Acórdão nº 1459/05.5GCALM-A de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 28 de Setembro de 2016

Magistrado ResponsávelROSA TCHING
Data da Resolução28 de Setembro de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Recurso de revisão[1] Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I. RELATÓRIO 1.AA, devidamente identificado nos autos veio, ao abrigo do disposto nos artigos 449º, nº1, al. d) e nº3, à contrario, 450º, nº1, al. c) e 451º, nº1, todos do Código de Processo Penal e artigo 29º, nº 6 da Constituição da República Portuguesa, interpor recurso extraordinário de revisão do acórdão proferido, em 3 de Janeiro de 2014. no processo comum, com intervenção do tribunal colectivo, nº 1459/05.5GCALM, do, então, .... Juízo Criminal da Comarca de ..., integralmente confirmado pelo acórdão do Tribunal da Relação de ..., de 15 de Outubro de 2014, e que o condenou: - pela prática, em concurso efetivo, de um crime de homicídio simples, p. e p. pelo art. 131º do Código Penal, perpetrado na pessoa de BB, na pena de 12 anos de prisão, e de dois crimes de homicídio qualificado perpetrados contra CC e DD, p. e p. pelos arts. 131º e 132º, nºs 1 e 2, alíneas f) e i), do Código Penal, na pena parcelar, por cada um deles, de 17 anos de prisão.

- E, em cúmulo jurídico destas penas parcelares, na pena única de 25 anos de prisão.

- a pagar ao ofendido e assistente EE, a título de danos não patrimonias, resultantes da conduta ilícita e culposa do arguido, a quantia de € 50.000,00 (cinquenta mil euros).

  1. São os seguintes os fundamentos de recurso, expressos nas conclusões da respectiva motivação, que se transcrevem: « 1.O requerente AA foi condenado, a 03 de Janeiro de 2014, em 1ª Instância no ... Juízo Criminal do Tribunal de Família e Menores e de Comarca de ..., pela prática em concurso real efetivo de um crime de homicídio simples (perpetrado contra BB) na pena de doze (12) anos de prisão, e de dois crimes de homicídio qualificado (perpetrados contra CC e DD) na pena parcelar, por cada um deles, de dezassete (17) anos de prisão e, em cúmulo jurídico na pena única de vinte e cinco (25) anos de prisão.

  2. Dessa decisão interpôs recurso para o Venerando Tribunal da Relação de ..., vindo, em 15 de Outubro de 2014, a ser notificado do douto aresto que confirmou a decisão de 1.ª Instância na pena única de vinte e cinco (25) anos de prisão. Quanto ao que, uma vez mais, não conformado com o teor do douto aresto do Tribunal da Relação de ... interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça reivindicando Justiça para a sua condenação, vindo a, 19 de Março de 2015, ser notificado da rejeição do mesmo e confirmação da pena única de vinte e cinco (25) anos de prisão pela prática daqueles ilícitos.

  3. O presente recurso extraordinário de revisão de sentença tem como objecto a decisão que recaiu nestes autos e donde adveio a condenação - já transitada em julgado - do requerente na pena única de vinte e cinco (25) anos de prisão.

  4. O Requerente AA lança mão desta possibilidade recursória por - para lá da injustiça que branda aos céus ab initio da sua constituição como arguido - ter tido conhecimento, nas semanas posteriores ao início do cumprimento da pena que lhe foi aplicada nestes autos, portanto há poucos meses, da existência de factualidades do conhecimento directo das testemunhas que elencou no requerimento de interposição da presente petição que - sejam isoladamente considerados, sejam globalmente aferidos - colocam em dúvida quer a Justiça da sua condenação, quer o fundamento da própria decisão.

  5. Como V /Ex.as podem constatar, dos depoimentos destas testemunhas, resultam novos factos e novos meios de prova que abalam - por completo - a prova produzida nestes autos na perspectiva utilizada para a condenação do requerente AA e, de certo modo, alinham argumentos que possibilitam dilucidar quem terá, eventualmente, praticado os ilícitos objecto deste processo.

  6. Com efeito, estas novas factualidades advenientes dos novos meios de prova - seja pela sua justificada oportunidade e originalidade, seja pela isenção, verosimilhança e credibilidade - impõem que, pela gravidade das mesmas, se caracterize como qualificada a dúvida sobre a justiça da condenação do requerente e se coloque, necessariamente, em causa a estabilidade do julgado.

  7. Efetivamente, estes novos factos, ante a sua ressonância na prova produzida, exigem que, por impossibilidade de coexistência com a estabilidade do caso julgado, se proceda a um novo julgamento do processo e à prolação de urna nova decisão que leve em conta a existência destas factualidades.

  8. Como melhor afirmam Simas Santos e Leal Henriques, a presente providência assenta a sua esfera de gravidade no equilíbrio ténue entre a imutabilidade da sentença decorrente do caso julgado e a necessidade de respeito pela verdade material.

  9. Com esta petição, e com tudo o que em sua decorrência se venha a extrair, é uma nova decisão judicial que se substitua através da repetição do julgamento, a uma outra já transitada em julgado.

