Acórdão nº 09S0622 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 03 de Junho de 2009

Magistrado ResponsávelSOUSA PEIXOTO
Data da Resolução03 de Junho de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: 1. Relatório AA propôs, no Tribunal do Trabalho de Lisboa, a presente acção declarativa contra BB, pedindo que o despedimento de que diz ter sido alvo por parte da ré fosse declarado ilícito e que esta fosse condenada a reintegrá-la, sem prejuízo do direito de vir a optar pela indemnização de antiguidade, e a pagar-lhe as retribuições que se vencerem até à decisão final, acrescidas de juros de mora, contados desde a citação até integral pagamento.

Fundamentando a sua pretensão, a autora alegou, em resumo, o seguinte: - foi admitida ao serviço da ré, em 1 de Outubro de 1982, para, no âmbito de um contrato de trabalho subordinado, exercer as funções de professora do 1.º Ciclo, no estabelecimento de ensino, denominado Externato João XXIII, de que a ré é proprietária; - foi despedida pela ré, por carta datada de 17 de Março de 2004, para produzir efeitos no dia 31 do mesmo mês e ano, com o fundamento de que tinha sido indeferida a autorização provisória de leccionação, ao abrigo da qual a autora se encontrava a exercer as funções de professora; - o despedimento é nulo, uma vez que ao caso se aplica o disposto no art.º 113.º, n.º 2, do Código do Trabalho, nos termos do qual o contrato de trabalho caduca, se o título que condicionava a actividade do trabalhador vier a ser retirado por decisão definitiva que já não admita recurso; - com efeito, exercendo a autora a actividade docente ao abrigo de uma autorização provisória de leccionação, o contrato de trabalho vigente entre as partes só caducava quando tal autorização fosse retirada por decisão não susceptível de recurso; - a tal autorização aplica-se o regime previsto nos artigos 58.º e seguintes do Decreto--Lei n.º 553/80, de 21 de Novembro (Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo), nos termos dos quais as autorizações provisórias têm de ser requeridas pelos estabelecimentos de ensino interessados, até 15 de Outubro de cada ano, e têm de ser objecto de despacho nos 30 dias posteriores à sua entrega (art.º 59.º do referido Estatuto); - nos termos do art.º 108.º do Código de Procedimento Administrativo, a falta de despacho dentro daquele prazo considera-se como um deferimento tácito; - o requerimento a pedir a concessão de autorização foi apresentado em 10 de Setembro de 2003 e o despacho de indeferimento só foi proferido em 23 de Janeiro de 2004, o que significa, levando em conta a regra de contagem dos prazos prevista no art.º 72.º do Código do Procedimento Administrativo (CPA), que o deferimento tácito ocorreu em 23 de Outubro de 2003; - nos termos do art.º 140.º, n.º 1, al. b), do CPA, aquele acto de deferimento tácito não era revogável e, por isso, o despacho que indeferiu a concessão de autorização provisória de leccionação era um acto administrativo nulo (art.º 133.º, n.º 1 e n.º 2, al. d), do CPA), impugnável a todo o tempo (art.º 134.º do CPA); - deste modo, o requisito de insusceptibilidade de recurso daquele despacho de indeferimento, determinante da perda do título para o exercício da actividade docente da autora, ainda não estava preenchido, sendo que, por força do disposto no art.º 59.º, n.º 1, do Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo, era a ré a destinatária do acto, sobre ela recaindo, por isso, o ónus de interpor recurso.

Por sua vez, na contestação, a ré alegou, em resumo, o seguinte: - o contrato de trabalho da autora cessou por caducidade, nos termos do art.º 113.º, n.º 2, do C.T., motivada pela inexistência de título, dado o indeferimento do pedido de autorização provisória para leccionar; - o facto de o despacho de indeferimento não ter sido proferido no prazo de 30 dias não tem como consequência o deferimento tácito previsto no art.º 108.º do CPA, dado que a formação do deferimento tácito dos pedidos de aprovação ou autorização decorre da subsunção desse pedido numa das alíneas do n.º 3 do citado art.º 108.º, ou em norma especial que o preveja; - o art.º 58.º do DL n.º 553/80 não prevê expressamente o deferimento tácito, nos casos da decisão do pedido formulado não ter sido proferida no prazo de 30 dias; - tal significa que, não prevendo a lei aquele deferimento tácito e não se enquadrando o pedido de autorização para leccionação nas alíneas do n.º 3 do art.º 108.º do CPA, a consequência é a aplicação do art.º 109.º do mesmo diploma; - ora, aplicando o regime do art.º 109.º, o decurso do prazo de 30 dias sem que haja decisão, só confere ao interessado a faculdade de presumir o indeferimento dessa pretensão, legitimando, desse modo, o direito do interessado interpor recurso; - in casu, o interessado não pode ser senão a autora, por ser a trabalhadora quem deve assegurar as condições necessárias para prestar o seu trabalho, pelo que deveria ter sido ela a interpor o recurso; - não o tendo feito, não pode imputar a responsabilidade à ré, por um facto que era da sua iniciativa, dado que a verdadeira destinatária do acto era a interessada autora; - sem conceder, ainda que se entenda que é de aplicar o disposto no art.º 108.º do CPA, a verdade é que o despacho que indeferiu a concessão de autorização provisória de leccionação não é um acto nulo e, por isso, impugnável a todo o tempo, mas sim um acto anulável, na medida em que a lei não prevê tal nulidade (artigos 133.º e 135.º do CPA); - admitindo, por mera hipótese, que a cessação do contrato de trabalho foi ilícita, então a autora deverá deduzir ao montante das retribuições que vier a auferir desde Fevereiro de 2005 a importância de € 2.178,17 que obteve com a cessação do contrato e que não receberia, se não fosse o despedimento, bem como o acréscimo remuneratório que, há, pelo menos, seis meses, vem auferindo no Centro Social e paroquial da Bobadela, no âmbito de uma programa ocupacional do Fundo de Desemprego.

No saneador-sentença, a acção foi julgada improcedente e a ré absolvida do pedido.

A autora recorreu, mas o Tribunal da Relação de Lisboa confirmou a decisão recorrida, o que levou a autora a interpor recurso de revista, cujas alegações concluiu da seguinte forma: 1.A A. intentou acção contra a R. impugnando o despedimento por esta declarado e invocando para tanto e em suma o seguinte: a) Fora admitida ao serviço do Externato João XXIII, propriedade da R., em 1 de Outubro de 1982, para o desempenho de funções de Professora do 1.º Ciclo; b) No dia 31 de Março de 2004, a R. despedira a A., com fundamento no facto de haver sido indeferida, pela Direcção Regional de Educação de Lisboa, a autorização provisória de leccionação, ao abrigo da qual a A. se encontrava a exercer as suas funções de Professora no Externato da R.; c) Sendo aplicável ao caso dos autos o art. 113.º, n.º 2, do Código do Trabalho, o contrato de trabalho vigente com a A. só poderia caducar por força daquele normativo, se o título ao abrigo do qual a A. exercia as suas funções tivesse sido retirado por decisão definitiva que já não admitisse recurso; d) O acto de indeferimento da DREL era um acto ferido de nulidade e, por isso, impugnável a todo o tempo, sendo a R. que tinha legitimidade para o impugnar, uma vez que fora ela que, ao abrigo do art. 58° e seguintes do Dec.-Lei 553/80, requerera a autorização para a A. continuar a leccionar naquele ano lectivo; e) Não se mostrando preenchido o requisito da irrecorribilidade do acto de indeferimento da autorização provisória de leccionação, não se podia operar a caducidade nos termos do art.º 113.º, n.º 2, do Código do Trabalho, sendo em consequência ilícita a cessação contratual declarada pela Ré.

  1. Em matéria de caducidade, temos no Código do Trabalho a previsão normativa do art. 387.º que regula, em termos genéricos, a caducidade e temos o art.º 113° que regula a caducidade do contrato de trabalho quando a "carteira profissional ou título de valor equivalente" vier a ser retirado ao trabalhador.

  2. Entende-se que a situação configurada nos autos e que...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT