Acórdão nº 781/11.6TTFAR.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 25 de Novembro de 2014

Magistrado ResponsávelFERNANDES DA SILVA
Data da Resolução25 de Novembro de 2014
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I.

  1. AA demandou no Tribunal do Trabalho de Faro, em Dezembro de 2011, mediante acção declarativa emergente de contrato individual de trabalho, ‘BB, Ld.ª’, ambas devidamente identificadas, pedindo, a final, que seja declarado ilícito o despedimento de que foi alvo e que seja também declarado que a categoria profissional da A. é a de Técnica de Contabilidade Principal, com a consequente condenação da R. a pagar-lhe as diferenças salariais contabilizadas, bem como as demais importâncias discriminadas, devidas, além do mais, a título subsídios de férias e de Natal, indemnização por danos não patrimoniais e indemnização em substituição da reintegração.

    Alegou para o efeito, em síntese útil, que: - Foi admitida ao serviço de CC em 02 de Abril de 2007 para desempenhar as funções de escriturária de 3.ª, com o vencimento mensal de € 500,00, acrescido de subsídio de alimentação de € 5,70 por cada dia efectivo de trabalho.

    - Em 01 de Agosto de 2007 passou a desempenhar as suas funções para a sociedade demandada, de que é única sócia e gerente CC, assinando, em 17 de Outubro de 2011, um escrito que designaram por acordo de cessação do contrato de trabalho.

    - Sucede que, no dia seguinte, a A. remeteu à Ré uma missiva onde revoga aquele acordo. E no dia 19 de Outubro deslocou-se às instalações da Ré para ocupar o seu posto de trabalho e para comunicar pessoalmente à Ré a revogação do acordo, bem como para que não procedesse à transferência bancária dos montantes acordados, sendo informada pela gerente da Ré que já tinha sido efectuada uma primeira transferência no montante de € 677,48.

    - Tendo então solicitado o NIB para devolver as quantias transferidas para a sua conta, a gerente da Ré comprometeu-se a enviá-lo posteriormente por correio electrónico, mas não o fez, impedindo ainda a A. de ocupar o seu posto de trabalho, afirmando que a mesma estava despedida.

    - Mais alegou que recebeu sempre a retribuição correspondente à categoria profissional de escriturária de 3.ª, mas desde 02 de Abril de 2007 que desempenhou funções correspondentes à categoria profissional de Técnica de Contabilidade Principal, funções que já tinha desempenhado para a “DD, Ld.ª”.

    - Assim, atenta a diferença salarial, existe um crédito a seu favor no total de € 14.991,00, que não lhe foi pago, a que acresce o montante de € 2.630,00 relativo à diferença salarial dos subsídios de férias e de Natal dos anos de 2007 a 2011, tendo ainda direito a receber o abono para falhas.

    - Aduz por fim que, devido ao despedimento, passou a dormir mal, a andar triste e angustiada, temendo pelo futuro da sua família, pelo que teve que pedir ajuda médica para colmatar os estados de ansiedade e depressão.

    A ré contestou. E deduziu pedido reconvencional, que foi rejeitado.

    Saneada, instruída e discutida a causa, proferiu-se sentença, a julgar a acção parcialmente procedente, com o seguinte dispositivo: “1 – Declara ilícito o despedimento efectuado por iniciativa da Ré ‘BB’ na pessoa da A. AA; 2 – Condena a Ré (…) a pagar à A. (…) as retribuições vencidas desde 19 de Outubro de 2011, incluindo o subsídio de Natal do ano de 2011, e as vincendas até ao trânsito em julgado da decisão final desta causa, considerando-se a retribuição mensal base de € 529,00 (…) acrescida do subsídio de alimentação no montante diário de € 5,70 (…), com dedução das importâncias que a A. tenha comprovadamente obtido com a cessação do contrato e que não receberia se não tivesse ocorrido o despedimento, e com dedução dos montantes recebidos a título de (subsídio de) desemprego pela A., se for o caso, devendo esses montantes ser entregues à Segurança Social pela Ré; 3 – Condena a Ré (…) a pagar à A. (…), a título de indemnização em substituição da reintegração, o montante de 30 (trinta) dias de retribuição base por cada ano completo ou fracção de antiguidade (€ 529,00), atendendo-se ao tempo decorrido desde o despedimento até ao trânsito em julgado desta decisão judicial; 4 – Condena a Ré (…) a pagar à A. (…), a título de indemnização por danos não patrimoniais o montante de € 2.500,00 (…); 5 – Absolve a Ré (…) do demais contra si peticionado pela A. (…); 6 – Absolve a Ré (…) do pedido de litigância de má-fé deduzido pela A. (…); 9 – Autoriza a Ré (…) a compensar nos montantes devidos à A. o montante de € 3.387,40 (…) que transferiu para a conta bancária da mesma em 28 de Outubro de 2011; 28 de Novembro de 2011; 29 de Dezembro de 2011; 30 de Janeiro de 2012 e 28 de Fevereiro de 2012, caso a A. não tenha entretanto devolvido o referido montante; 10 – Condena a Ré (…) e a Autora (…) no pagamento das custas na proporção dos respectivos decaimentos, 80,56% e 63,99%, respectivamente, sem prejuízo da protecção jurídica concedida à Autora”.

