Acórdão nº 19/10.3GCRDD-E.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 08 de Janeiro de 2015

Magistrado ResponsávelRAUL BORGES
Data da Resolução08 de Janeiro de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

No âmbito do processo comum com intervenção de tribunal colectivo n.º 19/10.3GCRDD, do então Tribunal Judicial da Comarca do Redondo, integrante do Círculo Judicial de Évora, foi submetido a julgamento o arguido AA, actualmente em cumprimento de pena iniciada no dia 13 de Janeiro de 2014 (anteriormente esteve preso preventivamente à ordem do processo principal, de 28-03-2012 a 3-07-2012, conforme certidão de fls. 145 verso).

Por acórdão datado de 28 de Março de 2012, foi deliberado condenar o arguido em referência, pela prática de um crime de violência doméstica, p. p. pelo artigo 152.º, n.º 1, alínea a) e n.º 2, do Código Penal, na pena de quatro anos de prisão, e como autor material de um crime de violação, p. e p. pelo artigo 164.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, na pena de cinco anos de prisão, e em cúmulo jurídico, na pena única de sete anos de prisão. O arguido interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Évora, que por acórdão de 16 de Outubro de 2012, entendeu “operar a comutação, in mellius, do decidido em 1.ª instância”, julgou o recurso parcialmente procedente no particular atinente à escolha e medida da pena, revogando o acórdão recorrido e decidindo em substituição e suprimento condenar o arguido: Como autor de um crime de violência doméstica, p. p. pelo artigo 152.º, n.º 1, alínea a) e n.º 2, do Código Penal, na pena de três anos de prisão; Como autor material de um crime de violação, p. e p. pelo artigo 164.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, na pena de quatro anos de prisão.

E em cúmulo jurídico, na pena única de cinco anos e seis meses de prisão.

Tudo conforme certidão constante de fls. 151 a 172, junta após despacho por nós proferido nesse sentido, a fls. 143.

******* O arguido interpôs o presente recurso extraordinário de revisão em 29 de Maio de 2014, nos termos do artigo 449.º, n.º 1, alínea d), do CPP, apresentando a motivação de fls. 3 a 7, que remata com as seguintes conclusões (em transcrição integral, incluídos realces): 1. O recorrente foi condenado na pena de quatro anos de prisão pela prática do crime de violência doméstica, p. e p. pelo artigo 152° n.° 1 a) do Código Penal; 2. E pela pratica de um crime de violação p. e p. no artigo 164° n.° 1 al. a) do Código Penal, na pena de cinco anos de prisão.

3. Em cúmulo jurídico na pena de sete anos de prisão; 4.Tal decisão veio ser alterada pelo Tribunal da Relação de Évora que alterou a pena para cinco anos de prisão; 5. O recorrente cumpriu prisão preventiva e foi restituído à liberdade em 3 de Julho de 2012; 6. Em 13 de Janeiro de 2013 recolheu ao Estabelecimento Prisional de Elvas para cumprimento da pena de prisão de cinco anos; 7. Contudo, durante este lapso de tempo a ofendida teve a iniciativa de entrar em contacto com o recorrente, nomeadamente através do envio de mensagens de texto via telemóvel, chamadas telefónicas e ainda ocorrência de encontro sexual entre os dois; 8. O recorrente na senda de provar a sua inocência deixou que esses contactos tivessem lugar e na verdade, os mesmos são reveladores ou pelo menos indiciadores de que o depoimento da ofendida (e única base da condenação) não merecem credibilidade linear e suscitam graves dúvidas quanto à condenação do recorrente.

9. Tais factos acrescem a novos meios de prova - testemunhal - que não foi introduzida no processo tempestivamente pelas razões que se aduziram e que são alheias ao recorrente, conforme se expôs na motivação.

10. Assim, as mensagens enviadas pela ofendida, a análise psicopatológica que da ofendida o Prof. ... efectuou, a conversa telefónica entre ofendida e recorrente, os novos depoimentos tudo conjugado leva à existência de serias e graves dúvidas sobre a condenação a que foi sujeito o recorrente, nos termos e para os efeitos do artigo 449° nº 1 d) do CPP.

11. O comportamento da ofendida posterior à condenação não é compatível com os factos descritos em audiência de julgamento.

12. Não é compatível com as alegadas e provadas em Tribunal violações físicas, psicológicas e sexuais por parte do recorrente sobre a ofendida.

13.Tal comportamento revelado pelas mensagens e pelo teor da conversa é sim, compatível com uma personalidade manifestamente perturbada, que ainda que sem mentir conscientemente, alterou ou manipulou factos a seu favor, o que resultou numa enorme injustiça.

14. Aliás, como conclui o Prof. Dr. Pio de Abreu da análise que fez, quer do depoimento prestado em audiência pela ofendida, quer do teor das mensagens sms, bem como dos registos clínicos, Estas características colocam-na no grupo das personalidades histriónicas, com traços acentuados de dependência. Uma das suas características deste tipo de personalidade é a tendência a dependerem da opinião dos outros e a faltar à verdade, mesmo de um modo inconsciente. Com efeito, a existência das pessoas com este tipo de personalidades funciona no “como se”, representando papéis consoante o “palco” que ocupam e a respectiva audiência.

15. E os meios de prova testemunhal que não foram conhecidos em Tribunal, uns, por inépcia evidente do mandatário, outros por estratégia processual assim definida e imposta ao recorrente, vão todos no sentido indiciário que o recorrente não praticou os crimes pelos quais foi condenado.

16. Deverá, pois em conformidade ser autorizada a revisão da sentença proferida pela primeira instância e transitada em julgado.

Conforme supra se expôs, resultam sérias dúvidas sobre a justiça desta condenação e como tal, deve ser autorizada a revisão da sentença, devendo desde já serem ordenadas as seguintes diligências: A. Seja oficiada a TMN (agora MEO) com sede na Avenida Álvaro Pais, n.° 2, 1649-041 Lisboa para informar nos autos sobre a titularidade dos números de telefone: ..., ..., ..., ..., ... e ... (números através dos quais foram enviadas e recebidas as mensagens); B.

Caso não seja possível identificar a titularidade, informe a TMN se estes números foram objecto de pagamentos/carregamentos e através de que contas bancárias de forma apurar a identidade do(s) titular(es) dessas mesmas contas; C. Sejam inquiridas as testemunhas cujo depoimento e interesse, se resumiu supra: 1. BB, ...o, com domicílio profissional na ...l; 2. CC, residente na Rua ...; 3. DD, residente na Rua ...; 4. EE, ..., 5. FF, residente na ...; 6. GG, residente na Rua ...; 7. HH; 8. II, ambos a notificar na ...; 9. JJ, ..., E. Seja inquirido o representante legal da ..., com sede na ..., a fim de confirmar o processo de retirada das mensagens do telemóvel do recorrente, que se encontram transcritas nos documentos 1 e 2.

  1. Seja inquirida a Dr.ª LL pertencente ao Serviço de Segurança Social de ..., na medida em que foi a autora da ficha de sinalização que levou à emissão do documento n.° 6.

  2. Sejam admitidos nos autos os documentos ora apresentados.

  3. Seja efectuada pelo Tribunal a audição do CD que ora se junta; MAIS REQUER: Nos termos do artigo 457° n.° 2 e caso seja autorizada a revisão, a suspensão imediata da pena de prisão.

******* Por despacho de 2-06-2014, a Exma. Juíza, a fls. 123/4, deferiu a pretensão de ofício à TMN para informar sobre a titularidade de números de telefone e indeferiu, por inadmissível, a inquirição das testemunhas arroladas, por não ter sido alegado pelo arguido que ignorava a sua existência ao tempo do julgamento ou que estiveram impossibilitadas de depor.

******* A Exma. Juíza prestou a informação a que alude o artigo 454.º do CPP, afirmando, a fls. 132/4: «AA, arguido nos autos, veio interpor recurso extraordinário de revisão de sentença, alegando que em face das mensagens escritas trocadas entre o arguido e a ofendida, chamadas telefónicas e um encontro sexual, ocorridos entre 03.07.2012 (data da sua restituição à liberdade após ter cumprido prisão preventiva) e 13.01.2013. (data em que iniciou o cumprimento de pena de prisão), associadas a meios de prova testemunhal que não foram produzidas em audiência de julgamento e a análise psicopatológica efectuada por especialista médico, existem sérias e graves dúvidas sobre a sua condenação.

* Foi proferido despacho que indeferiu a inquirição de testemunhas indicadas pelo recorrente e deferiu as diligências de prova que consistiam no apuramento junto de uma operadora telefónica a fim de apurar a quem pertencem os telemóveis de onde foram emitidas e onde foram recebidas as mensagens escritas alegadamente trocadas entre o arguido e a ofendida.

* A fls. 127 e 128 dos autos foi junta informação da operadora telefónica MEO.

* Cumpre emitir a informação a que alude o artigo 454° do Código de Processo Penal o que se faz nos termos que se seguem: O presente tribunal condenou o arguido pela prática de um crime de violência doméstica, previsto e punido pelo artigo 152°, n° 1, alínea a) e n° 2 do Código Penal e um crime de violação, previsto e punido pelo artigo 164°, n° 1, alínea a) do Código Penal.

Para proferir tal condenação, o tribunal teve em consideração a prova então produzida em audiência de julgamento, a qual se fundou no depoimento da ofendida e no depoimento das testemunhas de acusação, tudo devidamente conjugado com a prova documental junta aos autos.

Veio agora o arguido juntar aos autos transcrições de mensagens escritas trocadas entre o arguido e a ofendida, reproduções de chamadas telefónicas e mensagens escritas que indiciam a ocorrência de um encontro sexual entre o arguido e a ofendida, ocorridos entre 03.07.2012 (data da sua restituição à liberdade após ter cumprido prisão preventiva) e 13.01.2013. (data em que iniciou o cumprimento de pena de prisão), as quais atenta a informação da Meo constante de fls. 127 e 128, terão muito provavelmente sido remetidas e recebidas pelo arguido e pela ofendida.

Tais meios de prova de per si ou conjugados com os que já foram apreciados no processo não são, em nosso entendimento, aptos a gerar uma grave dúvida sobre a justeza da condenação.

O facto de entre o arguido e a ofendido existir ume relação amorosa, no mínimo disfuncional, não...

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