Acórdão nº 1658/14.9TBVLG.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 06 de Abril de 2017

Magistrado ResponsávelLOPES DO REGO
Data da Resolução06 de Abril de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1.

AA – Sucursal de Portugal intentou acção de condenação contra BB, alegando que, no exercício da sua actividade seguradora, celebrou contrato de seguro com CC, relativamente ao veículo ...-...-IF. Em 22 de agosto de 2009, este veículo era conduzido pelo réu, tendo o mesmo perdido o seu controlo, despistando-se, saindo da via e embatendo contra um muro; daí resultou a morte de passageiro que viajava naquele veículo; o acidente ficou a dever-se ao facto do réu não ter observado a prudência e a diligência necessárias à condução, acusando ainda uma taxa de álcool no sangue de 0,72 g/l e a presença de substância psicotrópica.

Por força do contrato de seguro e para regularização do sinistro, a autora despendeu € 74.670,65 – valor que reclama do réu, tendo em conta o disposto no artigo 27.º, n.º 1, alínea c), do decreto-lei n.º 291/2007, de 21 de agosto.

Conclui pedindo que, com a procedência da acção, o réu seja condenado a pagar-lhe a quantia de € 74.670,65 relativa às despesas com o sinistro descrito, acrescida de juros à taxa legal de 4%, desde a citação e até efectivo e integral pagamento.

O réu contestou, impugnando parcialmente os factos, imputando as causas e culpas na produção das lesões a conduta imprevidente e temerária da vítima e afirmando não haver nexo causal entre a TAS ou a substância psicotrópica detectada e o acidente , recaindo sobre a seguradora o respectivo ónus da prova.

Concluída a audiência de discussão e julgamento, veio a ser proferida sentença que decidiu julgar a acção totalmente improcedente por não provada, por entender que incumbia à A. a prova do nexo causal entre a condução do R., com a referida taxa de alcoolemia, e o acidente mortal - e, em consequência, absolveu o réu do pedido.

  1. Inconformada, apelou a A., tendo a Relação concedido provimento ao recurso, revogando a sentença recorrida e, em consequência, julgando procedente a ação instaurada pela autora/recorrente contra o réu, condena-se este a pagar à autora a quantia de € 74.670,65 (setenta e quatro mil seiscentos e setenta euros e sessenta e cinco cêntimos), relativa às despesas com o sinistro descrito, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% ao ano, desde a citação e até efetivo e integral pagamento.

    O acórdão recorrido começou por enunciar a matéria de facto apurada, fazendo-o nos seguintes termos: 1) Por escritura pública datada de vinte e dois de Dezembro de 2009, foi a DD COMPANHIA DE SEGUROS S.A., incorporada, por fusão – com efeitos a partir de 1 de Janeiro de 2010 – na sociedade AA, ora A..

    2) Por força da escritura de fusão celebrada, a ora A. assumiu a universalidade dos ativos e passivos da DD COMPANHIA DE SEGUROS, S.A, sociedade incorporada.

    3) A Autora dedica-se à atividade seguradora.

    4) Por contrato de seguro, celebrado entre a DD COMPANHIA DE SEGUROS, S.A. e CC, a 4.10.2008, titulado pela apólice n.º 0047…, referente ao veículo automóvel de marca Opel, modelo Astra, com a matrícula ...-...-IF (doravante designado IF), este transferiu a responsabilidade civil pela circulação do veículo para a aqui Autora.

    5) No dia 22.08.2009, pelas 04h30m, o veículo seguro IF transitava na Estrada Nacional 15 (EN 15), na localidade de C…, concelho de Valongo.

    6) O veículo IF seguia no sentido de marcha Gandra / Valongo e era conduzido por BB, aqui Réu.

    7) A EN15 dispõe de duas vias de trânsito, cada uma para sentidos opostos.

    8) Sensivelmente ao KM 10,665, o Réu perdeu o controlo do veículo IF.

    9) No veículo IF seguia pelo menos, juntamente com o R., EE, na parte de trás do lado direito do IF.

    10) EE seguia pelo menos com a cabeça fora do veículo através da janela.

    11) A cabeça de EE embateu contra o referido muro.

    12) Em virtude da pancada sofrida, EE sofreu lesões traumáticas crâneo-meningo-encefálicas.

    13) As referidas lesões foram causa direta e necessária da sua morte.

    14) EE teve morte no local.

    15) O aqui Réu foi submetido ao teste de alcoolemia, tendo acusado uma T.A.S. de 0,72 g/l, 16) O aqui Réu foi também sujeito ao teste para deteção de substâncias psicotrópicas, tendo acusado a presença de 40,18 microgramas de tetraidrocanabinol por mililitro de sangue.

    17) Do sinistro resultou a morte de EE, passageiro do veículo IF.

    18) No âmbito do processo comum perante tribunal singular que correu seus termos perante o 2.º Juízo do TJ de Valongo, o aqui. R. veio por sentença transitada em 24/09/2013 a ser absolvido “da prática de um crime de condução sob a influência de estupefacientes ou substâncias psicotrópicas, previsto e punido pelos artigos 292.º n.ºs 1 e 2 e 69.º n.º al. a) todos do CP” e condenado pela “prática de um crime de homicídio por negligência, previsto e punido pelo artigo 137.º n.ºs 1 e 2 do CP na pena de 180 dias de multa à taxa diária de € 6” pela prática dos factos ali dados como provados que aqui se dão por reproduzidos (cfr. doc. de fls. 53 a 84, cujo teor aqui se dá por reproduzido) e dos quais se destacam: “7 - No automóvel conduzido pelo arguido, seguiram mais três pessoas, incluindo EE que ocupou o banco traseiro da viatura, do lado direito.

