Acórdão nº 08P1130 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Maio de 2008

Magistrado ResponsávelMAIA COSTA
Data da Resolução14 de Maio de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I. RELATÓRIO AA foi condenado, entre outros arguidos, pelo Tribunal Colectivo da comarca de Valpaços, como autor material de: a) um crime de roubo agravado, p. e p. pelo art. 210°, nºs 1 e 2, b) do Código Penal (CP), na pena de 6 anos de prisão; b) um crime de roubo agravado, p. e p. pela norma indicada, na pena de 5 anos de prisão; c) um crime de dano, p. e p. pelo artigo 212°, n° l do CP, na pena de 6 meses de prisão; d) dois crimes de coacção grave, p. e p. pelos arts. 154°, n° l e 155°, n° l, a) do CP, na pena de 2 anos de prisão, por cada um; e) um crime de roubo agravado, p. e p. pela norma acima indicada, na pena de 4 anos e 8 meses de prisão; f) um crime de falsificação, p. e p. pelo art. 256°, n°s l, c) e 3, do CP, na pena de l ano e 6 meses de prisão; g) um crime de roubo agravado, p. e p. pela norma atrás indicada, na pena de 5 anos de prisão; h) um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art. 275°, n° l, do CP, na pena de 3 anos de prisão.

Em cúmulo jurídico destas penas parcelares, foi condenado na pena única de 14 anos de prisão.

Deste acórdão recorreu o arguido para a Relação do Porto, impugnando a matéria de facto e também a matéria de direito, quer quanto à subsunção dos factos, quer quanto à medida das penas parcelares e unitária.

A Relação deu provimento parcial ao recurso, absolvendo o arguido do crime de dano e do crime de roubo agravado mencionado na al. g), e condenando-o na pena única de 10 anos de prisão.

Mais uma vez inconformado, recorre o arguido para este Supremo Tribunal de Justiça, concluindo assim a sua motivação: 1) O arguido foi condenado na pena única de 10 (dez) anos de prisão pela prática de três crimes de Roubo Agravado, dois crimes de coacção grave, um crime de falsificação e um crime de detenção de arma ilegal; 2) O Douto Acórdão de que se recorre, bem como o da Primeira Instância, erraram, com o devido respeito, na qualificação jurídica do crime, considerado como, de roubo agravado previsto e punido pelo nº 1 e 2, al. b), do art. 210º do Código Penal, na pena de 6 (seis) anos de prisão, ao veículo da GNR, com o qual o recorrente não pode concordar.

3) Ora, resulta da matéria de facto produzida em sede de audiência, que a viatura da GNR, se encontrava com a chave na ignição e a trabalhar, conforme resulta do depoimento da testemunha BB (cassete nº 6, lado b, de 2224 a 2356) e do próprio visionamento das imagens captadas pela Radiotelevisão Portuguesa (RTP), bem como das declarações das testemunhas que os arguidos CC e DD, após o primeiro retirar de um saco uma "shotgun", entraram para o carro da GNR, para o lugar do condutor e passageiro, respectivamente, e fugiram do local.

4) Face ao enquadramento factual, aferido pela prova produzida, estamos perante um crime de furto de uso de veículo e não roubo agravado. Isto porque, 5) Nenhuma violência foi exercida pelo arguido DD, não tendo usado nenhuma arma, ou sequer apontado qualquer arma aos agentes da GNR e assim, não os ameaçou na sua vida ou integridade física.

6) O arguido DD limitou-se a introduzir-se dentro de uma viatura que aí estava parada, com a chave na ignição, e em funcionamento, segundo o arguido CC.

7) Não houve intenção dos arguidos, e muito menos ainda em particular do recorrente, de se apropriarem da viatura em causa, tendo apenas esta sido usada como meio de fuga. Tendo sido aliás, pouco tempo depois abandonada e recuperada pela GNR.

8) Pelo que estamos aqui perante um crime de furto de uso de veículo e não de um crime de roubo, cujo elemento diferenciador em relação ao crime de furto, bem como ao crime de roubo que absorve o anterior, está na especificidade da intenção do agente: no caso de furto e de roubo, a intenção é a de "apropriado", no sentido de tomar posse de facto sobre a coisa, contra a vontade do proprietário, passando a actuar com animo domini, integrando-a na sua esfera patrimonial ou de terceiro; no furto de uso de veículo, diversamente, a intenção é apenas a "utilização" abusiva, com a mera tomada da disponibilidade de veículo para benefício do seu uso - cfr. a título de exemplo o ac. STJ de 18 de Março de 1988, BMJ 375, 218.

