Acórdão nº 404/11.3PULSB-A de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 08 de Fevereiro de 2017
Magistrado Responsável | ROSA TCHING |
Data da Resolução | 08 de Fevereiro de 2017 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça * I. Relatório.
AA, id. nos autos, detida atualmente no estabelecimento prisional de ..., em cumprimento de pena e à ordem do processo comum nº 404/11.3PULSB-A, da Comarca de Lisboa - Tribunal de Instância Local Criminal- ..., invocando o disposto no artigo 222º, nºs 1 e 2, al. b) do Código de Processo Penal, veio requerer a providência de Habeas Corpus, com os seguintes fundamentos, que se transcrevem: « I - DOS FACTOS A impetrante e a sua mãe BB celebraram no processo à margem uma transacção do pedido cível com a lesada, homologada por sentença de 17 de Dezembro de 2014 (pág. 616 e sgts. 3° volume).
Por sentença transitada em julgado em 17/03/2015, foram a impetrante e sua mãe condenadas, cada uma, numa pena de três anos e três meses de prisão, suspensa na sua execução por idêntico período e sujeita à condição de proceder ao pagamento à assistente de catorze mil e quinhentos euros (14.500 euros) no prazo de 18 meses a contar da data do trânsito em julgado da presente sentença, devendo, ao fim de seis meses estar paga, pelo menos, a quantia de cinco mil euros (5.000 euros) e, ao fim de 12 meses, estar paga, pelo menos, a quantia de dez mil euros (10.000 euros).
Em 16/07/2015 foi registada a penhora à ordem do processo à margem sobre a casa de morada de família pertencente à impetrante e à sua mãe.
Ora a penhora efectuada garantia o pagamento da dívida.
- A impetrante não cumpriu a condição de pagamento à assistente por dificuldades surgidas no recebimento da herança do avô da AA por representação do seu pai (veja-se pág. 839 - 4° volume).
- Mas a dívida estava garantida pela penhora.
- A impetrante mais a sua mãe vendeu a casa de morada de família e, para não irem para a rua, fizeram um contrato de arrendamento com o próprio comprador.
- A impetrante só assim conseguiu pagar ao sucessor da assistente em 21/12/2016.
II - A DEC1SÃO DA REVOGAÇÃO DE SUSPENSÃO Esta decisão, salvo melhor opinião é nula, porquanto: Não foi respeitado o princípio do contraditório uma vez que a decisão foi tomada pela Meritíssima Juíza a quo, sem que previamente tenha sido dada ampla e efectiva possibilidade ao sujeito processual contra o qual é dirigida, de a discutir, de a contestar e de a valorar.
Foram violados os princípios do art° 32° nº 5 do CRP, art° 495° nº 2 do CPP, art°s 55° e 56° do C. Penal. Veja-se acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra Proc. 181/06. OTASEI.A.C1 Tribunal da Guarda.
A revogação da suspensão da pena por incumprimento do agente das obrigações impostas só pode ocorrer se o incumprimento se verificar com culpa e só terá lugar como última ratio.
Ora nenhuma culpa foi verificada e como se constata dos factos indicados, conclui-se muito facilmente, e socorrendo-se do aliás douto acórdão sobre o recurso nº 746/05 Comarca do Porto publicado na Colectânea de Jurisprudência - Acordão do Supremo Tribunal de Justiça nº 184 pág. 182-II, que a prisão da impetrante é ilegal por se tratar de abuso de poder devido a decisões das quais resultam erros grosseiros na aplicação do direito, nomeadamente: A condição pecuniária sujeita a prisão, no caso de incumprimento, tendo muito antes da sentença uma sentença homologatória da transacção sobre o pedido cível.
Outro erro grosseiro foi a revogação da suspensão da sentença, não tendo havido a prática de crimes da mesma natureza.
A providência do Habeas Corpus, enquanto medida excepcional que é, visa reagir de modo imediato e urgente contra a privação arbitrária da liberdade e contra a manutenção de uma situação de ofensa à liberdade manifestamente ilegal.
