Acórdão nº 08B1734 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 21 de Maio de 2009

Magistrado ResponsávelMARIA DOS PRAZERES PIZARRO BELEZA
Data da Resolução21 de Maio de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam, no Supremo Tribunal de Justiça: 1. AA e mulher, BB, e CC, na qualidade de cabeça de casal da herança de DD, instauraram contra a Sociedade de Empreendimentos EE, Lda., FF, GG, HH, II, JJ, KK, LL, MM, NN, OO, PP, QQ, RR, SS, TT, UU, VV e XX, , condóminos do Bloco ., situado em Areias de ... ....... Albufeira, integrado no empreendimento Clube ......, e representados pela administradora do condomínio, Sociedade de Gestão Financeira Central da ......, Lda., na qual pediram a anulação das deliberações da assembleia geral de condóminos de 9 de Maio de 2001, relativas à "análise, discussão e votação das contas do ano de 2000" e "apresentação, debate e votação do orçamento do condomínio para o ano de 2001", e consequente fixação das quantias a pagar pelos autores em relação a 2000 e a 2001, feita conjuntamente para o Bloco C - Ala Norte (onde se situa a fracção nº ......, designada pela letra J, de que são proprietários os dois primeiros autores) e Bloco C - Ala Poente (a que pertence a fracção nº 27, designada pelas letras DD, propriedade da terceira autora).

Para o efeito, alegaram, em síntese, que estiveram presentes na assembleia e que votaram contra as deliberações; que as mesmas foram votadas sem terem sido facultados quaisquer documentos comprovativos das despesas do ano de 2000 e, quanto ao orçamento, sem serem indicadas as receitas, recebidas ou a receber, pela administração, nem os actos de cobrança efectuados; que a propriedade horizontal foi constituída separadamente para os quatro blocos que integram o prédio, e nomeadamente, para os blocos C - Ala Norte e C - Ala Poente; que as contas incluem despesas que não respeitam a espaços comuns ou a serviços de interesse comum, nomeadamente por se reportarem também à exploração do empreendimento turístico; que não foi respeitada a regra da proporção entre os encargos comuns e a percentagem que foi atribuída às suas fracções no acto constitutivo da propriedade horizontal, percentagem essa que também não foi observada nas votações; que as deliberações foram aprovadas apenas pela condómina Sociedade de Empreendimentos Imobiliários do Sul Seis, Lda., e correspondem a pagamentos e serviços do seu interesse e da Administradora, por resultarem da exploração turística do empreendimento.

Contestou a Sociedade de Gestão Financeira Central da ......, Lda.. Em síntese, alegou que as duas alas do Bloco C constituem um único prédio, com um total de 98 fracções (81 da ala Poente e 17 da ala Norte); que os apartamentos dos autores se integram no empreendimento turístico, instalado num conjunto de edifícios, com acesso às diversas infra-estruturas de que este dispõe e delas beneficiando; que o Bloco C não tem autonomia relativamente ao conjunto de blocos que o compõem; que as percentagens atribuídas às fracções dos autores estão correctamente calculadas; que as despesas respeitam a infra-estruturas de utilização comum e a serviços de interesse comum.

Por sentença de fls. 274, a acção foi julgada procedente, sendo declaradas nulas as deliberações da assembleia de condóminos realizada em 9 de Maio de 2001, "relativas à aprovação das contas relativas ao ano de 2000 e à aprovação do orçamento do condomínio para o ano de 2001", por terem sido aprovadas "em contrário do que dispõe o título constitutivo da propriedade horizontal, infringindo normas de carácter imperativo", constantes dos artigos 1424º, nº 1 do Código Civil (proporcionalidade nos encargos comuns) e 1419º, nº 1 do Código Civil, 80º, nºs 1 e 2, d), do Código do Notariado e 2º, nº 1, b), do Código do Registo Predial (alterações ao título constitutivo).

Entendeu ainda a sentença que as deliberações sempre seriam anuláveis pelos seguintes motivos: - por significarem a oneração dos "condóminos ora AA. com encargos de conservação e manutenção de partes comuns e de serviços de interesse comum de que os seus prédios urbanos (denominados Alas) não dispõem e das quais não usufruem (jardins, piscina, áreas descobertas), não comungando com o resto do empreendimento (afecto à exploração turística) de instalações telefónicas e equipamentos de som e de televisão, para além de que alguns dos encargos respeitam somente à exploração comercial/turística do empreendimento onde se inserem as fracções dos AA., que estes não realizam".

