Acórdão nº 340/10.0PAVCD-A.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 27 de Setembro de 2017

Magistrado ResponsávelMARIA ERMELINDA CARNEIRO
Data da Resolução27 de Setembro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo número 340/10.0PAVCD-A.P1 Tribunal Judicial da Comarca do Porto – Juízo Local Criminal de Vila do Conde – Juiz 2 Acordam em conferência na Primeira Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto:I - RelatórioPor sentença de 14 de junho de 2017 proferida no processo supra identificado procedeu-se ao cúmulo jurídico das penas fixadas ao arguido B… nos referidos autos e no Processo Comum nº 1438/09.3GAVCD, tendo sido condenado na pena única de 16 meses de prisão.

Não se conformando com a decisão proferida dela recorreu o arguido, rematando a motivação de recurso que apresentou, com a formulação das seguintes conclusões (transcrição): «1ª - «Para efeito de cúmulo jurídico de pena de prisão com pena de multa, a efetuar nos termos do artº 77º nº 3 do CP atende-se à prisão subsidiária resultante da conversão da pena de multa. Tal solução é a que melhor permite a consideração global dos factos e da personalidade do arguido, com vista à determinação da pena única final a aplicar, acarretando em regra um benefício para o mesmo (STJ no Ac. de 06.03.2002 - Proc. nº 01P4217) 2ª – Não cremos que, uma vez convertida a pena de multa em “prisão subsidiária” exista qualquer diferença em relação à pena de prisão “tout court”, pelo menos no que diz respeito ao seu aspeto prático, quando a pena de prisão subsidiária é efetivamente cumprida, por serem idênticos os objetivos de ambas as penas, não sendo intenção do legislador, com o artº 49º CP, criar uma 3ª modalidade de pena mas sim uma pena de prisão “tout court” ainda que sujeita a um regime condicional de “reversão” e/ou “suspensão”.

  1. – A possível perversidade da junção, num cúmulo jurídico, de penas de prisão com regimes diferentes (precisamente pela possibilidade de reversão e suspensão atribuída pelo artº 49º/2e /3), designadamente pela: - possível necessidade de alteração da pena cumulada no caso do arguido, depois de decretado tal cúmulo, poder fazer reverter ou suspender-se uma das penas de prisão subsidiária consideradas.

    - ou, alternativamente, pelo entendimento de que, quando o arguido consinta, dentro de um cúmulo, na inclusão de uma pena de prisão subsidiária juntamente com uma pena de prisão “tout court”, tal acarreta forçosamente uma renúncia do arguido a tal possível regime do 49º/2/3 CP… 4ª – … não é simplesmente convocada no caso concreto porque a pena de prisão subsidiária aqui em causa (86 dias de prisão no âmbito do proc. 356/10.7GAVCD) foi já integralmente cumprida e extinta, não sendo mais possível recorrer a tais prerrogativas do 49º/2/3 CP, isto é, não se colocam aqui quaisquer reservas ou obstáculos de “iure condito” nem de “iure contendo” na inclusão de tal pena no âmbito do presente cúmulo jurídico, não devendo tratar diferentemente aquilo que agora é igual.

  2. – Em suma, apesar de prisão “tout court” e prisão subsidiária terem, abstratamente, géneses e regimes diferentes, nem a génese afeta a identidade e o fim das 2 penas nem o regime deve ser agora considerado, porque a pena foi integralmente cumprida sem “reversão” ou “suspensão” (49º/2/3 CP).

  3. – Concretamente, discordamos da conclusão da Sentença “a quo” de que “Cremos, assim, que apenas a reclusão é eficaz na ressocialização do arguido, não sendo a simples censura do facto e a ameaça da pena da prisão susceptíveis de realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.” com a justificação de que, “o arguido terá começado a interiorizar o desvalor da sua conduta, ainda que essa interiorização seja (não exactamente pelo reconhecimento do bem jurídico protegido) sobretudo em função dos custos pessoais resultantes da privação da liberdade”.

  4. – Tal conclusão não se revê, desde logo, no relatório social emitido nos presentes autos, nomeadamente (realçando apenas os aspetos mais importantes) que: a) À data da reclusão, B… vivia “em relacionamento afectuoso e de entreajuda, procurando o casal concretizar as melhores condições profissionais e remuneratórias facilitadoras da estabilidade financeira pelo desempenho das funções de “forneiro” numa Padaria/Pastelaria.” b) Que “B… em contexto prisional tem apresentado comportamentos de acordo com os normativos instituídos. Frequentou em contexto prisional o “curso de estrada segura”.

    1. Que “Beneficiou de licença de saída jurisdicional, que decorreu sem registo de anomalias, e colocado em regime aberto – interior, recentemente.

    2. Que “B… não apresenta hábitos aditivos, problemas físicos ou mentais condicionantes da reintegração social.” e) Que atualmente“reconhece que o estilo de vida mantido por desorganização pessoal foi o principal motivo para a prática criminal, assim como os custos pessoais resultantes da privação da liberdade, aguardando com expectativa a definição da situação jurídica que lhe possibilite organizar o seu regresso à liberdade.

