Acórdão nº 1179/09.1TAVFX.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 04 de Março de 2015

Magistrado ResponsávelOLIVEIRA MENDES
Data da Resolução04 de Março de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

* Acordam no Supremo Tribunal de Justiça No âmbito do processo comum com intervenção do tribunal colectivo n.º 1179/09.1TAVFX, do 1º Juízo Criminal de Vila Franca de Xira, tendo em vista o conhecimento superveniente de concurso de crimes, foi o arguido AA, com os sinais dos autos, condenado na pena conjunta de 12 anos de prisão.

O arguido recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça.

É do seguinte teor o segmento conclusivo da respectiva motivação[1]: 1- Ao determinar a medida única da pena em 12 anos de prisão efectiva, não se revela valorizada a personalidade do arguido, as suas condições pessoais e socio-económicas.

2- Na determinação da medida única da pena, o Tribunal a quo atenta tão somente às necessidades de prevenção geral, omitindo por completo as exigências de prevenção especial, violando assim o disposto nos artigos, 71º e 77º do Código Penal.

3- A aplicação de uma pena, tem como finalidade, a protecção de bens jurídicos e a socialização do agente do crime, tendo na culpa o barómetro para limitar a pena a aplicar. Sendo que se pretende com a aplicação de uma pena, a ressocialização do recorrente, esta pena em concreto, afasta completamente essa possibilidade.

4- O recorrente é um homem ainda jovem, tem filhos menores, beneficia de um enquadramento familiar estrutura do encontrando-se socialmente integrado.

5- Que demonstra consciência crítica da sua situação jurídica e das consequências que daí advieram.

6- Tem um bom comportamento no estabelecimento prisional onde se encontra.

7- A certeza de que terá de cumprir pena privativa da liberdade fizeram-no mudar diametralmente o seu comportamento.

8- Condenar o recorrente em reclusão em 12 anos, significa votá-lo à ostracização da sociedade, impossibilitando a sua reinserção.

9- O tribunal a quo violou, ou pelo menos fez interpretação errónea dos critérios definidos nos arts. 71º, 77º do Código Penal.

10- Entende o Recorrente que a pena aplicada, encontra-se desajustada e exagerada, face a esses mesmos critérios.

Na contra-motivação o Ministério Público formulou as seguintes conclusões: 1ª - A pena de 12 anos de prisão imposta ao arguido, mostra-se equilibrada e justa, tendo sido determinada no respeito pelos critérios fixados nos arts. 40°, 71º, 77° e 78°, todos do C. Penal; 2ª - Tendo sido considerados, no seu conjunto, os factos praticados, a personalidade do arguido e os seus antecedentes criminais; 3ª - Não foi violado qualquer preceito legal.

A Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu o seguinte parecer: Mostram os autos que: 1.

Após a audiência a que alude o artigo 472.º do CPP, por se considerarem preenchidas as normas dos artigos 77.º e 78.º do CP e 471.º do CPP, por acórdão de 3 de Julho de 2014 foi imposta ao condenado a pena única de 12 anos de prisão.

  1. Inconformado, o condenado interpõe recurso, pugnando por uma pena de medida inferior.

  2. O acórdão recorrido revela-se omisso na descrição dos comportamentos do condenado integradores dos crimes em concurso, bem como das respectivas circunstâncias envolventes ¾ indispensáveis para permitir uma avaliação do “ilícito global”, essencial para uma correcta determinação da pena única.

  3. O acórdão recorrido incluiu no presente cúmulo jurídico as penas privativas de liberdade impostas nos processo n.ºs 3878/06.0TAOER, 1255/06.2TASNT, 1046/07.3TDLSB, 1054/06.0TAOER e 109/09.5GAVFX, não constando do acórdão recorrido os elementos necessários que revelem se as penas de substituição impostas se encontram em execução, foram declaradas extintas ao abrigo da norma do artigo 57.º, ou se foram revogadas por força das normas dos artigos 50.º, n.º 1 e 56.º, todos do CP.

    II 1.

    Como é sabido, a moldura penal do concurso, para além de ter como limite mínimo a mais elevada das penas parcelares concorrentes, terá sempre como limite máximo a «soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes», não podendo ultrapassar 25 anos.

    E será dentro da moldura penal do concurso assim fixada que o Tribunal, num segundo momento, terá de encontrar, em função das exigências da culpa e da prevenção, a medida da pena única.

    1.1 Sendo, por um lado, de 6 anos de prisão a medida da pena parcelar mais elevada e, por outro lado, mostrando-se que a soma das penas parcelares ultrapassa 25 anos de prisão, a moldura penal do concurso teria como limite mínimo 6 anos de prisão e como limite máximo 25 anos de prisão.

    Assim e desde logo não podemos aceitar o entendimento plasmado no acórdão recorrido segundo o qual a moldura penal do concurso tem como limite máximo «60 anos e 7 meses de prisão».

  4. Como é sabido, na determinação da medida da pena do concurso é essencial a consideração da globalidade dos factos, na sua interligação e tipo de conexão entre si, em ordem ao apuramento da gravidade do ilícito global, e da personalidade “estrutural” do agente naqueles revelada, para se poder concluir pela presença de uma personalidade propensa ao crime ou, inversamente, de pluriocasionalidade não radicada nessa personalidade.

    2.1 Ora, sendo o acórdão recorrido omisso na descrição dos comportamentos do condenado integradores dos crimes em concurso, bem como das respectivas circunstâncias envolventes, não permite que se alcance um juízo sobre o “ilícito global”, sendo certo que, e como este Supremo Tribunal vem repetidamente afirmando, a decisão que imponha uma pena única «deve bastar-se a si mesma no que respeite aos elementos de facto relevantes para a integração dos pressupostos de determinação da pena única» [2].

    Deste modo, o acórdão recorrido revela‑se nulo, ao abrigo da norma do artigo 379.º, n.º 1, alínea a) do CPP.

  5. Como claramente decorre da norma do artigo 56.º, n.º 3 do CP, a revogação da pena de substituição determina o cumprimento da pena de prisão fixada na sentença.

    3.1 Ora, não constando que as penas de substituição impostas nos processos que deixámos referidos sob I-4 foram ou não revogadas, as penas de prisão substituídas não deviam ter integrado o cúmulo jurídico efectuado.

    3.1.1 Na verdade, o cometimento de um crime antes do trânsito em julgado da decisão que tenha suspendido a execução pena de prisão nos termos do artigo 50.º, n.º 1 do CP ― o mesmo é dizer, o cometimento de um crime antes do início da execução desta pena não privativa de liberdade ― não pode determinar a execução da pena de prisão substituída por não constituir fundamento de revogação da pena de substituição.

    Só o cometimento de crime no decurso da suspensão da execução da pena, ou o incumprimento, nesse período, dos deveres, regras de conduta e outras obrigações impostas, podem determinar a execução da pena de prisão substituída por constituírem fundamento de revogação da pena de substituição, mas ainda assim desde que o Tribunal, ao abrigo da norma do artigo 56.º do CP, conclua que as finalidades que estavam na base da imposição da pena de substituição já não possam ser alcançadas através da execução desta.

    3.1.2 Ao efectuar-se cúmulo jurídico que integre uma pena de prisão substituída — cuja execução não possa pois ser efectivada por não se mostrar revogada a pena de substituição —, não se tem em consideração, nomeadamente, que: ‑ quando o Tribunal da condenação impõe uma dada pena de prisão, mas a substitui por uma pena não privativa de liberdade, está efectivamente a aplicar e, posteriormente, irá fazer executar, em vez daquela pena de prisão, uma outra pena — uma pena de substituição.

    ‑ no artigo 77.º do CP não está prevista a possibilidade de cúmulo jurídico de uma pena de prisão com uma pena de substituição, nomeadamente a pena não privativa de liberdade prevista no artigo 50.º n.º 1 do mesmo diploma.

    Antes, claramente decorre do seu n.º 3 opção no sentido de a diferente natureza da pena não privativa de liberdade dever manter‑se na pena única [3].

    ‑ só se cumulam penas de prisão cuja execução possa efectivar-se.

    Ora, se a execução de uma dada pena de prisão não se pode efectivar, por não revogada a pena de substituição, não é sua integração (indevida, dizemos nós) na realização de um dado cúmulo jurídico que vai criar o pressuposto em falta. Tanto mais que da regulamentação decorrente dos artigos 77.º e 78.º do CP não é possível retirar fundamento algum que imponha a realização de cúmulo jurídico que integre pena de prisão substituída sem que a sua execução se mostre passível de ser efectivada [4], ao que acresce que as apelidadas penas de substituição em sentido próprio — penas cumpridas em liberdade e que pressupõem a prévia determinação da medida da pena de prisão que vão substituir ― constituem dogmaticamente verdadeiras penas e não uma forma de execução de uma pena de prisão.

    3.1.3 Se o Tribunal da última condenação integrar em cúmulo jurídico uma pena de substituição não revogada, acaba afinal por “revogar” esta ao arrepio do pretendido pela lei quando, no artigo 56.º, n.º 1 prevê taxativamente os casos em que tal revogação possa ocorrer, criando contra legem um fundamento novo.

    Ao efectuar‑se cúmulo jurídico que integre uma pena de prisão substituída — cuja execução não possa ser efectivada por não se mostrar revogada a pena de substituição — não se tem ainda em consideração, que, atento o disposto no artigo 495.º, n.º 3 do CPP, qualquer Tribunal que venha a condenar um arguido ― pela prática de um crime cometido no decurso da execução da pena não privativa de liberdade prevista no artigo 50.º, n.º 1 do CP ― deve comunicar essa condenação ao Tribunal que for competente, nos termos do artigo 470.º n.º 1 do CPP, para a execução, pois que é este — e só este, dizemos nós — o competente em razão da matéria para, conhecedor agora do cometimento do novo crime e do teor da respectiva decisão condenatória, decidir da eventual revogação ou alteração das condições da pena de substituição, ao abrigo do disposto nos artigos 55.º e 56.º do CP.

    Competente pois para a revogação de uma pena de substituição, com a consequente efectivação da execução da pena de prisão substituída, não é o Tribunal com competência territorial, nos termos do...

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