A prisão está a causar danos na saúde da impetrante que sofre de Púrpura e a causar transtornos psíquicos nas duas crianças, uma enteada e um filho.
A impetrante requer a providência do Habeas Corpus, devendo ser urgentemente libertada e requer igualmente para a arguida sua mãe, que ainda não está presa, a providência do Habeas Corpus preventivo, o que é da mais elementar Justiça que se espera do mais Alto Tribunal ».
* A Exmª Srª Juíza titular do processo nº 404/11.3PULSB, prestou a informação a que alude o artigo 223º, nº1, do Código de Processo Penal, nos seguintes termos: « 1. AA foi condenada nestes autos pela prática em co-autoria material e sob a forma tentada de um crime de furto qualificado previsto e punido pelos arts. 203°, nº1, 204°, nº2, al. a) com referência ao art. 202°, al. b) numa pena de três anos e três meses de prisão suspensa na sua execução pelo mesmo período e sujeita à condição de proceder ao pagamento à assistente de €14 500,00 no prazo de dezoito meses a contar do trânsito em julgado da sentença devendo ao fim de seis meses estar paga quantia de €5000,00 e ao fim de doze meses estar paga pelo menos a quantia de €l0 000,00.
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Na sessão de audiência de julgamento que teve lugar no dia 17 de Dezembro de 2014 foi celebrada transacção quanto ao pedido de indemnização civil.
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O valor relativo à transacção não foi objecto de pagamento na data acordada.
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A sentença em apreço foi proferida em 12 de Fevereiro de 2015, tendo transitado pacificamente em julgado.
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Não tendo sido cumprida a condição a que estava sujeita foi determinada a audição da condenada para o dia 26 de Novembro de 2015.
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A mesma não compareceram na diligência, apesar de notificadas, tendo sido emitidos mandados de detenção para assegurar a sua presença no dia 10 de Dezembro de 2015.
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Na data de 10 de Dezembro de 2015 foi ouvida quanto às razões do incumprimento, tendo sido solenemente advertida e tendo-lhe sido prorrogado o prazo para cumprimento do primeiro pagamento previsto na sentença até ao dia 15 de Fevereiro de 2016, mantendo-se os demais nas datas originalmente fixadas.
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Não foi feito qualquer pagamento, tendo sido designada nova data para audição da condenada, indicando-se para o efeito o dia 6 de Abril de 2016, às 9h30m.
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A condenada não compareceu alegando motivos de saúde e afirmou não ter procedido ao pagamento do valor em causa por desconhecerem qual a conta bancária para onde fazer tal pagamento, dado o falecimento superveniente da assistente.
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Foi-lhes fornecida a informação sobre como realizar esse pagamento e, caso se comprovasse clinicamente a impossibilidade alegada por motivo de saúde, determinou-se a designação e nova data para audição das condenadas, dia 26 de Abril de 2016.
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Não foi junta aos autos informação clínica sobre a indicada doença da condenada, tendo sido emitidos mandados para a sua comparência no dia acima indicado, atenta a falta não justificada.
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No dia 26 de Abril de 2016 foram apresentados documentos.
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Por despacho de 4 de Julho de 2016 proferido a fls. 999 a 1004 foi revogada a suspensão da execução das penas de prisão fixadas na sentença determinando-se o integral cumprimento por ambas as condenadas.
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Foi interposto recurso deste despacho, o qual não foi admitido por ser extemporâneo.
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Foi apresentado requerimento solicitando derradeira oportunidade de cumprimento da condição aplicada à suspensão da pena de prisão em que foram condenadas.
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O mesmo foi indeferido.
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Foi apresentado novo requerimento a 16 de Novembro de 2016, o qual foi também indeferido por inadmissibilidade legal.
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Foi ainda interposto recurso da decisão proferida a 4 de Julho de 2016, não tendo o mesmo sido admitido por manifesta extemporaneidade.
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AA deu entrada no estabelecimento prisional de ... no dia 30 de Janeiro de 2016 (04h26m), onde se mantém ».
* Remetida a presente providência ao Supremo Tribunal de Justiça, foi...
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