Acórdão nº 385/11.3TXPRT-M.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 10 de Setembro de 2014
Magistrado Responsável | MARIA DOLORES SILVA E SOUSA |
Data da Resolução | 10 de Setembro de 2014 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Proc. n. º 385/11.3TXPRT-M.P1 Porto Acordam, em Conferência, no Tribunal da Relação do Porto.
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Secção criminal.
I-Relatório.
No Processo n.º 385/11.3TXPRT-M do 2.º Juízo do Tribunal de Execução de Penas do Porto, em que é recorrente, o arguido B…, foi proferida decisão 26 de Março de 2014, a fls. 433 a 437, que não concedeu a liberdade condicional ao arguido, cumpridos que estão 2/3 (23.10.2013) da sua pena de prisão.
O arguido inconformado interpôs recurso, consoante motivação de fls. 7 a 17 destes autos, pugnando pela revogação dessa decisão e pela concessão da liberdade condicional, acabando por concluir nos seguintes termos: 1. Deve alterar-se a redação do n.º 4 da alínea M. dos factos tidos como provados, com o título “caracterização pessoal”, de modo que ali fique a constar que o recluso está e sente-se arrependido, considera justa a pena de prisão e desde 11 de Novembro de 2013 que trabalha na cozinha do EP.
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Dos factos provados, com a alteração peticionada na conclusão anterior decorre, entre outros factos e conclusões, que o recluso B…: a) Desde Fevereiro de 2005 e até ao dia 28 de Fevereiro de 2011, esteve em liberdade, ou seja, esteve em liberdade por um período de 6 anos.
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Em 28 de Fevereiro de 2011 apresentou-se voluntariamente no estabelecimento prisional onde se encontra desde então a cumprir o resto da pena em que foi condenado; c) Desde Julho de 2003 e até á data do CT (3 de Março de 2014) não cometeu nenhum crime; d) Durante esse período de tempo, cumpriu efetivamente 4 anos e 9 meses de prisão (desde Julho de 2003 a Fevereiro de 2005 e desde 28 de Fevereiro de 2011 até á data do CT); e) Durante esses 4 anos e 9 meses de cumprimento efetivo da pena de prisão, o B… trabalhou e cometeu uma única infração (uso de telemóvel); f) Entre Fevereiro de 2005 e Fevereiro de 2011, ou seja, durante 6 anos, o recluso B… esteve em liberdade e também não cometeu nenhum crime; g) Durante esses 6 anos que intercalaram o cumprimento da pena em prisão preventiva e o início do cumprimento do restante da pena, não há noticia de que a liberdade de que beneficiou o recluso B… tenha afetado a ordem e/ou a paz social; h) Apresentou-se a insolvência beneficiando o Estado, de modo a que este execute o seu património.
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O recluso B…, conforme consta praticamente em todos os Relatórios Técnicos e Sociais colhidos para instruir os autos para efeitos do CT do dia 3 de Março de 2014 e conforme decorre da sua conduta no interior do EP, vem pautando a sua vida pelo estrito respeito no seu relacionamento com os outros reclusos, com os senhores guardas prisionais e com os demais funcionários, pelo trabalho e pelo cumprimento das normas e regras legais, não praticando factos criminosos ou crimes nem cometendo, com exceção da referente ao uso de telemóvel, infrações disciplinares.
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Quando em liberdade, designadamente entre Fevereiro de 2005 e 28 de Fevereiro de 2011 ou quando esteve em gozo de precárias, o recluso B… não criou alarme na ordem e na paz pública tendo-se conduzido de modo exem piar nas suas relações profissionais e sociais.
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O juízo de prognose formulado pelo tribunal "a quo' que levou á não concessão da liberdade condicional a B… não se adequa e não se compatibiliza com os factos referidos na conclusão 2 e alicerça-se num raciocínio inquinado que não tem sustentação fáctica.
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Os factos praticados pelo recluso são "velhos", têm mais de 10 anos, não envolveram qualquer crime de sangue, mas apenas e só "o rei do mundo" (o dinheiro), que escraviza tudo e todos.
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Da concessão da liberdade condicional ao recluso B…, quando decorreram já mais de 10 anos da prática dos factos e quando á data do CT tinha cumprido já mais 2/3 partes (praticamente 3/4 partes) da pena de prisão, não resultará qualquer alarme na ordem e na paz pública.
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Na douta decisão recorrida incorreu-se em erro na apreciação dos factos, erro de julgamento e violou-se o art. 61.º/1 e 2 do Cód. Penal.
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Verificam-se, assim, os requisitos do artigo 61.º, n.º 1 e 2 alíneas a) e b) do Cód. Penal para ser concedida ao recluso a liberdade condicional, repete-se, condicional.
*O Ministério Público respondeu, consoante fls. 22 a 29 destes autos, sustentando que o recurso não merece provimento, mantendo a posição anteriormente assumida em pronúncia sobre a concessão da liberdade condicional, concluindo nos seguintes termos: 1- Face ao tipo, gravidade e modo como os cries pelos quais o recorrente cumpre pena foram cometidos e à sua posição de mera assunção da autoria dos mesmos, não é possível, neste momento, efectuar um juízo de prognose favorável no sentido de que o mesmo conduzirá a sua vida de modo socialmente responsável e sem cometer novos crimes; 2 - Na apreciação dos pressupostos da liberdade condicional deve tomar-se em consideração o crime pelo qual o agente cumpre pena e as circunstâncias em que o mesmo ocorreu, no sentido de se determinar o seu carácter e a personalidade, reveladores do seu comportamento em liberdade; 3- A circunstância dos crimes em causa terem sido levados a cabo durante cerca de 6 anos, revela a persistência e a renovação da intenção criminosa do arguido e caracteriza a sua personalidade desviante e gananciosa; 4 - Perante um prejuízo causado ao estado de € 6.149.013, 08, não ressarcido, a consideração da prevenção especial e geral, a primeira essencial nesta fase de cumprimento da pena, constitui uma ponderação real e efectiva sobre o seu comportamento em liberdade, de acordo com o modo como o mesmo vem cumprindo a pena a que foi condenado, bem como do sentir da sociedade quanto à reposição da validade das normas jurídicas violadas; 5- A mera assunção da prática dos crimes, desacompanhada de atitudes e comportamentos condizentes, revela a reduzida capacidade de autocrítica revelada pelo recorrente relativamente aos factos praticados e é sinónimo de ausência de uma efectiva interiorização do desvalor das condutas assumidas e acentua os traços de uma personalidade mal formada, fazendo duvidar da sua real capacidade para adequar os seus comportamentos futuros aos valores sociais dominantes, tutelados pelas normas penais; 6 - No caso dos autos, não se mostra minimamente assegurada a verificação dos pressupostos previstos nas als. a) e b) do n° 2 do art. 61.º do C. Penal; 7 - Não foram violados quaisquer preceitos legais, tendo o Tribunal a quo feito uma correcta interpretação dos factos e da aplicação do Direito no caso em apreço.
Nesta Relação, o Ministério Público emitiu do parecer no sentido da improcedência do recurso.
Cumpriu-se o disposto no art. 417.º, n.º 2 do Código de Processo Penal.
Foram colhidos os vistos legais.
*II- Fundamentação.
Conforme se alcança das conclusões do recurso – que como decorre do estatuído no art. 412º, n.º 1, do Código de Processo Penal, e é jurisprudência pacífica, delimitam o âmbito do seu conhecimento –, é suscitada a seguinte questão: 1.Questão a decidir: - Pretensão de alteração do ponto 4 da alínea M dos factos provados.
- Existem ou não fundamentos para a concessão da liberdade condicional.
*2 Factualidade relevante.
Da decisão recorrida transcrevem-se os seguintes factos relevantes: «A.
O condenado encontra-se a cumprir, pela prática dos indicados crimes, a pena de:
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NUIPC PCC 156/00.2IDBRG – 1.ºJCrTJBarcelos -1 crime de introdução fraudulenta no consumo, na forma qualificada (art.º 97. b), com referência ao art. 96.º, n.º 1 a) do RGIT): (3A6M de prisão) - 1 crime de fraude sobre mercadorias, na forma continuada (art. 23.º, n.º 1 do DL 28/84 de 20jan): (8M de prisão + 80D de multa à taxa diária de €30,00) - 1 crime de fraude fiscal, na forma agravada e continuada (art. 23.0. n.º 1,2, a) e b), 3 a), e) e D, 4 do RJIFNA): (3A6M de prisão) - 1 crime de branqueamento de capitais, na forma continuada (art. 2.º, n.º 1 a) do DL 325/95 de 2dez): (3A de prisão) (decisão do STJ) - 1 crime de frustração de créditos (art. 88.º, n.º 1 do RGIT): (8M de prisão) -1 crime de falsificação (art. 256.0, n." 1 a), b) e c) do CP): (8M de prisão) *** Factos de 1997 a 2003 Decisão de 1.ª instância de 60ut2006 Decisão do TRG de 16fev2009 Decisão do STJ de 6mai2010 *** Cúmulo jurídico de 6A4M de prisão + multa de 80D de multa à taxa diária de €30,00 (decisão do STJ) *** Condenação no pagamento por via de pedido cível, solidariamente, ao Estado Português, do valor de €6.149.013,08.
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Iniciou o cumprimento da pena (com reporte à globalidade dos autos integrantes do cúmulo jurídico de penas) em 28fev2011 (com início deferido face a desconto a efectuar no âmbito de detenção seguida de m.c. - entre 13jul2003 e 14set2004, com termo previsto para 3dez2015, com 1/2 vencido em 30ut2012, os 2/3 para 230ut2013 e os 5/6 para 12nov2014.
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A pena de multa (800 de multa à taxa diária de €30,00) mostra-se extinta pelo pagamento (18mar2011).
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Apresentou-se à insolvência, dando origem ao NUIPC 22/07.0TBESP do 1.ºjTJEsposende, em 2jan2007, sendo declarado insolvente em 4jan2007, pelas 17h30m45s, com trânsito em julgado de 19fev2007.
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Nesses autos de insolvência não foi ainda proferido despacho de encerramento, encontrando-se os mesmos a aguardar a liquidação do activo.
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Tem outros antecedentes criminais conhecidos: a) PCS 343/01 - 1.ºJCrTJBarcelos - crime de fraude às garantias fiscais e aduaneiras - art. 98.º, n.º 1 do RGIT - pena de 150D de multa à taxa diária de 700$00 - extinta pelo pagamento; b) PCS 34/99.6EAVIS (ex. 112/01) - 1.ºJCrTJBarcelos - especulação - art...
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