Acórdão nº 53/10.3PAVFX.L2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 27 de Abril de 2017

Magistrado ResponsávelGABRIEL CATARINO
Data da Resolução27 de Abril de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)
  1. Relatório No processo supra epigrafado, foi proferida decisão [[1]] – cfr. fls. 1920 a 1961 - que, julgando, parcialmente procedente a acusação – cfr. fls. 1479 a 1495 – que havia sido impulsada contra o arguido AA, [...], o condenou, nos termos do artº 77º do Código Penal, em cúmulo jurídico, na pena unitária de 8 (oito) anos de prisão.

    A decisão sob recurso, julgou a acusação parcialmente procedente e (fls. 1958 a 1960): a) absolveu o arguido da prática de: a) 2 (dois) crimes de pornografia de menores, p. e p. pelo art.º 176.º, n.º 4, com referência à al. b), do número 1, do Código Penal por falta de prova da sua comissão (lesadas BB e CC); b) da prática de 1 (um) crime de pornografia de menores, p. e p. pelo art.º 176.º, n.º 4, com referência à al. b), do número 1, do Código Penal na redacção da Lei 59/2007, de 4 de Setembro, por descriminalização da conduta face à entrada em vigor da Lei 103/2015, de 24 de Agosto, e artº 2º nº 2 do Código Penal (lesada DD); tendo-o condenado: a) como autor material de 8 (oito) crimes de abuso sexual de crianças, p. e p. pelo art.º 171.º, n.º 3, al. b), e 30.º, n.º2, do Código Penal, na redacção da Lei 59/2007, de 4 de Setembro, na pena de 18 (dezoito) meses de prisão para cada um deles (lesadas BB, CC, EE, FF, GG, HH, II e JJ); d) como autor material de 1 (um) crime pornografia de menores agravado, p. e p. pelo ar.º 176.º, n.º 1, al. c) e 177.º, n.º 5, do Código Penal, na redacção da Lei 59/2007, de 4 de Setembro, na pena de 1 (um) ano e (sete) meses de prisão (lesada Andreia Campaniço); e) como autor material de 1 (um) crime pornografia de menores agravado, p. e p. pelo ar.º 176.º, n.º 1, al. c) e 177.º, n.º 6, do Código Penal, na redacção da Lei 59/2007, de 4 de Setembro, na pena de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão (cedência de material pornográfico com menores de 14 anos a terceiros via partilha de ficheiros informáticos).

    No mais a decisão,

    1. Julgou e declarou perdido a favor do Estado, nos termos do art. 109º do Código Penal, o computador apreendido e todo o seu conteúdo e ordena a sua destruição, lavrando-se o competente auto; b) Ordenou a remessa de cópia da decisão às equipas da DGRSP que elaboraram o relatório social e o relatório à personalidade; c) Ordenou, após trânsito, a recolha de amostra de ADN do arguido nos termos e para os efeitos do disposto nos artº 8º nº 2 e 5 da Lei 5/2008 de 12 de Fevereiro; d) Ordenou, uma vez recolhida a amostra a sua inserção na competente base de dados ao abrigo do disposto no artº 18º nº 3 da Lei 5/2008 de 12 de Fevereiro; e) e transitada a decisão, que fosse remetida certidão, com nota de trânsito, ao INML para efeitos de recolha da amostra e subsequente inserção na base de dados; e ordenou a remessa de boletins ao Registo Criminal.

      O Ministério Público interpôs recurso da decisão para o Supremo Tribunal de Justiça – cfr. fls. 1967 a 1983 – bem como o arguido – cfr. fls. 1985 a 1991 – e tendo o processo sido remetido ao Tribunal da Relação de Lisboa, viria a ser excepcionada a incompetência material do T.R. – cfr. 2010 – e o processo remetido a este Supremo Tribunal.

      I.a). – Quadro Conclusivo.

      “1ª - Constitui objecto do presente recurso o douto acórdão proferido a fls. 1710 e seguintes dos autos identificados em epígrafe, apenas e tão só quanto à medida das parciais aplicadas ao arguido AA pela prática, em autoria material e concurso efectivo, de 8 (oito) crimes de abuso sexual de crianças, na pena de 18 (dezoito) meses de prisão para cada um deles, de 1 (um) crime de pornografia de menores agravado, na pena de 1 (um) ano e 7 (sete) meses e de um crime de pornografia de menores agravado, na pena de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão, que tem, naturalmente, reflexos no cúmulo jurídico efectuado, onde o tribunal a quo decidiu aplicar a pena única de 8 (oito) anos de prisão.

      1. - Nada temos a apontar ao douto acórdão recorrido quanto aos factos provados e não provados, nem quanto à fundamentação da decisão de facto e enquadramento jurídico efectuado, cujas considerações, aliás, subscrevemos, nem sequer quanto à escolha das penas de prisão, que face aos factos provados e ao respectivo enquadramento jurídico, se nos afigura ser adequada ao caso concreto, por realizar as finalidades da punição.

      2. - Concordamos, ainda, com a medida concreta da pena aplicada pelo crime de pornografia de menores agravado, perpetrado sobre a ofendida DD, de 1 (um) ano e 7 (sete) meses, porque fixada próxima da pena mínima aplicável (1 anos e 4 meses) e adequada às circunstâncias do caso concreto, atenta a matéria de facto provada.

