Acórdão nº 1081/11.7PAMGR.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 03 de Julho de 2014

Magistrado ResponsávelOLIVEIRA MENDES
Data da Resolução03 de Julho de 2014
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça.

No processo comum com intervenção do tribunal colectivo n.º 1081/11.PAMGR, do 1º Juízo da comarca da Marinha Grande, AA e BB, com os sinais dos autos, foram condenados, entre outros arguidos, nas penas de 6 anos de prisão e 200 dias de multa à taxa diária de € 1.000 e 3 anos de prisão, respectivamente, o primeiro pela autoria de um crime de tráfico de estupefacientes e de três crimes de condução de veículo automóvel sem habilitação legal, o segundo pela autoria de um crime de tráfico de menor gravidade.

Os arguidos interpuseram recurso para este Supremo Tribunal.

É do seguinte teor o segmento conclusivo da motivação de recurso do arguido AA[1]: «1. Foi o recorrente condenado pela prática de um crime de produtos estupefacientes, p.p. pelo art. 21º do Dl 15/93 de 22 de Janeiro, na pena de seis anos de prisão.

  1. Afigura-se ao aqui recorrente que, face à matéria dada como provada, o mesmo deveria ter sido condenado pela prática do ilícito previsto no art. 25° do DL n.º 15/93, de 22.1.

  2. Com efeito, os factos assentes - número de transacções efectuadas, número de consumidores/compradores, a forma como a actividade era desenvolvida - permitiriam integrar a conduta do recorrente naquele outro ilícito, punível com pena de prisão de um a cinco anos.

  3. Atendendo à prova produzida sobre a concreta actividade levada a cabo pelo arguido, ter-se-á que concluir, no respeito pelo princípio da presunção da inocência, que os lucros obtidos seriam diminutos, que a actividade era desenvolvida sem qualquer tipo de organização, inexistiam intermediários, os contactos eram directos entre o recorrente e os compradores de estupefacientes.

  4. Nenhuns objectos indiciadores de um tráfico com carácter sistemático e organizado lhe foram aprendidos.

  5. As transacções efectuadas terão ocorrido durante cerca de dez meses, tendo sido identificados como compradores, cerca de seis indivíduos, num total de trinta transacções.

  6. O recorrente é consumidor de haxixe e cocaína.

  7. A não se entender assim, ou seja, que não estamos perante um tráfico de menor gravidade, estar-se-ia a "meter no mesmo saco" os grandes traficantes, cujo principal móbil é o lucro e que transaccionam grandes quantidades de estupefacientes, e os pequenos traficantes, como é o caso do recorrente.

  8. Sem prescindir do exposto, e caso V. Exc. considerem que estamos efectivamente perante a prática do ilícito do art. 21º do DL 15/93, somos de opinião que a pena de seis anos se revela excessiva, face ao disposto no art. 71º do Código Penal, e atenta a matéria de facto dada como provada relativa às condições pessoais do recorrente.

  9. O recorrente tem agora, aos 48 anos de idade, o primeiro contacto com o meio prisional, encontrando-se em reclusão há já um ano.

  10. Embora registe antecedentes criminais, falamos de dois crimes de ofensa à integridade física simples e um crime de detenção de arma proibida, ilícitos de natureza diferente daquele que é objecto dos presentes autos.

  11. O quantum penal a aplicar resultante daquele correcto enquadramento jurídico a que já nos referimos ou, caso se considere que a conduta do recorrente é integradora do art. 21° do já citado diploma legal, com a aplicação de uma pena próxima do limite minimo legal, seria susceptível de ser suspenso na sua execução.

  12. Essa suspensão impunha-se, face ao comportamento do arguido há um ano a esta parte, o facto de antes de ser detido ter sempre trabalhado, ainda que de forma precária, não se sentindo, em nossa opinião, muito intensas as necessidades de prevenção especial.

  13. Seria de todo possível ter sido efectuado um juízo de prognose favorável de que o quantum penal a que nos referimos, acompanhado da ameaça da sua execução, seria suficiente para que o recorrente levasse uma vida apartado da comissão de ilícitos.

  14. O risco prudencial subjacente a essa suspensão pela qual pugnamos, sairia esbatido se a mesma fosse acompanhada de regime de prova, nos termos do art. 53° do CP.

  15. Disposições violadas: Artigos 21° e 25° do DL 15/93 de 22/1 e art. 50°, 53° e 70° do Código Penal».

O arguido BB extraiu da sua motivação de recurso as seguintes conclusões: «1- O arguido/recorrente discorda da escolha e medida da pena aplicada considerando que não foi devidamente valorada a personalidade do arguido, tendo sido negligenciados os seguintes factos: 1.1- O arguido possui fracos recursos económicos; 1.2- A conduta do arguido que desde novembro de 2012 não possui qualquer actividade ilícita; 1.3- A personalidade do arguido enquanto companheiro carinhoso preocupado e atento ás condições tisicas e psíquicas da sua companheira; 1.4- Ser filho de uma família desorganizada, destruturada e conflituosa; 1.5-o seu progenitor ser alccoolico e que não assegurava convenientemente a manutenção das necessidades básicas;.

2- Ainda no que concerne à pena, entende também o recorrente que as exigências gerais de culpa e prevenção, admitem que ao arguido seja aplicada preferencialmente uma pena não privativa da liberdade.

