Acórdão nº 516/09.3PTPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 15 de Dezembro de 2009

Magistrado ResponsávelMARIA DEOLINDA DIONÍSIO
Data da Resolução15 de Dezembro de 2009
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REC PENAL.

Decisão: ANULADO O JULGAMENTO.

Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO - LIVRO 395 - FLS 301.

Área Temática: .

Sumário: I – Detectada a condução de veículo automóvel com TAS superior a 1,20g/l, esgota-se a possibilidade de imputação de novo crime punível pelo artigo 292º do C.Penal, até completa eliminação pelo organismo dos efeitos do álcool, convencionada pelo legislador em 12 horas, restando a imputação do crime de desobediência se o arguido for encontrado a conduzir durante tal período.

II - É ilegal, por violação do princípio da necessidade, a ordem para submissão a novo exame de pesquisa de álcool no ar expirado naquele convencionado período de 12 horas.

Reclamações: Decisão Texto Integral: Processo n.º 516/09.3PTPRT.P1 Acordam, em conferência, na 2ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto, I – RELATÓRIO No .º Juízo do Tribunal de Pequena Instância Criminal do Porto, em processo especial sumário, com o n.º 516/09.3PTPRT, foi o arguido B……….

, com os demais sinais dos autos, julgado e condenado em 230 (duzentos e trinta) dias de multa, à taxa diária de € 10 (dez euros), a título de pena única das seguintes penas parcelares: - 70 (setenta) dias de multa à taxa diária de € 10 (dez euros), pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelo art. 292º, do Cód. Penal; - 140 (cento e quarenta) dias de multa à taxa diária de € 10 (dez euros), pela prática de um crime de desobediência qualificada, p. e p. pelo art. 348º n.º 2, do Cód. Penal; e, - 90 (noventa) dias de multa à taxa diária de € 10 (dez euros), pela prática de um crime de desobediência, p. e p. pelo art. 348º n.º 1 a), do Cód. Penal.

Mais foi condenado nas penas acessórias de proibição de conduzir, previstas no art. 69º n.º 1, alíneas a) e c), do Cód. Penal, pelos períodos de, respectivamente, 3 e 4 meses, e no total de 7 (sete) meses.

Inconformado com a decisão, interpôs recurso o arguido, finalizando a sua douta motivação com as seguintes conclusões: «O OBJECTO DOS PRESENTES AUTOS 1. O crime de condução sob efeito do álcool, com taxa de alcoolemia de 1,33 g/l, ocorrida às 4.18 horas, não é objecto dos presentes autos, mas sim do processo n.º …/09.3PTPRT do .° Juízo do Tribunal de Pequena Instância Criminal do Porto.

A NECESSIDADE DA DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO PROCESSO 2. A sentença julgou verificada a prática do crime de condução de veículo em estado de embriaguez a que se refere o artigo 292°, n.º 1, do Código Penal, que prevê a prática de tal crime por aquele que, pelo menos por negligência, conduzir veículo em via pública ou equiparada, com uma taxa de álcool no sangue igual ou superior/a l, 2 g/l.

  1. O facto provado que a tal conclusão pode conduzir — a taxa de álcool no sangue igual ou superior a l,2 g/l— apenas se verificou no que ao comportamento ocorrido pelas 4.18 horas se refere, comportamento esse que, como se disse, não é objecto dos presentes autos.

  2. A sentença não procedeu a qualquer subsunção dos factos ao direito da qual resultem concretizados que factos, afinal, preenchem cada um dos tipos de ilícito que julgou verificados; face a isso, é legítimo concluir que a sentença, perante ao elenco dos factos provados, pode ser interpretada, no que ao crime tipificado no artigo 292°, n.º l do CP se refere, de uma de duas maneiras: ou querendo dizer que neste processo se apurou tal crime relativamente ao comportamento descrito nos factos 1° a 4° dos provados (ocorrido às 4.18 horas) ou, em alternativa, que a sentença considerou que tal crime foi preenchido pela factualidade de 6° dos factos provados (ocorrida às 6.00 horas), o que determinará diferentes razões de censura, de acordo com cada uma das suas interpretações possíveis.

    AS RAZÕES DE CENSURA DA DECISÃO: 5. A condução sobe efeito de álcool constatada pela acção de fiscalização ocorrida às 4.18 horas não constitui objecto destes autos, mas sim do processo n.º …/09.3PTPRT, do .° Juízo do Tribunal de Pequena Instância Criminal do Porto.

  3. Nesse processo e relativamente a esses factos, foi proferida decisão que, como se referiu, homologou a suspensão provisória do processo nos termos dos arts. 384°, 281°, n.º 1, al. a) e 282° do CPP, decisão da qual não foi interposto recurso, pelo que transitou em julgado (cfr. doc. n°4).

  4. A apreciação da mesma conduta e a decisão punitiva sobre o mesmo crime, efectuada nos presentes autos, viola o princípio do non bis in idem.

  5. A sentença recorrida violou, por isso, o disposto no artigo 29°, n.º 4 da Constituição da República Portuguesa e, no âmbito mais restrito do caso julgado, o disposto nos artigos 4° do CPP e 496°, 497°, 498° e 677° do CPC, devendo ser revogada e substituída por decisão que se abstenha de conhecer de tal crime, face à circunstância de a sua prática ser objecto do referido processo n.° …/09.3PTPRT do .° Juízo do Tribunal de Pequena Instância Criminal do Porto.

    No caso de o crime do artigo 292°, n.° 1 se referir à condução verificada às 6.00 horas: Reapreciação da prova gravada: ampliação da matéria de facto provada 9. Deve ser dado como provado não apenas o que consta do facto 1° da sentença (que no dia 28 de Março de 2009, cerca das 04:18horas, o arguido conduzia o veículo automóvel ligeiro de passageiros, com a matrícula ..-..-OF, marca Peugeot, de cor azul, pela ………., área desta cidade e comarca do Porto, após ter ingerido bebidas alcoólicas, tendo acusado a IAS de 7,33 G/L, conforme ticket emitido pelo aparelho "Drager Alcotest, 7110MKIII", aparelho este cuja utilização se encontra devidamente autorizada pelas entidades oficiais), mas também que foi também submetido a exame de álcool-teste, através do aparelho Drager para a detecção qualitativa de excesso de álcool, tendo então acusado uma taxa de 1,16 g/l.

  6. É isso que resulta do conjunto da prova constante dos autos e, desde logo, do teor do próprio auto de notícia por detenção, conjugado com o depoimento da única testemunha que sobre isso se referiu, o agente da PSP C………., ouvida em julgamento e cujo depoimento foi gravado em CD, constando da faixa de gravação identificada com o seu nome e registada entre as 15.43 às 15.55 horas, constando o excerto transcrito na presente motivação, de "00´00 a 00'57".

  7. Do que acaba de se expor resulta que o ponto 1° da matéria de facto provada, se restrita ao respectivo teor, se encontra incorrectamente julgado, encontrando-se a sentença viciada por erro notório na apreciação da prova (art. 410°, n.º 2, al. c) do CPP).

    A absolvição quanto ao crime do artigo 292°, n.° 1 do Código Penal O tipo objectivo de ilícito pressupõe a verificação da taxa de álcool no sangue igual ou superior a l, 2g/l.

  8. Relativamente à condução que é objecto dos presentes autos, não foi verificada tal taxa, nem qualquer outra que, por isso, não consta dos factos provados.

  9. E não se tendo provados os factos em abstracto subsumíveis à conduta criminalmente tipificada, não pode julgar-se praticado o crime, pelo que a sentença recorrida violou o disposto no artigo 290°, n.º l do CP, devendo ser revogada e substituída por outra que de tal crime absolva o arguido.

    SEM PRESCINDIR: 15. O crime previsto no artigo 292°, n.º l do Código Penal é de perigo abstracto, exigindo a verificação, no momento da sua prática, de todos os elementos objectivos do tipo.

  10. A proibição de não conduzir veículos nas doze horas seguintes à detecção de uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 1,2 g/l — e apenas nesse período— e a possibilidade o agente poder conduzir antes do termo desse período, desde que demonstre por análise que o teor alcoólico do seu organismo é inferior a 0.5 g/l, são expressão do carácter temporário da concentração do teor alcoólico no sangue e de que a dissipação desse teor alcoólico é simples efeito de o organismo se encontrar em funcionamento.

  11. Os alcoolímetros são meios de obtenção de prova e não meios de prova.

  12. Às 4 horas, a taxa de álcool no sangue poderia até ter um valor inferior ao limite previsto no artigo 292°, n.º l do Código Penal, podendo mesmo ser de l, 06 g/l, de acordo com a tabela anexa à Portaria n.° 748/94 de 3 de Outubro (1,16 g/l - (l,16 g/l * 8%)), caso em que a conduta objectivamente provada corresponderia não seria criminalmente ilícita, constituindo contra-ordenação.

  13. Em tais circunstâncias, é manifesto que a situação de facto não poderia deixar de conduzir razoavelmente à dúvida quanto à verificação do elemento objectivo do tipo em análise e, por força do princípio in dubio pro reo, à absolvição, princípio aquele que pela decisão recorrida foi violado.

    A MEDIDA CONCRETA DA PENA PELOS...

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