9) E mesmo em caso de uso de violência, a apropriação de veículo integra um crime de furto de uso de veículo - vide ac. STJ de 30 de Janeiro de 1991; CJ, XVI tomo I, 12.

10) Pelo que a condenar o arguido DD, o mesmo deve ser condenado pela prática do crime supra referido, e não pela prática do crime de roubo, em pena nunca superior a 6 meses, atentas as considerações quanto à sua primariedade e condições sócio-económicas e pessoais, insertas nos autos.

11) Sem prescindir, caso o Meritíssimo Tribunal não entenda ser essa a subsunção jurídica adequada, sempre terá de diferenciar a postura do arguido CC e a do recorrente, uma vez que este último não usou de qualquer tipo de violência - quem segurava a arma era o arguido CC.

12) Pelo que, a condenação em roubo agravado não se adequa, no que ao recorrente importa, devendo ser diferenciada a actuação dos arguidos, devendo o tribunal, caso não entenda enveredar pela qualificação em furto de uso de veículo, condenar o recorrente num crime de furto simples, condenando-o numa pena nunca superior a 6 meses.

13) São excessivas as penas aplicadas a cada um dos crimes, bem como é manifestamente excessiva a pena unitária de dez anos aplicada ao arguido Recorrente, sendo nítida a violação do artigo 71º do Código Penal.

14) O artigo 71º nº 1 do Código Penal, determina que o quantum da pena de prisão seja fixado em função da culpa do agente e das exigências de prevenção.

15) O nº 2 do referido artigo 71º, determina que o tribunal na fixação da medida concreta da pena atenda a todas as circunstâncias, que não fazendo parte do tipo de crime deponham a favor ou contra ele, considerando nomeadamente as circunstâncias atenuantes e agravantes apresentadas nas alíneas a) a f).

16) Nos termos do modelo supra mencionado: a) Toda a pena serve finalidades exclusivas de prevenção, geral e especial; b) A pena concreta é limitada, no seu máximo inultrapassável, pela medida da culpa; c) A pena concreta é determinada, dentro do referido limite máximo, atendendo a uma moldura de prevenção geral de integração, cujo limite superior é oferecido pelo ponto óptimo de tutela penal dos bens jurídicos e cujo limite inferior é constituído pelas exigências mínimas de defesa do ordenamento jurídico; d) Dentro da moldura de prevenção geral de integração, a medida da pena é encontrada em função das exigências de prevenção especial, em regra positiva ou de socialização excepcionalmente negativa ou de intimidação ou segurança individuais.

17) Salvo o devido respeito, o douto acórdão não ponderou tal dinâmica.

18) O arguido apesar de se ter iniciado aos 14 anos no consumo de estupefacientes, não tem antecedentes criminais, contando actualmente com 40 anos de idade.

19) Tem mantido ocupação laboral, embora precária e não fixa, conforme desejaria, sustentando-se a si próprio, ou pelo menos, contribuindo, sempre que possível, de alguma forma para as despesas domésticas, no lar onde sempre viveu, com seus pais, e actualmente, apenas com a sua mãe, de 82 anos de idade.

20) Mantém laços consistentes com os familiares, os quais se mostram receptivos a apoiá-lo, com quem sempre contou, tanto durante a sua vida de toxicodependente, tendo os seus irmãos patrocinado por diversas vezes desintoxicações, como depois de ter sido detido, pois foi visitado regularmente pelos seus familiares, conforme se verifica pela Relatório Social junto aos autos, a fls. 1883 e segs.

21) O recorrente cumpre escrupulosamente com o seu dever de apresentação periódica, três vezes por semana, como de resto lhe foi imposto.

22) E manifesta o propósito de alterar o seu estilo de vida, procurando organizar o seu quotidiano para não voltar a delinquir.

23) Após ter sido restituído à liberdade em finais de Setembro de 2007, por força de terem sido excedidos os prazos de duração máxima de prisão preventiva em que se encontrava, mantém uma postura...

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