Acórdão nº 92/11. 7JAAVRJ3. S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 25 de Novembro de 2015

Magistrado ResponsávelOLIVEIRA MENDES
Data da Resolução25 de Novembro de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

* Acordam no Supremo Tribunal de Justiça No âmbito do processo comum com intervenção do tribunal colectivo n.º 92/11. 7JAAVRJ3, da 1ª Secção Criminal da Instância Central de Aveiro, tendo em vista o conhecimento superveniente de concurso de crimes, foi o arguido AA, com os sinais dos autos, condenado na pena conjunta de 6 anos e 9 meses de prisão.

O arguido recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça.

É do seguinte teor o segmento conclusivo da respectiva motivação[1]: «

  1. O Acórdão recorrido violou os princípios da adequação e proporcionalidade das penas, ao aplicar ao arguido, em cúmulo jurídico, uma pena de seis (06) anos e nove (09) meses de prisão.

  2. O Acórdão recorrido violou o disposto no artigo 374°, n.º2, do Código de Processo Penal, incorrendo assim na nulidade cominada no artigo 379°, n.°1, alínea a), do mesmo Código; salvo o devido respeito, limitou-se a tecer considerações de cariz genérico e algo abstracto, quando se impunha que fosse mais concretizador.

  3. Violado se mostra também o artigo 77° do Código Penal, sobretudo porque o Acórdão recorrido fixou uma pena elevada, sem ter em devida consideração o conjunto dos factos atinentes à personalidade e à culpa do arguido.

  4. O acórdão recorrido não deu uso ao método e à prática jurisprudencial corrente de aplicação do princípio de exasperação ou agravação que consiste, fundamentalmente no aditamento à pena parcelar mais grave de uma dada porção ou fracção das restantes penas.

  5. Por último, cremos que a pena a aplicar, em cúmulo jurídico, não deverá ultrapassar os cinco (05) anos de prisão e deverá ser suspensa na sua execução, ainda que sujeita a regime de prova.

  6. No caso vertente resulta provado que o recorrente se encontra perfeitamente inserido social e familiarmente, tem mantido um bom comportamento desde a data da prática dos factos objecto dos presentes autos, sendo que os factos dados como provados e as conclusões do seu relatório social junto aos autos permitem efectuar um juízo de prognose favorável quanto ao mesmo.

  7. Ê que, ao fixar-se um juízo de censura jurídico-penal haverá que ser ponderado o futuro do agente numa perspectiva de contribuição para a sua recuperação como indivíduo dentro dos cânones da sociedade. Ao invés, o cumprimento de seis anos e nove meses de prisão, longe de ajudar a reinserção do agente estará a atirá-lo irremediavelmente para a marginalidade - com o que a sociedade só virá a perder».

    Na resposta o Ministério Público alegou: «Nos autos em epígrafe foi tal arguido condenado, em sede de conhecimento superveniente de concurso de crimes, na pena única de 6 anos e 9 meses de prisão resultantes do cúmulo jurídico das penas que nos presentes autos e no processo n" 79/11.0JAAVR lhe foram aplicadas, respectivamente: . pena única de 6 anos de prisão; . pena única de 3 anos de prisão, suspensa na sua execução por igual período.

    Contesta o recorrente tal decisão, defendendo que:

  8. O Acórdão recorrido violou os princípios da adequação e proporcionalidade das penas, ao aplicar ao arguido, em cúmulo jurídico, uma pena de seis (06) anos e nove (09) meses de prisão.

  9. O Acórdão recorrido violou o disposto no artigo 374º, n.°2, do Código de Processo Penal, incorrendo assim na nulidade cominada no artigo 379º n.°1, alínea a), do mesmo Código; salvo o devido respeito, limitou-se a tecer considerações de cariz genérico e algo abstracto, quando se impunha que fosse mais concretizador.

    C) Violado se mostra também o artigo 77º do Código Penal, sobretudo porque o Acórdão recorrido fixou uma pena elevada, sem ter em devida consideração o conjunto dos factos atinentes à personalidade e à culpa do arguido.

  10. O acórdão recorrido não deu uso ao método e à prática jurisprudencial corrente de aplicação do princípio de exasperação ou agravação que consiste, fundamentalmente no aditamento à pena parcelar mais grave de uma dada porção ou fracção das restantes penas.

  11. Por último, cremos que a pena a aplicar, em cúmulo jurídico, não deverá ultrapassar os cinco (05) anos de prisão e deverá ser suspensa na sua execução, ainda que sujeita a regime de prova.

  12. No caso vertente resulta provado que o recorrente se encontra perfeitamente inserido social e familiarmente, tem mantido um bom comportamento desde a data da prática dos factos objecto dos presentes autos, sendo que os factos dados como provados e as conclusões do seu relatório social junto aos autos permitem efectuar um juízo de prognose favorável quanto ao mesmo.

  13. É que, ao fixar-se um juízo de censura jurídico-penal haverá que ser ponderado o futuro do agente numa perspectiva de contribuição para a sua recuperação como individuo dentro dos cânones da sociedade. Ao invés, o cumprimento de seis anos e nove meses de prisão, longe de ajudar a reinserção do agente estará a atirá-lo irremediavelmente para a marginalidade - com o que a sociedade só virá a perder.

    Delimitado, pois, o recurso por tais conclusões, clama o recorrente . quer por uma pena inferior à fixada e que não ultrapasse os 5 anos de prisão.

    · quer, por último, pela suspensão da respectiva execução, ainda que sujeita a regime de prova, pedidos, aliás, coincidentes com os que logo formulou quando solicitou nos autos a realização do cúmulo jurídico de tais penas.

    Vejamos, porém, de que forma o tribunal a quo, no acórdão sob crítica, fundamentou não só a medida da pena, mas também como rebateu desde logo os argumentos que o recorrente cedo aduziu em favor da sua tese: "(. •• ) Relativamente à medida da pena são considerados em conjunto, "os factos e a personalidade do agente" (art. 77. º, n.º 1, parte final, do C. Penal).

    Assim, a moldura penal varia, neste caso, entre 2 anos e 6 meses de prisão (pena parcelar mais elevada) e 18 anos e 5 meses de prisão (soma de todas as penas concretas aplicadas nos dois processos).

    Neste cenário, pretende o arguido AA que se aplique uma pena concreta não inferior a 5 anos e se suspenda a sua execução, conforme sustenta no requerimento em que solicitou a realização de cúmulo jurídico te reafirmou em alegações finais).

    Mas tal pretensão é absolutamente inviável não só à luz dos princípios e normas legais, como também perante os mais elementares critérios de justiça, de razoabilidade e de lógica. Com efeito, nos presentes autos foi o arguido AA condenado na pena única de 6 anos de prisão efectiva, sendo, por isso, absolutamente incongruente que neste novo cúmulo, agora com mais três penas parcelares a considerar, viesse a ser-lhe aplicada uma pena única de 5 anos de prisão ou inferior, para depois ser suspensa na sua execução (situação semelhante foi ponderada pelo STJ no acórdão de 06-03-2008, In CJ STJ I, pág. 249).

    E neste caso importa atentar que o arguido AA recorreu da decisão proferida pela 1.ª instância, em 22-05¬2013, que lhe aplicou essa pena única de 6 anos de prisão, tendo pugnado, em sede de recurso, além do mais, pela fixação da pena final em medida não superior a 5 anos, suspensa na sua execução (ctr. f1s. 630 a 656).

    Porém, tendo apreciado as questões suscitadas pelo recorrente, o Tribunal da Relação de Coimbra, por acórdão de 12-11-2014, veio a julgar totalmente improcedente o recurso, mantendo aquela pena única de 6 anos de prisão (cfr. 699 a 723).

    E nem tão pouco se pode argumentar com o decurso do tempo, pois que tal acórdão transitou em julgado em 05-01-2015 (cfr: f1s. 753), ou seja, há escassos quatro meses e meio, sendo que o arguido AA apresentou o requerimento para a realização do cúmulo jurídico pouco depois desse trânsito, precisamente para evitar a emissão dos mandados de detenção (como aí argumentou e solicitou).

    Compreende-se a intenção do arguido AA, mas, na realidade, o que o mesmo pretende é, através da realização desta audiência de cúmulo jurídico, derrogar o decidido, em última instância, pelo Tribunal de Relação de Coimbra, que manteve aquela pena de 6 anos de prisão efectiva. E com que argumentos? Desde logo dizendo que, com o "desmantelamento" do cúmulo efectuado em tal acórdão, nada impede que, nesta nova operação de cúmulo jurídico, seja agora fixada uma pena não superior a 5 anos, pois que aquele caso julgado é “um caso julgado relativo".

    Sucede que, perante aquela decisão transitada em julgado, o arguido AA sempre teria de cumprir a pena de 6 anos de prisão (com ressalva de eventual recurso de revisão, que aqui não se coloca).

    Assim, caso se atendesse a sua pretensão (de fixar agora uma pena igual ou inferior a 5 anos de prisão), tal implicaria premiá-lo pelo facto de ter cometido mais três crimes (no aludido Processo 79/11.0JAAVR), precisamente aqueles que levaram à realização de cúmulo jurídico.

    Essa pretensão é de tal maneira inconsistente e inviável, que não só atenta contra as normas e princípios jurídicos vigentes, como atentaria contra o sentimento comunitário de realização da justiça, além de que seria um rude golpe na confiança dos cidadãos no sistema de justiça penal.

    Mas sendo esses os factores a considerar na medida da pena única, vejamos o que nos indicam os factos e a personalidade do arguido AA.

    No que respeita àqueles, trata-se, na maioria dos casos, de crimes de natureza sexual de que foram vítimas raparigas menores, sendo que os mesmos se prolongaram entre Junho de 2010 e Maio de 2011 (quase um ano). Ao todo são nove as ofendidas com tais condutas do arguido AA (BB, CC, DD, EE, FF, GG, HH, II e JJ). Os factos são, pois, graves e duradouros, sendo certo que o arguido António Barroca não logrou contactos físicos de natureza sexual com as vítimas. Ademais, trata-se de ilícitos cujas necessidades de reprovação e prevenção são elevadas, atenta a sua frequência, além de que motivam forte repulsa e censura comunitária (conforme resulta dos acórdão condenatórios).

    Por outro lado, a personalidade do arguido AA está bem patente no seu percurso e passado criminal, tendo sido condenado, ao todo, por 13 vezes, desde o longínquo ano de 1988. Tal evidencia um total desrespeito pelos valores socialmente reinantes e uma permanente infracção...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT