Acórdão nº 08S724 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 08 de Outubro de 2008
Magistrado Responsável | VASQUES DINIS |
Data da Resolução | 08 de Outubro de 2008 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1. Em acção especial emergente de acidente de trabalho, instaurada mediante participação recebida, em 19 de Dezembro de 2003, no Tribunal do Trabalho de Matosinhos, AA demandou a "BB, S.A.
", e "CC - Equipamentos para a Indústria Tintas, Lda.
", pedindo a condenação destas a pagar-lhe: - € 7.572,11, a título de incapacidades temporárias; - € 5.011,44, a título de pensão anual vitalícia remível pela IPP de 14,99% devida desde 18 de Dezembro de 2003; - € 16,80, a título de despesas de deslocação.
- Juros de mora sobre tais quantias, à taxa legal, desde a data da tentativa de conciliação.
Alegou para tanto, em resumo, que: - No dia 8 de Janeiro de 2003, em Matosinhos, o Autor sofreu um acidente de trabalho, que consistiu numa queda, quando trabalhava sob as ordens, direcção e instruções da sua entidade patronal, "CC, Lda", ora segunda Ré, da qual, além de trabalhador, é, também, sócio/gerente; - O acidente causou-lhe fractura do antebraço direito e do punho direito, em consequência do que ficou afectado de incapacidade temporária absoluta para o trabalho (ITA) durante o período compreendido entre as datas de 9 de Janeiro de 2003 a 4 de Maio; de incapacidade temporária parcial temporária parcial (ITP), com o grau de desvalorização de 30% durante o período de 5 de Maio de 2003 a 5 de Setembro de 2003, e de 20%, de 6 de Setembro de 2003 a 17 de Dezembro de 2003; vindo a ser-lhe atribuída a incapacidade permanente parcial para o trabalho (IPP) com o grau de desvalorização de 14,99%; - Os riscos inerentes à prestação laboral do Autor, ao serviço da segunda Ré encontravam-se, à data do acidente de trabalho, transferidos para a primeira Ré mediante um contrato de seguro de acidente de trabalho, na modalidade de seguro a prémio variável (ou também chamado de folha de férias) titulado pela apólice n.º ..........; - A retribuição anual do trabalhador sinistrado, Autor, é composta de uma parte fixa (no valor mensal de € 1.361,47) e de uma parte variável, constituída por comissões de vendas/prémios de produção; - Para o cálculo de tais indemnizações deverá ter-se em conta a parte variável recebida durante o ano de 2002 (12 meses imediatamente antecedentes ao acidente), que ascendeu ao valor total de € 28.699,60, bem como a parte fixa da retribuição, esta pelo montante que auferia à data do acidente (Janeiro de 2003), ascendendo a um valor anual de € 19.060,58 (€ 1361,47 x 14 meses).
- As indemnizações pelas incapacidades temporárias totalizam a importância de € 13.850,44, tendo já recebido da seguradora a quantia de € 6.278,33.
- Em relação à IPP de 14,99%, o trabalhador sinistrado terá direito a receber um capital de remição de uma pensão anual e vitalícia no valor de € 5.011,44, devida desde o dia 18 de Dezembro de 2003 (data da alta definitiva) até atingir o fim da idade activa.
- A estes valores acresce, ainda, a quantia de € 16,80, a título de despesas de deslocação.
Ambas as Rés contestaram: A "CC", a pugnar pela sua absolvição do pedido, alegou, em resumo, que o pagamento reclamado pelo Autor é da inteira responsabilidade da Ré "BB S.A.", porquanto os riscos inerentes à prestação laboral daquele tinham sido transferidos para esta, mediante a celebração de um contrato de seguro de acidentes de trabalho, na modalidade de seguro a prémio variável, também designado de "folha de férias", titulado pela apólice n.º ........., contrato este que se encontrava em vigor na data do acidente de trabalho.
Por sua vez, a Ré seguradora, defendeu a improcedência parcial da acção, quanto a ela, com a fixação da pensão e demais prestações a seu cargo com base na remuneração anual de € 1.361,47 x 14 meses e isentando-se a mesma de quaisquer custas na fase contenciosa a que não deu azo, mais se condenando a Ré empregadora a custear todas as prestações efectuadas ou a efectuar ao Autor na proporção da remuneração não transferida, para o que, em súmula, aduziu o seguinte: - Conforme expôs na tentativa de conciliação realizada na fase administrativa do processo, o salário que lhe era declarado pela Ré empregadora, relativamente ao Autor, e com base no qual assumiu determinado risco contra determinada retribuição era de apenas € 1.361,47 x 14 meses; - O contrato de seguro de acidentes de trabalho que mantém com a empregadora, e por força do qual é demandada nos presentes autos, é um contrato de prémio variável, na modalidade de "folhas de férias"; - Ora, como resulta das folhas de férias juntas aos autos, a entidade empregadora participou à contestante o salário supra referido e não qualquer outro; - Assim, imputar à seguradora o pagamento de uma pensão calculada com base em vencimentos superiores àqueles que lhe eram comunicados violaria todo o espírito e regulamentação do contrato de seguro, não podendo, por isso, à situação dos autos, deixar de se considerar integralmente aplicável o disposto no n.º 3 do artigo 37.º da Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro (adiante, LAT); - Deste modo, a contestante nunca poderá ser responsabilizada por um valor superior àquele que era declarado como vencimento e com base no qual cobrava o respectivo prémio do seguro, pelo que, a apurar-se que existe retribuição para além dos aludidos € 1.361,47 x 14 meses, devem as prestações correspondentes ficar a cargo da entidade patronal, solução, de resto, que se impõe não apenas quanto às prestações em dinheiro mas ainda quanto ao custeamento de todas as prestações em espécie - médicas, medicamentosas, etc., já prestadas ou a prestar ao Autor; - Assim sendo, atendendo à remuneração efectivamente declarada à contestante e, como tal, abrangida pelas garantias da apólice contratada, pelo menos no que à contestante diz respeito, foram já pagas ao Autor todas as indemnizações devidas pelos períodos de incapacidade de que padeceu.