3- Com efeito, no que concerne à prevenção geral há que considerar o valor particularmente baixo do bem patrimonial ofendido, não se revelando assim razões de prevenção geral particularmente exigentes.

4- Em relação à prevenção especial há que considerar que o recorrente esteve já detido por 2 vezes, mas que ocorreu em 1993 e 1996, o que denota claramente que não deverá haver um juízo de censura elevado.

5- Acresce ainda que o arguido há cerca de 2 anos que deixou a sua conduta criminosa, facto que deverá ser considerado em termos de atenuação da pena-- cfr. art. 72° n° 2 al. d) do C.P.

6- Assim, em sede de determinação da escolha e medida da pena entende o recorrente que a decisão tomada pelo tribunal "a quão" viola os preceitos contidos nos artigos 70°, 71º e 72º do C.P».

Com tais fundamentos, na procedência do recurso, pugna o arguido pela aplicação de uma pena não privativa da liberdade Na contra-motivação o Ministério Público formulou as seguintes conclusões: «I O arguido, AA ,tal como consta dos factos dados como provados ,além das vendas de cocaína mencionadas nos n.ºs 18 a 27, no dia 08/11/2012, na Rua S… B… e R… 1.º de Janeiro, n.º xx, x.º andar, O…, M… G…, detinha entre outros objetos e valores : - 49 doses individuais de cocaína, acondicionadas num canto de plástico, com o peso total de 9,509 g, dentro de uma embalagem de medicamentos; - uma peúga contendo 26 doses individuais de cocaína, acondicionadas num canto de plástico, com o peso total líquido de 4,443 g; - um saco de plástico contendo duas embalagens em plástico: uma com heroína com o peso líquido de 50,20 g e outra com dez embalagens de cocaína com o peso líquido total de 49,076 g ; que destinava a serem vendidas a terceiros; II O arguido adquiriu as substâncias que vendeu e as que pretendia vender, na cidade de Lisboa, onde se deslocou durante todo o ano de 20102 ; com ida e regresso de táxi fretado na M… G… , pelo menos três vezes, à zona do Campo Grande e seis outras vezes à Praça de Espanha, no próprio dia; III Este recorrente não atendeu a todos factos apurados e dados como provados , mormente quanto às quantidades e disseminação da heroína e cocaína que detinha na sua residência e aí lhe foi apreendida pelas autoridades .

IV As deslocações relâmpago, mormente de táxi, permitem concluir que, com o apoio da sua companheira - a arguida, CC, não teve mãos a medir na venda de heroína e cocaína, mormente na sua residência; V O arguido e recorrente lançou-se e desenvolveu, durante cerca de um ano e até ser detido, atividade muito para além do pequeno traficante ou " retalhista de rua".

VI No atinente ao arguido, BB, além dos produtos estupefacientes que lhe foram apreendidos nos dias 08/11/2012 e 26/02/2013, todos os factos dados como provados e que não questionou, apontam para a persistência na prática do crime de tráfico de tais produtos em toda e qualquer oportunidade que lhe surja; VII Desafia a ação da justiça ,com total indiferença às reações penais já sofridas; sem qualquer materialização do invocado afastamento do crime nem tão pouco vontade de recuperação.

VIII As candentes necessidades quer de prevenção geral quer especial foram minuciosamente ponderadas pela decisão recorrida que teve em conta não só a medida ótima da tutela dos bens jurídicos mas também as exigências de socialização.

IX Os arguidos, AA e BB , não sendo primários, agiram bem conscientes da gravidade das condutas e de toda a destruição gerada à sua volta , X A simples censura do facto e ameaça da pena não assegurariam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.

XI Apresentando-se como desperdício; sem qualquer rigor ou poder dissuasor uma pena menos severa e, por maioria de razão, cuja execução ficasse suspensa.

XII Assim, perante a gravidade dos factos e da culpa do agente, bem andou o tribunal ao condenar o arguido, AA, como autor material, pela prática de - um crime de tráfico de estupefacientes ,p. e p. pelo art.ºs 21º, n.º 1 , do D. L. 15/93 de 22/01 ,na pena de 6 (seis) anos de prisão efectiva , E condenar o arguido, BB ,convolando o crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art.º 21.º, n.º 1 , por foi acusado, como autor material pela prática de um crime de tráfico de menor gravidade p. e p. pelos art.ºs 21.º, n.º 1 e 25.º, al. a) do DL 15/93, de 22.12 ,na pena de 3 (três) anos de prisão efectiva.

XIIl Que se mostram bem doseadas e equilibradas.

XIV Não se vê qualquer erro; obscuridade ou contradição em toda a matéria de facto dada como provada , tal como inexiste qualquer falta de fundamentação , geradora de nulidades .

XV Não se mostram violados os art.ºs 21.º e 25.º, ambos do Dec. Lei 15/93 de 22/01 nem os arts. 50.º, 53º, 70.º, 71.º e 72.º, todos do Código Penal, ou qualquer outro dispositivo legal.

XVI Merece inteira confirmação o acórdão recorrido».

A Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu o seguinte parecer: «Os arguidos AA e BB recorrem para o Supremo Tribunal de Justiça do acórdão...

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