Acórdão nº 231/02.9GNPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 11 de Novembro de 2009

Magistrado ResponsávelMARIA DO CARMO SILVA DIAS
Data da Resolução11 de Novembro de 2009
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REC PENAL.

Decisão: PROVIDO.

Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO - LIVRO 595 - FLS 205.

Área Temática: .

Sumário: A opção legislativa em 2001 (Lei 77/2001, de 13.7) foi a de abandonar a possibilidade de punir com pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor aquele que for condenado por crime cometido no exercício de condução com grave violação das regras de trânsito rodoviário, a menos que a sua conduta integre ainda os crimes indicados no artigo 69º, n.º 1, al. a) do Código Penal.

Reclamações: Decisão Texto Integral: (proc. n º 231/02.9GNPRT.P1)*Acordam, em conferência, os Juízes do Tribunal da Relação do Porto:*I- RELATÓRIO No .º Juízo de Competência Criminal do Tribunal Judicial da Maia, nos autos de processo comum (tribunal singular) nº 231/02.9GNPRT, foi proferida sentença, em 15/7/2008 (fls. 494 a 505 do 3º volume), constando do dispositivo o seguinte: “Pelo exposto, julgo a acusação procedente, por provada, e, em consequência, condeno o arguido B………. pela prática, em autoria material, de um crime de homicídio por negligência, previsto e punido nos termos dos artigos 15-b), 137 nº1, ambos do Código Penal, numa pena de 220 (duzentos e vinte) dias de multa, à taxa diária de € 4,00 (quatro euros), num total de € 880,00 (oitocentos e oitenta euros) e na pena acessória de proibição de conduzir veículo com motor por 5 (cinco) meses.

Determino que o arguido proceda à entrega do título que o habilita ao exercício da condução de veículos a motor neste tribunal, ou em qualquer posto policial, e nos 10 dias subsequentes ao trânsito em julgado da presente sentença (art. 69 nº 3 do CP e 500 nº 2 do CPP), sob pena de incorrer na prática de um crime de desobediência, previsto e punido nos termos do artigo 348 nº 1-b) do Código Penal, e ser ordenada a apreensão do veículo (art. 500 nº 2 e 3 do CPP).

Advirto, o exercício da condução de tais veículos no período de proibição constitui conduta proibida e punida por lei como crime de violação de proibição, previsto e punido nos termos do artigo 353 do Código Penal.

(…) Comunique ao IMTT, nos termos dos artigos 69 nº 4 do Código Penal e 500 nº 1 do Código de Processo Penal.

Notifique e deposite (art. 372, nº 5, do CPP).

(…)”*Não se conformando com a sentença, apenas no que respeita à condenação do arguido em pena acessória, o Ministério Público interpôs recurso dessa decisão (fls.521 a 526), formulando as seguintes conclusões: 1. O arguido foi condenado pela prática, em autoria material, de um crime de homicídio por negligência p. e p. pelo artigo 137 nº 1 do CP, na pena de 220 dias de multa, à taxa diária de € 4,00, num total de € 880,00, e na pena acessória de proibição de conduzir veículo com motor por cinco meses.

  1. Todavia, ao crime de homicídio por negligência p. e p. pelo artigo 137 nº 1 do CP, não corresponde qualquer sanção acessória.

  2. A sentença recorrida fundamentou a sanção acessória no disposto no art. 69 nº 1-b) do CP, invocando a utilização de veículo na prática do crime pelo qual o arguido foi condenado.

  3. Todavia, tal preceito exige a verificação cumulativa de duas condições: crime cometido com utilização de veículo e cuja execução tiver sido por este facilitada de forma relevante.

  4. No caso em apreço, o crime foi cometido com a utilização de veículo, mas nem da acusação, nem da sentença resulta que a utilização de tal veículo facilitou de forma relevante a execução do crime.

  5. Com efeito, não se trata de crime que poderia ser cometido sem a utilização de veículo, e que se tornou significativamente de mais fácil execução devido a tal utilização.

  6. O artigo 69 nº 1-b) do CP, aplica-se apenas a crimes dolosos em que a utilização de veículo constitui instrumento do crime, facilitando tal utilização de forma significativa, a sua execução.

  7. Assim, exigindo este preceito a verificação cumulativa de duas condições, não pode aplicar-se, de forma automática, a casos de crimes cometidos com a má utilização de veículo, sem mais.

  8. Face ao exposto, o arguido não pode ser condenado na pena acessória de proibição de conduzir.

  9. Ao condenar o arguido na sanção acessória de proibição de conduzir a sentença recorrida violou o disposto no artigo 69 nº 1-b) do CP; bem como o princípio da legalidade das penas, consagrado no art. 29 nº 1 da Constituição da República Portuguesa e art. 1 do CP.

    Termina pedindo o provimento do recurso, com a consequente revogação parcial da sentença recorrida, no que respeita à condenação do arguido em pena acessória de proibição de conduzir veículo a motor por cinco meses.

    *Na 1ª instância não foi apresentada resposta ao recurso.

    *Nesta Relação, o Sr. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer (fls. 543), concluindo pelo provimento do recurso, acrescentando que, se assim não fosse, a sentença deveria ser considerada nula por incumprimento do disposto no art. 358 nº 1 e 3 do CPP (invocando ainda acórdão de fixação de 25/6/2008).

    *Foi cumprido o disposto no art. 417 nº 2 do CPP.

    Feito o exame preliminar e, colhidos os vistos legais, realizou-se a conferência.

    Cumpre, assim, apreciar e decidir.

    *Na sentença sob recurso foram considerados provados os seguintes factos: “1. No dia 3 de Maio de 2002, cerca das 19h, o arguido B………. encontrava-se no stand “C……….”, nº …., sito na Estrada Nacional .., km 10.1, ………., concelho da Maia, do lado direito da estrada atento o sentido de trânsito ………./……… .

  10. Vindo do interior dessa propriedade, o arguido iniciou a condução do veículo automóvel de matrícula QX-..-.., visando tomar o sentido de trânsito ………./………. daquela via, tendo para tanto que virar à esquerda ao sair daquele stand.

  11. Assim, naquelas condições de tempo e lugar, quando o trânsito se encontrava fluido, mas compacto, atento o sentido de marcha ………/………., e sem trânsito no sentido contrário, o arguido saiu com a viatura referida em 2. do stand referido em 1. e entrou na via a fim de virar à esquerda, sendo que o fez de forma rápida e num único acto, não fazendo a perpendicular ao virar à esquerda, não parando no eixo da via para ver se tinha de dar prioridade a alguém que viesse da esquerda, em ultrapassagem, sendo que ao sair do stand não tinha visibilidade para esse local atento o trânsito que se fazia sentir.

  12. Nessas circunstâncias de tempo e lugar, D………., conduzindo o motociclo ..-..-NR, circulava no sentido ………./………. daquela via, a efectuar ultrapassagem aos veículos que seguiam no seu sentido de marcha.

  13. Acontece que dado o arguido ter efectuado a manobra de virar à esquerda quando saía do stand referido em 1., não fazendo a perpendicular, nem parando no eixo da via para ver se tinha de dar prioridade a alguém que viesse da sua esquerda, ainda que em ultrapassagem, como devia e podia ter feito, levou a que aquele D………., que efectuava uma manobra de ultrapassagem no seu motociclo a outras viaturas, em local que podia fazer, por ali existir linha descontínua, embatesse, junto à linha delimitadora descontínua, já no sentido ……….-………., com a parte frontal do seu motociclo (NR) na parte lateral frontal do veículo automóvel conduzido pelo arguido (QX).

  14. Na sequência do embate D………. foi projectado para cima, embateu lateralmente no capô do QX, caindo no chão, ficando o seu corpo imobilizado na faixa de rodagem do seu sentido de marcha perto do stand referido em 1..

  15. Como consequência directa e necessária do embate e queda referidos em 5., D………. sofreu as lesões traumáticas descritas no relatório de autópsia constante de fls. 40 a 47, cujo teor aqui se dá por reproduzido, nomeadamente e ao nível: a) cabeça: - meninges: hemorragia sub-dural posterior e bilateral; - encéfalo: sangue em todos os ventrículos; b) tórax: - paredes: fractura com infiltração sanguínea dos bordos, do pericárdio parietal anterior; - pericárdio e cavidade pericárdica: laceração com infiltração sanguínea dos bordos, do pericárdio parietal anterior; - aorta: secção, de forma linear, de direcção horizontal, de bordos infiltrados de sangue, localizada na aorta ascendente, infrapericárdica; - pleura e cavidades pleurais: sangue nas cavidades pleurais, na quantidade respectiva de cinquenta centímetros cúbicos à direita, mil centímetros cúbicos à esquerda; - pulmão direito: focos de contosão e infraparenquimatosos; - pulmão esquerdo: lacerações com infiltração sanguínea, hilares, atelectásia; - mediastino: infiltração sanguínea do mediastino.

  16. As lesões traumáticas meningo-encefálicas e toráxicas descritas em...

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