Acórdão nº 1139/03.6GBAGD de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 15 de Dezembro de 2009
Magistrado Responsável | DRª PILAR DE OLIVEIRA |
Data da Resolução | 15 de Dezembro de 2009 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
S Meio Processual: RECURSO CRIMINAL Decisão: CONFIRMADA Legislação Nacional: ARTIGOS 2º, 4, 44º,45º CP , 371º-A CPP Sumário: 1. A decisão sobre a medida e espécie da pena tem lugar no dispositivo que se segue ao julgamento, a sentença, apenas podendo ser reapreciada em recurso que da mesma seja interposto.
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O regime de permanência na habitação e a prisão por dias livres são verdadeiras penas de substituição da pena de prisão e não formas de execução desta.
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A reabertura da audiência destina-se aos casos de aplicação da lei nova mais favorável, após o trânsito em julgado da condenação, com base na primeira parte do artigo 2º, nº 4 do Código Penal que imponham a aplicação de uma nova pena e que, por isso, impliquem reavaliação dos fundamentos de facto da decisão.
Decisão Texto Integral: I. Relatório No processo comum singular nº 1139/03.6GBAGD da Comarca do Baixo Vouga, Juízo de Instância Criminal de Águeda, o arguido A...
foi condenado por sentença de 7 de Abril de 2006, confirmada por acórdão desta Relação de 29 de Novembro de 2006, transitado em julgado, na pena única de um ano e oito meses de prisão, resultante das seguintes penas parcelares: - um mês e quinze dias de prisão pela autoria de um crime de violação de domicilio qualificado p. e p. pelo artigo 190º, nº 1 e nº 3 do Código Penal; - um ano de prisão pela autoria de um crime de resistência e coacção sobre funcionário p. e p. pelo artigo 347º do Código Penal; - um ano de prisão pela autoria de um crime de ofensa à integridade física qualificada p. e p. pelos artigos 143º, nº 1 e 146º, nº 1 do Código Penal; - sete meses de prisão pela autoria de um crime de dano p. e p. pelo artigo 212º, nº 1 do Código Penal.
O arguido encontra-se preso em cumprimento de tal pena desde 27 de Março de 2009 e, considerando dois dias de detenção sofrida, está o seu termo previsto para 24 de Novembro de 2010.
Em 31 de Março de 2009 o arguido requereu, ao abrigo do disposto no artigo 44º, nºs 1 e 2 do Código de Processo Penal, que a pena seja executada em regime de permanência na habitação ou, nos termos do artigo 45º do mesmo diploma, por dias livres.
O arguido foi ouvido em declarações e foi elaborado relatório social.
Em 27.7.2009 foi determinada a reabertura da audiência nos termos do artigo 371º-A do Código de Processo Penal.
Realizada a audiência, em 7 de Agosto de 2009 foi proferida sentença em que se decidiu manter inalterada a pena aplicada ao arguido.
Inconformado com o decidido, o arguido recorreu, condensando a respectiva motivação nas seguintes conclusões: I- Após início do cumprimento de uma pena de prisão efectiva, se o condenado requer a aplicação do regime fixado no Artº. 44º e, caso o Tribunal o entenda, em simultâneo, com o regime do Artº. 45º, ambos do Código Penal, tamanho requerimento não se subsume a uma reabertura da Audiência, antes, configurando um requerimento normal que com celeridade terá de ser apreciado; II- O regime legal fixado no Artº. 44° do Código Penal, mais de que um mero incidente de execução da pena, consubstancia uma verdadeira pena de substituição.
III- Assim, tendo por como ultima ratio a pena de prisão, bem assim o efeito infame do meio prisional, bem assim o facto de ao arguido haver sido aplicada a pena de um ano e seis meses, o facto de este estar obrigado a contribuir com a pensão de alimentos para os seus filhos menores na quantia de € 250,00 e de estes, nomeadamente, um filho de 12 anos manifestar grande preocupação com o facto de o pai estar preso, é de lhe aplicar a pena de substituição a que alude o Art9. 44º nº. 2 do Código Penal, por se mostrar preenchido o requisito da al. d) do n° 2; IV- Por maioria de razão, há-de resultar aplicável tamanho regime se o condenado, concomitantemente com essa pena de substituição, se propõe cumprir pena de prisão por dias livres a executar ao fim de semana, não sendo necessário, neste caso, a verificação do requisito temporal a que alude o Artº. 45º do Código penal, já que é o próprio condenando que, para garantia do cumprimento da pena do Art°. 44º se propõe, simultaneamente, cumprir a pena prevista naquela norma legal.
V- Assim sendo, face ao disposto no Artº. 44º do Código Penal, nomeadamente, ao facto de este preceito consubstanciar uma verdadeira pena de substituição e o facto de o arguido se prontificar a cumprir prisão por dias livres, afigura-se-nos ser de concluir por um juízo de prognose a si favorável em ordem à sua reintegração e respectiva capacidade para conduzir a sua vida de modo socialmente responsável à luz de uma perspectiva de realização adequada e suficiente das finalidades da punição.
TERMOS EM QUE, NOS MELHORES DE DIREITO CUJO PROFICIENTE SUPRIMENTO DE Vª.S EXª.S SE INVOCA, DEVE O PRESENTE RECURSO SER RECEBIDO E NO SEU TOTAL PROVIMENTO, REVOGAR-SE A DECISÃO RECORRIDA, ASSIM SE FAZENDO JUSTIÇA.
