Acórdão nº 2100/13.8TJLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Julho de 2016

Magistrado ResponsávelANTÓNIO DA SILVA GONÇALVES
Data da Resolução14 de Julho de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça “AA, Irmãos, L.da” intentou, nos então Juízos Cíveis de Lisboa, ação declarativa, com processo comum, contra o “Banco BB, SA”, pedindo: a) Seja considerada nula, por abusiva, a cláusula, que referencia, do contrato de financiamento celebrado entre a A. e a Ré, por violação do Princípio da Boa-fé, e, consequentemente, declarada a nulidade da comunicação do aumento do spread, assim como o aumento unilateral do spread em si mesmo, e ser a Ré condenada a restituir as quantias que a autora lhe entregou, ou venha a entregar, acima do inicialmente estipulado, ou seja, todos os valores correspondentes à diferença de juros e respetivo imposto do selo resultantes da aplicação da taxa de spread acima de 4%, que se cifravam, em Agosto de 2013, em € 6.160,05, devendo ainda a ré ser condenada a indemnizar a autora em juros vencidos e vincendos, calculados à taxa legal, que esta deixou de auferir, pela entrega de valores correspondentes à diferença de juros e respetivo imposto de selo resultantes da aplicação da taxa de spread acima de 4%, que, no dia 25 de Setembro de 2013 se fixam na quantia de € 293,87; b) Seja considerada abusiva a dita cláusula, no segmento em que estabelece um prazo de trinta dias para a resolução do contrato após a comunicação da alteração da taxa de juro, por tal prazo ser manifestamente desproporcional e insuficiente para que sejam tomadas providências que acautelem os interesses da Autora e, consequentemente, declarada a nulidade da comunicação do aumento do spread, assim como o aumento unilateral do spread em si mesmo e ser a Ré condenada a restituir as quantias que a autora lhe entregou, ou venha a entregar, acima do inicialmente estipulado, e, bem assim, juros de mora, nos termos e montantes antecedentemente especificados; c) Seja a mesma cláusula considerada excluída do contrato, por violação dos deveres de informação e comunicação, nos termos das disposições conjugadas do artigo 5º, 6º e alínea a) e b) do artigo 8º do decreto-lei n.º 446/85 de 25 de Outubro, e, consequentemente, declarada a nulidade da comunicação do aumento do spread, assim como o aumento unilateral do spread em si mesmo e ser a Ré condenada a restituir as quantias que a autora lhe entregou, ou venha a entregar, acima do inicialmente estipulado, e, bem assim, juros de mora, nos termos e montantes especificados em a); d) Deve a comunicação do aumento do spread ser considerada inválida, nula ou inexistente por abstrata e imprecisa e ser a Ré condenada a restituir as quantias que a autora lhe entregou, ou venha a entregar, acima do inicialmente estipulado, e, bem assim, juros de mora, nos termos e montantes especificados em a).

Alega, para tanto e em suma, o seguinte: No dia 20 de Abril de 2011 Autora e Ré celebraram o Contrato de Financiamento n.º FEC 005...8/11, no âmbito do qual foi mutuada pela Ré à Autora a quantia de € 760.000,00, a ser “liquidada” em 72 prestações mensais, incidindo sobre o capital em dívida uma taxa de juro, correspondente à Euribor a um mês, arredondada à milésima acrescida dum spread de quatro pontos percentuais, a fixar no primeiro dia de cada período de um mês, a que acresce uma comissão de gestão de 0,125% ao ano.

Tal contrato foi celebrado por exigência da Ré, tendo em vista liquidar dois contratos sob a forma de conta corrente caucionada, celebrados um pela autora, outro pela sociedade “CC, Lda”, sociedade igualmente detida pelos sócios da autora, num período em que os limites de crédito da autora e da sociedade “CC, L.da” se encontravam no máximo, isto é, globalmente cifravam-se em € 500.000,00.

Bem sabendo a ré que a autora e a sociedade “CC, L.da”, não tinham condições financeiras para, de repente, liquidar a totalidade dos valores em dívida.

Além desses dois contratos de conta corrente caucionada, autora e ré – “DD Imobiliária - Sociedade de Locação Financeira, S.A”, entretanto incorporada por fusão na ré - tinham celebrado em, 29 de Setembro de 2003, um contrato de locação financeira, com um prazo de duração de 10 anos, onde vigorava uma taxa de spread de 1,25%, que igualmente estava a ser integralmente cumprido e que tinha por objeto um prédio urbano sito em Mozelos.

Contrato esse que, na data da celebração do contrato aqui em crise, se encontrava a pouco mais de dois anos do seu término faltando liquidar aproximadamente € 260.000,00.

Neste contexto, o referido contrato de locação financeira viu o seu termo antecipado para a mesma data de início de vigência do contrato de financiamento, passando o prédio objeto daquele primeiro contrato, na data da celebração deste último, a ser propriedade da autora, que sobre ele constituiu hipoteca a favor da Ré, para garantia de pagamento de € 760.000,00 (setecentos e sessenta mil euros - € 500.000,00 + € 260.000,00).

Apesar de a Autora estar a cumprir o contrato de financiamento, a Ré comunicou-lhe, por carta datada de 23 de Março de 2012, a subida de 4% para 5% do spread a aplicar.

Justificando tal aumento com a descida do rating da dívida de longo prazo de Portugal e consequente limitação e escassez no acesso aos mercados externos de financiamento, com penalização dos custos de financiamento no âmbito do crédito concedido pelas Instituições Financeiras aos agentes económicos.

Ora tal cláusula - 9. §§ 8 e 9 - é nula, já enquanto a Ré, que a pré-definiu unilateralmente, se reserva, através dela, o direito de alterar a taxa de juro por toda e qualquer contingência de “mercado” da qual lhe resulte prejuízo, assim de imediato transferido para a sua contraparte contratante, in casu, a Autora; já pelo abusivo do curto prazo de 30 dias para a A. resolver o contrato, na sequência da comunicação do aumento do spread, por claramente insuficiente para que sejam tomadas as providências no sentido de acautelar os interesses da contraparte.

Devendo em qualquer caso ter-se por excluída, por preterição dos deveres de comunicação e informação, estabelecidos na Lei das Cláusulas Contratuais Gerais.

E, em qualquer caso, revelando-se a comunicação feita pela Ré, vazia da indicação em concreto das circunstâncias que evidenciem poder o contrato de financiamento ser afetado pelas razões invocadas.

Contestou a Ré, dizendo, no essencial: O contrato de financiamento invocado pela A. mais não é do que “um sucedâneo reestruturado” dos dois anteriores contratos de crédito em conta corrente também referidos na petição inicial, na execução dos quais foram correntes e sempre aceites pela A. as alterações dos spreads aplicados às taxas convencionadas.

Estando a comunicada alteração do spread contemplada nos §§ 8 e 9 da cláusula 9.ª do contrato de financiamento sub judice, que é conforme ao disposto no artigo 22.º, n.º 2, da LCCG, tendo a inclusão de cláusulas que tais sido ratificada pela entidade de supervisão.

Nem sendo a dita cláusula “in totum de mera adesão, podendo ser negociada e, eventualmente, suprimida”.

Para além de ter sido cabalmente cumprido o regime das cláusulas contratuais gerais no que respeita aos deveres de comunicação e esclarecimento, com remessa ao legal representante da A., com 13 dias de antecedência, do “contrato, para apreciação”, nada tendo sido dito ou solicitado por aquela.

Sendo, no tocante ao prazo para resolução, em caso de não aceitação da alteração contratual, que aquele corresponde às instruções emanadas pela entidade de supervisão e ao estatuído no artigo 22.º da LCCG, bem como aos usos e prática bancária corrente… Àquele nada havendo oposto a A., na sua vista prévia do “contrato”.

Remata com a improcedência da ação e a sua absolvição do pedido.

Por despacho de folhas 227-231 julgou-se o tribunal incompetente, em razão do valor, para os termos subsequentes da causa, ordenando-se a remessa dos mesmos às então Varas Cíveis de Lisboa.

O processo seguiu seus termos, procedendo-se, em audiência prévia, ao saneamento do processo, identificação do objeto do litígio e enunciação dos temas da prova.

Por despacho de folhas 283, foi admitido o “Banco EE, SA” a intervir na presente acção como ré, em substituição do “Banco DD, S. A.”.

Realizada que foi a audiência final, veio a ser proferida sentença que julgou a ação improcedente e absolveu a ré do pedido.

Inconformada, desta sentença recorreu a autora para a Relação de Lisboa que, por acórdão de 28.01.2016 (cfr. fls. 419 a 451), revogou a sentença recorrida e, julgando a ação procedente, condenou a ré a restituir à autora a quantia de € 6.160,05, bem como os montantes correspondentes às diferença de juros e respetivo imposto de selo, resultantes da aplicação, com fundamento na excluída cláusula contratual geral, da taxa de spread acima de 4%, que a autora/recorrente, lhe tenha entregue após 21-08-2013, e lhe venha a entregar até ao trânsito em julgado doacórdão proferido.

Desagradado, recorre agora para este Supremo Tribunal a ré “Banco EE, SA”, que alegou e concluiu pela forma seguinte: A.

A conclusão expressa na douta decisão em crise de que “é sobre o proponente de cláusula contratual geral que recai o ónus da prova da comunicação daquela, nos termos exigidos pelo artigo 5.º, n.º 1 e 2 da LCCG, e do...

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