Acórdão nº 022/16 de Tribunal dos Conflitos, 30 de Março de 2017

Magistrado ResponsávelISABEL S
Data da Resolução30 de Março de 2017
EmissorTribunal dos Conflitos

I - Relatório 1.

A………… e “B…………, Limitada” intentaram, em 09.12.2014, no Tribunal da Comarca de Portalegre, Secção Cível, J1, contra a “Sociedade Ternisa, Termas da Fadagosa de Nisa, E.M”, e o Município de Nisa, “acção de impugnação de deliberação social de aprovação de contas finais de 2014 e de projecto de partilha na sequência de liquidação de sociedade”.

Peticionaram as autoras que se declarasse a nulidade ou a anulação da deliberação social que, tomada pela primeira ré na assembleia geral de 04.11.2014, aprovou, por maioria, as contas finais de 2014 e o projecto de partilha, na sequência de liquidação de sociedade, e bem assim que se declarasse que as autoras não têm de suportar os prejuízos da ré “Ternisa”, porquanto tal deliberação seria “... ilegal e nula, nos termos do art.º 56.º n.1, al. d) do CSC, por violar normas imperativas, nomeadamente o art.º 40.º e o art.º 19.º n.º 6 da LAEL, ou os artigos 2.º, 3.º 67.º, 17.º e 18.º n.º 3 da Constituição (...), e ainda por abuso de direito na modalidade de venire contra factum proprium ou, caso assim se entenda, anulável, por violação das mesmas disposições e princípios, nos termos do art.º 58. n.º 1, alíneas a), e b), do CSC”.

  1. Citados os réus, veio o Município de Nisa contestar a acção por excepção e por impugnação, não tendo, porém, excepcionado a incompetência material do tribunal comum.

  2. Notificadas as partes, ao abrigo do disposto no artigo 3.º, número 3, do NCPC, para, querendo, pronunciarem-se sobre a eventual verificação da excepção dilatória de incompetência absoluta do tribunal em razão da matéria, pronunciaram-se as autoras no sentido de dever ser reconhecida a competência tribunal comum para julgar a causa.

  3. No despacho saneador, datado de 11.05.2015, a Senhora Juiz da Secção Cível, J1, da Instância Local de Portalegre, decidiu, ao abrigo do disposto nos artigos 64.º, 96.º, alínea a), 97.º, n.º 1, 98.º, 99.º, n.º 1, 577.º, alínea a), e 578.º todos do NCPC, e artigo 40.º, n.º 2 da Lei n.º 58/98, de 18 de Agosto, julgar verificada a excepção dilatória de incompetência absoluta do mesmo tribunal em razão da matéria e, em consequência disso, declarar aquele tribunal materialmente incompetente para o conhecimento da acção, e competentes os tribunais administrativos e fiscais, absolvendo os réus da instância.

    Fundamentou-se, em suma, tal decisão na circunstância de “...a deliberação da 1.ª ré quando decidiu imputar aos sócios a responsabilidade pelo pagamento integral do passivo desenvolveu-se a coberto dos poderes de autoridade necessários ao cumprimento da função que lhes foi confiada e a serem regulados por normas de direito administrativo, visto se dirigirem à satisfação do interesse público. Por isso, os seus actos devam ser qualificados como actos de gestão pública, porque praticados a coberto de normas de direito administrativo”.

    Para além de que “o próprio acto de constituição da empresa municipal...constitui inegavelmente um contrato regido pelo direito público, cuja relação jurídica subjacente é regulada pelo direito administrativo”.

  4. Inconformadas com o assim decidido, as autoras recorreram para o Tribunal da Relação de Évora que, por acórdão de 03.12.2015, julgando improcedente o recurso, decidiu que a competência para conhecer da acção pertencia aos tribunais administrativos.

    E isto na consideração, em suma, de que, «tal como resulta da decisão impugnada, a deliberação da 1.ª ré, quando decidiu imputar aos sócios a responsabilidade pelo pagamento integral do passivo, teve em conta “normas de direito administrativo, visto se dirigirem à satisfação do interesse público”, havendo também que considerar que o próprio contrato de constituição da empresa municipal ... teve por substrato normas essencialmente de direito público em prol e no interesse da comunidade em geral e também da comunidade em especial, circunscrita ao espaço territorial abarcado pela área da actividade da empresa», daí ser «seguro que o caso em apreço se inclui na hipótese do art.º 4.º, n.º 1, al. f), do ETAF, uma vez que existem naquela Lei 50/2012, que regula a criação de Empresas Municipais (bem como nas Leis que a antecederam mas que foram revogadas), normas de direito público que regulam os aspectos que se tem por controvertidos nestes autos, designadamente no que respeita à responsabilidade dos sócios com vista ao equilíbrio dos resultados da empresa e à satisfação dos prejuízos acumulados».

    Assim sendo, estamos perante uma situação em que, no âmbito do contrato de sociedade subjacente ao litígio, constitutivo da Empresa Municipal, existem normas de direito público que regulam aspectos...

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