Acórdão nº 50/14.0SLLSB-U.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 09 de Março de 2017

Magistrado ResponsávelMANUEL BRAZ
Data da Resolução09 de Março de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: O Ministério Público junto da Relação de Lisboa interpôs, em 01/07/2016, recurso extraordinário para fixação de jurisprudência do acórdão desse tribunal de 08/06/2016, proferido no processo 50/14.0SLLSB-U.L1, transitado em julgado em 27/06/2016, alegando que se encontra em oposição com o acórdão da mesma Relação de 27/04/2016, também transitado em julgado, proferido no processo 50/14.0SLLSB-V.L1.

Por acórdão de 29/09/2016, o Supremo Tribunal de Justiça, considerando não ocorrer motivo de inadmissibilidade e haver oposição de julgados, ordenou o prosseguimento do recurso.

Foram notificados os sujeitos processuais interessados, nos termos e para os efeitos do artigo 442.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, tendo sido apresentadas alegações pelo Ministério Público, que concluiu nos termos que se transcrevem: «1. O artigo 188.º, n.º 8, do C.P.P. regula distintamente dois direitos: o direito de exame dos suportes técnicos, e o direito a obtenção de cópia dos mesmos suportes; 2. O direito de exame constante da primeira parte do preceito, autoriza o arguido e o assistente a examinarem os suportes técnicos das conversações ou comunicações, independentemente de estes se encontrarem ou não transcritos.

  1. O direito de o arguido e assistente obterem cópia dos suportes técnicos foi limitado pelo legislador à cópia das partes que pretendam transcrever para juntar ao processo como prova, e 4. de forma expressa, às partes (sessões) que contenham conversações ou comunicações que não se encontram transcritas.

  2. Se a intenção do legislador fosse a de permitir que o arguido e o assistente pudessem obter cópias dos suportes técnicos das conversações ou comunicações que foram consideradas relevantes e que já se encontram transcritas, bastaria expressar tal propósito, sem necessidade de distinguir as que se encontram transcritas das que não se encontram.

  3. Com esta possibilidade conferida ao arguido e ao assistente de examinarem os suportes técnicos na secção encontra-se assegurada a ampla defesa dos seus direitos e interesses, bem como acautelado o princípio da igualdade de armas, que decorre da estrutura acusatória do processo criminal.

  4. Esta opção do legislador de não permitir a entrega de cópia ao arguido dos suportes técnicos das conversações que foram consideradas relevantes e se encontram transcritas, permitindo tão só o seu exame na secretaria, visou acautelar o seu direito a um processo justo e ao contraditório, 8. conciliando-o com outros direitos fundamentais, como o da reserva da intimidade da vida privada e familiar, do direito à palavra e da inviolabilidade das comunicações (arts. 26.º e 34.º, n.ºs 1 e 4, da CRP).

  5. Da leitura do disposto nos artigos 86.º, 89.º e 188.º do Código de Processo Penal, resulta que o legislador consagrou, no artigo 188.º do Código de Processo Penal, um regime especial em relação ao exame, pelo arguido e pelo assistente, dos suportes técnicos das conversações e comunicações.

  6. Com efeito, o artigo 188.º n.º 8, do C.P.P só permite o exame, pelo arguido e assistente, dos suportes técnicos a partir do encerramento do inquérito, enquanto em relação aos demais meios de prova, o legislador permite que o arguido, o assistente, o ofendido, o lesado e o responsável civil, possam proceder ao exame do processo e seus elementos, quando nos termos do artigo 86.º n.º 9, do Código de Processo Penal, tenha sido atingido o prazo máximo de duração do inquérito, isto é, mesmo não se encontrando findo o inquérito.

  7. Ao fixar este este regime especial no que se refere à possibilidade de exame e obtenção de cópias dos suportes técnicos o legislador visou, por um lado, regular expressamente esta matéria, e, por outro, afastar a aplicação do regime geral previsto nos artigos 86.º e 89.º do C.P.P., ao que seguramente não foi alheia a natureza intrusiva das escutas e necessidade de controlo da sua reprodução.

Pelas razões expostas acompanhamos a solução do acórdão recorrido.

Propõe-se, pois, que o Conflito de Jurisprudência existente entre os acórdãos da Relação de Lisboa, de 8 de Junho de 2016 (recorrido) e de 27 de Abril de 2016 (fundamento), seja resolvido nos seguintes termos: ”Nos termos do artigo 188.º, n.ºs 8 e 9, alínea b), do Código de Processo Penal, após a dedução da acusação, o arguido pode examinar na secção todas as conversações telefónicas gravadas, transcritas ou não, podendo obter cópia, apenas, das não transcritas, com vista à sua transcrição para junção ao processo como prova”».

Colhidos os vistos, o processo foi apresentado à conferência do pleno das secções criminais, cumprindo decidir.

Fundamentação: I. A conferência considerou estarem verificados os pressupostos do recurso, designadamente a oposição de julgados. Este pleno pode decidir em sentido contrário, como resulta do n.º 4 do artigo 692.º do Código de Processo Civil, aqui aplicável por força do disposto no artigo 4.º do Código de Processo Penal.

Mas não é caso disso.

Os pressupostos formais estão verificados, à luz dos artigos 437.º, n.ºs 1, 2, 4 e 5, e 438.º, n.º 1, do Código de Processo Penal: o recorrente tem legitimidade, os acórdãos em conflito são de tribunal de Relação, transitaram em julgado, não eram passíveis de recurso ordinário, e o recurso para fixação de jurisprudência foi interposto do acórdão proferido em...

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