    8 - Nas descritas circunstâncias, o arguido iniciou a marcha do “IF” conduzindo o mesmo na Estrada Nacional n.º 5, na direção Gandra-Valongo.

    (…) 10 - Logo após o início da marcha, EE colocou a cabeça, braços e parte do tronco da parte de fora do automóvel, através da janela do lugar do passageiro direito traseiro, fazendo gestos de brincadeira para o automóvel que os seguia.

    11 - O arguido apercebeu-se da posição em que EE seguia, tendo-o alertado para se introduzir completamente no veículo automóvel.

    12 - EE não se introduziu completamente no veículo, permanecendo na mesma posição durante o caminho.

    13 - O arguido apercebeu-se que EE não acatou as palavras que lhe foram dirigidas, tendo continuado a marcha do veículo.

    14 - Entre 5 e 10 minutos após o início da marcha, ao km. 10,665 da via, o arguido deixou de olhar para a estrada e de prestar atenção à condução para selecionar uma determinada canção gravada numa pen USB que estava introduzida no auto-rádio do veículo.

    15 - Na sequência do descrito em 14, o arguido perdeu o controlo da viatura que conduzia e permitiu que a mesma passasse a circular na valeta que ladeia a via no sentido de marcha que seguia.

    16 - O veículo circulando com as rodas direitas na valeta, raspou com a lateral direita ao longo da casa que ladeia a via e embateu com a roda frontal direita num passadiço em betão que se situa sobre a valeta e faz ponte entre a casa e a entrada.

    (…) 23 - Em consequência da brusca aproximação do veículo “IF” à casa que ladeia a via, EE embateu, frontalmente com a cabeça contra a habitação.

    (…) 25 - Por força do impacto EE sofreu lesões traumáticas crâneomeningo-encefálicas que lhe provocaram a morte.

    (…)”.

    19) No âmbito do processo referido em 17), a Autora foi demandada no pedido de indemnização civil deduzido pelos pais do falecido EE.

    20) Nos referidos autos foram celebrados acordos de transação, em cumprimento dos quais a aqui A. pagou por força do contrato de seguro em 01.08.2013 a FF a quantia de € 35.000,00 e em 26.06.2013 a GG a quantia de € 35.000,00 (conforme docs. 7 a 10 e 15 a 16 juntos aos autos a fls. 85 a 95 e 100 a 102 (cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).

    21) Em 12.07.2013, a Autora pagou a HH a quantia de € 734,40 (setecentos e trinta e quatro euros e quarenta cêntimos) a título de encargos judiciais, conforme doc. 11 de fls. 96 dos autos (cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).

    22) Em 16.07.2013, a Autora pagou a HH a quantia de € 1.641,37 (mil, seiscentos e quarenta e um euros e trinta e sete cêntimos) a título de honorários, conforme doc. 12 de fls. 97 (cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).

    23) Em 16.07.2013, a Autora pagou a HH a quantia de € 1.310,13 (mil, trezentos e dez euros e treze cêntimos) a título de honorários, conforme doc. 13 de fls. 98 (cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).

    24) Em 16.07.2013, a Autora pagou a HH a quantia de € 81,60 (oitenta e um euros e sessenta cêntimos) a título de encargos judiciais, conforme doc. 14 de fls. 99 (cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).

    25) Em 11.05.2012, a Autora pagou a HH a quantia de € 734,40 (setecentos e trinta e quatro euros e quarenta cêntimos) a título de encargos judiciais, conforme doc. 17 de fls. 103 (cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).

    26) Em 27.07.2011, a Autora pagou a II DE PORTUGAL a quantia de € 12,75 (doze euros e setenta e cinco cêntimos) a título de emissão de certidão, conforme doc. 18 de fls. 104 e doc. 19 de fls. 105 (cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).

    27) Em 03.06.2011, a Autora pagou a HH a quantia de € 734,40 (setecentos e trinta e quatro euros e quarenta cêntimos) a título de encargos judiciais, conforme doc. 20 de fls. 106 (cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).

    28) Em 24.11.2009, a Autora pagou a II DE PORTUGAL a quantia de € 156,00 (cento e cinquenta e seis euros) a título de honorários, conforme doc. 21 de fls. 107 (cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).

    29) Nas circunstâncias de tempo e lugar referidas em 5) a 7) o R. deixou momentaneamente de olhar para a estrada e de prestar atenção à condução, para procurar uma música numa “Pen”.

    30) Como consequência do referido em 29) o R. perdeu o controlo do IF nos termos referidos em 8) e despistou-se.

    31) Resvalando para a valeta do lado direito da via, atento o sentido de marcha em que seguia, saindo assim parcialmente da via de trânsito em que seguia e raspando no muro da casa que ali ladeava a via.

    32) EE seguia na altura do embate referido em 31) pelo menos com a cabeça, braços e parte do tronco do corpo de fora da...

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