Acórdão nº 425/13.1GAMLD.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 01 de Junho de 2016

Magistrado ResponsávelMARIA DEOLINDA DION
Data da Resolução01 de Junho de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

RECURSO PENAL n.º 425/13.1GAMLD.P1 2ª Secção Criminal CONFERÊNCIA Relatora: Maria Deolinda Dionísio Adjunto: Jorge Langweg Acordam os Juízes, em conferência, no Tribunal da Relação do Porto: I - RELATÓRIO 1.

No âmbito do processo comum, com intervenção de Tribunal Singular n.º 425/13.GAMLD, da Comarca de Aveiro, Mealhada – Instância Local – Secção Competência Genérica-J1, por sentença proferida a 2 de Novembro de 2015, foi o arguido B…, com os demais sinais dos autos, absolvido da prática do crime de furto simples, previsto e punível pelo art. 203º, n.º 1, do Cód. Penal, que lhe estava imputado e bem assim do pedido de indemnização civil que contra ele formulava o demandante/assistente C….

  1. No decurso da audiência de julgamento, mais concretamente na sessão levada a efeito no dia 8 de Outubro de 2015, o ilustre mandatário do assistente, Dr. D…, após advertência da M.ma Juíza que à mesma presidia, viu ser-lhe retirada a palavra e aplicada a multa de 2 (duas) UC, com fundamento em falta de respeito ao Tribunal e ao abrigo do disposto no art. 150º, n.º 1, do Cód. Proc. Civil.

  2. Inconformados com tais decisões, o assistente C… e seu ilustre advogado, Dr. D…, respectivamente, delas interpuseram recurso, rematando este a motivação do recurso interlocutório com as seguintes conclusões: (transcrição sem destaques) “I - O Advogado ora recorrente, não se conforma com a decisão que o condenou, "... em multa de 2 U.C., por falta de respeito ao Tribunal estribada no disposto no art. 150º, n.º 1 do C.P.C..

    II - Só ouvindo a gravação da sessão de audiência e julgamento Vª.s Exª.s poderão ficar com uma ideia do que se passou na mesma e verificar que a "ATA DE AUDIÊNCIA DE JULGAMENTO" que a ela diz respeito está completamente truncada, descontextualizada e, devendo ser lavrada pela Sr.ª Funcionária que ali esteve presente esta, em vez de transcrever o que nela se passou, teve a veleidade de, entre outras coisas, fazer de mote próprio, considerações e juízos de valor sobre a atuação do Advogado ora recorrente.

    III - Conforme se lê na sobredita transcrição e se ouve na gravação, a MMª Sr.ª Dr.ª Juíza por variadíssimas vezes interrompeu o recorrente, quando este estava no pleno desempenho do mandato, pugnando pelos interesses do seu mandante e durante o ato em que o mesmo produzia para a ata requerimentos fundamentados em aspetos de direito, como seja a falta de Registo Criminal devidamente atualizado, uma vez que o mais recente era de 29/05/2015, o seu período de validade é de 3 meses, estávamos em 08/10/2015, portanto mais de 4 meses e 9 dias daquela data e já o recorrente tinha junto aos autos cópia de douto Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Coimbra, transitado em julgado no qual o arguido nestes dois processos tinha sido condenado também por furto de árvores, a MM.ª Juíza fazendo tábua rasa desta questão impediu o recorrente de exercer o seu trabalho como o tem de fazer.

    IV – A MM.ª não deixou o recorrente indicar o processo em que se tinha passado o atraso na decisão e renovação de prova (Proc. Comum Singular N.º 194/14.8 GAMLD) e, começou a dirigir-se ao recorrente em tom exaltado, com o indicador em riste e a abrir (arregalar) os olhos para o recorrente, como se este fosse um miúdo, tentando intimidá-lo, obrigando o recorrente, face a tal comportamento da MM.ª Juíza, desrespeitador c intimidatório a dirigir-se-lhe de modo a chamar-lhe à atenção para tal fato.

    V - A MM.ª Juíza, exigiu ao recorrente, quando este pretendeu fazer um protesto para a ata, para o deferir ou não que lhe fosse dado conhecimento antecipado do teor do protesto, sob pena de nova condenação em multa, o que é um atropelo ao disposto no artigo 80º do Estatuto da Ordem dos Advogados.

    VI - Condenando o recorrente e finalizando com uma frase demonstrativa da atitude que até aí vinha a demonstrar para com o mesmo: "E acabou-se aqui a conversa." VII - Face à indisponibilidade demonstrada pelo recorrente em estar no dia seguinte para a leitura a sentença, por força de uma consulta médica, que este referiu ter, a MM.ª Juíza disse-lhe: "Oh Sr. Dr., desculpe. O Sr. Dr. só pode estar a brincar comigo".

    VIII - Contudo a MM.ª Juíza não leu a sentença no dia em que a marcou na dita sessão, uma vez que, sem se saber porquê, entendeu de mote próprio, solicitar ao Tribunal da Relação do Porto, "escusa para continuar a intervir no processo ao abrigo do disposto no artigo 43º, n.ºs 1 e 4, do Código de Processo Penal".

    IX - Vindo a ser proferido Acórdão de indeferimento de tal pedido em 21 de Outubro de 2015, junto aos autos em 26 de Outubro do mesmo ano (e que ora se junta fotocópia), no qual se lê fls. 393 dos autos: "Analisados os documentos juntos aos autos, designadamente as atas das várias sessões da audiência e a gravação integral da sessão de 08.10.2015, logo ressalta que tudo o que aconteceu no decurso dessas diligências entre o senhor advogado, mandatário do assistente, e a senhora juíza, se contém no domínio das estritas relações profissionais entre ambos, embora com evidenciação de divergências sobre matéria do processo e sobre a própria condução e disciplina da audiência, por vezes manifestadas de forma muito tensa e extremada, com as particularidades que a personalidade de cada um lhes empresta.

