Acórdão nº 487/07.0TAETZ.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 07 de Novembro de 2009

Data07 Novembro 2009

S Meio Processual: RECURSO PENAL Decisão: NÃO PROVIDO Sumário: 1. O facto do julgador na sua apreciação da prova ter feito ressalvas ao depoimento de uma testemunha, médico do arguido, não configura qualquer erro notório na apreciação da prova pela singela razão de tal depoimento não configurar prova pericial e estar sujeito, como qualquer depoimento ou como os documentos juntos pela defesa à livre apreciação daquele.

Decisão Texto Integral: Acordam, precedendo conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora:I No Tribunal Judicial de Estremoz, sob acusação do Ministério Público, foi submetido a julgamento em processo comum, perante juiz singular, o arguido F.

, melhor identificado nos autos, pela prática, em autoria material de dois crimes de injúria agravada, p. e p. pelos art.181.º n.º1e 184.º do Código Penal, com referência aos art. 183.º n.º1, alin. a) e 132.º n.º2, alin. l) do mesmo diploma legal.

Foram formulados pedidos de indemnização civil pelos ofendidos J.R. e A.P. por danos não patrimoniais.

O arguido apresentou contestação.

Realizado o julgamento, o tribunal, por sentença publicada no dia 2 de Março de 2009, julgou a acusação procedente e parcialmente procedentes os pedidos de indemnização civil, e, em consequência, decidiu:

  1. Condenar o arguido pela prática de cada um dos sobreditos crimes de injúria agravada nas penas parcelares de 80 (oitenta) dias de multa, à razão diária de €7,5 (sete euros e cinquenta cêntimos), e, em cúmulo jurídico, na pena única de 120 (cento e vinte) dias de multa, o que, à razão diária de €7,5, perfaz a importância global de €900,00 (novecentos euros); b) Condenar o arguido/demandado a pagar aos demandantes J.R. e A.P. a importância de €1.000,00 (mil euros), a cada um deles, acrescida de juros calculados à taxa legal desde a citação até efectivo e integral pagamento; Inconformado, o arguido veio interpor recurso daquela sentença, nos termos constantes de fls.212 a 226.

    Extraiu da respectiva motivação as seguintes conclusões: 1:ª - A sentença é nula por não ter valorado os documentos que corporizam as facturas da “Elos” comprovativas de que o arguido na data e à hora que constam da acusação, não podia estar no Mercado Abastecedor…, porque estava nesse dia e a essa hora no Armazém da Grula em….

    1. - Nula, também, porque não levou em conta todos os factos relevantes para a decisão.

    2. - Verifica-se erro notório na apreciação da prova – art. 410.º, n.º2, alin. c) - na medida em que na audiência de julgamento foi discutida e provada matéria de facto que, levada em linha de conta, conduziria por si só à absolvição do arguido, ou, quando muito e complementada com outros factos que foram testemunhal e documentalmente provados, conduziria a que se tivesse reconhecido que quando a queixa deu entrada no tribunal estava já prescrito o direito de a exercer.

    3. - As facturas do grossista "Elos" de que o arguido juntou cópias e cujos originais exibiu a título devolutivo por integrarem a sua contabilidade e escrita organizada, como justificou - foram injustificadamente desvalorizados na sentença recorrida.

    4. - A desvalorização desses documentos só também pode ter sido consequência de uma percepção incorrecta dos seguintes depoimentos da testemunha M. A. e do próprio arguido, por isso que em cumprimento do preceituado nos n°s 3 e 4, do artigo 412°, do CPP, o recorrente entende que o tribunal a quo teve uma percepção incorrecta, não valorando adequada e correctamente esses depoimentos, que se transcrevem: B – M.A.: 30-01-2009, minuto 15:41:22 a minuto 16:12:44, mais precisamente: a) - 20090130155455_23072...11:09 a 12:11 - MANDATÁRIO DO ARGUIDO: «O seu pai está aqui a ser acusado de no dia 20 de Julho desse ano, no Mercado Abastecedor, ter tido uma discussão com os dois fiscais, o Sr. R. e o Sr. P. de ter chamado, aos dois fiscais, no dia 20 de Julho, duas vezes "corruptos" aos Srs. Fiscais. Eu comecei por lhe perguntar se tinha havido mais alguma discussão.

    Desculpe mas em Julho não há cerejas.

    MANDATÁRIO DO ARGUIDO: «Mas pode haver discussões. Mas podia ter havido alguma briga em Julho, ou alguma discussão, sem ter sido a das cerejas.» «Não, mas não houve porque nós nunca mais fomos ao Mercado Abastecedor.» MANDATÁRIO DO ARGUIDO: «Não tem dúvidas disso?» «Não, não tenho dúvidas. Só voltámos a ir ao Mercado Abastecedor este ano, em Janeiro».

  2. - 20090130155455_23072...16:30 a 16:53 - MANDATÁRIO DO ARGUIDO: «Era possível ter havido, depois desta discussão, alguma outra discussão no Mercado Abastecedor, sem você saber?» «Não» MANDATÁRIO DO ARGUIDO: «Porque é que diz isso assim?» «Porque nós nunca mais lá fomos».

    C - ARGUIDO: F... - 09-02-2009, minuto 10:56:47 a minuto 10:58:05, mais precisamente: a) - 20090209111025_23072...00:00/01:17 - «Sr. Dr. Juiz, eu no dia em que estou a ser acusado, eu não estava no Mercado; eu andei a trabalhar todo o dia com o meu camião e desloquei-me à GRULA, a…, a carregar duas vezes, e a última vez foi cerveja e em quantidade e levei o camião grande.

    JUIZ - «Portanto no dia que consta da acusação não...» «Sim. Eu às seis da tarde não estava no Mercado.

    JUIZ - «Mas há pessoas que o colocam lá naquela, naquela circunstância de espaço e de tempo.» «Mas Sr. Dr. Juiz, eu tenho a factura da mercadoria que fui comprar, e a essa hora.» JUIZ - «São essas as suas declarações não é?» «Sim, Sr. Dr. Juiz».

    1. - Houve erro notório na apreciação da prova sendo apontadas injustificadas ressalvas ao depoimento médico de uma testemunha sem qualquer suporte técnico-científico de valor superior ou ao menos idêntico ao da mesma testemunha - médico -.

    2. - Houve erro notório na apreciação da prova posto nenhuma testemunha arrolada pelo M° P° e/ou pelos queixosos ter afirmado que os factos descritos na acusação ocorreram em 20 de Julho ou sequer em Julho.

    3. - Houve erro notório na apreciação da prova ao dar-se como provado que "em virtude do comportamento do demandado/arguido, descrito nos autos, algumas pessoas, mormente comerciantes do referido mercado, começaram a olhar para aqueles com desconfiança e apreensão, porquanto nenhuma prova foi a tal propósito produzida.

    4. - O arguido-demandado foi condenado a pagar a cada demandante €1.000,00, acrescidos de juros calculados à taxa legal desde a citação até efectivo e integral pagamento quando, mesmo atendendo aos factos que foram dados como provados e atendendo a critérios de parcimónia, ajuste e moderação, nunca as indemnizações arbitradas deveriam ter sido em valores superiores a € 600 cada uma.

    5. - Em suporte da decisão proferida quanto aos pedidos de indemnização deduzidos contra o arguido, foi invocado na sentença o preceituado nos art°s 562° e 566°, n° 2 do CC.

    6. - Ao fixar o montante da indemnização correspondente aos danos não patrimoniais, o juiz tem necessidade de recorrer à equidade, ao prudente arbítrio e ao bom senso, para que o respectivo valor seja actualizado, retratando a situação existente no momento do encerramento da discussão, por isso que tal montante não vence juros a contar da citação.

      12.º - A regra «in illiquidis non fit mora», expressa no n° 3 do art. 805° do CC é Justificada pelo facto de o devedor não poder cumprir enquanto se não apura o objecto da prestação. É necessário, antes de mais, que o devedor saiba quanto deve.

    7. - O arguido nunca, em qualquer caso, poderia ter sido condenado a pagar juros a partir da citação (enfim, da notificação para contestar os pedidos civis de indemnização).

      O Ministério Público respondeu ao recurso nos termos constantes de fls.249 a 252, sustentando a sua improcedência, concluindo nos seguintes termos: “ 1 – A prova, testemunhal e documental produzida em sede de audiência de julgamento, foi correctamente apreciada e valorada; 2 – Não existe qualquer nulidade da sentença recorrida, nomeadamente ao nível de qualquer contradição entre a prova produzida e os factos dados como provados; 3 – A decisão recorrida não merece qualquer reparo pelo que o recurso interposto deverá ser julgado totalmente improcedente.” Responderam também ao recurso os demandantes cíveis, A.P.

      e J.R.

      nos termos constantes de fls.246 e 247, defendendo a manutenção da sentença recorrida.

      O recurso foi admitido por despacho proferido em 12 de Maio de 2009 (v.fls.254).

      Nesta Relação, a Senhora Procuradora-Geral Adjunta, teve vista dos autos e emitiu o douto parecer de fls.263 a 267 no sentido da improcedência do recurso.

      Cumprido o disposto no n.º2 do art. 417.º do CPP, efectuado o exame preliminar e colhidos os vistos legais, teve lugar a conferência, cumprindo agora decidir: É consabido que o objecto do recurso é extremado pelo teor das conclusões que cada recorrente extrai da correspondente motivação, conforme o n.º 1 do art. 412.º do Código de Processo Penal, sem prejuízo para a apreciação das questões de oficioso conhecimento e de que ainda se possa conhecer [v. Ac do STJ de 3.2.99, BMJ 484, pág 271; Ac do STJ de 25.6.98, BMJ 478, pág. 242; Ac do STJ de 13.5.98, BMJ 477, pág. 263; Simas Santos/Leal Henriques, Recursos em Processo Penal, pág. 48; Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, III, pág. 320 e 321].

      Das conclusões, supra transcritas, com referência à motivação do recurso, resulta que o recorrente invoca a nulidade da sentença, a existência do vício de erro notório na apreciação da prova, impugna a matéria de facto e, por último, sustenta que as indemnizações arbitradas não deveriam exceder €600,00 cada uma e que os juros de mora não são devidos desde a citação/notificação.

      São, pois, estas as questões que reclamam solução.

      II - Fundamentação Importa, antes de mais, elencar a matéria de facto que o tribunal recorrido deu como provada e não provada, bem como a fundamentação do julgado.

      Na sentença recorrida foram considerados provados os seguintes factos: 1 – No dia 20 de Julho de 2007, a hora não concretamente apurada, contudo compreendida entre as 17h00m e as 18h00m, no Mercado Abastecedor …, o arguido, detentor do cartão de vendedor n.º …, dirigiu-se...

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