Acórdão nº 00807/11.3BEPNF de Tribunal Central Administrativo Norte, 18 de Junho de 2021

Magistrado ResponsávelMaria Fernanda Antunes Apar
Data da Resolução18 de Junho de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO Z., S.A., representada por Z., na qualidade de liquidatário, propôs contra o INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL, ambos melhor identificados nos autos, ação administrativa especial, pedindo a anulação da decisão proferida no processo de averiguações n.º 201000003906 do Serviço de Fiscalização do Alentejo, pela Senhora Diretora do Núcleo de Fiscalização de Beneficiários e Contribuintes, Sector de Portalegre, que lhe foi notificada por ofício de 05 de setembro de 2011, recebido em 08 de setembro de 2011, pelo qual a Autora foi considerada definitivamente em dívida de contribuições para a Segurança Social no montante de €100.812,06.

Por sentença proferida pelo TAF de Penafiel foi julgada procedente a acção e anulada a decisão proferida no processo de averiguações n.º 201000003906.

Desta vem interposto recurso.

Alegando, a Entidade Demandada formulou as seguintes conclusões: 1.- Vem o presente recurso interposto da sentença proferida pelo Mmº Juiz do Tribunal a quo, que julgando procedente a presente ação anulou a decisão da Diretora de Núcleo de Fiscalização de Beneficiários e Contribuintes do Sector de Portalegre da Segurança Social, serviço integrado no ISS, IP, datada de 05/09/2011, através da qual foi “ considerado em dívida para com a Segurança Social, na importância de Euros 100.812,06 (cem mil oitocentos e doze euros e seis cêntimos) resultante das declarações de remunerações elaboradas e registadas oficiosamente”, decisão essa, proferida no âmbito do processo de averiguações Proave n.º 2010 00003906 2.- Colocam-se, assim, primacialmente, nos presentes autos, duas questões, a saber, se efetivamente, padece o ato impugnado de vício de omissão de audiência de interessados no procedimento, e a questão de saber se, a quantias auferidas pelos trabalhadores da Impugnante, em tal período, devem, como entende o ora Recorrente, incluir-se no conceito de retribuição e como tal constituir base de incidência para efeitos de contribuições para a segurança social ou se, pelo contrário, como defendido na douta sentença de que ora se recorre, não devem tais importâncias ser consideradas retribuição não devendo constituir base de incidência contributiva para a segurança social.

  1. - Ora, no que se refere à alegada omissão de audiência de interessados no procedimento, começaremos por dizer que, não compreende o ora Recorrente, como poderia o Mmº Juíz do tribunal a quo concluir da forma como o fez, quando é certo que, está documentalmente comprovado no respetivo Proave, tanto assim, que consta das alíneas F) e G) da matéria dada por provada, que foi o Autor, ora Recorrido, a coberto do ofício nº 021327, datado de 13/04/2011, notificado para o efeito, tendo o mesmo exercido tal direito de audiência prévia em 10/05/2011.

  2. - Sendo certo que, no exercício de tal direito, veio questionar os elementos probatórios recolhidos, sendo, no entanto, incapaz, em sede de audiência de interessados, de contrariar as conclusões a que os serviços chegaram pela análise dos elementos contabilísticos fornecidos pelo ora Recorrido, isto é, contrariar os factos que foram levados ao seu conhecimento no projeto de decisão final, mais tendo indicado, prova testemunhal, concretamente, J. e M., a apresentar.

  3. - No entanto, não tendo as mesmas sido oportunamente apresentadas, carecendo ambas de melhor identificação, pois não indicavam profissão ou morada, consideraram os serviços não ser relevante a audição das mesmas, na medida em que, nada de novo havia sido alegado, pelo ora Recorrido, em sede de pronuncia, nem contraposta prova documental suscetível de infirmar as conclusões a que chegaram os serviços do ora Recorrente.

  4. - A este propósito concluiu o Mmº juiz na douta decisão recorrida, passando a citar “Era manifesta a relevância e utilidade dos depoimentos em causa, quer na discussão sobre o fundamento e a natureza das “ajudas de Custo”, “prémios de desempenho” e demais questões do foro contabilístico, quer na obtenção e confirmação de informação/detalhe relativamente aos documentos comprovativos das diversas rubricas.” 7.- No que a tal concerne, dir-se-á que, atuam os serviços de fiscalização do Impugnado ao abrigo dos poderes de autoridade que lhe são conferidos pela Lei Orgânica do ISS, IP (cfr. artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 83/2012, de 30 de março e, também, os Estatutos do ISS, IP, aprovados pela Portaria n.º 135/2012, de 8 de maio), podendo, para o efeito, efetuar as pertinentes diligências de fiscalização, levantar autos de declarações, proceder a notificações para apresentação de documentação, entre outros atos.

