Acórdão nº 07S4654 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 10 de Julho de 2008

Magistrado ResponsávelVASQUES DINIS
Data da Resolução10 de Julho de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1. AA instaurou em 14 de Setembro de 2005, no Tribunal do Trabalho de Lisboa, a presente acção emergente de contrato individual de trabalho contra o Instituto do Desporto de Portugal pedindo a condenação deste a pagar-lhe a indemnização decorrente de alegado despedimento ilícito, sem prejuízo da opção pela reintegração no seu posto de trabalho a exercer no momento processual próprio, e a pagar-lhe o montante já vencido de € 10.276,91, acrescido das retribuições que se vencerem até decisão final e de juros calculados à taxa legal de 4% ao ano contados desde a citação até integral pagamento; no caso de a Autora não vir a exercer a opção pela reintegração no seu posto de trabalho, pediu a condenação do Réu no pagamento das retribuições de férias, subsídio de férias e de Natal que se vencerem em consequência da cessação do contrato.

Para tanto alegou, em síntese, que o Réu a admitiu ao seu serviço em 1 de Outubro de 1998, desempenhando desde então sob as suas ordens, direcção e autoridade, as funções de monitora de natação, no âmbito de um contrato de trabalho vigente entre as partes; que deixou de trabalhar ao serviço do Réu em 26 de Setembro de 2004, por este ter rescindido, por carta de 27 de Julho desse ano, o referido o contrato; e que o Réu não lhe pagou os meses de Agosto de cada ano, os subsídios de férias nem os subsídios de Natal, no total de € 9.669,59.

Na contestação, o Réu, a pugnar pela improcedência da acção e pela sua absolvição do pedido, solicitou a condenação da Autora como litigante de má fé, alegando que as partes celebraram entre si um contrato de prestação de serviço que podia ser denunciado por ambas as partes sem obrigação de indemnização, mediante aviso prévio de 60 dias, tendo o Réu accionado a cláusula em que tal se estipulava e comunicado à Autora a cessação do contrato com respeito pelos prazos previstos e que a Autora conhecia os termos desse contrato, tendo concordado com as condições da sua denúncia.

A Autora respondeu à contestação, dizendo que não litigou de má fé porque até juntou com a petição inicial alguns documentos de onde resulta que o Réu caracterizava a relação jurídica existente entre as partes como emergente de um contrato de prestação de serviço, embora o não fosse por a sua execução configurar um autêntico contrato de trabalho subordinado.

Na audiência de discussão e julgamento (acta de fls. 165 e seguintes), o Réu arguiu a nulidade do contrato dos autos, caso se considere contrato de trabalho, por a Autora só poder ser admitida por concurso público e por ser proibida a celebração de contratos de trabalho na Administração Pública, defesa essa que foi admitida nos termos do artigo 489.º, n.º 2, última parte, do Código de Processo Civil, apesar da oposição da Autora.

A Autora optou pela indemnização de antiguidade em detrimento da sua reintegração, conforme ficou a constar da acta de fls. 172.

Na 1.ª instância a acção foi julgada improcedente, com a consequente absolvição do Réu do pedido.

Apelou a Autora, sem sucesso, pois o Tribunal da Relação de Lisboa negou provimento ao recurso.

