Acórdão nº 08A631 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 17 de Abril de 2008

Magistrado ResponsávelMOREIRA CAMILO
Data da Resolução17 de Abril de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I - No Tribunal Judicial da Comarca de Matosinhos, AA, BB, CC e DD intentaram acção declarativa de condenação, com processo ordinário, contra EE, FF, GG, HH e marido II, JJ e marido KK, pedindo que, com a procedência da acção: "Seja proferida decisão que produza os efeitos das declarações em falta, que aos réus cumpria emitir como sucessores do falecido promitente-vendedor no contrato-promessa de compra e venda referido nos artºs. 1º e 2º desta petição inicial, por ele celebrado com o também falecido Pai das autoras, promitente-comprador, declarando transmitida da titularidade dos réus para a das autoras a propriedade dos lotes n.ºs .., .., .., .. e.. do loteamento sito na Rua da .................. (antes, Rua do ................), na freguesia de S. Mamede de Infesta, concelho e comarca de Matosinhos, inscritos na matriz predial urbana da freguesia de S. Mamede de Infesta, sob os artºs n.ºs ...... (lote n.° 3), ...... (lote n.° 4), ..... (lote n.° 5), ..... (lote n.° 6) e .... (lote n.º 7), e descritos na Conservatória do Registo Predial de Matosinhos, sob os n.ºs ....../...... - S. Mamede de Infesta (lote n.° ..),................. - S. Mamede de Infesta (lote n.º ..), ...................... - S. Mamede de Infesta (lote n.º ..), .......... S. Mamede de Infesta (lote n.º ..) e .............-S. Mamede de Infesta (lote nº ..); condenados os réus a verem decidido em conformidade com o peticionado nas alíneas anteriores; - e - ordenado o cancelamento de qualquer registo relativo aos mencionados lotes, efectuado em detrimento dos direitos das autoras".

Contestaram os Réus EE, FF e GG, pedindo que se declarem os 2.º e 3.º RR partes ilegítimas e o 3º isento de custas por à lide não ter dado causa.

Contestaram também os Réus JJ e marido KK e HH e marido II, pugnando pela improcedência da acção, por inexistência de título bastante para suportar a pretensão das Autoras.

Houve réplica.

No despacho saneador foi decidido que todos os Réus são partes legítimas.

Houve dois recursos de agravo interpostos pelos Autores (a subir diferidamente), um respeitante ao despacho de indeferimento do pedido de depoimento de parte dos Réus (os Autores, por lapso, referiram depoimento de parte dos Autores) e outro referente à notificação de alegações à parte contrária, tendo, após a rectificação do aludido lapso cometido pelas Autoras, sido o primeiro agravo reparado a fls. 567, o que, lamentavelmente, passou despercebido à Relação, a qual se pronunciou sobre o mesmo, considerando, quanto a ele, haver inutilidade superveniente da lide.

A final, foi proferida sentença, pela qual, se julgou a acção procedente, condenando-se os Réus nos termos do referido pedido.

Após apelação dos Réus HH e marido II e JJ e marido KK, foi, no Tribunal da Relação do Porto, proferida decisão singular, pelo Relator, ao abrigo do disposto no artigo 705º do Código de Processo Civil (CPC), nos termos da qual, na parte que aqui releva, se decidiu julgar improcedente a apelação, confirmando-se a decisão recorrida, para cujos fundamentos se remeteu.

Notificados, os apelantes vieram reclamar para a conferência, nos termos do artigo 700º, nº 3, do CPC, após o que foi proferido acórdão, o qual julgou procedente a apelação, revogando a sentença recorrida e absolvendo os Réus do pedido.

Inconformados, vieram as Autoras interpor o presente recurso de revista, o qual foi admitido.

As recorrentes apresentaram alegações, formulando as seguintes conclusões: 1ª - O acórdão sub censura considerou que "a questão prévia suscitada pelas Autoras", quanto à impossibilidade "de a Relação conhecer da inadmissibilidade da execução específica [do contrato-promessa incorporado de fls. 20 a 21 e 184 a 185 (I volume)] defendida pelos "recorridos", "apenas nas suas alegações de recurso de apelação", não se qualifica como "questão nova".

