Acórdão nº 4/14.6PMPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 14 de Junho de 2017

Magistrado ResponsávelL
Data da Resolução14 de Junho de 2017
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)
  1. secção criminal Proc. nº 4/14.6PMPRT.P1 Acordam em conferência no Tribunal da Relação do Porto: I – RELATÓRIO:No processo comum (tribunal singular), do Juiz 1 da secção Criminal da Instância Local do Porto, Comarca do Porto os arguidos B…, C…, D…, E…, F…, G…, H…, I…, J… e K…, foram submetidos a julgamento e a final foi proferida sentença de cuja parte decisória consta o seguinte: (…) Pelo exposto, decido: ● Absolver B…, C…, D…, E…, F…, G…, H…, I…, J…, K…, da prática, em co-autoria material, de um crime de dano qualificado, p. e p. pelo art. 213° n.º 1, als. a) e c), do Código Penal.

    ● Sem tributação criminal.

    ● Julgo improcedente, por não provado, o pedido de indemnização civil formulado pelo Município N… e em consequência absolvo os demandados do pedido.

    ● Custas cíveis a cargo do demandante, sem prejuízo do disposto noart. 4º, n.º 1, al. n), do RCP.

    ● Após trânsito: extraia certidão da presente sentença, de fls. 3 a 7, do processo apenso e de fls. 3-4, 9-10 dos autos, e remeta à CMP para instrução do processo de contra-ordenação.

    (…) Inconformado, o Ministério Público interpôs recurso, no qual formula as seguintes conclusões: (…)1ª Os factos dados como provados na douta sentença recorrida integram os elementos objectivos do crime de dano qualificado, p. e p., pelos arts. 212º., e 213º., nº. 1 . als. a) e c) , do Cód. Penal.

  2. Na verdade, integra o conceito de desfigurar a alude o citado art. 212º., o acto de pintar e, no caso, concreto, o acto de pintar um muro.

  3. E, porque o muro em causa é o muro exterior de uma escola que pertence à Câmara Municipal N…, destinava-se ao uso e utilidades públicos.

    1. Não foi, manifestamente, intenção do legislador, ao regular, nos termos em que o fez, o regime legal da afixação e inscrição de mensagens de publicidade e propaganda (Lei nº. 97/88, de 17/08) e, designadamente, tendo em conta o teor dos seus arts. 4º. e 10º., tomar posição no sentido da descriminalização de determinado tipo de acções, que expressamente qualifica contra-ordenação, acções essas que preenchem também todos os elementos do tipo objectivo do crime de dano, previsto no art. 212º., do Cód. Penal.

    2. Para além da análise comparativa da norma do art. 212º., do Cód. Penal com o regime jurídico consagrado na Lei nº. 97/88, de 17/08, este mesmo sentido se retira da leitura da Reunião Plenária da V Legislatura, de 27/01/1988, in Diário da Assembleia da República, I Série, pag. 4542/3 e, do Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sobre o projecto de lei n.° 25/V (condiciona a afixação da publicidade ou de propaganda, bem como a realização de inscrições ou de pinturas murais), in DAR, I Série, pag. 393 e segs..

    3. O critério para distinguir uns casos dos outros, ou seja, para distinguir se estamos perante a prática do crime de dano ou apenas de uma contra-ordenação, só pode ser o da maior danosidade social da acção, numa análise casuística.

      O tribunal “a quo” apreciou, salvo o devido respeito, erradamente a prova produzida em julgamento, na medida em que deu como não provado o facto de os arguidos terem agido cientes que a sua conduta era proibida e punida por lei criminal.

    4. Concluir que os arguidos preencheram com a sua conduta o elemento subjectivo do crime de dano, resultou da prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, a partir dos factos dados como provados na douta sentença recorrida, num raciocínio lógico e dedutivo.

    5. A douta sentença recorrida apreciou, salvo o devido respeito, erradamente a prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento ao dar como não provado que os arguidos ao agirem estivessem cientes que a sua conduta constituía um ilícito criminal.

    6. E, violou, o disposto nos arts. 212º. e 213º., nº. 1, al. c), ambos do Cód. Penal.

      Face ao exposto, deverá ser concedido provimento ao recurso, substituindo-se a douta sentença recorrida por outra que condene os arguidos B…, C…, D…, E…, F…, G…, H…, I…, J… e K…, pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de dano qualificado, p. e p., pelos arts. 212º., nº. 1 e 213º., nº. 1, als. a) e c), ambos do Cód. Penal, pois só assim se fará (…) Os arguidos responderam, pugnando pela improcedência do recurso.

      O demandante Município N… respondeu pugnando pela procedência do recurso.

      Nesta instância, o Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido da procedência do recurso.

      Cumprido que foi o disposto no artº 417º nº2 do CPP não foi apresentada resposta.

      *Foram colhidos os vistos legais e realizou-se a conferência.

      *A sentença recorrida deu como provados e não provados os seguintes factos, seguidos da respectiva motivação: (…) 1. No dia 31 de Maio de 2014, pelas 16h50m, os arguidos que pertencem à Juventude L… (…), actuando concertadamente e em conjugação de esforços e vontades, com vista a expressarem a sua opinião política e a fazer propaganda política, servindo-se de tintas de várias cores de que previamente se muniram, pintaram vários desenhos e expressões de cariz político, como, “Avante com Abril”, “L…”, “35 anos/1979-2014/Juventude L…”, “Pôr fim ao desastre”, “Derrota o Governo e a Politica de Direita”, vulgografitos, no muro exterior da Escola M…, sita na Rua …, no Porto, tal como se mostra retratado a fls. 9-10 e 390, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

      1. A referida escola pertence à Câmara Municipal N… e destinava-se ao uso e utilidade públicas, como os arguidos bem sabiam.

      2. Com tal conduta, os arguidos, desfiguraram, ofenderam a estética do muro exterior da supra referida Escola M…, o qual antes da intervenção daqueles encontrava-se apenas pintado de branco.

      3. A Câmara Municipal N… - Departamento Municipal do Ambiente e Serviços Urbanos – procedeu à remoção dos grafitos, o que importou um custo de valor não concretamente apurado.

      4. Os arguidos agiram deliberada, livre e conscientemente, de forma concertada, em conjugação de esforços e vontades com vista a expressarem a sua opinião política e a fazer propaganda política, na execução de um plano previamente delineado, bem sabendo que os grafitos executados alteravam a estética do aludido muro exterior da escola da Escola M…, bem sabendo que tal muro delimitava a área pertencente à Escola M… e que se destinava ao uso e utilidade públicas.

      5. Sabiam também que o muro em causa lhes não pertencia, porque público, e que actuavam sem o conhecimento e consentimento da Município N…/Câmara Municipal.

      6. Mais sabiam, assim, que a conduta levada acabo era proibida e punida pelaLei n.º 97/88, de 17.08.

      7. A arguida B… é solteira; vive com a mãe e uma irmã, em...

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