Acórdão nº 67/12.9TCGMR.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 20 de Novembro de 2014
Magistrado Responsável | OLIVEIRA VASCONCELOS |
Data da Resolução | 20 de Novembro de 2014 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: Em 2012.02.23, na ... Vara de Competência ..., AA intentou a presente ação declarativa de condenação, sob a forma de processo ordinário, contra Fundação Cidade de ....
Pediu a condenação da ré a pagar-lhe a quantia total de 800.504,80 €, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a data da citação até efetivo pagamento, sendo : a) - 688.004,80 €, devida a titulo de indemnização por danos decorrentes de benefícios (ou lucros cessantes) que deixou de obter, em consequência da revogação do seu mandato ao serviço da ré; b) - 37.500,00 € devida a título de indemnização pelo incumprimento parcial do contrato por parte da ré, relativo ao período que medeia entre 1 de Janeiro de 2011 e 31 de Agosto de 2011, consubstanciado na redução da remuneração da Autora em tal período; e c) - 75.000,00 €, devida a título de indemnização por danos morais.
Alegou em resumo, que - quando, em Agosto de 2009, exercia funções na ...- ..., auferindo, como contrapartida do seu trabalho, a remuneração mensal de 7.101,24 €, acrescida de subsídios de férias e de Natal, a ré propôs-lhe integrar o seu Conselho de Administração para o primeiro mandato, a terminar em 31 de Dezembro de 2015, tendo a autora, atentas as condições propostas e a natureza das funções a desempenhar, entendido dever aceitar tal “convite”; - em razão do referido, a autora fez cessar a comissão de serviço em que se encontrava e foi designada ... do Conselho de Administração (CA) da ré, para o seu primeiro mandato, a terminar a 31 de Dezembro de 2015, auferindo - logo a partir de Setembro de 2009, inclusive a remuneração mensal fixa de 12.500,00 € x14,tudo acrescido do direito ao uso, sem restrições, de um veículo automóvel (com seguro, portagens, parqueamento e 200 litros de combustível mensal incluídos) e de um telemóvel, direito este com um valor médio mensal não inferior a 1.450,00 €; - sucede que, a partir de 1 de Janeiro de 2011, a Ré , unilateralmente, reduziu a componente pecuniária da sua retribuição de € 12.500,00 para € 8.750,00 mensais e, poucos meses decorridos, em Setembro de 2011, revogou sem justa causa o mandato que a vinculava à ré, facto que implicou o seu regresso imediato ao seu lugar no ..., passando, doravante, a auferir a remuneração mensal correspondente a esse trabalho, no valor de € 2.289,92 ; - em razão do referido, tem a autora a haver da ré a competente indemnização decorrente da revogação antecipada do mandato, maxime dos valores pecuniários que deixou de auferir a partir da redução unilateral do seu vencimento ao serviço da ré, referente ao período que medeia entre 1 de Janeiro de 2011 e 31 de Agosto de 2011 [ no total de € 37.500,00 (€ 12.500,00 - €8.750,00 = € 3.750,00 x 10) ] , dos benefícios que deixou de obter até 31/12/2015 [ 688.004,80 ( 12.500,00€ - 2 289,92€ = 10 210,08 x 60 + 1450,00€ x 52 ), e da quantia de € 75.000,00 a titulo de indemnização por danos morais.
Contestando e também em resumo, a ré alegou que - o estatuto remuneratório da autora não era o por ela invocado; - o exercício do mandato pela autora, enquanto administradora executiva da Fundação, não foi isento de criticas, razão porque se optou por fazer caducar o mandato e não lançar mão do mecanismo de justa causa, evitando-se assim a exposição e um julgamento público da própria autora; - a caducidade do mandato conferido à autora foi, no essencial, legítima, não consubstanciando a respectiva cessação um qualquer dano susceptível de desencadear uma obrigação de indemnização.
Proferido despacho saneador, fixada a matéria assente e elaborada a base instrutória, foi realizada audiência de discussão e julgamento.
Em 2013.06.03, foi proferida sentença, em que se julgou a ação parcialmente procedente, com o seguinte teor; “Termos em que se decide julgar parcialmente procedente a presente ação e, consequentemente, condenar a ré Fundação Cidade de ... a pagar à autora AA o seguinte: a) a quantia pecuniária já líquida de € 224.541,20, a título de indemnização do dano sofrido com a revogação unilateral do mandato da autora ao serviço da ré, correspondente ao valor do vencimento que a Autora teria recebido no âmbito desse mandato, desde a produção de efeitos da sua destituição - 1 de setembro de 2011 - até março de 2013, data em que foi anunciada a extinção da Ré, inclusive, descontado do valor da efetiva retribuição auferida pela Autora ao serviço do ... – ...; b) a quantia pecuniária que vier a ser liquidada ulteriormente, também a título de indemnização do mesmo dano a que se alude em a), referente ao valor do vencimento que a autora receberia da ré, descontado do valor da efetiva retribuição por si auferida ao serviço do ..., no período compreendido entre abril de 2013 e a data efetiva da extinção da Ré, no caso de tal extinção se concretizar em momento anterior a 31 de dezembro de 2015, sendo que, no caso de ocorrer posteriormente a esta data, o valor da indemnização aqui em causa a atribuir à Autora será o contabilizado até essa data de 31 de dezembro de 2015; c) a quantia pecuniária de € 33.750,00, correspondente ao valor global da redução ilícita do vencimento da autora ao serviço da Fundação Cidade de ..., entre 1 de janeiro de 2011 e 31 de agosto de 2011; d) a quantia pecuniária de € 10.000,00, a título de ressarcimento dos danos não patrimoniais sofridos pela autora, em consequência da revogação do seu mandato ao serviço da ré; e) os juros de mora, contabilizados sobre os valores referidos em a), c) e d), à taxa de 4%, desde a data da citação da ré até efetivo pagamento.
Custas da seguinte forma: - uma vez que se relegou para liquidação ulterior parte da indemnização a que a Autora tem direito, as custas serão provisoriamente repartidas por Autora e Ré em partes iguais, relegando-se a liquidação definitiva da responsabilidade correspondente para o momento da liquidação definitiva da referida indemnização”.
A ré e a autora apelaram – esta subordinadamente – com parcial êxito, tendo a Relação de ..., por acórdão de 2014.01.30, alterado a decisão recorrida nos seguintes termos: “ - Condenar a Ré Fundação Cidade de ... a pagar à Autora AA a indemnização, a título de lucros cessantes, de valor equivalente/correspondente à soma das prestações/remunerações mensais (de € 8.750,00) que deixou de auferir após (1/9/2011) e por causa da revogação do mandato, e até 31/12/2015, e sendo a mesma deduzida do que ganhou no mesmo período por não ter tido de cumprir integralmente o mandato; - Determinar que a quantia indemnizatória indicada em 9.2. seja fixada/liquidada em sede de incidente posterior, nos termos do art. 661.º, n.º 2, do CPC.
9.4.- Condenar a Ré Fundação Cidade de ... a pagar à Autora AA os juros de mora, contabilizados sobre a quantia indemnizatória referida em 9.2, à taxa legal, vencidos a partir da sua notificação para deduzir oposição à liquidação e até efetivo pagamento de tal quantia.
” Novamente inconformadas, a ré e a autora – esta novamente subordinadamente - deduziram as presente revistas, apresentando as respectivas alegações e conclusões.
A autora contralegou.
Cumpre decidir.
Por despacho de 2014.05.22 e na sequência da extinção da ré pelo Decreto-lei 56/2014, de 10.04, foi determinado que a instância prosseguiria, no lado passivo, com a intervenção dos liquidatários Direção Geral do Tesouro e Finanças, Gabinete de Estratégia, Planeamento e Avaliação Cultural (GEPAC) e a Câmara Municipal de ....
As questões Tendo em conta que - o objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões neles insertas, salvo as questões de conhecimento oficioso - arts. 684º, nº3 e 690º do Código de Processo Civil; - nos recursos se apreciam questões e não razões; - os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do acto recorrido são os seguintes os temas das questões propostas para resolução: A) – Se da livre revogação do vínculo que ligava a autora e a ré resulta a ausência do direito de indemnizar B) – Montante da indemnização C) – Custas.
Os factos São os seguintes os factos que foram fixados no acórdão recorrido: - A Ré foi instituída pelo Decreto-Lei nº 202/2009, de 28 de agosto, sendo, nos termos do disposto no art. 1.º deste diploma, uma pessoa coletiva de direito privado e utilidade pública, com duração indeterminada, dotada de personalidade jurídica (al. A dos factos assentes).
- A Autora é, desde 1991, licenciada em gestão de empresas, com curso de pós graduação em direção de empresas, concluído em 1999 (al. B dos factos assentes).
- Encontrava-se, em Agosto de 2009, a exercer funções profissionais na ...- Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional ..., onde auferia a remuneração mensal de 7.101,24 €, acrescida de subsídios de férias e de Natal (al. C dos factos assentes).
- A Autora foi designada pela Ré ... do Conselho de Administração desta, auferindo uma remuneração mensal fixa de € 12.500,00, paga catorze vezes durante cada ano (doze meses, acrescido de subsídios de férias e de Natal) (al. D dos factos assentes).
- Enquanto administradora da Ré a Autora tinha a seu cargo a gestão de toda a área administrativa e financeira da Ré, pela qual era responsável, competindo-lhe, ainda, substituir a Presidente do Conselho de Administração nos impedimentos desta (al. E dos factos assentes).
- A retribuição a que se alude em 2.4 foi reduzida para € 8.750,00, a partir...
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