Notificado, o Ministério Público respondeu ao recurso, concluindo o seguinte: 1. A decisão recorrida fez uma correcta aplicação da lei, não merecendo qualquer juízo de censura, dada a benevolência da condenação, tendo em conta o historial do arguido.
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Face à pena aplicada ao arguido está afastada a possibilidade de a mesma poder ser substituída por qualquer das penas de substituição previstas nos artigos 44° e 45º do Código Penal.
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Face ao comportamento do arguido no decurso dos presentes autos justifica-se que o mesmo cumpra a pena de prisão, dada a culpa e ilicitude que rodearam a sua conduta.
Termos em que, julgando improcedente o recurso do apresentado pelo arguido será feita JUSTIÇA! Admitido o recurso e remetidos os autos a esta Relação, a Exmª Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer no sentido de que o recurso não merece provimento.
Cumprido o disposto no artigo 417º, nº 1 do Código de Processo Penal, o arguido respondeu pugnando pela procedência do recurso.
Corridos os vistos legais e realizada conferência, cumpre apreciar e decidir.
***II. Fundamentos da Decisão Recorrida Da decisão recorrida constam os seguintes fundamentos (transcrição da parte relevante para apreciação do recurso interposto): Da prova produzida em sede de reabertura da audiência de julgamento e do relatório junto autos resultou ainda que: O arguido tem veículos automóveis que coloca em stands à consignação, nomeadamente em X… e em Y…, ficando para si com metade do lucro venda; No mês de Junho de 2009 não vendeu qualquer veículo automóvel; A mãe dos filhos do arguido aufere € 1.550,00 mensais resultantes de um armazém que deu de arrendamento a uma empresa que se dedica ao fabrico de móveis de casa de banho; Tem ainda um outro armazém com cujo arrendatário se encontra em litígio judicial por rendas em atraso; A esposa do arguido dedica-se à criação de gado suíno, bem como à execução e comercialização de tapetes de Arraiolos, actividades que lhe dão rendimentos no valo de € 600,00 mensais; Factos não provados Da prova produzida em sede de reabertura da audiência de julgamento não ficou provado que: - é o arguido que tem provido pelo sustento da esposa e dos filhos, comprando alimentos; vestuário, provendo pelo pagamento de despesas escolares, médicas e medicamentosas, para além da pensão de alimentos que paga.
Fundamentação da decisão da matéria de facto Pese embora a reabertura da audiência, nos termos do art. 371 °-A do Código de Processo Penal, se limite à questão da apreciação da possibilidade de aplicação retroactiva da lei nova por se mostrar em concreto mais favorável, não visando a realização de um segundo julgamento, tal não afasta a possibilidade da produção de prova acrescida (mesmo por determinação ex officio, se necessário para aferir da aplicabilidade da lei nova.
Ac. RP 23.01.2008, www.dgsi.pt; Ac. RC 27.02.2008, CJ, ano XXXIII, tomo 1, pág. 55 e ss.;Ac. RG 07.04.2008, www.dgsi.pt; Ac. RP 28.05.2008, www.dgsi.pt; Ac. RP 10.12.2008, www.dgsi.pt No caso dos autos, sendo que a questão que é trazida à apreciação do Tribunal é a da aplicabilidade do disposto no n° 2 dá art. 44° do Código Penal, reclamou a produção de prova acrescida (cingida à matéria alegada e com relevo em face da hipótese legal dessa norma), que foi apreciada pelo Tribunal mediante uma análise global e criteriosa, que foi interpretada, conjugada e ponderada segundo cânones de razoabilidade, adequação e sempre em observância das regras por que se pauta o processo penal.
Assim, o Tribunal teve em consideração o relatório social constante de fls. 1011 a 1016 dos autos, referente às condições de vida do cônjuge do arguido e dos seus filhos.
O arguido, nas suas declarações, fez referência às condições económicas da sua esposa revelando, contudo, não ter um conhecimento concreto, antes revelando ser fruto de informações que teve, à excepção do facto de um dos armazéns da esposa ter sido ocupado por uma empresa que foi declarada insolvente, reconhecendo embora serem prédios valiosos.
Informou ainda o Tribunal das suas condições pessoais, relatando os frutos do seu rendimento vincando que não consegue levar a cabo a sua actividade de venda de veículos automóveis estando preso no estabelecimento prisional.
MJ…, actual companheira do arguido fez referência aos alimentos que o arguido tem de prestar aos filhos, bem como as dificuldades encontradas na própria entrega, de géneros alimentício: que os filhos lhe pedem. Confirmou ainda que o arguido tem carros à venda em locais diversos.
JR…, no seu depoimento, afirmou que os problemas do arguido com a Justiça se deveram um período conturbado da sua vida, por razões ligadas à sua separação da esposa, mas que estabilizou. Aludiu ainda ao facto de a esposa do arguido ter os armazéns vazios.
Da ponderação de toda a prova produzida, pese embora pelo menos uma das testemunhas haja referido que os armazéns da esposa do arguido estarem vazios, o próprio arguido apenas firmou que um desses armazéns se encontra vago.
De todo o modo, tendo em consideração o teor do relatório junto aos autos, e sendo que, seja as declarações do arguido, seja o depoimento da testemunha JR… se...
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