    X - O Recorrente, na sessão de julgamento em causa não desrespeitou o Tribunal nem qualquer dos seus intervenientes, leia-se Colega, Sr.ª Oficial de Justiça, Sr. Procurador ou MM.ª Juíza, tendo atuado no domínio das estritas relações profissionais entre ambos (advogado e MM.ª Juíza), embora com evidenciação de divergências sobre matéria do processo e sobre a própria condução e disciplina da audiência, nunca tendo usado expressões e imputações que não fossem indispensáveis à defesa da causa, bem como à defesa do seu bom nome, respeito e dignidade que lhe são devidos por todos e qualquer um. Tudo no âmbito do disposto no n.º 2 do citado artigo 150º do C.P.C..

    XI - O Recorrente nasceu em 20 de Abril de 1953, tem portanto 62 anos de idade, é Advogado desde 19 de Outubro de 1981, nunca deixou, nem nunca deixará enquanto puder trabalhar, de pugnar pelos legítimos interesses dos seus mandantes que em si confiam, exigindo que, quem quer que seja o deixe trabalhar sem espartilhos de que teor sejam, em conformidade com a legislação aplicável, sem atropelos a esta e com respeito e dignidade pelo pessoa profissional e humana, devida e vinda donde vier, designadamente para com pessoas mais velhas, que não necessitam que lhes abram (arregalem, como se diz em linguagem popular) os olhos ou lhe apontem o dedo em riste.

    XII - A MM.ª Juiz violou o disposto no artigo 80º do Estatuto da Ordem dos Advogados e no artigo 150º n.º l e n.º 2 do C.P.C., uma vez que aplicou, sem fundamento fáctico aquele n.º 1, quando tudo o que se passou em audiência deve e tem de ser enquadrado sem relevância desrespeitosa e ao abrigo do disposto no citado n.º 2 do sobredito art.º 150º, bem como do mencionado artigo 80º.

    XIII - São elementos fundamentais de prova, a gravação da audiência, a transcrição da mesma, a ata, bem como os demais factos constantes dos documentos juntos.

    XIV - O recorrente não praticou qualquer ato que pudesse motivar a aplicação da multa de que foi alvo.

    XV - Deverá ser proferido douto Acórdão que revogue a decisão que o condenou na multa de 2 UC's, tudo com as demais consequências.”*--------------------------------------------- --------------------------------------------- --------------------------------------------- 6.

    Neste Tribunal da Relação a Ex.ma Procuradora-Geral Adjunta emitiu douto parecer, louvando-se nas respostas apresentadas que reforçou ainda com pertinente argumentação, concluindo pelo não provimento dos recursos.

  3. Cumprido o disposto no art. 417º n.º 2, do Cód. Proc. Penal, responderam ambos os recorrentes [embora no cabeçalho se tenha feito constar unicamente o nome do assistente que, todavia e como é óbvio, não dispõe de legitimidade e interesse em agir no tocante à questão da multa aplicada ao seu advogado] insistindo na sua tese.

  4. Realizado exame preliminar e colhidos os vistos legais, vieram os autos à conferência que decorreu com observância do formalismo legal, nada obstando à decisão.

    *** II- FUNDAMENTAÇÃO 1.

    É consabido que, para além das matérias de conhecimento oficioso [v.g. nulidades insanáveis, da sentença ou vícios do art. 410º n.º 2, do citado diploma legal], são apenas as questões suscitadas pelo recorrente e sumariadas nas respectivas conclusões que o tribunal de recurso tem de apreciar [v. Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, Tomo III, 2ª ed., pág. 335 e Ac. do STJ de 20/12/2006, Processo n.º 06P3661, in dgsi.pt].

    Daí que, se o recorrente suscita questões na motivação que, depois, não retoma nas conclusões, deve dar-se predominância à matéria que nestas foi vertida, olvidando-se o mais que naquela consta – v., Ac. STJ, de 1/7/2005, Proc. 1681/01- 3ª, in dgsi.pt.

    Assim, no caso sub judicio, as questões suscitadas, na sua pré-ordenação lógica, são as seguintes: Recurso Interlocutório Admissibilidade da aplicação de multa a advogado Recurso do assistente C… 1. Nulidade da decisão por deficiente gravação da prova 2. Vícios do art. 410º, n.º 2, do Cód. Proc. Penal*2.

    A fundamentação de facto da decisão recorrida, no que ao caso interessa, é a seguinte: (transcrição) A) Factos Provados 1. C…, assistente, comprou a E…, árvores implantadas em terreno desta, com o objectivo de, futuramente, vir a cortá-las e fazê-las suas.

  5. C…, na realização do negócio aludido em 1., pagou a E… o valor de 5.300 euros, como contrapartida pela madeira da qual não chegou a apossar-se.

  6. C…, que é simultaneamente comprador e vendedor de madeira, não pôde vender a madeira aludida em 1., e por consequência, não pôde obter o lucro que obteria na venda da mesma.

  7. No âmbito dos vertentes autos, C… teve que suportar despesas de deslocação ao Tribunal e à GNR para prestar declarações.

  8. C… ficou perturbado e preocupado com o...

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