  10. Petição extraordinária de revisão que se estriba em vícios ligados à organização do processo que conduziu à decisão ora posta em causa, nomeadamente ao surgimento de novos factos totalmente desconhecidos aquando do julgamento destes autos.

  11. E é interposta ao abrigo do que se encontra preceituado, entre outros, no n.º 6 do artigo 29.° da Constituição da Republica Portuguesa e artigo 449.°, nº 1 alínea d) do Código de Processo Penal.

  12. O Tribunal de l.ª instância, mais tarde o Tribunal da Relação de ... e posteriormente o Supremo Tribunal de Justiça fundamentaram a condenação do requerente AA, única e exclusivamente, em meios de prova indirectos e na livre convicção que os mesmos faziam crer ao julgador.

  13. Mesmo quando o requerente AA tendo prestado declarações ao longo de todo o processo clamava a alto e bom som (para quem se predispôs a ouvi-lo), que não tinha praticado os crimes pelos quais foi condenado.

  14. Declarações que, pese embora suportadas pela prova testemunhal produzida nos autos, foi totalmente descurada por quem julgou e o condenou.

  15. Circunstância que não é repudiada no acórdão de l.ª Instância, porquanto se menciona no mesmo que a condenação do requerente resulta de " ... uma série de meios de prova indirectos.", porque, efetivamente, de directo nenhum elemento de prova existe que permita corroborar a condenação do requerente.

  16. E convenhamos, no rigor dos princípios, inexistem nos autos qualquer prova documental, pericial ou testemunhal que permita ou autorize, sem controvérsia, provar ainda que a título indiciário a verificação dos elementos constitutivos dos crimes de homicídio qualificado pelos quais se encontra a cumprir pena.

  17. Impõe-se pois questionar, em que base probatória se sustentou a condenação do requerente AA.

  18. Questão que sai reforçada com o facto de que depois de ser confrontado com a efectiva prisão ter sabido da existência de testemunhas que detêm conhecimento directo das factualidades pelas quais foi condenado e que nunca deram a conhecer aos autos essas informações, e outras testemunhas que, já tendo dado palavra ao que conheciam nesta matéria, são ora portadoras de novos factos directamente relacionados com o objecto do processo e que, individual ou globalmente considerados, colocam em dúvida a justiça da decisão e atestam, indubitavelmente, a inocência do requerente AA.

  19. Efetivamente os meios de prova - indirectos - utilizados na fundamentação da condenação do requerente AA, nos diversos patamares judiciais por onde o processo transitou, encontram-se, nesta data, irremediavelmente abalados pelos que surgiram nas últimas semanas e foram dados a conhecer ao requerente, nomeadamente as referidas testemunhas entretanto conhecidas.

  20. Dai que o requerente AA, somente depois de tomar conhecimento da existência destas testemunhas, infra descriminadas e melhor identificadas no requerimento de interposição desta petição, se determinou a apresentar a presente petição de revisão.

  21. Testemunhas cujos depoimentos atestam, sem qualquer margem para dúvidas, que o requerente AA não praticou os factos pelos quais foi condenado e, nesta data, se encontra, injustamente, a cumprir pena de prisão.

  22. De forma sintética e como se aflorou acima, são dois os conjuntos de testemunhas que estribam esta petição de revisão e que criam graves e fundadas dúvidas sobre a justiça da decisão proferida nestes autos: um primeiro conjunto de seis testemunhas, cuja existência e o conhecimento que as mesmas têm das factualidades conexas com o processo, o requerente AA ignorava por completo; e um segundo conjunto de três testemunhas que, pese embora hajam sido ouvidas em algumas fases do decurso do processo, são conhecedoras de novos factos directamente correlacionados com a decisão pela qual o requerente AA foi condenado.

  23. Do primeiro grupo fazem parte: FF; GG; HH; II; JJ e LL.

  24. Do segundo grupo constam: MM; NN e OO.

  25. Dos depoimentos das testemunhas elencadas no primeiro grupo resultam a existência de novos factos, totalmente desconhecidos até há poucas semanas para o requerente AA, que, como melhor se descreveu na motivação desta petição e para onde se remete a douta apreciação de V/Ex.as, abalam por completo a prova produzida nos autos e vertida na decisão.

  26. Já, dos depoimentos das testemunhas elencadas no segundo grupo resultam, igualmente, a existência de novos factos, totalmente desconhecidos até há poucas semanas para o requerente AA e para o próprio processo, que, como melhor se descreveu na motivação desta petição e para onde se remete a douta apreciação de V/Ex.as, abalam por completo a prova produzida nos autos e vertida na decisão.

  27. Por conseguinte, estes novos factos para lá de reforçarem a convicção de que os elementos probatórios nos autos não permitem o preenchimento dos elementos constitutivos dos tipos de crime imputados ao requerente AA - nas circunstâncias de tempo, modo e lugar da acção criminosa - atestam, insofismavelmente, que o mesmo é totalmente inocente dos crimes pelos quais foi condenado e que a decisão prolatada no processo é manifestamente injusta.

  28. O requerente AA não questiona a bondade da decisão, nem tão pouco a sua honestidade intelectual, tomada...

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