A mesma Ré deduziu resposta à contestação apresentada pela co-Ré "CC", concluindo, mais uma vez, pela condenação desta na proporção da remuneração do Autor não declarada.
Por seu turno, a "CC" respondeu à contestação apresentada pela co-Ré seguradora, impetrando, novamente, a sua absolvição do pedido.
Proferido despacho saneador, seleccionada a matéria de facto assente e organizada a base instrutória, sem reclamação das partes, veio a realizar-se a audiência de discussão e julgamento e decidida, sem reclamações, a matéria de facto questionada na base instrutória, foi proferida sentença em que, além de se ter decidido não condenar a Ré "CC" nem o Autor, como litigantes de má-fé, como pretendido pela Ré seguradora, julgou-se improcedente a acção contra Ré "CC", absolvendo-a do pedido, e procedente contra a Ré "BB, S.A.", condenando-a a pagar ao Autor: - A quantia de € 9.861,94 de diferença na indemnização pelos períodos de incapacidades temporárias, nos termos do artigo 17.º n.º 1, alíneas e) e f), da LAT; - O capital de remição de uma pensão anual e vitalícia no valor de € 5.011,48, obrigatoriamente remível, com início de vencimento em 18 de Dezembro de 2003, dia seguinte ao da alta, nos termos do artigo 17.º, n.º 1, alínea f), da LAT; - A quantia de € 16,80, a título de despesas de deslocação, nos termos do artigo 15.° da LAT; - Juros de mora, à taxa legal, sobre as prestações pecuniárias em atraso.
Em conformidade, foi a Ré seguradora condenada nas custas.
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A mesma Ré interpôs recurso de apelação, intentando obter a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto, especificamente quanto ao teor das respostas aos quesitos 1.º e 2.º da base instrutória, e, por via da pretendida alteração, limitada a sua responsabilidade nos termos reclamados na sua contestação; sustentou, outrossim, a condenação dos apelados como litigantes de má-fé, também, nessa parte impetrando a revogação da sentença.
Tendo o Tribunal da Relação do Porto confirmado a decisão da 1.ª instância, a apelante veio pedir revista do respectivo acórdão, tendo formulado, a terminar a respectiva alegação, as conclusões assim redigidas: 1. O depoimento da testemunha DD, ao vir negar um documento escrito e assinado por si próprio, era de inadmissível valoração, não podendo, nessa medida, fazer qualquer tipo de prova contra tal documento (pedido de cotação de seguro).
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Tal questão, de proibição da valoração do seu depoimento, só em sede de recurso poderia ser levantada, pois que só com a sentença e com a fundamentação das respostas aos quesitos se sabe que valoração foi feita ao depoimento de tal testemunha.
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A proibição de valoração de um depoimento a que se refere o Art. 394.° CC ou a inadmissibilidade legal de alguém depor como testemunha prevista nos Arts. 616.° e 617.° CPC são questões absolutamente distintas, sendo que a que foi invocada pela recorrente foi a primeira, a qual, por isso, deveria ter sido conhecida pelo Tribunal da Relação.
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Ao não o fazer, violou o Acórdão em crise o estatuído no Art. 394.° do Cód. Civil e não conheceu de matéria de que deveria ter conhecido, o que, nos termos do estatuído no Art. 668.º, n.º 1, d), [do Código de Processo Civil], constitui nulidade que desde já se invoca para todos os efeitos legais.
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Está assente que o contrato de seguro celebrado entre as RR. é um contrato do ramo acidentes de trabalho para trabalhadores por conta de outrem na modalidade de prémio variável.
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Ainda que esteja provado que com tal contrato a R. Patronal transferiu para a R. Seguradora a sua responsabilidade infortunística relativamente a toda a retribuição do A., aqui se incluindo por isso prémios e comissões de vendas, o certo é que cabia à R. Patronal, para que tal garantia se efectivasse, declarar tais parcelas variáveis da retribuição nas folhas de remuneração enviadas à Recorrente.
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Ora, está assente que o acidente ocorreu no dia 08/01/2003.
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E, como resulta dos autos, as folhas de remuneração relativas a Janeiro de 2003, enviada a 19/02/2003 e a Fevereiro de 2003 enviada a 09/03/2003 são totalmente omissas quanto ao pagamento de qualquer verba para além da retribuição mensal...
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