Acórdão nº 1348/14.2TAGDM.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 26 de Abril de 2017

Magistrado ResponsávelJORGE LANGWEG
Data da Resolução26 de Abril de 2017
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 1348/14.2TAGDM.P1 Data do acórdão: 26 de Abril de 2017 Relator: Jorge M. Langweg Adjunta: Maria Dolores da Silva e Sousa Origem: Comarca do Porto Instância Local de Gondomar | Secção Criminal Sumário: Um recorrente arguido carece de legitimidade para impugnar matéria de facto provada que apenas contribuiu para a absolvição de coarguido (artigo 401º, 1, b), a contrario sensu, do Código de Processo Penal), por carecer de interesse em agir (nº 2 do mesmo artigo).

Acordam, em conferência, os juízes acima identificados do Tribunal da Relação do Porto Nos autos acima identificados, em que figura como recorrente o arguido B…;I – RELATÓRIO1. Por sentença datada de 28 de Setembro de 2016, o arguido ora recorrente – entre outros – foi condenado pela prática, em autoria material, de um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo artigo 143º, n.º 1 do Código Penal, na pena de 100 (cem) dias de multa à taxa diária de €5,00 (cinco euros).

2. No mesmo dispositivo o arguido C… foi absolvido da acusação pela prática de dois crimes de ofensa à integridade física simples de que vinha acusado.

3. Inconformado com a decisão, o arguido recorreu da mesma, terminando a motivação do recurso com a formulação das conclusões seguidamente reproduzidas: "O Recorrente foi condenado pela prática, em autoria material, de um crime de injúria agravada[1], previsto e punido pelo artigo 143°/1 do Código Penal na pena de 100 dias de multa, à taxa diária de €5,00.

O Tribunal a quo deu como provados, entre outros e com relevo para apreciação do presente recurso, os seguintes factos: "No dia 15 de Outubro de 2013, cerca das 17:00 horas, no interior do estabelecimento comercial de supermercado sito na Rua …, n°. …, em …, o arguido B… munido de uma vassoura desferiu diversas pancadas nos braços de C….

Em resposta imediata às pancadas nos braços, (restringindo-se aa impugnação à parte sublinhada) o arguido C… desferiu um murro na face de B…, ao que caíram e se envolveram, de forma não concretamente apurada, no chão.

Os arguidos B… e D… agiram livres, deliberada e conscientemente com intenção de se ferirem e molestarem fisicamente o corpo de C…, o que conseguiram.

Sabiam esses arguidos que as suas condutas eram punidas e proibidas por lei.

O arguido C… agrediu B… para repelir agressões no seu corpo de que estava a ser alvo naquele momento." (impugnando-se o facto na parte sublinhada).

Para dar como provados aqueles factos, o Tribunal a quo formou a sua convicção no depoimento das testemunhas indicadas pela acusação e nas declarações do ofendido/arguido C….

Com o devido respeito, face à prova testemunhal produzida em audiência de julgamento, não aceita o recorrente que se tenham provado aqueles factos.

Os arguidos C… e B… negaram os factos que lhes são imputados e apresentaram versões diferentes dos mesmos, afirmando, em suma, cada um deles terem sido vítimas e não agressores. Assim é que, Na versão do ofendido/arguido C… resulta que quando entrou no estabelecimento comercial de supermercado, o arguido B… dirigiu-se a si com um pau de vassoura e desferiu-lhe duas pancadas no braço. Refere que levantou o braço para se defender de agressões na cabeça e que lhe deu um murro na cara como reação às agressões que estava a ser vítima naquele momento, conforme resulta das suas declarações gravadas no sislema integrado de gravação digital disponível na aplicação informática do Tribunal e por referencia à ata de audiência de discussão c julgamento de 20.09.2016, com início de gravação às 10:01:52 e fim de gravação às 10:11,37, no período de 00:02 a 02:05.

Por sua vez, na versão do ofendido/arguido B… resulta que se encontrava no supermercado com D…, junto à secção do talho, quando sentiu um murro na face e um empurrão, tendo caído no chão. Nesse momento, refere ter visto o arguido C… com uma vassoura no ar dirigida a si, tendo conseguido agarrar o cabo da mesma e dessa forma, segurando cada um dos arguidos por uma ponta da vassoura, foi arrastado até à porta da loja - conforme resulta das declarações gravadas no sistema integrado de gravação digital daquele Tribunal, com início de gravação às 10:11:29 c Hm de gravação às 10:22.21, mais precisamente no período de tempo de 00:49 a 03:11.

O Tribunal a quo acolheu a versão de C… por entender que embora grosso modo concordantes, não tiveram suporte na restante prova produzida, confirmando as testemunhas inquiridas a versão de C….

Sucede que, nenhuma das testemunhas ouvidas em audiência de julgamento foi capaz de relatar ao Tribunal em que parte do corpo C… terá sido atingido pela vassoura, não obstante a douta decisão recorrida dá como provado que aquele foi atingido nos braços.

Para tanto, assentou a convicção do Tribunal unicamente nas declarações do ofendido C…, pessoa claramente interessada no desfecho dos presentes autos.

Até porque não consta dos autos nenhum relatório médico ou boletim clínico que ateste a existência de lesões nos braços de C…, nem em qualquer outra parte do seu corpo.

Além disso, os depoimentos das testemunhas E… e F… deveriam ter sido valorados pelo Tribunal a quo de forma crítica de acordo com o previsto no artigo 127° do CPP, ponderando-se que devido ao facto destas testemunhas terem uma relação de amizade com C… (dado outrora lerem sido funcionárias do filho deste c por isso o conhecerem há alguns anos), depuseram de forma parcial.

Tanto assim que ambas as testemunhas revelaram uma memória muito seletiva sobre os factos ocorridos no dia 15 de Outubro de 2013, apenas se recordando de factos que apenas beneficiam o ofendido/arguido C….

Nesse sentido, a testemunha E… no seu depoimento (gravado no sistema áudio do Tribunal e por referência à ata da audiência de julgamento de 20.09.2016, com início de gravação 10:30:31 e fim de gravação 10:39:57, concretamente no período de 01:15 a 03:54) referiu ter presenciado o arguido B… a bater com uma vassoura no corpo de C…, mas não conseguiu explicar como reagiu C… para afastar a alegada agressão, bem como não conseguiu identificar qual a parte do corpo em que o mesmo terá sido atingido, Escudando-se, assim, na falta de memória e no alegado pânico vivenciado no que concerne aos factos imputados ao arguido C…, respondendo de forma vaga e com recurso a expressões, tais como "enrolados", convenientemente sem concretizar - como resulta ainda do seu depoimento gravado no CD dc 05:37 a 06:13 c de 07:15 a 07:41.

O que não é de todo normal face às regras da experiência comum, não corroborando o depoimento daquela testemunha a versão do ofendido/arguido C…, o qual, aliás, confessou ter dado um murro na face do arguido/ofendido B… como reação às alegadas ofensas.

Acresce que, do depoimento da testemunha F…, não resulta que aquela tenha presenciado pancadas com a vassoura no corpo de C…, muito menos que aquele tenha sido atingido nos braços. Na verdade, A referida testemunha quando questionada acerca do que se passou, referiu ao Tribunal que viu o senhor G… com um pau de vassoura dirigido ao senhor C… tentando-o agredir e que, nesse ato, este levantou a mão para se defender, tendo começado os dois a agredir-se, não conseguindo, porém, concretizar tais agressões - cfr. depoimento, gravado no sistema áudio do Tribunal e por referência à ata de audiência e julgamento com inicio de gravação às 10:39:59 e fim de gravação às 10:46:25, mais concretamente no período de 01:25 a 03:06.

O depoimento da testemunha F… embora não totalmente coincidente com o da testemunha E…, é em tudo igual quanto à "falta de memória" relativamente aos factos que são imputados ao arguido C…, ressaltando à evidência que tais depoimentos foram produzidos de forma parcial e ensaiada, não tendo sequer reportado ao Tribunal o murro desferido por C… no ofendido B….

Constando dos autos boletins clínicos e exames médicos de avaliação do dano corporal que atestam a presença de lesões/escoriações no corpo do arguido B…, pese embora, s.m.o e a nosso ver mal, o Tribunal a quo tenha dado por não provado que as lesões verificadas em B… advieram de agressões do arguido C…. Acresce que, O depoimento da testemunha H… também não confirma, em nenhum momento a descrição dos factos trazida aos autos por C… relativamente aos factos imputados ao aqui recorrente B…, pois este apenas assistiu a uma pequena parte da contenda, não tendo presenciado o início da mesma, tendo a testemunha referido ao Tribunal que quando chegou ao estabelecimento viu dois homens envolvidos no chão "agarrados um ao outro" e uma senhora a desferir murros e pontapés e a rasgar a camisola de um deles - conforme depoimento gravado no sistema integrado de gravação digital do tribunal a quo por referência à ata da audiência de julgamento de 20.09.2016 com inicio da gravação às 10:46:27 e fim da gravação às 10:52:03.

Pelo que, não restam dúvidas que o Tribunal a quo deu como provado que "o arguido B… munido de uma vassoura desferiu diversas pancadas nos braços de C… e que em resposta imediata a essas pancadas aquele desferiu um murro na face de B…", apenas com base nas declarações do ofendido C….

Sendo que, na ausência de relatórios médicos (relativamente à pessoa de C…), os depoimentos das testemunhas presentes no local em que ocorreram os factos – E… e F… - no seu todo e da forma parcial como o fizeram, não poderiam nunca servir para que o Tribunal a quo formasse a sua convicção no sentido que o arguido cometeu o crime de ofensa à integridade física simples em que foi condenado.

Resultando, outrossim, do depoimento da testemunha F… gravado no CD no período de 01:25 a 03:06., a confirmação da versão do arguido B…, pois que como referiu aquela testemunha C… para se defender da agressão com o pau de vassoura, levantou a mão.

Na verdade, C… não se defendeu com um murro em resposta imediata às pancadas e para repelir as agressões no seu corpo, como o próprio assim fez crer ao Tribunal, e que nenhuma das testemunhas inquiridas confirmou – C… defendeu-se com a mão e posteriormente, com animus ofendendi e não...

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