Acórdão nº 122/07.7GCACB.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 17 de Junho de 2009

Magistrado ResponsávelJORGE GON
Data da Resolução17 de Junho de 2009
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

I – RELATÓRIO 1.

No processo comum com intervenção do tribunal singular registado sob o n.º122/07.7GCACB, a correr termos no 3.º Juízo do Tribunal Judicial de Alcobaça, o arguido F..., melhor identificado nos autos, foi submetido a julgamento pelos factos constantes da acusação deduzida nestes autos pela imputada prática de «uma contra-ordenação ao disposto no art. 30.º, n.º1 e 2 do Código da Estrada e, por via dela e pela sua incúria e imperícia, um crime de homicídio por negligência, p. e p. pelo art. 137.º, n.º1, do Código Penal» (cfr. fls. 88 a 90).

O Instituto da Segurança Social, I.P., através do Centro Nacional de Pensões veio, a fls. 111-118, deduzir contra AXA Portugal, Companhia de Seguros, S.A. pedido de reembolso das prestações da Segurança Social que, por morte de J..., pagou ao cônjuge sobrevivo e aos filhos menores deste, a título de subsídio por morte e pensões de sobrevivência, no montante global de 6.012,58 €, acrescido das pensões que se vencerem e sejam pagas na pendência da acção, até ao limite da indemnização a conceder, bem como os respectivos juros de mora legais, desde a data da citação até integral e efectivo pagamento.

A fls. 119 e seguintes, D..., cônjuge sobrevivo de J..., e C... e G..., filhos menores de J... e representados pela primeira, vieram deduzir pedido de indemnização civil contra AXA Portugal, Companhia de Seguros, S.A., peticionando a condenação desta no pagamento da quantia global de 361.140 €, correspondente ao dano da perda do direito à vida e aos danos morais sofridos por J..., aos danos não patrimoniais sofridos pelos três demandantes e, ainda, aos danos patrimoniais, relativos ao motociclo e danos com incidência futura, acrescendo juros à taxa legal, a contar da notificação da demandada para contestar.

No decurso da audiência de julgamento, o Instituto da Segurança Social, I.P. – Centro Nacional de Pensões requereu a ampliação do pedido, o que foi deferido nos termos do despacho de fls. 283.

Realizado o julgamento, foi proferida sentença que decidiu: - Condenar o arguido pela prática, em autoria material, de um crime de homicídio por negligência, p. e p. pelos artigos 13.º, in fine, 15.º, al. b), e 137.º, n.º1, do C.P., na pena de 11 (onze) meses de prisão, que, nos termos conjugados dos artigos 43.º, n.º1, e 47.º, n.º1, do C.P. na redacção introduzida pela Lei n.º59/07, de 4.09, foi substituída por 330 (trezentos e trinta) dias de multa, à razão diária de 15 € (quinze euros), o que perfaz o montante total de 4.950 € (quatro mil novecentos e cinquenta euros); - Condenar o arguido, pela prática de uma contra-ordenação grave, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 35.º, n.º1, e n.º2, al. a), 131.º, 132.º, 135.º, n.º1 e n.º3, al. a), 136.º, n.º3, 138.º, nºs 1, 3 e 4, 145.º, al. f), e 147.º, nºs 1 e 2, do Código da Estrada, aprovado pelo D.L. n.º114/94, de 3.05, alterado pelo D.L. n.º265-A/01, de 28.09, e pelo D.L. n.º44/2005, de 23.02, na sanção acessória de inibição de conduzir pelo período de 6 (seis) meses, «devendo, no prazo de 15 dias úteis a contar do trânsito em julgado da presente sentença, proceder à entrega na secretaria deste Tribunal, ou em qualquer posto policial, da sua carta de condução, sob pena de incorrer em crime de desobediência, conforme disposto no artigo 160.º, nºs 1 e 3, do mesmo diploma»; - Julgar o pedido de indemnização civil de D..., C... e G... parcialmente procedente, condenando a demandada a pagar: a) a quantia de 4.298 € (quatro mil duzentos e noventa e oito euros), a título de danos patrimoniais, a repartir pelos três herdeiros, acrescida dos respectivos juros de mora, vencidos e vincendos, calculados à taxa legal dos juros civis em vigor em cada momento, desde a citação até integral pagamento; b) à demandante D..., a quantia global de 69.480,95 € (sessenta e nove mil quatrocentos e oitenta euros e noventa e cinco cêntimos), a título de danos não patrimoniais e danos patrimoniais futuros, acrescida de juros de mora, calculados à taxa legal dos juros civis em vigor em cada momento, desde a sentença e até integral pagamento, e deduzindo as prestações que a Segurança Social-Caixa Nacional de Pensões pagou e vier a pagar a título de pensão de sobrevivência; c) à demandante C..., a quantia global de 46.276,52 € (quarenta e seis mil duzentos e setenta e seis euros e cinquenta e dois cêntimos), a título de danos não patrimoniais e danos patrimoniais futuros, acrescida de juros de mora, calculados à taxa legal dos juros civis em vigor em cada momento, desde a sentença e até integral pagamento, e deduzindo as prestações que a Segurança Social-Caixa Nacional de Pensões pagou e vier a pagar a título de pensão de sobrevivência; d) ao demandante G..., a quantia global de 50.695,91 € (cinquenta mil seiscentos e noventa e cinco euros e noventa e um cêntimos), a título de danos não patrimoniais e danos patrimoniais futuros, acrescida de juros de mora, calculados à taxa legal dos juros civis em vigor em cada momento, desde a sentença até integral pagamento, deduzindo as prestações que a Segurança Social-Caixa Nacional de Pensões pagou e vier a pagar a título de pensão de sobrevivência; e e) absolvendo a demandada do demais peticionado; - Julgar o pedido de indemnização civil do Instituto da Segurança Social, I.P. – Centro Nacional de Pensões parcialmente procedente e, em consequência: a) condenar a demandada a pagar-lhe a quantia de 5.400,60 € (cinco mil e quatrocentos euros e sessenta cêntimos), acrescida das prestações vincendas que a primeira pagar, a título de pensão de sobrevivência, a D..., C... e G..., e dos juros de mora vencidos e vincendos desde a citação até integral pagamento, calculados à taxa legal em vigor em cada momento; b) absolvendo-a do demais peticionado.

condenar a arguida na pena de 100 (cem) dias de multa, à taxa diária de € 6,00 (seis euros), o que perfaz o montante de € 600,00 (seiscentos euros), pela prática, como autora material de um crime de ofensa à integridade física por negligência, p. e p. pelo artigo 148.º, n.º 1, do Código Penal.

Tal sentença foi objecto de despacho de aclaração (cfr. fls. 443).

  1. Inconformados, o arguido e a demandante civil D..., por si e em representação dos seus filhos, recorreram da sentença, formulando, nas respectivas motivações, as seguintes conclusões: 2.1. Recurso do arguido (transcrição): «1.ª- Pela douta sentença em crise foi o ora recorrente condenado: a)- pela prática, em autoria material, de um crime de homicídio por negligência, p. e p. pelos arts. 13°, in fine, 15°, aL. b), e 137°, n.º 1, todos do CP, na pena de 11 meses de prisão, substituída por 330 dias de multa, à taxa diária de € 15, num total de € 4.950, nos termos dos arts. 43°, n.º 1, e 47°, n.º 1, do mesmo diploma, na redacção introduzida pela Lei n° 59/2007, de 4/9; b)- pela prática de uma contra-ordenação grave, p. e p. pelos arts. 35.º, n.º 1 e n.º 2, aL. a), 131.º,132.º,135.º, n.º1 e n° 3, al. a), 136.º, n.º 3, 138°, n.º 1, 3 e 4, 145°, al. f), e 147.º, n.º 1 e 2, todos do Cód. da Estrada, na sanção acessória de inibição de conduzir pelo período de 6 meses.

    1. - O Tribunal a quo deu como provado que «[o] arguido, atentas as concretas circunstâncias de tempo, modo e lugar em que circulava e a sua capacidade pessoal, devia e podia ter efectuado a manobra descrita em 2) cedendo a passagem ao motociclo identificado em 3) e sem causar perigo para a circulação deste, assim como devia e podia prever o resultado da sua conduta» (facto descrito sob o n.º 15 da douta sentença recorrida).

    2. - Dado que tal facto não foi alegado pela acusação nem pela defesa e o Tribunal a quo não comunicou ao arguido a intenção de o introduzir, não havendo, portanto, concedido a este tempo para se preparar sobre esse facto novo, foi violado o disposto no n.º 1 do art. 358.º do CPP, pelo que, a douta sentença em crise padece de nulidade, nos termos do art. 379.º, n.º 1, al. b), do mesmo Código.

    3. - Subsidiariamente, sempre se aduz que, em face das normas dos arts. 20.º, n.º 1, e 35.º, n.º 1, do Cód. da Estrada, a mudança de direcção para a esquerda é uma manobra lícita.

    4. - Assim, «(n]ão é suficiente para se concluir pela culpa de qualquer dos intervenientes ter-se apenas dado como provado que o arguido, ao chegar junto ao local onde a estrada entronca pelo lado esquerdo com outra via, pretendendo mudar o seu sentido de marcha para prosseguir por essa via, accionou o "pisca-pisca", aproximou o automóvel do centro da estrada e virou para a esquerda, e em circunstâncias não apuradas, veio a ser embatido por um velocípede com motor, que circulava pela sua mão de trânsito, em sentido oposto ao do arguido, desconhecendo-se a que distância se encontrava do automóvel no momento em que este iniciou a manobra de mudança de direcção».

    5. - Com efeito, «[p]ara a actuação de um condutor que realiza determinada manobra constituir conduta censurável, e portanto culposa, tem de ocorrer alguma circunstância que aponte para a existência de perigo ou embaraço para o trânsito. Não se pode concluir pela existência de tal circunstância quando um condutor em relação ao qual não se prove que, na altura em que efectuava uma manobra de mudança de direcção para a esquerda, já lhe era visível ou previsível a aproximação de um veículo que, em sentido contrário, circulava em velocidade excessiva».

    6. - Ora, in casu, em face do acervo factual considerado provado – e só esse pode ser relevado –, não se conhece o local do embate, nem a que distância o motociclo da vítima se encontrava do veículo conduzido pelo arguido quando este iniciou a manobra de mudança de direcção, nem tampouco se a aproximação desse motociclo já era visível ou previsível ao arguido na altura em que este efectuava aquela manobra, sendo escassíssimos os factos respeitantes à dinâmica do acidente.

    7. - Sabe-se, isso sim, que o condutor do motociclo, independentemente de conduzir sob o efeito de estupefacientes, violava a imposição, essa absoluta, do art. 27°, n.º 1, Cód. da Estrada...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT