Acórdão nº 253/16.2GBETR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 11 de Janeiro de 2017

Magistrado ResponsávelMARIA DEOLINDA DION
Data da Resolução11 de Janeiro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

RECURSO PENAL n.º 253/16.2GBETR.P12ª Secção Criminal 4ª Secção Judicial CONFERÊNCIARelatora: Maria Deolinda Dionísio Adjunto: Jorge Langweg Acordam os Juízes, em conferência, no Tribunal da Relação do Porto: I - RELATÓRIO Por sentença proferida, a 5 de Setembro de 2016, no processo especial sumário, n.º 253/16.2GBETR, da Comarca de Aveiro, Estarreja - Instância Local, Secção Competência Genérica-J2, foi o arguido B…, com os demais sinais dos autos, condenado pela prática de um crime de desobediência, previsto e punível pelas disposições conjugadas dos arts. 348º, n.º 1, al. a) e 69º, n.º 1, al. c), do Cód. Penal, com referência ao art. 152º, n.ºs 1 e 3, do Cód. Estrada - na pena de 50 (cinquenta) dias de multa à taxa diária de € 7,00 (sete euros) e na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor pelo período de 3 (três) meses.

Inconformado o arguido interpôs recurso rematando a sua motivação com as seguintes conclusões que se transcrevem: “1 – Vem o presente recurso interposto da sentença condenatória; 2 – Nos termos do disposto no n.º 3 als. a), b) e c) do art. 412º do Código de Processo Penal, quando se impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, o recorrente deve especificar: d) Os pontos de facto que considera incorretamente julgados; e) As provas que impõem decisão diversa da recorrida; f) As provas que devem ser renovadas; 3 - Do ponto 1 da matéria de facto considerada provada consta que o arguido cometeu uma infração; Contudo, não consta dos autos que tenha sido elaborado auto de notícia relativamente a tal infração; - O arguido realizou o teste de álcool no posto da GNR de …, tendo originado a elaboração do auto de notícia 2929585544. Não tendo sido objeto de apreciação pela Meritíssima Juíza a quo, o auto de notícia que aqui se junta, comprovativo da realização do teste para deteção de álcool, que da sentença recorrida consta ter o arguido recusado.

4 - Por conseguinte, estes dois pontos encontram-se incorretamente julgados.

5 - As provas que impõem decisão diversa da que consta da sentença recorrida, encontram-se na conjugação dos depoimentos dos guardas C…, militar da GNR a prestar serviço no posto de …, gravado através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso pelo Tribunal, com início pelas 11h06 e termo pelas 11h41 e D…, militar da GNR a prestar serviço no posto de …, gravado através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso pelo Tribunal, com inicio pelas 11h44 e termo pelas 12h17.

6 - As provas que devem ser renovadas - considerando a factualidade objeto da presente impugnação, são testemunhal, produzida pelos Guardas da GNR C… e D…, em conjugação com a apreciação do aludido auto de notícia.

7 - O arguido não recusou fazer o teste de sopro para deteção de álcool, como se encontra provado pelo teor do auto de notícia que aqui se junta.

8 - O facto de o arguido não ter entrado na viatura após a realização do teste para deteção de álcool, para ser conduzido ao posto da GNR, não se ficou a dever à sua atuação mas, ao receio que os próprios guardas manifestaram perante a presença de oito clientes do café que se insurgiram contra a atuação destes; 9 - Os próprios guardas declararam em sede de audiência de julgamento que decidiram chamar reforços por recearem a ação dos clientes do café e não o arguido.

10 - O princípio da livre apreciação da prova tem de respeitar as regras da experiência e a motivação da convicção do Tribunal tem de ser coerente e razoável, explicando o modo de génese da mesma e, não havendo nenhum elemento probatório que sustente ter havido não acatamento de qualquer ordem, a fundamentação da matéria de facto mostra-se contrária à prova produzida.

11 - A decisão recorrida não dispõe de suficiente força de convencimento do arguido e dos membros da comunidade, padecendo da nulidade prevista no art. 379º, n.º 1 al. a) do Código de Processo penal, por referência ao nº 2 do art. 374º do mesmo diploma, nulidade esta que é de conhecimento oficioso.

12 - Tem o Tribunal o poder-dever de fundar a «boa decisão de direito» na «boa decisão de facto», ou seja, numa decisão que não padeça de insuficiências contradições insanáveis da fundamentação ou erros notórios na apreciação da prova.

13 - Pelo que, é de concluir existir erro notório na apreciação da prova na sentença aqui colocada em crise. O princípio da livre apreciação da prova, entendido como esforço para alcançar a verdade material, como tensão de objetividade, encontra assim no «in dúbio pro reo» o seu limite normativo.

14 - No caso do texto da sentença recorrida não dispõe de suficiente força de convencimento do arguido e dos membros da comunidade jurídica relativamente à bondade da solução encontrada quanto à imputação do crime sob apreciação.

15 - Por isso, o Tribunal errou, com notória inobservância das regras de experiência e notória preterição do princípio «in dúbio pro reo», na apreciação dos factos que supra são objeto de impugnação. Pois, da prova produzida nestes autos, ficaram muitas dúvidas sobre a factualidade objeto de apreciação.

16 - Não estão verificados os elementos objetivos e subjetivos integradores do tipo legal de crime que é imputado ao arguido. Não se provando factos essenciais, sendo certo que, sobre o arguido não recai nenhum ónus de provar factos fosse o que fosse, pelo que, impõe-se a absolvição do crime que lhe é imputado.”*Admitido o recurso, por despacho proferido a fls. 86, respondeu o Ministério Público sufragando a improcedência e manutenção do decidido, concluindo a motivação nos moldes seguintes: “I) O tribunal a quo julgou criteriosa e prudentemente o arguido e face à prova produzida em audiência de discussão e julgamento só poderia ter concluído pela sua condenação, como fez, e bem.

II) Não deve confundir-se, falta ou insuficiência da fundamentação, com discordância relativamente à própria fundamentação, ou à decisão final, pois, por muito desejável que assim fosse, o julgador não tem necessariamente que convencer da justeza das suas decisões.

III) Ora, lida e relida a sentença condenatória, encontramos nela a fundamentação lógica e escorreita mais do que necessária e suficiente para acompanhar o raciocínio da Sra. Juiz.

IV) O Tribunal a quo efectuou uma análise crítica da prova produzida, fundamentando de uma forma ampla as suas opções probatórias de modo a não deixar dúvidas porque decidiu da forma que decidiu (e não de outra) dentro do quadro legal do princípio geral da livre apreciação da prova.

  1. E fê-lo traduzindo no texto da sentença essas opções valorativas que em função do conjunto de provas (sobretudo testemunhais enquadradas pelos depoimentos dos agentes da GNR no que tange à questão fundamental em apreço) entendeu serem justificadas.

    VI) A expressiva, extensa e clara explicitação do modo como o tribunal efectuou a sua motivação em relação àqueles depoimentos e sobretudo desmontando as declarações do arguido (únicas que poderiam contrariar a versão dos militares da GNR) que tinha outra versão dos factos (e que o Tribunal não valorou) não merecem qualquer censura.

    VII) Também entendemos que a invocação de violação do princípio in dúbio pro reo não tem qualquer fundamento uma vez que a sentença recorrida não dá indicação de qualquer dúvida que tenha sido resolvida em desfavor do arguido.

    VIII) Evidentemente não concretiza tal situação a circunstância de, havendo duas versões dos factos, o tribunal ter optado por uma delas, pois pode tê-lo feito, e fê-lo fundamentadamente.

    IX) Ora, o arguido, ora recorrente entende o contrário, porquanto sempre o arguido realizou o teste de álcool no posto da GNR de …, tendo originado a elaboração do auto de contra-ordenação n.º 2929585544, para além de que não consta dos autos que tenha sido elaborado auto de notícia relativamente a tal infracção (crime de desobediência).

  2. Mas então não resulta do auto de notícia que o arguido, ora recorrente foi detido precisamente por se recusar a efectuar o teste, bem sabendo que a ordem dada pelos agentes era legítima, produzida por autoridade competente, no âmbito estrito das suas...

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