Acórdão nº 343/10.5TBVLN.G2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 20 de Junho de 2017
Magistrado Responsável | ERNESTO CALEJO |
Data da Resolução | 20 de Junho de 2017 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I- Relatório: 1-1- AA intentou a presente acção declarativa de condenação com processo comum ordinário, contra Companhia de Seguros BB SA (hoje ..., S.A.
), e CC, alegando, em síntese, que foi vítima da queda de um haltere quando se encontrava a fazer exercícios no ginásio do 2° R, o que lhe causou danos, sendo que este havia transferido para a R. a responsabilidade civil por danos ocorridos nesse local. O haltere caiu devido ao facto de o 2° R. não ter agido com o cuidado que devia, nomeadamente por o respectivo suporte não oferecer condições de retenção.
Conclui pedindo a condenação da 1ª R.
e subsidiariamente do 2ª R. no pagamento da quantia de € 212.
729,34, a título de indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais que sofreu, importância essa acrescida de juros de mora, contabilizados à taxa legal, desde a citação até efectivo pagamento.
Contestaram os RR., impugnando os factos descritos na petição inicial, negando qualquer culpa do 2° R.
na queda do haltere, imputando antes a responsabilidade pela produção dos danos à própria actuação do demandante.
A R.
Seguradora defendeu ainda a exclusão dos danos sofridos pelo A.
da cobertura do seguro que celebrara com o 2º R.
O A.
replicou mantendo a versão referida na petição inicial.
O processo seguiu os seus regulares termos posteriores, tendo-se proferido o despacho saneador, após o que se fixaram os factos assentes e se organizou a base instrutória, se realizou a audiência de discussão e julgamento, se respondeu à base instrutória e se proferiu a sentença.
Nesta, julgou-se a acção parcialmente procedente e, em consequência, condenou-se o R. CC: a) a pagar ao A. a quantia de € 858,18 (oitocentos e cinquenta e oito euros e dezoito cêntimos) a título de danos patrimoniais e de € 15.000,00 (quinze mil euros) a título de danos não patrimoniais; b) a pagar ao A. os juros de mora à taxa de 4 % (Portaria 291/03, de 8 Abr), desde a citação até integral pagamento, sobre o montante relativo aos danos patrimoniais e desde hoje até integral pagamento, sobre o montante relativo aos danos não patrimoniais.
No mais, julgou-se a acção improcedente, absolvendo o R. CC do restante pedido e a R. Companhia de Seguros BB SA, de todo o pedido.
1-2- Não se conformando com esta decisão, dela recorreram o A.
AA e o R. CC, de apelação para o Tribunal da Relação de Guimarães, tendo-se aí, por acórdão de 30 de Novembro de 2016, julgado os recursos interpostos pelo A. e pelo 2º R. parcialmente procedentes e, em consequência, decidiu-se alterar a condenação proferida em 1ª instância nos seguintes termos: “Julgar a acção parcialmente procedente e, em consequência, condenar a 1ª Ré Companhia de Seguros BB, S. A.
a) a pagar ao A. a quantia de € 858,18 (oitocentos e cinquenta e oito euros e dezoito cêntimos) a título de danos patrimoniais e de € 15.000,00 (quinze mil euros) a título de danos não patrimoniais; b) a pagar ao A. os juros de mora à taxa de 4% (Portaria 291/03, de 8Abr): • desde a citação até integral pagamento, sobre o montante relativo aos danos patrimoniais; • desde hoje até integral pagamento, sobre o montante relativo aos danos não patrimoniais”.
No mais, julgou-se a acção improcedente, absolvendo-se totalmente o R. CC do pedido.
1-3- Irresignada com este acórdão, dele recorreu a R. Seguradora para este Supremo Tribunal, recurso que foi admitido como revista e com efeito devolutivo A recorrente alegou, tendo das suas alegações retirado as seguintes conclusões: 1. Os danos do Autor encontram-se excluídos do âmbito de cobertura do contrato de seguro celebrado entre a Recorrente e 2° Réu, CC.
2. A responsabilidade pelos danos em discussão nestes autos é exclusivamente do 2° Réu.
3. A responsabilidade do 2° Réu não se encontra transferida para a Recorrente.
4. O Acórdão recorrido assenta em pressupostos que não encontram arrimo nas disposições legais atinentes à matéria aqui em discussão.
5. O Acórdão recorrido viola a lei substantiva, ao incorrer em erro na interpretação e aplicação do que se dispõe no Decreto-Lei nº 10/2009, de 12 de Janeiro, relativamente ao contrato de seguro desportivo.
6. Do nº 1 do artigo 2° do Decreto-Lei nº 10/09, de 12 de Janeiro resulta que os praticantes de actividades desportivas em infra-estruturas desportivas abertas ao público devem, obrigatoriamente, beneficiar de um contrato de seguro desportivo. 7. Do nº 2 do artigo 2º desse Decreto-Lei resulta que a responsabilidade pela celebração do contrato de seguro desportivo cabe às entidades que explorem infra-estruturas desportivas abertas ao público.