  2. Não se conformando com o assim ajuizado, a R. apelou para o Tribunal da Relação de Évora que, pelo Acórdão prolatado a fls. 275-290, deliberou …”julgar a apelação procedente e consequentemente revogam parcialmente a sentença recorrida em relação aos pontos 1, 2, 3, 4, 9 e 10 do dispositivo, absolvendo-se a ré dos pedidos a que se referem tais pontos, mantendo-se a mesma no demais decidido.

    ” É a A. que, irresignada, vem ora interpor a presente Revista, cuja motivação remata com esta síntese conclusiva: 1. O Tribunal a quo considerou que a matéria provada, em 19, não é suficiente para considerar que existiu um inequívoco despedimento da recorrente, pelo que revogou a sentença proferida em primeira instância.

  3. Este não é o entendimento da recorrente que, com o mais elevado respeito, considera que o Venerando Tribunal fez uma incorrecta aplicação do direito à matéria de facto.

  4. A matéria dada como provada no ponto 19 não pode ser analisada isoladamente, devendo antes ser conjugada com a restante.

  5. Na sustentação da sua posição, o Tribunal a quo refere acórdãos desse Superior Tribunal, que, em nossa opinião, foram doutamente proferidos em questões fácticas bem diferentes das dos presentes autos.

  6. Nas circunstâncias descritas na matéria provada, um declaratário normal, colocado na posição do declaratário real, não teria a menor dúvida de que se trataria de um despedimento.

  7. Despedimento que, por não ser precedido de processo disciplinar, deve ser considerado ilícito, devendo a Ré ser condenada a pagar à Autora as quantias a que foi condenada em primeira instância.

    Pelo exposto, termina, deve ser concedido provimento ao presente recurso e, em consequência, revogado o Acórdão recorrido, mantendo-se a sentença proferida em primeira instância, bem sabendo V. Ex.ªs que o Direito é mais do que a Lei e menos que a JUSTIÇA.

    ___ A R., notificada da interposição da Revista, respondeu-lhe e, do mesmo passo, apresentou recurso subordinado, também de Revista, fechando as alegações correspondentes com este quadro conclusivo: 1. Considerando-se que a Recorrente promoveu a cessação do acordo de revogação do contrato de trabalho, impunha-se como conditio sine qua non da validade e eficácia dessa cessação que a Recorrente, dentro do prazo de sete dias a contar da celebração de tal acordo, não apenas comunicasse à Recorrida a vontade de fazer cessar os efeitos do mesmo, mas simultaneamente fizesse a entrega ou colocasse à disposição desta, no mesmo prazo, os valores por si recebidos em cumprimento do mesmo (art. 350.º, n.ºs 1 e 3, do Código do Trabalho); 2. Ora, tendo a Recorrida efectuado – em cumprimento desse acordo – um pagamento à Recorrente em 18/10/2011, impunha-se a esta que, no referido prazo de sete dias, procedesse à devolução de tal quantia ou, pelo menos, a colocasse à disposição da Recorrida; 3. A simples solicitação de NIB à Recorrida por parte da Recorrente não constitui um meio efectivo de pagamento, pelo que não pode considerar-se tempestivamente satisfeito, pela Recorrente, o requisito de eficácia previsto na parte final do n.º 3 do art. 350.º do Código do Trabalho; 4. Em suma, a Recorrente não usou da diligência exigível e, nessa medida, não tornou válida e eficaz qualquer comunicação de cessação do acordo de revogação do contrato de trabalho; 5. O Acórdão ora recorrido, por seu turno, fez uma correcta aplicação da Lei na parte em que em que considerou a inexistência de um despedimento ilícito, na medida em que os factos provados são manifestamente insuficientes para sustentar tal conclusão; 6. Com efeito, a circunstância da legal representante da Recorrida ter recusado que a Recorrente reocupasse o seu pretenso posto de trabalho e tivesse – no diálogo mantido – utilizado a expressão "despedimento", não pode ser separada ou dissociada do contexto do acordo de revogação do contrato de trabalho entre si aceite e celebrado, sendo ambas as situações contemporâneas.

  8. Por outro lado, é consabido que o termo "despedimento", quando utilizado por leigos, não tem necessária e forçosamente o seu significado legal, podendo querer significar uma qualquer forma de extinção da relação laboral.

  9. Destarte, a matéria apurada – que deve ser analisada e valorizada num contexto global – é manifestamente insuficiente para concluir, com o mínimo de segurança e certeza, que a legal representante da Recorrida haja despedido (aqui, no seu significado legal) a Recorrente.

  10. Não se verificando, em concreto, uma situação de despedimento ilícito, não pode a Recorrida ser condenada no pagamento à Recorrente de quaisquer quantias, ao abrigo do disposto nos arts. 389.º, 390.º e 391.º do Código do Trabalho.

  11. Porém, e ainda que se verificasse, sem conceder, obrigação de indemnizar em resultado de um pretenso despedimento ilícito, a Recorrente, com base na factualidade apurada, não teria direito a ser ressarcida por danos não patrimoniais, por inexistência de nexo de causalidade e, nesta parte, a sentença a quo viola o disposto no art. 563.º do Código Civil.

  12. Na realidade, e conforme se constata da factualidade dos autos, o suposto estado de tristeza e angústia da Recorrente está intimamente e directamente relacionado...

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