Acórdão nº 1397/14.0TDPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 08 de Março de 2017

Magistrado ResponsávelCASTELA RIO
Data da Resolução08 de Março de 2017
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Na 1ª Secção Judicial / Criminal do TRP acordam em Conferência os Juízes no Recurso Penal 1397/14.

0TDPRT.P1 vindo do Juiz 5 da Secção Criminal da Instância Local do Porto PARTE I - RELATÓRIO No PCS 1397/14.0 aberta em 06-6-2016 a Audiência de Julgamento do Arguido B… sob Pronúncia de 28-5-2015 a fls 322-325 pelos factos e conforme o Direito da Acusação de 10-11-2014 a fls 255-260 pela prática de um crime doloso de abuso de confiança qualificado p.p. pelo art 205-1-4 do CP com conexo Pedido Civil de 04-12-2014 a fls 272-276 / 278-280 do Assistente C… de condenação do Arguido / Demandado Civil no pagamento de 6.134 € para indemnização de danos patrimoniais mais juros moratórios vencidos e vincendos desde a data de notificação até integral e efectivo pagamento, sucedeu que: «… pelo requerente, representado neste acto pelo seu mandatário judicial, com poderes para o ato [1], e pelo requerido foi dito que haviam chegado a acordo quanto ao pedido cível, com base nas seguintes cláusulas: 1ª O requerente reduz o pedido cível à quantia de € 5.204,00; 2ª Tal quantia será paga em 21 prestações mensais e sucessivas, sendo as primeiras 20 no montante de € 250,00 e a última no montante de € 204, vencendo-se a primeira no dia 1/10/2016 e as restantes no mesmo dia dos meses subsequentes; 3ª O pagamento será efectuado através de transferência bancária para a conta com o IBAN a indicar perlo ilustre mandatário do assistente; 4ª As custas do pedido cível serão suportadas pelo requerente, prescindindo ambas as partes de custas de parte e procuradoria.

Seguidamente, o Mmº Juiz proferiu a seguinte:SENTENÇA:“Face à qualidade dos intervenientes e à natureza disponível do objecto do processo, julgo válida e relevante a transacção efectuada, quanto ao pedido cível de fls. 278 a 280, homologando a mesma e declarando, em consequência, extinta a instância cível (artº 284º, 290º e 277º, al. d) todos do C.P.C. (nova versão)).

Custas nos termos acordados (artº 537º, nº 2 do C.P.C. (nova versão)).

De seguida, pelo Assistente, representado neste acto pelo seu mandatário judicial e pelo arguido, foi requerido, de comum acordo, a extinção da responsabilidade criminal, nos termos do artº 206º, nº 1 do C.P., considerando-se, o assistente, integralmente ressarcido dos prejuízos causados, atento o acordo celebrado.

Seguidamente, o Mmº Juiz proferiu o seguinte:DESPACHOAtento o requerido pelo assistente e pelo arguido e, ainda, o disposto no artº 206º, nº 1 do C.P., julgo extinta a respectiva responsabilidade criminal e ordeno o oportuno arquivamento dos autos.

Dou sem efeito o julgamento designado.

Notifique”.

Do despacho acabado de proferir foram todos os presentes notificados, do que disseram ficar cientes, tendo o ilustre mandatário do demandante, sido notificado, para, nos termos do disposto no artº 15º, nº 2, do Regulamento das Custas Processuais, no prazo de 10 DIAS, proceder à autoliquidação da taxa de justiça devida pelo pedido de indemnização cível formulado nos presentes autos».

Inconformado com o decidido, em tempo o MINISTÉRIO PÚBLICO interpôs RECURSO pela Declaração de interposição com MOTIVAÇÃO a fls 408-416 rematada com as sgs 6 CONCLUSÕES [2]: 1. O presente recurso é interposto do despacho judicial proferido em 6 de junho de 2016, constante da Ata de Audiência de Julgamento a fls. 390, nos termos do qual foi declarada extinta, por aplicação do disposto no art. 206º, n.º 1, do Código Penal, a responsabilidade criminal do arguido B…, a quem era imputada a prática de um crime de abuso de confiança, previsto e punido pelo art. 205º, n.º 1 e 4, al. a), do mesmo diploma legal.

  1. Na situação em apreço, não estão reunidos os pressupostos previstos no art. 206º, n.º 1, do Código Penal, para a referida extinção a responsabilidade criminal, uma vez que não ocorreu a restituição da coisa ilegitimamente apropriada.

  2. Na verdade, o que ficou consignado na Ata de Audiência de Julgamento de fls. 389 a 391 foi um acordo celebrado entre o assistente/demandante civil e o arguido/demandado civil no sentido deste último proceder ao pagamento faseado da quantia peticionada em sede de pedido de indemnização civil, ao longo de vinte e um meses, com início em 1 de outubro de 2016; 4. Ou seja, em 6 de junho de 2016, aquando da prolação do despacho judicial ora recorrido, não existiu nenhuma restituição da coisa apropriada nem uma reparação integral dos prejuízos causados, mas apenas uma expectativa de ressarcimento que, a ser cumprida, apenas se concluirá em julho de 2018.

  3. E, não tendo ocorrido a restituição da coisa ilegitimamente apropriada, não poderia o Tribunal concluir pela extinção da responsabilidade criminal do arguido e ordenar o arquivamento dos presentes autos.

  4. Tendo declarado extinta a responsabilidade criminal do arguido, o tribunal violou o disposto no art. 206º, n.º 1, do Código Penal.