8. Do nº 1 do artigo 14° do Decreto-Lei nº 10/09, de 12 de Janeiro resulta que as entidades prestadoras de serviços desportivos celebram um contrato de seguro desportivo, com determinadas coberturas mínimas a favor dos utentes ou clientes desses serviços.
9. Do nº 2 do artigo 140 do Decreto-Lei nº 10/09, de 12 de Janeiro resulta que a adesão ao seguro se realiza no acto de inscrição ou contratualização junto das entidades prestadoras dos serviços desportivos.
10. Resulta da matéria assente que o Autor frequentava o ginásio do 20 Réu, a título totalmente gratuito, por mero favor pessoal "alinhavado" entre ambos, e ao qual a Seguradora Recorrente era totalmente alheia.
11. O Autor frequentava o ginásio devidamente autorizado pelo seu proprietário (o 2.
0 Réu), mas nunca pagou qualquer contraprestação, nem nunca formalizou a sua frequência, por via de uma inscrição.
12. Uma correcta interpretação e aplicação da legislação referida nos pontos 5 a 9 destas conclusões impõe que apenas o 2º Réu, na qualidade de prestador dos serviços desportivos, deva responder pelas consequências de uma admissão - gratuita, e a título de mero favor pessoal - não formalizada.
13. A Primeira Instância sentenciou bem, ao interpretar que não é legítimo ser exigido à Recorrente que esta venha responder com base num risco que não foi avaliado nem reflectido na contrapartida representada pelo prémio de seguro.
14. É uma questão de razoabilidade e lógica jurídica, dimanada dos princípios, a afirmação de que esta 'inscrição' ou 'contratualização' exige um certo grau de formalização.
15. Por um lado, para que o 2º Réu, na qualidade de prestador dos serviços desportivos, pudesse comunicar à sua seguradora o número de utentes/clientes frequentadores do ginásio.
16. E por outro lado, para que a Recorrente Seguradora soubesse quantos utentes/clientes estavam cobertos pelo seguro.
17. Esta informação é um dos elementos essenciais do contrato de seguro, já que tem influência directa na fixação do respectivo prémio.
18. O 2º Réu não cumpriu o ónus que lhe impedia, de partilhar com a Recorrente Seguradora toda a informação que detinha acerca das circunstâncias relevantes para o juízo de risco, nomeadamente a existência de outros clientes/utentes frequentadores do ginásio, sem inscrição formalizada.
19. O Acórdão recorrido viola a lei substantiva, ao incorrer em erro na interpretação e aplicação do que se dispõe no Decreto-Lei nº 10/2009, de 12 de Janeiro, relativamente ao contrato de seguro desportivo, ao determinar que a responsabilidade do 2º Réu se encontra transferida para a Recorrente.
0. O Acórdão recorrido viola ainda a lei substantiva, ao fazer uma interpretação errada do que venham a ser "terceiros", para efeitos do contrato de seguro em causa, já que tal interpretação não encontra sustentação no animus da contratação, nem tem em consideração a natureza do próprio contrato de seguro desportivo obrigatório.
21.Os Réus não alargaram o âmbito de cobertura subjectivo do contrato de seguro, contrariamente ao que aponta o Tribunal recorrido.
22. Das condições especiais da apólice do contrato de seguro celebrado entre os Réus, resulta que o beneficiário, no caso, é o Réu.
23. Das condições especiais da apólice do contrato de seguro celebrado entre os Réus, resulta que os terceiros são todos os clientes/utentes do beneficiário, que frequentavam o ginásio do 2º Réu, tendo uma inscrição formalizada.
4. Só esta interpretação é consentânea com o que se dispõe na determinação dos riscos das condições gerais da apólice, já que nos termos dessas cláusulas apenas ficam garantidas as lesões corporais causadas a terceiros, e ocorridas no exercício do negócio do 2º Réu.
25. No entanto, o Autor não se encontrava a frequentar o ginásio, por conta do negócio...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO-
Acórdão nº 3849/17.1T8BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 06 de Junho de 2019
...a finalidade do Decreto-Lei, que é a segurança dos praticantes de desporto (cfr. preâmbulo do Decreto-Lei e Acórdão do STJ processo nº 343/10.5TBVLN.G2.S1). Caso os atletas pudessem optar por ser assistidos numa clínica cujas despesas de tratamento por sessão ultrapassassem o montante do ca......
-
Acórdão nº 3849/17.1T8BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 06 de Junho de 2019
...a finalidade do Decreto-Lei, que é a segurança dos praticantes de desporto (cfr. preâmbulo do Decreto-Lei e Acórdão do STJ processo nº 343/10.5TBVLN.G2.S1). Caso os atletas pudessem optar por ser assistidos numa clínica cujas despesas de tratamento por sessão ultrapassassem o montante do ca......