  5. - Sendo certo que, a audição de testemunhas arroladas pelo interessado não é obrigatória, podendo o órgão instrutor, se assim o entender, dispensá-la, o que fará, caso a mesma não revele utilidade, nomeadamente, quando estejam em causa factos que apenas podem ser provados por meio de documentos, não acrescente qualquer elemento novo ou esclarecedor ao processo e, sobretudo, quando do próprio processo constem elementos de facto que justificam a decisão a proferir.

  6. - Acresce que, no procedimento administrativo, e especificamente em sede de instrução, vigora o princípio da informalidade acolhido no artigo 57º do CPA, que se traduz na existência por parte da entidade instrutora de uma certa discricionariedade instrumental (poder de disposição ou ordenação oficiosa da sequência procedimental e da escolha das diligências a realizar), embora não possa deixar de analisar cuidadosamente as diligências probatórias requeridas pelos particulares, tendo em conta a oficiosidade da investigação dos factos pertinentes, e de pautar a sua atuação por critérios de objetividade e transparência, igualdade e imparcialidade.

  7. - Também a esse respeito, cumpre referir o preceituado no artigo 125.º do CPA, segundo o qual “Após a audiência, podem ser efetuadas, oficiosamente ou a pedido dos interessados, as diligências complementares que se mostrem convenientes”.

  8. - Não resultando assim, de tal preceito legal, qualquer imposição legal para o órgão instrutor, nomeadamente, nas situações em que esteja em causa a prova de factos que apenas podem ser provados por documentos.

  9. - Neste sentido, conforme salientado no Acórdão do STJ, de 8-10-2008, proc. 08S724, “Resulta do disposto nos artigos 392.º e 393.º, do Código Civil, a proibição de conferir à prova testemunhal, em relação à qual vigora o princípio da livre apreciação (artigos 396.º do Código Civil e 655.º, n.º 1, do Código de Processo Civil), qualquer valor quando incida sobre factos que só possam ser demonstrados por outros meios de prova ou que se achem evidenciados por meios de prova dotados de força probatória plena”.

  10. - Entende a doutrina que “O juízo sobre a utilidade de tais diligências complementares, para a correta decisão do procedimento, é do órgão instrutor (…) e abrange tanto as que se devem à sua iniciativa, como aquelas que tenham sido solicitadas na resposta (ou defesa) dos interessados ao abrigo do n.º 3 do art.º 101.º - não havendo, portanto, um direito destes à realização das mesmas ou de impugnação autónoma da decisão que denegou a sua realização”. É uma questão de “liberdade probatória (…)” in Mário Esteves de Oliveira, et al.

    , Código do Procedimento Administrativo Comentado, 2.ª Edição, Edições Almedina, págs. 466 e 467.

  11. - Sendo que, do Relatório Final notificado à ora Recorrida, constam os fundamentos pelos quais não foi considerada procedente a argumentação aduzida em sede de resposta em audiência prévia e a razão pela qual não foram inquiridas as testemunhas arroladas (cfr. fls. 1315 do Proave).

  12. - Afigura-se, assim, que ao contrário do decidido pela douta decisão recorrida, o ato praticado não pode ser invalidado com base no fundamento de não ter sido realizada a diligência probatória de inquirição de testemunhas, não existindo qualquer vício de omissão de audiência dos interessados.

  13. - Neste mesmo sentido, o já referido Acórdão do T.C.A. Sul (Proc. 2671/16.7BELSB) de 24-05-2018 decidiu que: «3.15 Ora, no exercício do dever de instrução que cumpre ao responsável pela direção do procedimento administrativo este “…deve procurar averiguar todos os factos cujo conhecimento seja adequado e necessário à tomada de uma decisão legal e justa dentro de prazo razoável, podendo, para o efeito, recorrer a todos os meios de prova admitidos em direito” (cfr. artigo 115º nº 1 do CPA). Essa averiguação foi feita, mormente através da vistoria efetuada pela entidade administrativa em sede de ação inspetiva, como resulta do probatório.

    E se no exercício do direito de audiência os interessados podem requerer diligências complementares e juntar documentos (cfr. artigo 121º nº 2 do CPA), a realização das diligências complementares requerida pelos interessados em sede de audiência prévia não é vinculativa para o órgão administrativo, o qual apenas levará a efeito aquelas que se mostrem ainda convenientes para a decisão administrativa a proferir, como claramente decorre do disposto no artigo 125º do CPA, que dispõe o seguinte: “após a audiência, podem ser efetuadas, oficiosamente ou a pedido dos interessados, as diligências complementares que se mostrem convenientes”. O que significa que o responsável pela direção do procedimento não tem que levar a cabo todas as diligências de prova que lhe sejam requeridas pelos interessados, antes deve efetuar um juízo crítico sobre as mesmas no sentido de aferir da sua utilidade para a decisão.

    3.18 Pelo que a mera circunstância de não terem sido levadas a cabo pelo órgão administrativo diligências complementares requeridas pelo interessado não consubstanciará violação do direito de audiência prévia, nem do direito de participação, como propugnado pelo recorrente.

    3.19 Por outro lado o requerente não invocou, fosse no requerimento inicial da providência seja no presente recurso, o que em concreto pretendia provar perante a...

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