.
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O demandante despendeu a quantia de €5,95, na limpeza a seco de um colete que trazia vestido.
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O demandante pagou a taxa de justiça a quantia de €102,00.
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O demandante ficou abalado com as palavras que lhe foram dirigidas, por A... bem como com os actos que contra si foram praticados, por este.
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O demandante constituiu mandatário.
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O demandante é pessoa conhecida em Tondela, onde durante 14 anos desempenhou as funções de comandante dos bombeiros.
Além da acusação provou-se que: 30. Os arguidos não possuem antecedentes criminais.
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O arguido A... aufere de reforma a quantia de €1.040,00.
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Vive em casa própria conjuntamente com a esposa que é doméstica.
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Despende quantias não apuradas em medicamentos.
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É pessoa muito conhecida nesta cidade, não havendo conhecimento de factos que desabonem a seu favor.
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O arguido B... encontra-se a estudar, não possuindo rendimentos próprios.» * 1.2. Quanto a factos não provados consta da sentença recorrida (transcrição): «Não se provaram outros factos com relevância para a decisão...
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