Acórdão nº 420/16.9T8STR.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 02 de Novembro de 2017

Data02 Novembro 2017
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA 2ª SECÇÃO CÍVEL I - AA intentou contra BB, CC, DD e EE a presenta ação declarativa, pedindo que: - se declare nula, por força do disposto nos arts. 280º, nºs 1 e 2, e 281º do CC[1], a escritura de partilha celebrada em 26.02.2009 no Cartório Notarial de FF, em S…., em que foram outorgantes os réus e GG, este último em representação de CC; ou, - se declare nula a mesma escritura por se tratar de ato simulado; - se declare nula a procuração outorgada por GG a CC em 28.01.2009 e, consequentemente, a escritura de partilha referida por falta de poderes de representação e abuso de representação; - se ordene o cancelamento de todos os registos de aquisição da nua propriedade de todos os prédios constantes das verbas um a três da escritura de partilha; - caso se entenda que o ato praticado na escritura se enquadra na qualificação prevista no nº 1 do art. 2029º ou numa compra e venda, sejam os réus condenados a pagar à autora a quota que lhe pertence, a quantificar por perito legalmente habilitado para aferir o real valor dos bens.

Alegou, em síntese, que: - ela e os réus BB, DD e EE são filhos de GG e de HH; - os réus outorgaram uma escritura de partilha por óbito de sua mãe, na qual interveio também o seu pai, na qual adjudicaram a BB e seu marido CC, a DD e a EE a nua propriedade dos prédios existentes no património hereditário e a seu pai o usufruto dos mesmos prédios, com direito a tornas dadas por recebidas, mas que efetivamente o não foram; - esta escritura foi celebrada sem conhecimento e sem consentimento da autora, sendo que este consentimento era necessário por estar a ser feita a partilha da meação do seu pai, pretendendo-se defraudar o direito da autora à partilha deste; - a mesma escritura constituiu um ato simulado, enganando a autora e prejudicando os seus futuros direitos sucessórios; - a procuração outorgada ao réu CC é nula por não ter observado o formalismo legal, o que envolve a sua nulidade e a do ato praticado com o uso da mesma.

Regularmente citados, os réus não contestaram.

Foi proferida sentença que, julgando a ação improcedente, absolveu os réus do pedido.

A autora apelou, vindo a ser proferido acórdão pelo Tribunal da Relação de Évora que, depois de aditar como provado um facto de entre os que a apelante defendia que deviam ser acolhidos, dada a confissão dos réus, negou provimento ao recurso, confirmando a sentença.

Deste acórdão trouxe a autora o presente recurso de revista, tendo apresentado alegações onde, pedindo o aditamento à matéria de facto provada dos factos por si alegados na petição inicial, que identifica, e a revogação do acórdão recorrido, formula as seguintes conclusões: 1ª - Os factos dados como provados na 1ª Instância e o facto aditado pelo acórdão recorrido conduzem a uma decisão diversa da tomada pelo acórdão recorrido e impõem a total procedência da ação.

2a - Também os factos alegados pela A. no art° 34° e nos art.°s 21°; 23; 24°; 25°; 32°; 33° e 35° da P.I., porque traduzem realidades comuns e acessíveis a todos os cidadãos e têm um sentido preciso e unívoco, são matéria de facto que, atenta a não apresentação de contestação pelos RR. e a revelia operante, não caberem em nenhuma das exceções previstas no art.° 568° do Cód. Proc. Civil e/ou estarem provados por documento, tinham e têm que ser considerados confessados e, dessa forma, aditados aos factos provados ou, em último caso, ser realizado julgamento tendo em vista a produção de prova sobre os mesmos.

3a - A matéria constante dos art.°s 21° e 35°, diz respeito à divergência entre o valor patrimonial indicado pelos RR. aos bens imóveis objeto da escritura de partilha e o seu valor comercial, sendo que, dizer que a um determinado bem foi atribuído um valor inferior ao seu valor comercial ou de mercado, é uma realidade concreta, de compreensão acessível a todos os cidadão e que, por isso, de acordo com a jurisprudência, constitui matéria de facto.

  1. - O mesmo se diga em relação à matéria constante dos art°s 23° a 25°; 32° e 33° da P.L, que diz respeito à intenção dos RR. enganarem a A./recorrente na celebração da escritura de partilha.

  2. - A jurisprudência e a doutrina têm sido unânimes em concordar que a intenção das partes, como é, por exemplo, o intuito de enganar terceiros, constitui matéria de facto, desde que, como é o caso, também sejam alegados factos exteriores reveladores da intenção.

    6a - Já quanto ao alegado pela A./recorrente no art.° 20° e no art.° 34° da P.I. que, ao contrário do declarado nem o GG recebeu nem os restantes outorgantes lhe pagaram tornas pela adjudicação dos bens, também deveria ter sido aditado à matéria de facto provada; em primeiro lugar porque a A./recorrente não sendo o confitente nem a simuladora, a confissão produzida não tem, quanto a si, força probatória plena e não está, portanto, sujeita às restrições das normas legais mencionadas no acórdão recorrido, podendo a prova ser obtida por testemunhas, por presunções ou, como é o caso, por confissão em consequência da revelia operante; por outro lado, porque, como tem sido entendido por alguma jurisprudência do STJ, os factos a coberto da força probatória plena do art.° 371°, n.° 1 do Cód. Civil, são apenas os factos praticados ou atestados pela entidade documentadora, ou seja, no caso do recebimento de tornas numa partilha extrajudicial, a escritura apenas prova plenamente que os interessados disseram perante o notário que receberam as tornas mas não prova que tal facto corresponda à realidade.

  3. - Por último, também deveria ter sido aditado aos fatos provados, o alegado pela A./recorrente na 1ª parte do artigo 20° da P.I. que GG tinha, à data da celebração da escritura de partilha, 86 anos de idade, por ser facto que se encontra documentalmente provado através do assento de óbito e da certidão da escritura de partilha.

    8a - Ao não ter aditado aqueles factos à matéria de facto provada, o acórdão recorrido violou o disposto no art.° 567°, n.° 1; no art.° 662°, n.° 1; e no art.° 662°, n.° 2, ai. b) do Cód. Proc. Civil.

  4. - A escritura de partilha em causa nos presentes autos, atendendo a toda a factualidade atrás descrita que se encontra provada, excluindo a A./recorrente da sucessão da sucessão da herança do seu pai e beneficiando injustificadamente os RR., seus irmãos e genro, ali outorgantes, dessa forma, prejudicando-a, viola as disposições legais que protegem a legítima dos filhos, neste caso, da A./recorrente e também é ofensiva dos bons costumes e da ordem pública, sendo proibida pelo disposto nos n.°s 1 e 2 do art.° 280° e no art° 281° do Cód. Civil e, por isso, nula.

    10 ª - Ainda que improceda o pedido de nulidade da escritura de partilha, o que por mero dever de ofício se aceita, sempre o mesmo negócio deverá ser anulado com base em simulação, nos termos do disposto no art.° 241° do Cód. Civil.

    11a - Mesmo que se entenda que sob aquela partilha existe uma verdadeira doação em vida do pai da A. aos ali restantes outorgantes, ou até uma compra e venda, nunca aqueles negócios poderão ser declarados válidos, nos termos previstos no art.° 241° do Cód. Civil, porquanto, nos termos do n.° 2 do art.° 241° do Cód. Civil, o negócio dissimulado de natureza formal só é válido se tiver sido observada a forma exigida por lei e, no caso concreto, falta um dos requisitos formais que é o consentimento da A., que era obrigatório em qualquer um daqueles negócios, nos termos do n.° 1 do art.° 2029° e do n.° 1 do art.° 877° do Cód. Civil.

    12a - Caso o entendimento venha a ser o de que o ato praticado na escritura se enquadra na qualificação jurídica prevista no n.° 1 do art° 2029° do Cód. Civil ou numa compra e venda, deverão, nesse caso, os RR. ser condenados a pagar à A. a quota que lhe corresponde, a qual deverá, no entanto, ser quantificada por perito legalmente habilitado para aferir o real valor dos bens.

    Não foram apresentadas contra-alegações.

    Colhidos os vistos, cumpre decidir, sendo questões sujeitas à nossa apreciação – visto o teor das conclusões que, como é sabido, delimita o objeto do recurso – as de saber se: - por virtude da confissão ficta devem ser tidos como provados os factos enunciados pela recorrente e que haviam sido por ela alegados na petição inicial.

    - a pretensão da autora deve proceder.

    II - A matéria de facto considerada como provada nas instâncias é a seguinte: A) Constante da sentença: - Factos provados: 1 - A A. e os RR. BB, DD e EE, são filhos de GG e de HH. (artº 1º da petição inicial) 2 - A R. BB é casada com o R. CC no regime da comunhão geral de bens. (artº 2º da petição inicial) 3 - HH faleceu em 16.12.2005, no estado de casada no regime da comunhão geral de bens, com GG. (artº 3º da petição inicial) 4 - HH deixou testamento público, no qual instituiu o cônjuge, GG, como herdeiro da quota disponível (artº 10º da petição inicial-parte).

    5 - Nos autos de execução que correram termos no 2º Juízo do Tribunal Judicial de …, com o n.º de processo 171-A/2000, em que era exequente II e executada a aqui A., foi por GG, seu pai, adquirido, por remição, o quinhão hereditário que pertencera à executada, na herança ilíquida e indivisa, aberta por morte de sua mãe, HH. (artº 4º da petição inicial) 6 - No dia 26 de Fevereiro de 2009, no Cartório Notarial em …, sito na Rua …, Edifício …, loja 1, em S…, perante a Sr.ª Notária FF, foi lavrada a fls. 107 e fls. 110, do Livro de Notas para...

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