Acórdão nº 747/13.1YRLSB.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 20 de Maio de 2015

Magistrado ResponsávelORLANDO AFONSO
Data da Resolução20 de Maio de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam os Juízes no Supremo Tribunal de Justiça: Relatório: AA e BB – Produtos Farmacêuticos Ldª. intentaram acção arbitral necessária contra CC Pharma (Malt

  1. Limited, DD; EE – produtos farmacêuticos Ldª, FF Portugal – Comércio e Desenvolvimento de Produtos Farmacêuticos Unipessoal Ldª e GG Limited pedindo que se julgue a acção procedente, por provada, e em consequência: - se condene as demandadas a absterem-se de, em território português, ou tendo em vista a comercialização nesse território, importar, fabricar, armazenar, introduzir no comércio, vender ou oferecer os genéricos «ROSUVASTATINA» ou, sob esta ou quaisquer outras designações ou marcas, qualquer outro medicamento contendo Rosuvastatina como princípio activo enquanto os direitos de propriedade industrial referidos se encontrarem em vigor, ou seja, até 3 de Julho de 2017; - se condene as demandadas a não transmitir a terceiros a sua posição de requerente nos pedidos de AIMs relativos aos genéricos «Rosuvastatina» desta petição, até à referida data de caducidade dos direitos ora exercidos; - se condene as demandadas no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória no valor de, pelo menos, € 99 700 por cada dia de incumprimento da sentença que venha a ser proferida nos termos acima peticionados.

    Alegaram, em síntese, as demandantes que: - a 1ª demandante é uma empresa farmacêutica de investigação, dispondo de vários medicamentos, sendo os seus produtos mais importantes, designadamente, o HH®, II ® e JJ ®; - O medicamento HH ® contém rosuvastatina cálcica como substância activa; - a 1ª demandante é titular da patente Europeia n.º 0521471, sendo que à data do pedido da EP e da prioridade aí reivindicada, a Rosuvastatina nunca tinha sido sintetizada por ninguém ou revelada por forma a ser explorada por peritos na matéria, nem tinha sido revelado o uso do processo de síntese que é mencionado na patente para obter esse produto; - A EP 521471 foi pedida em 30-06-1992 e a menção da sua concessão foi publicada no Boletim Europeu de Patentes 2000/23, em 25-10-2000; - Após a concessão a 1ª demandante apresentou junto do INPI a tradução portuguesa da EP 521471, razão pela qual a referida patente é válida e produz efeitos em Portugal até 3 de Julho de 2017, atenta a concessão do CCP (Certificado Complementar de Protecção) n.º 156; - a 2ª demandante obteve Autorizações de Introdução no Mercado (AIM) para o referido medicamento contendo Rosuvastatina como substância activa, o qual é comercializado no mercado português sob a marca de HH ®; - De acordo com a lista publicada na página do Infarmed, em 11-01-2012, a demandada CC requereu junto do Infarmed a concessão de AIM para 1 medicamento, sob 4 formas, tendo como substância activa a Rosuvastatina Cálcica, a qual lhe foi concedida no dia 27-06-2012; - De acordo com a mesma lista a demandada GG requereu a concessão de AIM para um medicamento, sob 4 formas, tendo como substancia activa a Rosuvastatina Cálcica, a qual ainda não foi concedida; - De acordo com a mesma lista a demandada DD requereu a concessão de AIM para 1 medicamento, sob 8 formas, tendo como substancia activa a Rosuvastatina Cálcica, a qual ainda não foi concedida; - De acordo com a mesma lista a demandada EE requereu a concessão de AIM para um medicamento, sob 4 formas, tendo como substancia activa a Rosuvastatina Cálcica, a qual foi concedida no dia 31-07-2012; - De acordo com a mesma lista a demandada FF requereu a concessão de AIM para 1 medicamento, sob 4 formas, tendo como substancia activa a Rosuvastatina Cálcica, a qual foi concedida em 21-11-2011, tendo ainda relativamente a este medicamento sido requerido e obtida a aprovação do preço de venda ao público.

    As demandantes vieram comunicar aos autos acordo celebrado com a demandada EE, e informando que, na decorrência do mesmo, perderam interesse na arbitragem iniciada quanto a esta.

    A fls. 399-424 foi proferida sentença arbitral que: 1) Condenou as demandadas CC, DD, FF e GG a absterem-se de importar, fabricar, oferecer, armazenar, introduzir no comércio ou utilizar, em Portugal, os genéricos Rosuvastatina, ou sob estas ou quaisquer outras designações ou marcas, qualquer outro medicamento contendo Rosuvastatina como princípio activo, enquanto os direitos de propriedade industrial das demandantes se encontrarem em vigor, ou seja, até 3 de Julho de 2017; 2) Absolveu as demandadas dos pedidos de não transmissão de AIM a terceiros e de condenação em sanção pecuniária compulsória; 3) Declarou extinto o processo arbitral e encerrado relativamente à demandada EE.

    4) Fixou as custas a suportar pelas partes em ¾ pelas demandadas e ¼ pelas demandantes.

    Não se conformando com tal decisão, dela recorreram demandantes (cf. fls. 443 a 467) e demandadas GG (fls. 475), CC Pharma (fls. 519), tendo o Tribunal da Relação de Lisboa, por acórdão de fls. 644 a 663, julgado a apelação parcialmente procedente nos seguintes termos: «Os honorários serão reduzidos a 13 500e, pelo que serão atribuídos a cada um dos Srs. Árbitros a quantia de 4 000€ e ao Sr. Secretário o montante de 1 500€; As custas da acção serão suportadas pelas demandantes em partes iguais.

    Em tudo o mais vai a decisão arbitral confirmada, ainda que por fundamento diverso.

    Ainda inconformadas vieram as demandantes AA e BB – produtos farmacêuticos Ldª. interpor recurso de revista, a título excepcional, para o STJ.

    Nas suas alegações de recurso apresentam as demandantes as seguintes conclusões: A. Nestes autos estão em causa questões cuja apreciação, pela sua relevância jurídica, é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito (art. 672.º, n.º 1, al. a), do CPC); B. São inúmeros os casos que partilham a matéria em apreciação nos presentes autos pendentes nos Tribunais arbitrais e no Tribunal da Relação de Lisboa, sem que as opiniões, relativamente aos pedidos sob recurso têm sido tudo menos coincidentes ou isentas de discussão.

    1. Na sentença proferida pelo Tribunal Arbitral constituído para dirimir o litígio entre a KK e LL e outros relativamente à substância activa Rizatriptano foi decidido que não existem dúvidas sobre a condenação das demandadas no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória em caso de incumprimento da decisão arbitral, dado o preenchimento de todos os requisitos para aplicação do art. 829.ºA do CC.

    2. Já o Tribunal constituído para dirimir o litígio KK Inc. e MM decidiu pela condenação das demandadas no pedido de não transmissão das AIMs.

    3. O quadro legal subjacente aos pedidos de condenação em apreço importam a apreciação e clarificação de pertinentes e relevantes questões jurídicas, como sejam: o pedido de não transmissão de AIM é de inequívoca utilidade para a tutela dos direitos em causa nos presentes autos? Em termos gerais, deverá o n.º 1 do art. 829.º-A do CC ser interpretado restritivamente, de modo a que se exclua a possibilidade do pedido de são pecuniária compulsória perante uma obrigação de prestação de facto negativo infungível futuro? F. A prolação de acórdão do STJ nos presentes autos, abordando as referidas questões, revela-se, além de útil para as recorrentes, indiscutivelmente importante para obter um consenso em termos de servir de orientação, quer para as pessoas que possam ter interesse jurídico ou profissional na resolução de tal questão a fim de tomarem conhecimento da provável interpretação, com que poderão contar, das normas aplicáveis, quer para as instâncias, motivo pelo qual deve ser admitido o recurso de revista excepcional ora interposto.

    4. Nestes autos estão também em causa interesses de particular relevância social (art. 672.º, n.º 1, al. b), do CPC), uma vez que a decisão tomada no aresto sob recurso pronuncia-se entre outros aspectos, sobre os requisitos gerais de admissibilidade do pedido de condenação na sessão pecuniária compulsória em caso de incumprimento da obrigação negativa, nos termos e para os efeitos previstos no art. 829.º-A do CC.

    5. O acórdão em crise é susceptível de aplicação a todas as situações nas quais o credor de uma obrigação de conteúdo negativo pretenda assegurar o cumprimento dessa obrigação através da fixação de uma sanção pecuniária accionável em caso de incumprimento.

      I. É inequívoco que esta é uma situação que se reveste de particular relevância social, para a eficácia e credibilidade do direito, da decisão e da própria justiça, devendo ser conhecida pelo STJ.

    6. A decisão recorrida contradiz outras decisões, transitadas em julgado, proferidas pelo mesmo Tribunal da Relação, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito (art. 672.º, n.º 1, al. c), do CPC) conforme se comprova pelos acórdãos fundamento que se juntam.

    7. Os pedidos de não transmissão a terceiros da AIM e de condenação em sanção pecuniária compulsória são uma consequência lógica do pedido de não exploração industrial e comercial dos medicamentos genéricos sub judice, uma vez que têm como finalidade garantir a tutela efectiva dos direitos de propriedade industrial que por meio da acção arbitral são exercidos.

      L. O tribunal a quo analisou impropriamente estes pedidos, como se de pedidos autónomos e independentes se tratassem, circunstância que levou ao erro de interpretação e aplicação da lei na decisão recorrida.

    8. Ao contrário do que é sustentado no acórdão recorrido, não se invoca nestes autos que a AIM constitua um acto de comercialização do medicamento, nem que a mesma AIM se traduza per se em qualquer violação do exclusivo conferido pela patente.

    9. Nesse âmbito a AIM consubstancia, indubitavelmente, e como o próprio nome indica, a autorização para que uma conduta infractora de direitos de patente se efective, tendo o tribunal a quo admitido, de resto, que a AIM é um pressuposto jurídico essencial para a...

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