Acórdão nº 400/13.6PDPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 18 de Março de 2015

Magistrado ResponsávelNETO DE MOURA
Data da Resolução18 de Março de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 400/13.6 PDPRT.P1 Recurso Penal Relator: Neto de Moura Acordam, em conferência, na 1.ª Secção (Criminal) do Tribunal da Relação do Porto I - Relatório No âmbito do processo comum que, sob o n.º 400/13.6 PDPRT, corre termos pela Instância Local do Porto, Secção Criminal (Juiz 7), da Comarca do Porto, foi submetido a julgamento, por tribunal singular, o arguido B…, mediante acusação do Ministério Público que lhe imputou a prática de factos susceptíveis de consubstanciar um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade previsto e punível pelos artigos 21.º e 25.º, al. a), do Dec. Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro.

Realizada a audiência, com documentação da prova nela oralmente produzida, foi proferida sentença, datada de 19.03.2014 (fls. 215 e segs.) e depositada na mesma data, com o seguinte dispositivo (na parte relevante): “Condeno B…, como autor imediato, sob a forma consumada e como reincidente, de um crime de tráfico de menor gravidade, p. e p. pelos art. 25.º, al. a), do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, 14.º, n.º 1, 26.º, 75.º e 76.º, do C.P., praticado em 10.10.2013, na pena de 3 (TRÊS) ANOS E 6 (SEIS) MESES DE PRISÃO.

(…) DECLARO PERDIDA A FAVOR DO ESTADO a substância apreendida e ordeno a sua oportuna destruição”.

Inconformado com tal decisão, e almejando a sua absolvição ou, quando menos, “uma substancial diminuição da pena” e a suspensão da sua execução, o arguido dela interpôs recurso para este Tribunal da Relação, com os fundamentos explanados na respectiva motivação, que condensou nas seguintes conclusões (em transcrição integral): 1. “O arguido destinava a cocaína, para consumo próprio e não para vender.

  1. Na decisão recorrida não se provou que o arguido tivesse aquela substância em seu poder para vender.

  2. A consideração de que tal substância era para venda resultou de uma mera ilação e não concretamente de factos que permitissem chegar a essa conclusão.

  3. Nos termos da Lei n° 30/2000, art° n 2° n°s 1 e 2 não constitui crime ter para consumo próprio a quantidade de 1,5 g diárias de cocaína, até um período máximo de 10 dias, o que perfaz 15 gramas.

  4. Ora o arguido tinha somente 4,799 g de cocaína, pelo que o arguido deve ser absolvido pela prática do crime por que foi condenado.

  5. Assim, na sentença recorrida foi feita uma errada aplicação do art° 25° al. a), com referência ao art° 21° n°1 do Decreto-Lei n° 15/93 de 22 de Janeiro e uma errada aplicação do art° 75° do C. Penal.

    Sem Prescindir: 7. Face aos factos dados como provados, foi exagerada a aplicação ao arguido de 3 anos de prisão, tendo assim sido feita uma indevida aplicação do art° 25° al. a) do Dec. Lei n° 15/93 de 22-1 que prevê como limite mínimo de 1 (um) a 5 (anos).

  6. e como reincidente, na pena total de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de prisão.

  7. impondo-se uma substancial diminuição da pena, 10. E sempre em qualquer dos casos ser a pena suspensa na sua execução, pois a simples censura do facto e a ameaça de prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (art° 50° n° 1 do Cód. Penal)”.

    *Admitido o recurso (despacho a fls. 207) e notificado o Ministério Público, veio este responder à respectiva motivação, pugnando pela sua improcedência, por considerar que se fez correcta aplicação do direito aos factos.

    *Ordenada a subida dos autos ao tribunal de recurso, e já nesta instância, na intervenção a que alude o n.º 1 do art.º 416.º do Cód. Proc. Penal, o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer em que se manifesta pela total improcedência do recurso, já porque foi feita criteriosa apreciação e valoração da prova, já porque a pena se mostra adequada à culpa do arguido e às necessidades de prevenção e “não pode ser efectuado um juízo de prognose positiva de que a ameaça da pena baste para o manter afastado da delinquência”.

    *Foi cumprido o disposto no art.º 417.º, n.º 2, do Cód. Proc. Penal, mas não houve resposta do recorrente.

    * Efectuado exame preliminar e colhidos os vistos, vieram os autos à conferência, cumprindo apreciar e decidir.

    II – Fundamentação São as conclusões que o recorrente extrai da motivação, onde sintetiza as razões do pedido, que recortam o thema decidendum (cfr. artigos 412.º, n.º 1, do Cód. Proc. Penal e, entre outros, o acórdão do STJ de 27.05.2010, www.dgsi.pt/jstj)[1] e, portanto, delimitam o objecto do recurso, assim se fixando os limites do horizonte cognitivo do tribunal de recurso, naturalmente sem prejuízo da apreciação das questões que são de conhecimento oficioso, como é o caso das nulidades insupríveis e dos vícios da sentença, estes previstos no n.º 2 do art.º 410.º do Cód. Proc. Penal.

    O arguido/recorrente afirma que não se provou que “tivesse aquela substância em seu poder para vender” (conclusão 2.ª) e que “nos termos da Lei n.º 30/2000, art.º 2.º, n.ºs 1 e 2 não constitui crime ter para consumo próprio a quantidade de 1,5 g diárias de cocaína, até um período máximo de 10 dias, o que perfaz 15 gramas” (conclusão 4.ª).

