Acórdão nº 599/14.4PFPRT-A.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 08 de Fevereiro de 2017

Data08 Fevereiro 2017
ÓrgãoCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 599/14.4 PFPRT-A.P1 Recurso penal Relator: Neto de Moura Acordam, em conferência, na 1.ª Secção (Criminal) do Tribunal da Relação do Porto I – Relatório No âmbito do processo especial abreviado que, sob o n.º 527/14.7 PTPRT, corre termos pela Secção de Pequena Criminalidade (J3) da Instância Local do Porto, Comarca do Porto, B…, devidamente identificado nos autos, foi submetido a julgamento, acusado pelo Ministério Público (fls. 41-42) da prática, em autoria material, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez.

Realizada a audiência, com documentação da prova nela oralmente produzida, por sentença de 31.05.2016, decidiu-se o seguinte (dispositivo da sentença reproduzido na acta de fls. 45-48): “Pelo exposto, julgo a acusação provada e procedente, e em conformidade: - Condeno o arguido B… pela prática, em 04/10/2014, de factos integradores de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez (TAS registada de 1,79 g/l, a que corresponde, após dedução do EMA, o valor apurado de 1,70 g/l), p. e p. pelo artigo 292.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 50 (cinquenta) dias de multa, à taxa diária de € 5,00 (cinco euros), o que perfaz um total de € 250,00 (duzentos e setenta e cinco euros); - Condeno o arguido, nos termos do art.º 69.º, n.

os 1, al. a), e 2, do Código Penal, na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 3 (três) meses e 10 (dez) dias.

Condeno, ainda, o arguido no pagamento da taxa de justiça no valor de 2 (duas) Unidades de Conta (UC´s), reduzido a metade, bem como nas custas do processo, sem prejuízo de eventual apoio judiciário.

Na liquidação da pena de multa, deverá ser descontado um dia, atenta a detenção de fls. 6 e 7, nos termos do disposto no art.º 80.º, n.º 2, do C. Penal.

À pena acessória em que o arguido foi condenado deverá ser descontado o período de 3 meses referente à injunção que o arguido cumpriu no âmbito da suspensão provisória do processo que lhe foi aplicada”.

Inconformado, veio o Ministério Público interpor recurso da sentença para este Tribunal da Relação, com os fundamentos explanados na respectiva motivação, que condensou nas seguintes conclusões (em transcrição integral): 1. Dispõe o artigo 80º, do Código Penal que: "1. A detenção, a prisão preventiva e a obrigação de permanência na habitação sofridas pelo arguido são descontadas por inteiro no cumprimento da pena de prisão, ainda que tenham sido aplicadas em processo diferente daquele em que vier a ser condenado, quando o facto por que for condenado tenha sido praticado anteriormente à decisão final do processo no âmbito do qual as medidas foram aplicadas. 2. Se for aplicada pena de multa, a detenção, a prisão preventiva e a obrigação de permanência na habitação são descontadas à razão de um dia de privação da liberdade por, pelo menos, um dia de multa.” 2. Nos presentes autos o arguido somente possui um dia de detenção que importa descontar, para ser considerado aquando da execução da pena de multa aplicada.

  1. Ora, de acordo com o preceituado no n.º 4, do artigo 282º, do mesmo diploma normativo, em caso de incumprimento das injunções e regras de conduta as prestações feitas não podem ser repetidas.

  2. A suspensão provisória do processo não envolve qualquer julgamento sobre o objeto do processo.

  3. Trata-se de um despacho proferido numa fase inicial do inquérito e necessita, além do mais, da concordância do arguido.

  4. Acresce que é uma decisão que não põe fim ao processo.

  5. O fim do processo só ocorrerá no final do decurso do prazo da suspensão, caso o arguido cumpra as injunções ou regras de conduta fixadas, com despacho de arquivamento ou no caso contrário, o processo prossegue – artigo 282.º, nºs 3 e 4, do Código de Processo Penal.

  6. Referindo-se à pena acessória prevista no artigo 69º, do Código Penal, refere o Prof. Figueiredo Dias o seguinte: “Uma tal pena deveria ter como pressuposto formal a condenação do agente numa pena principal por crime cometido no exercício da condução, ou com utilização de veículo, ou cuja execução tivesse sido por este facilitada de forma relevante; e por pressuposto material a circunstância de, consideradas as circunstâncias do facto e da personalidade do agente, o exercício da condução se revelar especialmente censurável. Uma tal pena – possuidora de uma moldura penal específica – só não teria lugar quando o agente devesse sofrer, pelo mesmo facto, uma medida de segurança de interdição da faculdade de conduzir, sob a forma de cassação da licença de condução ou de interdição da sua concessão.

  7. A injunção que foi fixada ao arguido aquando da suspensão provisória do processo, tem uma natureza completamente diferente da pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor a que alude o artigo 69º, do Código Penal e que aqui foi aplicada ao arguido num total de três meses.

  8. Desde logo a lei refere-se como injunção de não conduzir e após condenação em pena acessória. Por outro lado, aquando da pena acessória temos comunicação para a entidade rodoviária, se a carta do arguido se encontrar no regime provisório, o mesmo fica, por determinação do I.M.T. inabilitado para conduzir, uma vez que a mesma caduca automaticamente. Mais, se conduzir durante o período de cumprimento da pena acessória comete um crime. Ora, tais analogias não podem ser realizadas, nem aplicadas na injunção de proibição de conduzir veículos a motor. A única consequência para o arguido no incumprimento da mesma é o prosseguimento dos autos por incumprimento da injunção aplicada.

  9. Mais se o arguido fosse detetado a conduzir no cumprimento da injunção de proibição de conduzir aplicada a título de suspensão provisória do processo certamente não seria acusado e julgado pela prática do crime de violação de proibições, conforme o que aconteceria caso o arguido fosse detetado a conduzir durante o cumprimento da pena acessória de proibição de conduzir veículos a motor aplicada por condenação transitada em julgado.

  10. Neste sentido, Acórdão da Relação de Lisboa de 6/3/2012, proferido no âmbito do Proc. 282/09.2SILSB.L1-5, disponível in www.dgsi.pt, no qual se refere: “A pena acessória de proibição de conduzir assenta no pressuposto formal de uma condenação do agente numa pena principal (nos termos elencados nas diversas alíneas do nº 1 do art. 69º, do Cód. Penal) e no pressuposto material de (em face das circunstâncias do facto e da personalidade do agente), o exercício da condução se revelar especialmente censurável, censurabilidade esta que, dentro do limite da culpa, responde às necessidades de prevenção geral de intimidação e de prevenção especial para emenda cívica do condutor imprudente ou leviano. De facto, é o conteúdo do facto de natureza ilícita que justifica a censura adicional dirigida ao arguido em função de razões de prevenção geral e especial e que constituem a razão de ser de aplicação da pena acessória.” 13. Mais, a injunção a que o arguido se obrigou não lhe foi imposta, nem assumiu o carácter de pena ou sequer de sanção acessória.

  11. O arguido fez a entrega da carta de forma voluntária, no âmbito do cumprimento de uma injunção com que concordou, tendo como finalidade a suspensão provisória do processo, nos termos do disposto no artigo 281º, do Código de Processo Penal.

  12. Ora, de acordo com o preceituado no n.º 4, do artigo 282º, do mesmo diploma normativo, em caso de incumprimento das injunções e regras de conduta as prestações feitas não podem ser repetidas.

  13. Sempre se dirá que qualquer que seja a decisão a proferir e atendendo a que já foram proferidas decisões em sentidos opostos quanto à mesma questão pelos Tribunais das Relações, nomeadamente do Porto, Lisboa, Coimbra e Guimarães, tendo as mesmas transitado em julgado, a questão que aqui se suscita, salvo o devido respeito por opinião em contrário, poderá oportunamente ser colocada ao Supremo Tribunal de Justiça, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 437º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Penal...

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