A sentença considerou, assim, que a piscina, as áreas descobertas, as instalações telefónicas e os equipamentos de som e de televisão não são partes comuns; e portanto que, sem o acordo dos autores, a assembleia não lhes podia impor encargos que lhes respeitassem (mesmo que deles pudessem aproveitar, ou que eles valorizassem o conjunto urbano); - por violação do direito à informação dos condóminos, tendo em conta "a forma como as (...) contas foram apresentadas na assembleia", sendo pois aplicável, por analogia, o disposto no nº 1 do artigo 58º do Código das Sociedades Comerciais; - por ter sido considerada em conjunto a globalidade do empreendimento, em desconformidade com o título constitutivo.

  1. Por acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de fls. 438, a sentença foi confirmada, excepto quanto à alegada violação do direito à informação; e a fls. 52.0 foi proferido novo acórdão no sentido de se não verificar a nulidade do acórdão de fls. 438, suscitada nas alegações da revista entretanto interposta pela Sociedade de Gestão Financeira Central da ......, Lda. e admitida, com efeito devolutivo.

    Nas alegações que apresentou, a recorrente formulou as seguintes conclusões: "1. Tendo a Recorrente, nas suas alegações, invocado anterior Acórdão da Relação de Évora e procedido à junção, ao abrigo do disposto no art. 706º do CPC, de Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, ambos proferidos sobre as mesmas questões em discussão nos presentes autos, ao abrigo da mesma legislação, em processo em que foram partes os ora Recorrente e Recorridos e em que as decisões das várias instâncias sobre aquelas questões foram diametralmente opostas à decisão do Tribunal de 1ª instância, estando pois em causa a harmonização de julgados e salvaguarda do princípio da segurança jurídica, impunha-se ao Tribunal de Recurso sobre o mesmo se ter pronunciado, com o que se cometeu no Acórdão revidendo a nulidade de pronúncia prevista do no art. 668º, nº 1 d) do CPC.

    1. Na propriedade horizontal, o valor correcto da permilagem/percentagem a atribuir a cada uma das fracções há-de resultar forçosamente da relação existente entre o valor ou área das fracções em causa e o valor ou área total do prédio onde aquelas se inserem (consoante se opte por um ou outro dos critérios).

    2. Constituindo as alas norte e poente um único prédio - o Bloco C - com uma única descrição predial e um único artigo matricial, nada obsta a que a assembleia de condóminos seja realizada conjuntamente para as duas alas; caso em que para efeitos de votação e comparticipação nas despesas comuns, o valor relativo de cada fracção terá que ser achado tendo em consideração a área total do Bloco C (com as suas duas alas), sem que daí resulte qualquer violação ao título constitutivo ou às normas imperativas que regulam a propriedade horizontal.

    3. Não constitui alegação de facto novo, a simples operação de aritmética efectuada pelo Recorrente, nas suas alegações, com base na factualidade anteriormente alegada e nos dados constantes dos documentos autênticos, nomeadamente na escritura de constituição da propriedade horizontal, donde se conclui que a percentagem atribuída às fracções dos recorridos, no respectivo título constitutivo, não se encontra correctamente calculada.

    4. Tal operação que consiste na soma da área de todas as fracções que compõem o referido Bloco C (ala norte e ala poente) e no apuramento do valor relativo da fracção dos recorrentes face à área total do prédio, mediante a aplicação da regra de três simples, constitui raciocínio lógico dedutivo que ao recorrente, tal como ao julgador é lícito fazer, sem que daí resulte qualquer violação dos artigos 660°,661° e 664º do Código de Processo Civil.

    5. Correspondendo o valor das percentagens atribuídas às fracções dos recorridos na acta da assembleia de condóminos realizada em 9 de Maio de 2001 e nos documentos de cálculo e repartição de despesas, ao real valor relativo que cada uma daquelas fracções ocupa face à totalidade do bloco C onde se integram, não foi postergado o principio da proporcionalidade constante do nº 1 do art. 1424º CC ou infringido o título constitutivo da propriedade horizontal, pelo que deveriam ter sido julgadas válidas as deliberações aprovadas pela maioria dos condóminos presentes e representados na referida assembleia.

    6. Ao decidir pela prevalência da permilagem /percentagem atribuída às fracções dos recorridos no título constitutivo quando, defluía inequivocamente daquele documento autêntico que tais permilagens se encontravam incorrectamente calculadas, podendo ser conhecidas e rectificadas pelo Tribunal de recurso ao abrigo do disposto no art. 712 nº 1 a) do CPC, proferiu o Tribunal da Relação decisão materialmente injusta, por contrária aos critérios de efectiva e real proporcionalidade que estão subjacentes ao regime da propriedade horizontal no que toca à determinação da votação e comparticipação dos condóminos nos encargos comuns (arts. 1424º e 1430º nº 2 Código Civil), infringindo concomitantemente o princípio da prevalência da verdade material que enforma o Código de Processo Civil, reforçado pelo legislador após a reforma do CPC...

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