Acórdão nº 243/12.4GCLRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 16 de Março de 2016
Data | 16 Março 2016 |
Órgão | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam, em Conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra.
Relatório Por despacho de 14 de Outubro de 2015, a Exma. Juíza da Comarca de Leiria – Instância Local de Leiria, Secção Criminal, J2 – procedeu à conversão da pena de 160 dias multa, em que o arguido A...
havia sido condenado por sentença proferida nestes autos, por prisão subsidiária, e determinou o cumprimento de 106 (cento e seis) dias de prisão subsidiária.
Inconformado com o despacho de14 de Outubro de 2015, dele interpôs recurso o arguido A..., concluindo a sua motivação do modo seguinte: 1. Não decidiu bem o Tribunal a quo ao ordenar o cumprimento da pena de prisão subsidiária, sem que fosse dada a oportunidade ao arguido de se pronunciar sobre a conversão da pena de multa em pena de prisão, violando-se assim o Princípio do Contraditório ínsito no art. 61.º n.º 1 al a) do C.P.P., 2. Dispõe o n° 3 do art° 49° do C.P. que “ Se o condenado provar que a razão do não pagamento da multa lhe não é imputável, pode a execução da prisão subsidiária ser suspensa, por um período de um a três anos, desde que a suspensão seja subordinada ao cumprimento de deveres ou regras de conduta de conteúdo não económico ou financeiro. (...)”; 3. Do preceito supra mencionado podemos concluir que a falta de pagamento da multa não conduz imediata e irremediavelmente à aplicação da prisão subsidiária, porquanto o condenado pode provar que o pagamento não lhe é imputável; 4. E mesmo havendo lugar à aplicação da prisão subsidiária, esta pode ser suspensa, sendo necessário dar ao condenado a oportunidade de se pronunciar, provando eventualmente que o não pagamento lhe não é imputável e/ou requerendo a suspensão da pena de prisão; 5. Há que saber qual a razão da falta de pagamento da multa a que foi condenado para só depois se decidir da aplicação ou não da prisão subsidiária; 6. No caso em apreço não foi averiguado, e devia ter sido, o motivo pelo qual o arguido não pagou a multa, dando-se-lhe a oportunidade de se pronunciar, antes de proferido o despacho recorrido; 7. Neste sentido também os Acórdãos do Tribunal da Relação de Coimbra de 24.02.2010, Processo n° 373/00.5PAMGR.C1 e de 27.11.2013, Processo n° 325/10.7TATNV-B.C1, disponíveis em www.dgsi.pt.
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Neste último pode ler-se ainda “ que embora relativamente ao caso em apreço não exista previsão expressa no sentido de audição do arguido, tal resulta do disposto no art.°61°, n° 1, al. b) do C.P.P., que determina que o arguido deve ser ouvido pelo Tribunal ou pelo Juiz sempre que deva ser tomada alguma decisão que pessoalmente o afecte.
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É evidente que a decisão sob recurso afecta e muito o condenado, uma vez que contende com a sua liberdade.
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Por outro lado, e sem conceder, constitui nulidade insanável, nos termos do disposto na al. c) do art°119° do CP.P, a ausência do arguido nos casos em que a lei exigir a sua comparência, no sentido atribuído há muito a esta norma, de que a mesma se refere não só “ à ausência física do arguido nos actos em que seja obrigatória a sua presença”, mas também à “ sua ausência processual nos casos em que lhe deve ser feito convite para se pronunciar”.
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Não tendo o arguido sido notificado para se pronunciar sobre o incumprimento da pena de multa, quando tal se impunha e devia ter sido feito, foi não só violado o princípio do contraditório, mas também cometida a nulidade supra referida, o que implica a invalidade do despacho sob recurso e consequentemente a realização da notificação preterida e das diligencias que venham a ser requeridas ou oficiosamente determinadas caso assim o Tribunal o entenda, antes de proferida nova decisão.
