Acórdão nº 571/14.4GBOAZ.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 23 de Novembro de 2016

Magistrado ResponsávelMARIA ERMELINDA CARNEIRO
Data da Resolução23 de Novembro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 571/14.4GBOAZ.P1 Tribunal da Comarca de Aveiro - Instância Local de Oliveira de Azeméis – Secção Criminal (J1) Acordam, em conferência, na 1.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto I – Relatório Nos autos de processo comum que, com o nº 571/14.4GBOAZ.P12, correm termos no Tribunal da Comarca de Aveiro Oliveira de Azeméis - Instância Local – Secção Criminal – J1, aquando do saneamento do processo, o Senhor Juiz que proferiu o despacho a que alude o artigo 311.º do Código de Processo Penal, em questão prévia, rejeitou parcialmente a acusação pública no que respeita ao crime de ameaça também imputado ao arguido, por a considerar manifestamente infundada.

Inconformado com tal decisão, o Ministério Público dela interpôs recurso, extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões [transcrição]: «CONCLUSÕES

  1. O objeto do presente recurso consiste no despacho proferido a fls. 71 a 74 que, nos termos do disposto no art. 311.°, n.º 2, alínea c) e n.º 3, do Código de Processo Penal, que rejeitou parcialmente o recebimento da acusação pública deduzida nos autos a fls 40 a 44 contra o aqui arguido B…, na parte em que nesta o mesmo vem acusado pela prática (em concurso efetivo com o crime de homicídio qualificado, na forma tentada, que foi recebida pela Mm,ªJuíza) de um crime de ameaça agravada, previsto e punido pelo artigo 153.°, n.º l e artigo 155.°, n º 1, alínea a), ambos do Código Penal, na pessoa do ofendido C…, por entender que o comportamento que ali se imputa ao arguido consubstancia um ato de violência iminente que se esgota no próprio momento, não havendo por isso, ameaça de um mal futuro, característica essencial deste tipo legal de crime.

  2. Face ao princípio do acusatório o tribunal só pode rejeitar a acusação por manifestamente infundada, por os factos não constituírem crime, quando a factualidade em causa não consagra de forma inequívoca qualquer conduta tipificadora de um crime, iuízo que tem de assentar numa constatação objetivamente inequívoca e, incontroversa da inexistência de factos que sustentam a imputação efetuada.

  3. Em nosso entendimento, a acusação por nós deduzida contra o arguido B… é manifestamente fundada, integrando os factos nela vertida todos os elementos objetivos e subjetivos do crime de ameaça agravada, que se autonomizam, e não atos de execução, do crime de homicídio qualificada tentado.

  4. O Douto Despacho Recorrido violou o disposto nos arts.º 311.°, n.º 2, al. a) e n.º 3, alíneas d) do Código de Processo Penal e artigos 153.°, n.º 1 e 155.°, n.º l, alínea a), ambos do Código Penal.

Nestes termos, deverá ser determinado que o Douto Despacho Recorrido seja revogado e substituído por outro que receba a acusação pública na íntegra e designe a audiência de julgamento, assim se fazendo Justiça.» Admitido o recurso, e chegados os autos a este Tribunal da Relação, o Digno Procurador-Geral Adjunto emitiu o douto parecer, no sentido do provimento do recurso.

Observado o disposto no n.º 2 do artigo 417.º do Código de Processo Penal, nada mais se acrescentou.

Efetuado o exame preliminar e colhidos os vistos legais, foram os autos submetidos a conferência.

Nada obsta ao conhecimento do mérito.

*II – Fundamentação Conforme entendimento pacífico são as conclusões extraídas pelo recorrente a partir da respetiva motivação que operam a fixação e delimitação do objeto dos recursos submetidos à sua apreciação, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que seja ainda possível conhecer.

No presente caso, a questão suscitada, reconduz-se a saber se o despacho proferido nos termos do disposto no artigo 311º do Código Processo Penal podia rejeitar a acusação proferida contra o arguido, na parte em que lhe é imputada a prática de crime de ameaça agravada, por considerar-se tal crime consumido na execução do crime de homicídio tentado igualmente imputado ao arguido.

Com interesse para a decisão, o processo fornece os seguintes elementos: (i) a acusação formulada pelo Ministério Público tem o seguinte teor [transcrição]: «Em processo comum para julgamento perante Tribunal Singular (artigo 16º, nº 3 do Código Processo Penal), o Ministério Público deduz acusação contra, B...

(…) Porquanto: O arguido contratou com o ofendido C… e D… a substituição de um telhado de uma casa de arrumos da sua residência, sita residente na Rua …, n.º …, em …, Oliveira de Azeméis.

Durante os trabalhos o arguido visitava habitualmente a obra e conversava com o ofendido C…, falando-lhe mal de outros empreiteiros a quem anteriormente tinha contratado outras obras.

No dia 28 de outubro de 2014, pela manhã o ofendido C… entregou tal obra concluída ao arguido que a achou em conformidade, tendo sido combinado que nesse dia à tarde ou no dia seguinte aquele passaria lá em casa a fim de se efetuar o pagamento da obra.

Sucede que, nesse mesmo dia o ofendido C… foi contactado por D… que lhe transmitiu que o arguido lhe havia dito que o trabalho não estava em conformidade.

Pelo que o ofendido e D… se deslocaram à habitação do arguido a fim de se inteirarem do que estava mal e repararem eventuais irregularidades.

Ai chegados, cerca das 14:30 horas, o arguido expôs ao ofendido e acompanhante o que entendia não estar de acordo com o contratado, direcionando um jato de água de uma mangueira para o telheiro tentando fazer crer que o trabalho estava mal acabado enquanto, em voz alta, afirmava que o telhado deixava entrar água.

O ofendido, já saturado, prontificou-se a alterar o que, no entender do arguido, estaria mal, não deixando, no entanto, de lhe fazer o seguinte reparo: "Ó Sr. B…, você chateia-se com toda a gente, deve ser é para não pagar! ..." Ato contínuo o arguido proferiu a seguinte expressão, dirigindo-se ao ofendido C…: "Ó C… tu não digas isso que eu vou já lá acima buscar a caçadeira e dou-te dois tiros que te fodo!".

No entanto, o arguido não fez qualquer gesto indicativo que iria buscar a dita arma, continuando no mesmo local com o ofendido e seu acompanhante, enquanto estes não abandonaram o local, o que veio a acontecer, momentos após, a conselho do D… que temeu que tal ameaça pudesse vir a ser concretizada.

Cerca de 45 minutos após, entre as 15:00 e as 16:00 horas, encontrava-se o ofendido C… a trabalhar na esplanada do "E…", sito na Rua …, em …, Oliveira de Azeméis, quando o arguido ali se deslocou ao volante da sua viatura, que estacionou na via pública, do lado oposto ao do referido estabelecimento comercial, e dirigiu-se ao ofendido C… com as seguintes expressões: "Seu ladrão! Filho da puta! Estás a dizer que eu não pago?! ... Eu pago a toda a gente. Vou ali ao carro buscar uma coisa e mato-te já!" Nisto, o arguido foi ao seu veículo, retirou uma catana detrás do banco do condutor, e regressou munido com aquela, que empunhou, levantando-a no ar, desferindo com a mesma um golpe na direção da cabeça do ofendido C…, que só não chegou a ser...

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