  1. Mantendo o seu inconformismo, vem a Autora pedir revista, terminando a respectiva alegação com as conclusões que se transcrevem: 1. A A. intentou a presente acção contra o R. invocando em suma que tendo sido admitida ao serviço do R. como monitora de natação este rescindira o contrato em 26 de Setembro de 2004, rescisão que impugnava com fundamento em ilicitude, uma vez que o vínculo que existia entre as partes era um vínculo emergente de um contrato de trabalho subordinado e não de um contrato de prestação de serviços como o R. invocava à luz de um contrato incorrectamente qualificado como tal; 2. Dos factos provados sob os n.os 2, 3, 6, 8, 9, 10, 11, 12, 15, 16, 17, 19, 21 e 22 decorre que ficaram provados nos autos todos os requisitos cumulativamente exigidos para que se presuma existente o contrato de trabalho entre as partes à luz da presunção estabelecida pelo art. 12.º do Código do Trabalho, com a redacção anteriormente à Lei 9/2006, uma vez que o despedimento da A. ocorreu em 26 de Setembro de 2004; 3. Provados que estão todos os pressupostos da presunção estabelecida pelo art. 12.º do Código do Trabalho e não tendo o R. ilidido tal presunção (arts. 342.º e 350.° do Código Civil) não poderia a acção deixar de ser considerada procedente; 4. Quer antes quer depois do contrato datado de 2 de Dezembro de 2003 a retribuição da A. era a contrapartida pela actividade prestada de acordo com o que fora contratado e o que varia é o facto de a partir do contrato celebrado em 2 de Dezembro de 2003, a A. ter de "acertar contas" com quem a fosse substituir nas aulas que não pudesse dar; 5. Mas aquelas substituições estavam previstas desde o início da prestação de trabalho da A. ao R., subordinadas ao controle do Coordenador, e a serem feitas com o recurso a outros monitores do R. - Ver n.os 11 a 14 dos factos dados por provados; 6. O facto de ser o R. a pagar ao substituto ou ser a A. era somente uma matéria de maior facilitação no processamento das retribuições pelo R., pois mantinha-se o controle por este das substituições e do modo como podiam ser feitas, não descaracterizando o facto de a retribuição da A. ser a contrapartida do trabalho efectuado, sendo estabelecida em razão do número de horas ajustadas, como resulta do facto provado sob os N.os 10 e 11; 7. Deste modo, ao contrário do decidido no Acórdão recorrido, resulta inequívoco que, no caso dos autos, também se verificava o requisito previsto na citada alínea c) do art. 12.º do Código do Trabalho; 8. O Acórdão recorrido ao decidir como decidiu violou o art. 12.º do Código do Trabalho, na redacção anterior à Lei 9/2006 e os arts. 342.º e 350.º do Código Civil.

    O Réu contra-alegou para defender a confirmação do acórdão da Relação.

    No mesmo sentido se pronunciou a Exma. Magistrada do Ministério Público neste Supremo Tribunal, no entendimento de que a matéria de facto provada evidencia a execução de um contrato de prestação de serviço e, caso se tratasse uma relação laboral, «nunca o R. poderia ser condenado nomeadamente a "reintegrar" a A.», de harmonia com a orientação da recente jurisprudência que este órgão jurisdicional adoptou na sequência do juízo de inconstitucionalidade, emitido pelo Tribunal Constitucional no Acórdão de 11 de Julho de 2007, quanto à possibilidade de os institutos públicos celebrarem contratos de trabalho em violação do Decreto-Lei n.º 427/89, de 7 de Dezembro.

    A tal parecer respondeu a Autora para expressar a sua discordância, reafirmando o anteriormente alegado quanto à natureza do contrato e aduzindo que, no caso, "não optou pela reintegração mas antes pela indemnização" e toda a jurisprudência do Tribunal Constitucional "sobre esta matéria tem reconhecido o direito à indemnização nos casos de resolução ilícita do contrato de trabalho".

    Corridos os vistos, cumpre decidir.

    II 1. As instâncias fixaram, sem crítica das partes, a matéria de facto provada, nos termos que seguem: 1. O R. é um instituto público dotado de personalidade jurídica, autonomia administrativa, financeira e patrimonial, criado pelo DL 96/2003 de 7 de Maio, e que absorveu o CAAD - Complexo de Apoio às Actividades Desportivas, o qual foi extinto, sucedendo-lhe o R. na titularidade de todos os direitos, obrigações e atribuições.

  2. Tal como o CAAD, o R. dedica-se ao ensino de natação nas piscinas do Estádio do Jamor.

  3. Em 1 de Maio de 1999, o CAAD e a A. celebraram o contrato junto a fls. 92 a 95 denominado "contrato de prestação de serviços em regime de avença", cujo teor se dá por integralmente reproduzido, para o desempenho pela A. das funções de monitora de natação, dispondo a sua cláusula 1.ª o seguinte "O presente contrato tem por objecto a prestação, pelo segundo outorgante, de serviços de apoio ao primeiro no âmbito de assistência técnica especializada ao Complexo de Piscinas do Jamor-CAAD, como técnico de natação".

  4. A cláusula 7.ª de tal contrato dispõe que "A denúncia do presente contrato poderá ser feita por escrito pela parte que a pretende, mediante aviso prévio de 60 dias, sem obrigação de indemnização".

  5. Tal contrato foi alterado em 2 de Dezembro de 2003 nos termos constantes do documento de fls. 96 e 97, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

  6. Desde 1 de Outubro de 1998 que a A. tem desempenhado essas funções de monitora de natação primeiramente para o CAAD e...

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