    3. Que ”B… mantém adequado relacionamento conjugal, estando a esposa receptiva a apoiá-lo na medida das suas capacidades. Tem perspectivas de enquadramento laboral na entidade patronal para a qual trabalhava.

    4. E ainda que “Relativamente aos crimes pelos quais foi condenado, atualmente revela interiorização dos valores sociojurídicos protegidos, reconhecendo os custos pessoais, a nível familiar e laboral, resultantes da privação da liberdade a que está sujeito.» 8ª – Por outro lado, a Sentença “a quo” não se debruçou sobre matéria de facto alegada, designadamente os factos de 29º a 43º e sobre o doc. 5 que os prova (acórdão de cúmulo operado no âmbito do proc. 26/16.2T8VCD), factos que são importantes para melhor alcançar um juízo de prognose quanto à possível suspensão da execução da pena (50º/51º CP).

  5. – Em 24.2.2017 (há um ano e meio sensivelmente), decidiu-se no âmbito do proc. cumulatório 26/16.2T8VCD designadamente que: - Atenta a pena concreta fixada, é possível equacionar da suspensão da execução da pena de prisão, face à redacção do art. 50°, n° 1, do Código Penal, que permite a suspensão da pena de prisão aplicada em medida até 5 anos.

    Considerando o facto de o arguido, embora com as condicionantes decorrentes da sua actual situação de reclusão, (1) estar familiar e socialmente inserido, encontrando apoio nomeadamente junto da esposa, a qual funciona como factor de estabilidade para o mesmo, (2) de ter perspectivas de se voltar a inserir profissionalmente quando em liberdade, como sempre esteve anteriormente a ser preso, (3) e de actualmente começar a demonstrar a interiorização do desvalor das suas condutas e a vontade de actuar de maneira diferente no futuro, envidando esforços concretos para se habilitar com a carta de condução e para não conduzir enquanto não tiver essa habilitação, bem como atendendo a que os antecedentes criminais do arguido respeitam na sua quase totalidade ao crime de condução sem habilitação legal, crime este cujo risco de recidiva deixará de existir no momento em que o arguido conclua a sua habilitação com a carta de condução, entende-se ser desnecessário no caso concreto o efectivo cumprimento da pena única de prisão por parte do arguido, afigurando-se adequada a aplicação da pena de substituição consistente na suspensão da execução daquela pena (única possível atenta a concreta medida da pena fixada).

  6. - Tal conclusão é assim diametralmente oposta à decisão que foi alcançada nos presentes autos, apesar dos factos em que se fundamentam serem rigorosamente os mesmos.

  7. – Ou melhor dizendo, in casu, até poderemos convocar 3 aspetos que, à data do acórdão do 26/16 não existiam e que tornam hoje ainda mais evidente a possibilidade e necessidade da atribuição da suspensão da execução da pena de prisão nos presentes autos: a) O facto de um dos crimes em causa em tal outro cúmulo (26/16) ser de “condução perigosa de veículo rodoviário”, isto é, relativamente mais grave do que os crimes de condução de veículo sem habilitação legal aqui considerados no presente cúmulo; b) O facto do arguido ter, após o acórdão do cúmulo 26/16, cumprido mais 1 ano e meio de prisão, isto é, mais tempo teve – como efetivamente sucedeu e como efetivamente vem dito no relatório – para “revelar interiorização dos valores sociojurídicos protegidos, reconhecendo os custos pessoais, a nível familiar e laboral, resultantes da privação da liberdade a que está sujeito.” c) O facto do arguido ter, agora, merecido tal confiança em meio prisional que tem recentemente “Beneficiado de licença de saída jurisdicional, que decorreu sem registo de anomalias, e colocado em regime aberto – interior, recentemente. “ isto é, está atualmente em “regime aberto” em meio prisional.

  8. – Foi assim errada a apreciação feita na Sentença “a quo” de que, apenas agora “…o arguido terá começado a interiorizar o desvalor da sua conduta, ainda que essa interiorização seja (não exactamente pelo reconhecimento do bem jurídico protegido) sobretudo em função dos custos pessoais resultantes da privação da liberdade” 13ª – Na verdade, já antes (há 1 ano e meio), no âmbito do proc. 26/16.2T8VCD, tinha o arguido” começado a demonstrar interiorização do desvalor” das suas condutas “com vontade de atuar de maneira diferente no futuro” e aí mereceu o voto de confiança do Tribunal, tal como referido a págs 5 e 7 do respetivo acórdão cumulatório.

  9. - E agora, conforme o relatório social, também o arguido “revela interiorização dos valores sociojurídicos protegidos, reconhecendo os custos pessoais, a nível familiar e laboral, resultantes da privação da liberdade a que está sujeito”, isto é, o arguido revela efetivamente que estão interiorizados os valores sociojurídicos protegidos, está consciente do mal que praticou e o valor das normas violadas (isso o essencial).

  10. - O facto, referido no relatório social, de o arguido reconhecer também os custos pessoais e familiares resultantes da privação de liberdade não pretende anular, desvalorizar ou servir de justificação para aquele reconhecimento de desvalor da sua conduta, mas sim o de dar a entender uma 2ª constatação. Tão simples quanto isso.

  11. – A decisão de não...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT