Acórdão nº 532/14.3GBILH.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 27 de Janeiro de 2016

Magistrado ResponsávelRENATO BARROSO
Data da Resolução27 de Janeiro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. 532/14.3GBILH.P1 1ª Secção ACORDAM OS JUÍZES, EM CONFERÊNCIA, NA SECÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO 1. RELATÓRIO A – Decisão Recorrida No processo comum singular nº 532/14.3GBILH, da Comarca de Aveiro, Instância Local de Ílhavo, submetida a julgamento, pela pratica de um crime de ameaça, p.p., pelos Artsº 153 nº1 e 155 nsº1 e 2, ambos do C. Penal, a arguida B… foi absolvida.

B – Recurso Inconformado com o assim decidido, recorreu o M.P., tendo concluído as respectivas motivações da seguinte forma (transcrição) : 1. O mal objecto do crime de ameaça não pode ser iminente, pois que, neste caso, estar-se-á diante de uma tentativa de execução do respectivo acto violento, 2. O mal será de considerar como "futuro", com relevo para a verificação do crime de ameaça, desde que não se trate duma tentativa criminosa, nos termos em que o art.° 22° do Código Penal a descreve, ou seja, enquanto o agente não praticar actos de execução de um crime que decidiu cometer, entendendo-se como actos de execução aqueles que preenchem um elemento constitutivo de um tipo de crime, os actos que sejam idóneos a produzir o resultado típico ou actos que, segundo a experiência comum e salvo circunstâncias imprevisíveis, sejam de natureza a fazer esperar que se lhes sigam os anteriormente enunciados.

  1. O crime de ameaças tem subjacente, de forma intrínseca, uma projecção para o futuro da conduta da vítima, no sentido de incutir nesta, não o sentimento de ter de se defender de uma agressão mais ou menos actual, antes a coarctando no seu espaço de liberdade de actuação (o "receio dos dias seguintes", limitador dos seus movimentos.

  2. Tendo sido dado como provado que a arguida disse a C… "vou-te apanhar onde estiveres e vou-te matar", tendo-lhe nesse momento batido com a carteira que trazia, forçoso se torna concluir que a mesma proferiu uma expressão que se traduz num mal futuro, pois que não era naquele momento que a mesma pretendia matá-lo mas sim quando o voltasse a encontrar.

    Pelo exposto, deve o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência, ser a sentença recorrida revogada, devendo a arguida ser condenada da prática do crime de ameaça, p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.° s 153°, n. ° 1, e 155, n.° 1, al. a), do Código Penal.

    C – Resposta ao Recurso A arguida respondeu ao recurso, pugnando pela sua improcedência, apesar de não ter apresentado conclusões.

    D – Tramitação subsequente Aqui recebidos, foram os autos com vista ao Exmº Procurador-geral Adjunto, que pugnou pelo provimento do recurso.

    Observado o disposto no Artº 417 nº2 do CPP, não foi apresentada resposta.

    Efectuado o exame preliminar, determinou-se que o recurso fosse julgado em conferência.

    Colhidos os vistos legais e tendo o processo ido à conferência, cumpre apreciar e decidir.

  3. FUNDAMENTAÇÃO A – Objecto do recurso De acordo com o disposto no Artº 412 do CPP e com a Jurisprudência fixada pelo Acórdão do Plenário da Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça n.º 7/95, de 19/10/95, publicado no D.R. I-A de 28/12/95 (neste sentido, que constitui jurisprudência dominante, podem consultar-se, entre outros, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 12 de Setembro de 2007, proferido no processo n.º 07P2583, acessível em HYPERLINK "http://www.dgsi.pt/" HYPERLINK "http://www.dgsi.pt/"www.dgsi.pt, que se indica pela exposição da evolução legislativa, doutrinária e jurisprudencial nesta matéria) o objecto do recurso define-se pelas conclusões que o recorrente extrai da respectiva motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso.

    Na verdade e apesar do recorrente delimitar, com as conclusões que retira das suas motivações de recurso, o âmbito do conhecimento do tribunal ad quem, este contudo, como se afirma no citado aresto de fixação de jurisprudência, deve apreciar oficiosamente da eventual existência dos vícios previstos no nº2 do Artº 410 do CPP, mesmo que o recurso se atenha a questões de direito.

    As possibilidades de conhecimento oficioso, por parte deste Tribunal da Relação, decorrem, assim, da necessidade de indagação da verificação de algum dos vícios da decisão recorrida, previstos no nº 2 do Artº 410 do CPP, ou de alguma das causas de nulidade dessa decisão, consagradas no nº1 do Artº 379 do mesmo diploma legal.

    O objecto do recurso cinge-se assim às conclusões do recorrente, nas quais entende que a factualidade apurada consubstancia o preenchimento do crime de ameaça, razão pela qual solicita a condenação da arguida pelo cometimento deste ilícito.

    B – Apreciação Definida a questão a tratar, importa considerar o que se mostra fixado, em termos factuais, pela instância recorrida.

    Aí, foi dado como provado e não provado, o seguinte (transcrição): I-Fundamentação de facto; Discutida a causa, provaram-se os seguintes factos com interesse para a decisão da causa: 1-No dia 31.08.2014, por volta das 22H45, a arguida B… encontrava-se no interior da D…, sita na Av…., Ílhavo, quando se apercebeu da presença de C….

    2- A arguida e o referido C… mantiveram um relacionamento amoroso há cerca de sete anos, pautado por separações e reconciliações.

    3- Na altura referida em 1, C… fazia-se acompanhar por E….

    4- Na altura referida em 1. a arguida aproximou-se de C… e de E… e questionou o primeiro sobre os motivos da sua presença naquele locai e de estar na companhia da segunda.

    5- C… respondeu à arguida que não tinha nada a ver com isso e pediu-lhe para se afastar.

    6- Neste momento, a arguida exaltou-se e disse, dirigindo-se a C…: "cabrão'", '"chulo", "paga o que me deves".

    7- A arguida disse também para quem a quisesse ouvir: "este indivíduo deve-me dinheiro" e "chulo".

    8- A arguida disse ainda a C… "vou-te apanhar onde estiveres e vou- te matar" tendo-lhe batido com a carteira que trazia.

    9- Á arguida disse repetidamente: "este homem é meu" e "tu és meu".

    10- Cerca de duas a três semanas antes, a arguida e o C… haviam feito amor na casa do segundo, tendo-se despedido, uma vez que ele ia de férias com uns amigos.

    11- Na altura referida em 1. Arguida desconhecia que C… havia regressado de férias, não comunicando um com o outro desde a altura referida em 10.

    12- C… sentiu-se profundamente incomodado e envergonhado com o descrito de 4 a 8.

    13- C… e E… continuaram e continuam a frequentar o estabelecimento identificado em 1.

    14- A arguida foi empregada de pastelaria...

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