      3. – Todavia, discordamos das penas parciais aplicadas ao arguido e, consequentemente, da pena única de 8 (oito) anos de prisão efectiva que lhe foi aplicada, pugnando pela aplicação de uma pena de prisão de 5 (cinco) anos, face à gravidade dos factos, afigurando-se adequado e proporcional à medida de culpa, às necessidades de prevenção geral e especial, a suspensão da sua execução, sujeita a regime de prova, nomeadamente, com acompanhamento psicoterapêutico orientado para a interacção pessoal e social e da expressão sexual.

      4. – Dispõe o artº 40º, nº 1 do Código Penal que “a aplicação de penas e medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade”, esclarecendo o seu nº 2 que “em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa”.

      5. – Depois de escolhida a pena e para a sua determinação o Tribunal deve eleger os factores relevantes para o efeito, valorando-os à luz dos vectores de culpa e prevenção, nos termos do disposto no artº 71º do Código Penal que enumera, no seu nº 2, de forma exemplificativa, alguns dos mais importantes factores de medida da pena de carácter a aferir segundo critérios objectivos.

      6. – Ora no caso em apreço o Tribunal a quo tomou em consideração, nos termos dos citados preceitos legais, todas as circunstâncias a favor e contra o arguido, tendo escolhido a pena de prisão para cada um dos ilícitos, por ser aquela que se mostra adequada à gravidade dos factos e à situação pessoal do arguido, não obstante a inexistência de antecedentes criminais, a confissão dos factos e o arrependimento demonstrado.

      7. – É consabido que as exigências de prevenção geral neste tipo de ilícitos são elevadas.

      8. – Porém, salvo o devido respeito, não foram devidamente ponderadas, a nível das exigências de prevenção especial, as seguintes circunstâncias, a saber: data da prática dos factos (ocorridos entre o segundo semestre de 2009 e 29/11/2010); a inexistência de contactos directos com as vítimas dos crimes de abuso sexual; a inexistência de antecedentes criminais, a idade do arguido à data da prática dos factos (56 anos), a sua história de vida, a boa inserção social e laboral, o arrependimento e o recurso voluntário a consulta de psiquiatria que mantém desde há 5 anos, como o Dr. LL, na Clínica do ....

      9. – Com efeito, se é verdade que, em concreto, as exigências de prevenção especial são elevadas, ao contrário do pugnado no douto acórdão recorrido e, salvo melhor opinião, não são de tal forma prementes que demandem a aplicação de uma pena de prisão efectiva, pois que, se nos afigura que a personalidade do arguido poderá ser controlada através de um acompanhamento psicoterapêutico adequado, não se podendo olvidar que foi o próprio quem procurou ajuda médica desde que o processo foi despoletado, mantendo-se em tratamento até aos dias de hoje, por forma a controlar as suas fragilidades.

      10. – Entendemos adequada a aplicação de uma pena de 1 (um) ano de prisão por cada um dos crimes de abuso sexual de crianças, atenta a homogeneidade das condutas do arguido, já referida no douto acórdão e, quanto ao crime de pornografia agravado, a pena de 3 (três) anos de prisão.

      11. – Ora, tais crimes estão em relação de concurso, importando, por isso, à luz do artº 77° do Código Penal, realizar o cúmulo jurídico.

      12. – A pena aplicável, atento o quantum ora sugerido, tem como limite mínimo a mais alta das penas singulares – 3 anos de prisão – e limite máximo a soma material das penas individualmente impostas, i.e. 12 anos e 7 meses de prisão.

      13. – Apesar do teor do relatório pericial sobre a personalidade do arguido, cremos que a ponderação das suas condições de vida, a sua idade, a sua integração social, familiar e laboral, a sua conduta anterior e posterior aos factos, a inexistência de antecedentes criminais e, repete-se, inexistência de contactos directos com as vítimas, o arrependimento e a procura de ajuda médica especializada, que mantém até aos dias de hoje, permite concluir que as finalidades da pena serão alcançadas através da fixação de uma pena única de 5 anos de prisão, o que se sugere.

      14. – Aqui intercede a questão de saber se a pena terá de ser efectiva ou ainda é possível emitir um juízo de prognose que permita a suspensão da sua execução, nos termos do disposto no nº 1 do artº 50º do Código Penal.

      15. – In casu, ponderando o lapso temporal decorrido desde a prática do último acto integrador dos ilícitos pelos quais o arguido foi condenado e valorando as condições de vida do arguido e a sua idade, apesar das fragilidades apontadas na perícia à sua personalidade, mas ponderando as considerações do psicólogo clínico que o acompanha, cremos ser possível emitir um juízo de prognose favorável à suspensão da execução da pena.

      16. – Tudo visto e ponderado, afigura-se-nos ajustado, por adequado e suficiente, a condenação do arguido AA na pena única de 5 (cinco) anos de prisão, suspensa na sua execução, sujeita a regime de prova, com acompanhamento psicoterapêutico orientado para as dificuldades da interacção pessoal, social e da expressão sexual, o que se propõe.

      17. – Pelo exposto, impõe-se concluir que o Tribunal a quo interpretou erradamente e, em consequência, violou o disposto nos artigos 40º, nºs 1 e 2, 50º, nº 1, 71º, nºs 1 e 2, 77º, nº 1, todos do Código Penal.

      Nestes termos e com o mui douto suprimento de V.Exªs deve ser revogada a sentença recorrida, na parte...

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