    • Pelo exposto, é nosso parecer que deverá ser revogado o douto despacho recorrido, sendo o mesmo substituído por outro que determine o prosseguimento dos autos, com a realização do julgamento para a apreciação do crime de abuso de confiança imputado ao arguido B…» [3].

    ADMITIDO o Recurso a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito devolutivo para este TRP ut arts 399, 401-1-a-I, 406-1, 407-2-a, 408-1 a contrario sensu e 427 do CPP por Despacho a fls 417 NOTIFICADO a Sujeitos Processuais inclusive nos termos e para os efeitos dos arts 411-6 e 413-1 do CPP, o ARGUIDO apresentou RESPOSTA a fls 421-429 a final «Considerando que: a. o pagamento faseado era a única forma de o arguido ressarcir o ofendido dos prejuízos causados; b. o próprio ofendido não pretende ver o arguido condenado, dando de bom grado a sua concordância para a extinção da responsabilidade criminal, c. o ofendido declarou e considerou-se ressarcido de forma integral de todos os danos e prejuízos, d. o arguido se encontra a trabalhar e em condições de cumprir o acordo; e. protelar no tempo este processo só significaria perda de tempo e dinheiro para os envolvidos e para o Estado; f. uma putativa condenação do arguido nenhum efeito reparador significaria para o assistente e para a sociedade, pois quando ela tivesse lugar, há muito que poderia estar reparado o assistente; g. desaparecem as necessidades preventivas, pois que, a ameaça de uma possível condenação, e a carga que este processo impendeu sobre o arguido fazem cessar as necessidades de prevenção especial; • facilmente se percebe porque não merece qualquer reparo a sentença em crise, e por que andou bem o tribunal a quo ao decidir homologar o acordo e extinguir a responsabilidade criminal nos termos exarados.

    • Termos em que, deverão … negar provimento ao presente recurso … do Ministério Público; e por consequência, deverão manter a sentença recorrida nos seus precisos termos …» [4].

    Em Vista ut art 416-1 do CPP o Exmo Procurador Geral Adjunto emitiu a fls 445-446 II o PARECER que «… o recurso do MºPº não merece provimento» por considerar que: «Com a transação cível celebrada entre o arguido e o assistente este declarou expressamente mostrar-se inteiramente ressarcido dos prejuízos que lhe tinham sido causados pela conduta ¡lícita do arguido.

    Por isso, o assistente e o arguido, de comum acordo, dirigiram-se ao tribunal e pediram, a extinção da responsabilidade criminal, nos termos do artigo 206.º, n.º 1, do CP.

    No artigo 206., n.º 1, do CP, diz-se o seguinte: | “...

    extingue-se a responsabilidade criminal, mediante a concordância do ofendido e do arguido, sem dano ilegítimo de terceiro, até à publicação da sentença da 1.ª instância, desde que tenha havido restituição da coisa furtada ou ilegitimamente apropriada ou reparação integral dos prejuízos causados” O C… considerou-se inteiramente ressarcido dos prejuízos que lhe tinham sido causados.

    Parece-nos que basta esta declaração do ofendido para se mostrar preenchida a condição prevista no mencionado artigo da reparação integral dos prejuízos causados, não importando saber se tal declaração corresponde, ou não, inteiramente à realidade» [5].

    NOTIFICADOS ut art 417-2 do CPP os Sujeitos processuais NÃO apresentaram RESPOSTA.

    Na oportunidade – após demais serviço vg premente quando não urgente - efectuado EXAME PRELIMINAR e colhidos os VISTOS LEGAIS os autos foram submetidos à CONFERÊNCIA.

    PARTE II - APRECIANDO Contra a decisão de Direito do Despacho recorrido motivou o MP a quo concretamente que: «[…] De acordo com a acusação pública deduzida nos autos, para qual remete o despacho de pronúncia, ao arguido B… foi imputado o facto de, no exercício das funções que desempenhou, entre 17 de novembro de 2011 e outubro de 2012, como Presidente da Direção do C…, ter efetuado, de forma abusiva, diversos levantamentos e transferências de quantias monetárias existentes na conta bancária titulada pelo C…, fazendo sua a quantia pecuniária global de 6.134,0€ (seis mil, cento e trinta e quatro euros), da qual então se apoderou em benefício próprio, sem o conhecimento e contra a vontade da instituição e que era Presidente.

    Segundo tal acusação e pronúncia, tendo o arguido atuado voluntária, livre e conscientemente, conhecendo o caráter proibido da sua conduta, o mesmo incorreu na prática de um crime de abuso de confiança (qualificado) previsto e punível pelo art. 205º, n.º 1 e 4, al. a), do Código Penal.

    […] Dispõe o art. 205º, n.º 1 e 4, al. a), do Código Penal que “quem ilegitimamente se apropriar de coisa móvel que lhe tenha sido entregue por título não translativo da propriedade é punido (…) se a coisa referida no n.º 1 for (…) de valor elevado, o agente é punido com pena de prisão até 5 anos ou com pena de multa até 600 dias”.

    Analisada a redação do referido preceito legal, conclui-se que o crime em questão assume natureza pública, ou seja, o respetivo procedimento criminal não se encontra dependente da apresentação de queixa por parte de algum ofendido, circunstância essa que torna ineficaz qualquer desistência de queixa que seja requerida.

    Acontece que, sendo imputado ao...

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