  1. - A decisão sobre a inadmissibilidade de execução específica do contrato-promessa exige a indagação e o apuramento da vontade real dos promitentes-contraentes - matéria de facto, cuja fixação compete às instâncias.

  2. - É "questão" - e não mero argumento jurídico. E é "nova, porque, antes, nem as partes, nem o tribunal se confrontaram com ela. Assim, o tribunal recorrido "não podia tomar conhecimento" dela. 4ª - Havendo tomado conhecimento - tendo-a decidido -, o acórdão sub censura incorreu em excesso de pronúncia, sendo, assim, nulo [art.º 668.º/1/d/II parte do Código de Processo Civil].

  3. - O contrato-promessa sub Júdice foi celebrado em 30 de Outubro de 1986, quando ainda não havia sido publicado o Decreto-Lei nº 379/86, de 11 de Novembro, vigorando, por conseguinte, o art.º 830º do Código Civil, na redacção do Decreto-Lei nº 236/80, de 18 de Julho.

  4. - O Decreto-Lei nº 379/86 não contém norma que estabeleça a eficácia retroactiva da nova redacção do art.º 830º do Código Civil.

  5. - O Decreto-Lei nº 379/86 alterou o regime fixado pelo Decreto-Lei nº 236/80; não é um diploma interpretativo, tem carácter inovador.

  6. - Inexistindo a norma constante do nº 2 do art.º 830º do Código Civil, com a redacção do Decreto-Lei nº 379/86, não é possível resumir a vontade dos promitentes-compradores, com um conteúdo, sentido e alcance deles desconhecido, quando a manifestaram.

  7. - Aplicando o regime resultante do Decreto-Lei nº 379/86 ao contrato-promessa sub Júdice, o acórdão sub censura violou o disposto nos art.ºs 12º/1 e 2 e 830º do Código Civil (na redacção que lhe foi conferida pelo Decreto-Lei nº 236/80).

  8. - Na vigência do contrato-promessa sub judice, o promitente-comprador (Pai das Autoras) pagou integralmente o preço e requereu a "notificação judicial" dos recorridos para formalizarem a compra e venda (por não conseguirem acordar com os demais réus em fazê-lo); e as autoras (sucessoras do promitente-comprador) "instauraram (...) acção especial de fixação judicial de prazo", em que "veio a ser proferida (...) sentença" fixando aos réus prazo para indicarem dia, hora e Cartório Notarial para a realização da escritura.

  9. - O promitente-comprador, Pai das Autoras, estas, que lhe sucederam, o promitente-vendedor e a maioria dos seus sucessores manifestaram reiteradamente a vontade de celebrar a escritura pública de compra e venda, nunca excluindo a possibilidade da execução específica.

  10. - O tribunal recorrido não considerou esta factualidade - apurada e fixada em 1ª instância, patente no processo e integrante do acórdão sub censura - não a interpretou, segundo os critérios legais, nem retirou dela as consequências por ela postuladas.

  11. - Não havendo tomado conhecimento desta questão - não a decidindo -, o acórdão sub censura incorreu em omissão de pronúncia, sendo, assim, nulo [art.º 668º/1/d), I parte do Código de Processo Civil].

Pedem, assim, que, com o provimento do recurso, seja o acórdão recorrido anulado ou revogado e que, em seu lugar, seja proferida decisão que confirme a sentença da 1ª instância, ou, se assim não for decidido, que seja anulado e ordenado que o processo baixe ao Tribunal da Relação, a fim de a decisão de facto ser ampliada, em ordem a constituir base suficiente para a decisão de direito.

Contra-alegaram os recorridos, defendendo a confirmação do acórdão impugnado.

Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

II - No acórdão recorrido foram dados por provados os seguintes factos: 1) Em 30 de Outubro de 1986, o pai das Autoras, LL, viúvo, residente na Rua ............, ....1, na freguesia de S. Mamede de Infesta, concelho de Matosinhos, celebrou com MM, pai dos Réus, um acordo ao qual chamaram contrato-promessa de compra e venda, nos termos do qual prometeu comprar e o referido MM prometeu vender, pelo preço de esc. 16.000.000$00, os lotes nºs 3, 4, 5, 6, 7 e 8 de um terreno de que o último era dono, sito na então denominada Rua do...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
3 temas prácticos
3 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT