Acórdão nº 158/14.1PBSXL.L1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 30 de Março de 2016

Magistrado ResponsávelSANTOS CABRAL
Data da Resolução30 de Março de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça AA veio recorrer do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa que, julgando parcialmente procedente o recurso por si interposto, alterou a decisão de primeira instância, condenando-o como autor de um crime de homicídio qualificado previsto e punido pelos artigos 131º e 132º, nºs 1, 2, alínea b) do Código Penal, na pena de 15 anos de prisão, e no cúmulo dessa pena com a de 2 anos de prisão que lhe foi aplicada, como autor de um crime de detenção de arma proibida previsto e punido pelo art. 86º, n.º 1, alínea c), da Lei 5/2006, de 23 de Fevereiro, na pena única de 16 anos de prisão Em sede de primeira instância o recorrente foi condenado nas seguintes penas: Como autor de um crime de homicídio qualificado previsto e punido pelos artigos 131º e 132º, nºs 1, 2, alínea b) do Código Penal, na pena de 18 anos de prisão, como autor de um crime de detenção de arma proibida previsto e punido pelo art. 86º, n.º 1, alínea c), da Lei 5/2006, de 23 de Fevereiro, na pena de 2 anos de prisão, e, no cúmulo dessas penas, na pena única de 19 anos de prisão As razões de discordância encontram-se sintetizadas nas conclusões da respectiva motivação de recurso onde se refere que: 1 - Na verdade e sempre com o devido respeito, não se conforma o ora Recorrente com a pena aplicada decorrente da matéria de facto dada como provada; 2 - Quanto à desqualificação do crime de homicídio qualificado considera o Recorrente que existe contradição insanável entre a fundamentação e a decisão a que alude o artigo 410 n.º 2 alínea b) do Código Processo Penal.

3 - O recorrente foi condenado pela prática de um crime de homicídio qualificado, previsto e punido pelos artigos. 131° e 132°,1 e 2, alínea b) do Código Penal, na pena de 15 anos de prisão; 4 - O crime de homicídio foi considerado qualificado por verificação da circunstância prevista na alínea b) do nº 2 do artigo 132° do C. Penal, na justa medida em que o Tribunal viu, na factualidade comprovada, circunstâncias reveladoras de uma especial censurabilidade ou perversidade.

5 - O facto de a vítima ser sua companheira e atento ao circunstancialismo em que os factos foram praticados, não é susceptível de revelar especial censurabilidade ou perversidade, circunstancialismo que, na perspectiva do Recorrente desagravaria a sua culpa.

6 - O Recorrente agiu sob forte emoção e desilusão, circunstancias estas que não foram devidamente apreciadas pelo Colectivo em sede de culpa.

7 - Considera o ora Recorrente que a matéria de facto julgada provada, é de todo insuficiente para preencher aquele circunstancialismo qualificativo.

8 - A convicção do Tribunal formou-se por inferência dos factos objectivos com as regras da experiência comum, 9 - Porém a aplicação dessas regras claramente resulta, já depois de tudo ter acontecido, pois não se provou a existência de um plano prévio, nem a existência de uma verdadeira intenção de matar, 10 - Na presente situação não existiu um plano de acção ou pré-representação do processo causal, o que tornaria objectivamente mais insidiosa e firme a acção criminosa e mostraria uma tendência para delinquir mais intensa e decidida.

11 - O arguido nunca teve intenção de matar a ofendida, o crime de homicídio praticado pelo arguido não foi intencional, não houve premeditação, resultou antes de um momento de descontrole momentâneo do arguido. A decisão recorrida considerou que está excluída a existência de um plano prévio ao dizer “estamos em crer que quando o arguido declara que não a queria matar, ele está a falar verdade para 99% do tempo, excepto naqueles fatídicos segundos em que, movido pela raiva, lançou mão da arma e disparou”.

12 - Estando em crer que o arguido está a falar verdade em 99% por cento do tempo, quando este declara que não queria matar a vítima, podendo constatar-se que o Tribunal formou a sua convicção e fez a apreciação da prova com a convicção de que não era vontade do arguido causar a morte da vítima, excepto naqueles fatídicos segundos em que movido pela raiva, lançou mão da arma e disparou.

13 - Foi o momento em que a vítima provocou no arguido o arguido ao proferir contra este o insulto “filho da puta” que lhe provocou um descontrolo momentâneo e o levou a pegar na arma que se encontrava na mesinha de cabeceira com a intenção de que ofendida parasse de o insultar acabando por efectuar um disparo com a referida arma, o qual atingiu a cabeça da ofendida causando-lhe a morte.

14 - A vitima tinha conhecimento de que a mãe do arguido tinha falecido há pouco tempo e que o mesmo estava a sofrer e com dificuldades em ultrapassar a morte da mãe e sabia que ao chamar-lhe “filho da puta” estava propositadamente a provocá-lo, sabia que ao proferir este insulto era para provocar e humilhar o arguido, o que não evitou fazer, tendo de alguma forma, a ofendida contribuído para que o arguido reagisse de forma inesperada, provocando no arguido uma reacção de raiva e consequentemente numa fracção de segundos, descontrolou-se e disparou a arma contra a vitima.

15 - Não houve tempo para preparar o referido crime.

16 - Pelo que o Tribunal a quo ao considerar que o arguido em 99% do tempo não teve intenção de matar, deveria ter condenado o arguido pela prática de um crime de homicídio simples.

17 - Deveria o Tribunal a quo ter considerado que o crime não foi praticado com especial perversidade ou censurabilidade e consequentemente ter condenado o arguido pela prática de um crime de homicídio simples.

18 - O Recorrente agiu sob forte emoção ou impulso do momento, não planeou a sua acção, não meditou no crime antes de o executar, não houve premeditação.

19 - Também é revelador de que a intenção do Recorrente não era matar a ofendida o facto de ter disparado apenas uma bala, sendo que a arma estava carregada com 4 munições no carregador, pois se o mesmo tivesse intenção de matar, e pelas regras de experiência comum, não teria disparado apenas uma bala e teria disparado mais do que uma vez.

20 - O Recorrente também providenciou pelo auxílio à vitima após efectuar o disparo, ligou de imediato à sua irmã --- e aos familiares mais próximos, tal como consta na fundamentação do acórdão da 1.ª Instância, e pediu-lhes ajuda, para providenciarem por chamar os meios de socorro para tentar salvar a ofendida.

21 - Estas circunstâncias são demonstrativas de que não era intenção do Recorrente matar a ofendida, pois se tivesse essa intenção teria efectuado mais do que um disparo, ter-se-ia certificado de que a ofendida estava morta e não teria providenciado pelo seu auxílio.

22 - Foi “o diálogo ocorrido na noite fatídica” que lhe provocou “forte emoção e desilusão” e desencadeou o seu acto homicida, pelo que, deve ser afastada a especial censurabilidade ou perversidade da sua conduta e ser condenado por homicídio simples.

23 - O recorrente não deveria ter sido condenado pela prática de um crime de homicídio qualificado, p. e p. pela alínea b) do n.º 2 do Art.°132.º e pelo Art.°131.º do C. P., mas sim pela prática de um crime de homicídio simples, com uma moldura penal de 8 a 16 anos.

24 - Sendo que, ao condená-lo pela prática de um crime de homicídio qualificado, o douto acórdão de que ora se recorre fê-lo com insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, existe uma contradição entre a fundamentação e a decisão; 25 - O que constitui fundamento de recurso nos termos da alínea. b) do n.º 2 do Artigo 410º do C.P.P.

26 - No entanto, se assim não se entender, mesmo a ser condenado por homicídio qualificado, a pena a aplicar deve ser próxima do mínimo legalmente previsto, pois o arguido considera a pena excessiva porque na decisão recorrida a culpa que lhe é atribuída surge como “fortemente penalizadora” para si, quando, na sua perspectiva, há circunstâncias que apontam para a sua atenuação, pelo que, a entender-se que se configura um crime de homicídio qualificado, e não homicídio simples como é sua pretensão, sempre a pena deverá ser próxima dos 12 anos de prisão.

27 - Pois o Recorrente praticou o crime sob forte emoção e impulso do momento, não planeou a sua acção, não meditou no crime antes de o executar, não houve premeditação.

28 - A pena visa não só a punição mas também a ressocialização do agente.

29 - O Recorrente está bem inserido, tanto social como familiarmente.

30 - O Recorrente sempre trabalhou, é uma pessoa considerada e respeitada pelas pessoas que o conhecem.

31 - A medida da pena aplicada ao Recorrente é excessiva, desproporcionada e de severidade injustificada, tendo ultrapassado em muito a medida da culpa e na sua perspectiva, havia circunstâncias, como a ausência de antecedentes criminais, bom comportamento anterior e boa inserção social, com forte peso atenuativo.

32 - Uma pena tão elevada também prejudica a ressocialização do Recorrente, pois o mesmo na data da prática do crime tinha 52 anos e ao cumprir uma pena excessivamente longa prejudica a reintegração do arguido na sociedade, deve ser dada uma oportunidade ao agente para se reintegrar na sociedade.

33 - O Recorrente não era, como não é, um cadastrado, um psicopata, pelo que a pena aplicada pelo Tribunal "a quo" é de uma extrema violência, impedindo que o Recorrente, com 53 anos de idade, tenha uma nova oportunidade de viver em sociedade livremente.

34 - O Recorrente sempre trabalhou, tem uma família que o apoia, beneficia, desde a sua detenção, da visita das suas filhas, irmãs, sobrinhos e demais familiares com regularidade.

35 - De onde se conclui, salvo o devido respeito, que o douto acórdão “sub judice” não respeitou a globalidade dos parâmetros considerados adequados (cfr. artigo 71.º, n.ºs 1 e 2, do Código Penal), afigurando-se a medida concreta das penas fixadas globalmente desproporcionada em função da factualidade apurada.

Termina pedindo que sendo dado provimento ao recurso se altere a qualificação jurídica do crime de homicídio para o crime de homicídio simples ou, se assim não se entender...

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