    Porém, s.d.r., tais afirmações só podem resultar de confusão e equívocos, que importa, desde já, desfazer.

    A simples consulta do mapa a que se refere o n.º 9 da Portaria n.º 94/96, de 26 de Março, permite constatar a abissal diferença entre a quantidade de cocaína (cloridrato) que o arguido/recorrente diz poder deter para consumo próprio diário (1,5 gramas) sem cometer crime e o limite quantitativo máximo legalmente estabelecido para cada dose média individual diária daquela substância.

    Por outro lado, como já veremos, faz parte do elenco de factos provados da sentença que a cocaína que tinha em seu poder destinava-a o arguido/recorrente à venda a quem se lhe dirigisse para o efeito.

    O que o recorrente terá querido dizer é que, na sua óptica, não se fez prova desse facto (a detenção para venda) e, portanto, está a impugnar a decisão sobre matéria de facto, por erro de julgamento.

    Além disso, a irresignação do recorrente dirige-se à espécie e medida da pena, pretendendo que a pena de prisão seja (consideravelmente) diminuída e que a sua execução seja suspensa.

    Por isso são três as questões a enfrentar: - se houve erro de julgamento em matéria de facto, por incorrecta apreciação e valoração da prova; - se na determinação da pena o tribunal respeitou os parâmetros legais; - se é possível formular um juízo de prognose positivo sobre o comportamento do arguido/recorrente, de molde a justificar a suspensão da execução da pena de prisão.

    *Identificadas as questões a decidir e delimitado o objecto do recurso, importa conhecer os factos provados: No dia 10 de Outubro de 2013, pelas 11h.30m, B…, aqui arguido, circulava ao volante da viatura da marca Fiat …, com a matrícula "..-..-GI'', na Rua …, em …, área desta Comarca do Porto, local onde habitualmente transitam vários indivíduos ligados ao consumo de estupefacientes, tendo sido abordado por agentes da PSP.

    Apercebendo-se da abordagem policial, o arguido introduziu na boca um canto de plástico contendo vários pedaços de cocaína, com o peso líquido de 4,799 gramas por forma a não ser detido na posse de tal substância, e que destinava à venda a quem se lhe dirigisse para o efeito.

    A referida quantidade de cocaína que o arguido detinha, não lhe permitiria realizar número elevado de vendas ou cedências, nem retirar das mesmas lucros avultados.

    O arguido sabia que não lhe era lícito deter e vender cocaína, substância cuja natureza estupefaciente e características psicotrópicas bem conhecia e, não obstante, quis fazê-lo, agindo da forma descrita.

    Agiu livre e conscientemente, com conhecimento do carácter proibido e criminalmente punido da sua conduta.

    O arguido, à data, consumia diariamente heroína.

    No âmbito do Processo Comum Colectivo n.º 1488/90.HBSTS, do 2.º juízo criminal de Santo Tirso, o arguido foi em 21-11-1990 condenado na pena de 9 (nove) meses de prisão e multa de Esc. 30 000$00 (trinta mil escudos), pela prática em 30-01- 1990, de um crime de tráfico de estupefacientes, tendo já sido declaradas extintas as ditas penas, pelo cumprimento de prisão até 21-11-1990 e pelo pagamento da multa em 05-12-1990.

    No âmbito do Processo Comum Colectivo n.0 4516/05.4TBSTS, do 1.0 juízo criminal de Santo Tirso, o arguido foi em 15-07-1993 condenado na pena de 3 (três) anos e 15 (quinze) dias de prisão, pela prática em 1990, de um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, p. e p. pelo art.º 25.0, al. a), do Decreto-Lei n.º 15/93, posteriormente perdoado um ano de prisão, que viria a ser revogado, tendo já sido declarada extinta a dita pena, pelo cumprimento de prisão.

    No âmbito do Processo Comum Colectivo n.º 331/95, da 1.ª Vara Criminal do Porto, o arguido foi em 15-11-1995 condenado na pena única de 9 (nove) meses de prisão, pela prática em 28-01-1995, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art.º 25.0, ai. a), do Decreto-Lei n.º 15/93 e de um crime de consumo de estupefacientes, p. e p. pelo art." 40.0, n." 1, do Decreto-Lei n." 15/93, tendo a respectiva pena já sido declarada extinta.

    No âmbito do Processo Comum Singular n.º 119/97.3TBAMT, do 2.º juízo de Amarante, o arguido foi em 22-01-1998 condenado na pena de 3 (três) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 2 (dois) anos, pela prática em 24-08-1996 de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art.º 275.0, n.º 1 e n.º 2, do C.P., tendo a respectiva sentença transitado em julgado em 06-02-1998, já declarada extinta.

    No âmbito do Processo Comum Colectivo n.º 65/97 do Tribunal de Círculo de Paredes, o arguido foi em 11-02-1998 condenado na pena de 10 (dez) meses de prisão, pela prática em 20-10-1996 de um crime de consumo de estupefacientes, p. e p. pelo art.º 40.0, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 15/93.

    No âmbito do Processo Comum Colectivo n.º 48/98, do Tribunal de Círculo de Penafiel, o arguido foi em 21-12-1998 condenado na pena de 100 (cem) dias de multa à taxa diária de Esc. 500$00 (quinhentos escudos), pela prática em 19-09-1996 de um crime de tráfico de...

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