Acórdão nº 08P1959 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 10 de Setembro de 2008

Magistrado ResponsávelOLIVEIERA MENDES
Data da Resolução10 de Setembro de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça No âmbito do processo comum com intervenção do tribunal colectivo n.º 500/06, da 5ª Vara Criminal de Lisboa, AA, com os sinais dos autos, foi condenado como autor material, em concurso real, de sete crimes de roubo, sendo dois agravados, na pena conjunta de 7 anos de prisão -(1).

Na parcial procedência de pedido de indemnização civil deduzido foi o arguido e demandado condenado a pagar a BB, devidamente identificada, a importância de € 3.000 acrescida de juros à taxa legal.

Na sequência de recurso interposto pelo arguido para o Tribunal da Relação de Lisboa foi confirmada a decisão de 1ª instância.

Recorre agora o arguido para este Supremo Tribunal.

É do seguinte teor a parte conclusiva da motivação apresentada: 1. Não dispunha o douto Tribunal recorrido de elementos suficientes para a condenação do arguido no crime de roubo qualificado de que foi vítima MP.

  1. O reconhecimento efectuado pela testemunha foi feito na P.S.P., tratando-se este reconhecimento de prova não jurisdicional (à qual não assistiu nem o MP nem o Tribunal) e que, por isso, nenhum valor probatório pode ter face à exigência vinculativa do artigo 355º, do C.P.P.

  2. O modus operandi do arguido consistia em abordar as suas vítimas, exigindo-lhes sempre quantias concretas, o que no roubo em crise não aconteceu.

  3. O arguido era toxicodependente à data da prática dos factos, sendo esta a circunstância que o motivou na sua concretização, funcionando a nefasta influência da droga como circunstância modificativa atenuante.

  4. A indemnização arbitrada por danos morais, mais que reparar os danos causados à demandante Maria, pretende quase única e exclusivamente castigar o arguido, recluso com elevadas carências económicas.

  5. Assim, devem ser aplicadas ao recorrente as seguintes penas parcelares: a - pela prática de cinco roubos qualificados, desqualificados pelo valor, a pena de um ano de prisão por cada um; b - pela prática de um crime de roubo qualificado, a pena de três anos de prisão -(2); c - uma vez operado o cúmulo jurídico, ao recorrente deveria ter sido aplicada uma pena que não ultrapassasse os quatro anos de prisão, suspensa na sua execução, atentos os critérios legais (artigos 40º, n.º 2, 70º, 71º, 77º e 50º).

  6. O douto acórdão recorrido violou, por erro interpretativo, quer o disposto no artigo 71º, quer o disposto no artigo 40º, n.º 2, do Código Penal, uma vez que a pena em que condenou o arguido ultrapassou, em larga medida, a dimensão da culpa.

    O recurso foi admitido.

    Na contra-motivação apresentada o Ministério Público formulou as seguintes conclusões: 1. O acórdão ora recorrido cabe no âmbito do disposto no artigo 400º, n.º 1, alínea f), do CPP revisto pela Lei n.º 48/07, de 29 de Agosto, não sendo por isso passível de recurso para o STJ.

  7. Atenta a data de interposição de recurso, quer da decisão da 1ª instância, quer da decisão desta Relação, ora impugnada, é, pois, de acordo com o novo regime processual introduzido por este diploma legal que os autos passaram a ser tramitados (artigo 5º, do CPP).

  8. Pelo que o recurso interposto não deveria ter sido admitido (artigo 414º, n.º 2, do CPP).

  9. A sua admissão porém, por parte deste Tribunal da Relação, não vincula o Tribunal Superior (artigo 414º, n.º 3, do CPP).

  10. Por se tratar, pois, de uma decisão irrecorrível, deverá o recurso ser rejeitado no Supremo Tribunal de Justiça, não se conhecendo por isso do seu objecto.

    Caso porventura assim se não entenda 6. Deverá o recurso ser liminarmente rejeitado, nos termos do disposto no artigo 420º, n.º 1, do CPP, quer por falta de motivação, quer por manifesta improcedência.

  11. Em todo o caso, e também se assim se não entender, será então de dar parcial provimento ao recurso no que diz respeito à medida concreta das penas aplicadas, nos termos supra propostos.

    Por sua vez, a assistente e demandante MM extraiu as seguintes conclusões da sua contra-motivação: 1. Alega o arguido, inter alia, que a condenação no pedido cível no montante de € 3.000,00 visa quase única e exclusivamente castigar o Arguido (...), pelo que tal condenação, na sua óptica, deveria ser reduzida de forma adequada e equitativa.

  12. É com grande admiração que a recorrida, se depara com tais alegações, não compreendendo a sua razão de ser ou fundamento quando o valor peticionado pela recorrida foi no montante de € 20.000,00.

  13. Muito condescendente foi o Douto Tribunal a quo em condenar o arguido no pagamento de apenas € 3.000,00 não se vislumbrando onde se encontra a desproporcionalidade invocada pelo arguido.

  14. Não se pode fechar os olhos à violência psíquica e física que o crime representou para a recorrida: a intromissão no domicílio de uma senhora de 73 anos, a ameaça de potencial propagação de doença infecto-contagiosa pela agressão com uma seringa no pescoço, as ofensas à sua integridade física, o pânico sentido pela recorrida no momento e após a conduta criminosa do ora recorrente... 5. A recorrida ficou durante largos meses receosa de ter contraído o vírus HIV ou outra doença contagiosa pela picada da seringa a que foi submetida.

  15. A insegurança e mal-estar diário resultantes do roubo levado a cabo pelo recorrente não podem ser ignorados, ainda para mais numa senhora de idade como a assistente.

  16. A indemnização arbitrada pelo Tribunal de 1ª Instância e confirmada pelo Tribunal a quo não extravasa os padrões normalmente utilizados pela jurisprudência em casos semelhantes, sendo que é óbvio que a situação económica do recorrente foi devidamente tomada em, consideração pelos referidos Tribunais.

  17. A indemnização arbitrada pelo Tribunal de 1ª Instância e confirmada pelo Tribunal a quo teve como objectivo reparar tão-só os danos causados pelo recorrente, e não castigá-lo (de outro modo a indemnização seria bem superior).

  18. Deve a condenação no pagamento de uma indemnização pelo recorrente à recorrida ser totalmente mantida, nos termos que se encontram expressos e justificados na decisão ora recorrida, pois só assim se poderá ressarcir minimamente (e na medida do possível) os danos morais sofridos pela recorrida.

  19. Quanto à medida da pena as conclusões do recorrente não convencem.

  20. O próprio recorrente diz que os crimes foram praticados dolosamente.

  21. O recorrente representou os actos que quis cometer, sabia da sua ilicitude, dos danos que implicavam nas vítimas e na ordem pública e ainda assim, não se coibiu de os praticar.

  22. Mais, o recorrente não se tornou toxicodependente por acto involuntário, mas pelo contrário, e como aquele refere, "é toxicodependente desde os 16 anos, tendo por essa altura iniciado o consumo de cocaína e heroína".

  23. Neste sentido, não poderá a pena do agente ser atenuada em função daquilo que foi uma situação em que este se colocou de modo voluntário.

  24. Não é verdade que a decisão do Tribunal de 1ª Instância e confirmada pelo Tribunal a quo não considerou devidamente o alegado arrependimento demonstrado pelo recorrente.

  25. Não deve ser ordenada a suspensão da medida da pena, uma vez que não estão preenchidos os pressupostos do artigo 50º, do Código Penal: nada na personalidade do agente, nas condições da sua vida, na sua conduta anterior e posterior ao crime e nas circunstâncias deste, permite concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.

  26. Não se pode admitir, pois, que a mera ameaça da prisão seja suficiente para assegurar as finalidades da punição, sendo que também não se pode, com seriedade, prever que o arguido não volte a praticar outros crimes.

    * A Exm.ª Procuradora-Geral Adjunta emitiu douto parecer no qual suscita questão prévia atinente à admissibilidade do recurso, pronunciando-se no sentido de que a decisão impugnada é irrecorrível, atenta a data da prolação do acórdão de 1ª instância, 29 de Outubro de 2007, e a alteração operada pela Lei n.º 48/07, de 29 de Agosto, à alínea f) do n.º 1 do artigo 400º do Código de Processo Penal, segundo a qual só são susceptíveis...

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