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O Douto despacho recorrido violou os artigos 49° n° 3 do C.P., 61° n° 1 al. a) e b) do C.P.P., 119° al c) do C.P.P e 27° e 32° n° 5 da Constituição da República Portuguesa.
Pelo exposto, deve o presente recurso merecer provimento e, em consequência, revogar-se o despacho recorrido, com as legais consequências, assim se fazendo a costumada Justiça.
O Ministério Público na Comarca de Leiria – Instância Local de Leira, respondeu ao recurso pugnando pela improcedência deste e manutenção integral da decisão recorrida.
O Ex.mo Procurador Geral Adjunto neste Tribunal da Relação de Coimbra emitiu parecer no sentido de que deverá ser equacionada a hipótese da procedência do recurso, determinando-se que o Tribunal de 1.ª instância permita que o arguido se pronuncie nos termos e para os efeitos do disposto nos n.ºs 1 e 3 do art.49.º do Código Penal, realizando para o efeito as diligências necessárias.
Foi dado cumprimento ao disposto no art.417.º, n.º 2 do C.P.P., não tendo o arguido respondido ao douto parecer do MP.
Colhidos os vistos cumpre decidir.
Fundamentação O despacho recorrido tem o seguinte teor: « O arguido A..., foi, por sentença transitada em julgado, condenado numa pena de 160 (cento e sessenta) dias de multa, à razão diária de 9 € (nove euros), o que perfaz o montante de 1.440 € (mil quatrocentos e quarenta euros) a que corresponderam, 106 (cento e seis) dias de prisão subsidiária (atento o desconto efectuado a fls. 18.
O arguido não procedeu ao pagamento.
Não lhe são conhecidos quaisquer rendimentos ou bens suscetíveis de penhora, pelo que a cobrança coerciva da pena de multa se mostra inviável.
Vem o Ministério Público, a fls. 51, promover a conversão da multa em prisão subsidiária. Estabelece o n.º 1 do art. 49º do Código Penal, que se a multa não for paga voluntária ou coercivamente, é cumprida pena de prisão subsidiária pelo tempo correspondente reduzido a dois terços.
É o caso dos autos.
Pelo exposto, decido ordenar o cumprimento da pena de prisão subsidiária de 106 (cento e seis) dias, conforme foi decidido na sentença que condenou o arguido.
Notifique, sendo o arguido com expressa menção da faculdade que lhe assiste de obstar total ou parcialmente ao cumprimento da prisão pagando total ou parcialmente a multa, nos termos do disposto no n.º 2 do art. 49.º do Código Penal.
Transitada a presente decisão, passe e entregue os competentes mandados para cumprimento da pena.
Os mandados devem ser acompanhados de ofício solicitando a imediata comunicação, pela via mais expedita, do seu cumprimento. Notifique.».
* O âmbito do recurso é dado pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respetiva motivação. (Cfr., entre outros , os acórdãos do STJ de 19-6-96 [1]e de 24-3-1999 [2]e Conselheiros Simas Santos e Leal Henriques , in Recursos em Processo Penal , 6.ª edição, 2007, pág. 103).
São apenas as questões suscitadas pelo recorrente e sumariadas nas respetivas conclusões que o tribunal de recurso tem de apreciar [3], sem prejuízo das de conhecimento oficioso .
No caso dos autos, face às conclusões da motivação do recorrente A... aa questões a decidir são as seguintes: - se o Tribunal a quo ao proferir o despacho de conversão da pena de multa em prisão subsidiária, sem prévia notificação ao arguido, violou o princípio do contraditório e as disposições constantes dos artigos 49.º, n.º 3 do Código Penal, 61.º n.º 1 alíneas a) e b) do Código de Processo Penal e 27.º e 32.º n.º 5, da Constituição da República Portuguesa; e - se, em consequência, o despacho recorrido é nulo nos termos...
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