Acórdão nº 07B1321 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 28 de Fevereiro de 2008

Magistrado ResponsávelRODRIGUES DOS SANTOS
Data da Resolução28 de Fevereiro de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça 1. Na 11ª Vara Cível da Comarca de Lisboa, LS&R, S.A., propôs acção declarativa de condenação, com processo ordinário, contra AA SPA, alegando que celebrou com a ré, em 2 de Dezembro de 1997, um contrato de agência, que vigorou até 31 de Dezembro de 1998, mas que se renovou anualmente, na falta de rescisão, que, no entanto, veio a ocorrer em 22 de Setembro de 2004,sem que a ré tenha respeitado a antecedência de três meses relativamente à renovação do contrato.

Mais alega que, com tal conduta, a ré causou grande prejuízo à autora, tanto a nível de danos patrimoniais, danos emergentes e lucros cessantes, como a nível de danos não patrimoniais de imagem, devendo-lhe, deste modo, € 17.934,28 (construção de um comer), € 50.000,00 (produto modelo, inútil para venda), € 77.000,00 (publicidade autorizada e não recebida), € 125.158,19 (indemnização de clientela), € 130.000,00 (lucros cessantes) e € 100.000,00 (danos de imagem), o que perfaz o total de € 500.092,47.

Alega, ainda, que, devendo à ré o valor de € 200.127,23 de encomendas de produtos recebidos, fazendo-se a devida compensação, resulta um saldo favorável à autora de € 299.965,24.Conclui, assim, que deve a acção ser julgada procedente e, em consequência, ser:

  1. Reconhecida a ilegalidade da denúncia contratual da ré; b) A ré condenada a receber, a título de devolução, os produtos que a autora não conseguir vender por efeito da ilegal denúncia contratual; c) Condenada a ré a indemnizar a autora pelos prejuízos causados por via da denúncia da agência, sem observância de pré-aviso e perca de quota de mercado (lucros cessantes); d) Condenada a ré a indemnizar a autora por danos emergentes (comer ou «espaço dedicado», produto modelo, inútil para venda) e danos de imagem, que lhe foram provocados com a denúncia inadvertida do contrato; e) Condenada a ré a indemnizar a autora pela clientela angariada por esta no âmbito da agência; f) Condenada a ré a pagar à autora as despesas de publicidade por esta efectuada no âmbito da vigência do contrato de agência; g) Admitida a compensação de créditos da ré sobre a autora, cujo saldo será a liquidar em " execução de sentença", com a liquidação efectiva de todos os valores em referência nas alíneas anteriores b) a g).

    A ré contestou, por excepção, alegando que o Tribunal de Lisboa é incompetente para julgar a presente questão, já que, as partes decidiram, livre e conscientemente, na cláusula 28ª do contrato invocado, reservar exclusivamente à jurisdição italiana a competência para a dirimir, com atribuição exclusiva ao Tribunal da Comarca de Verbania, inserindo-se o caso no âmbito de aplicação da Convenção de Bruxelas, conforme o seu artigo 17º, 1º pelo que, deve a ré ser absolvida da instância.

    Contestou, ainda, por impugnação, alegando que a denúncia do contrato, com pré-aviso e justa causa, resulta dos graves incumprimentos do contrato pela autora, pelo que, carecem de fundamento os pedidos de indemnização de clientela e de ressarcimento dos prejuízos feitos pela autora.

    Em sede de reconvenção, alega que aqueles incumprimentos lhe causaram prejuízos, que deverão ser reparados pela autora.

    Conclui, deste modo, que deve ser absolvida dos pedidos formulados pela autora, devendo esta ser condenada a reconhecer que a denúncia do contrato de agência é legítima e eficaz, porque feita três meses antes da data do seu termo (31 de Dezembro de 2004) e por justa causa, ou, se assim não for entendido, a reconhecer que a resolução do referido contrato foi por justa causa imputável à autora, e, de todo o modo, a pagar à ré a dívida já reconhecida de € 200.127,23 e a indemnização para ressarcimento dos danos emergentes e lucros cessantes, cuja liquidação remete para " execução de sentença." A autora replicou, alegando que a causa de pedir se prende com o incumprimento de um contrato totalmente executado em território português e que, encontrando-se a autora domiciliada em território nacional, é manifesta a dificuldade da sua deslocação ao estrangeiro para propositura e acompanhamento desta acção, o que confere competência ao presente Tribunal para o julgamento da causa, nos termos do disposto nos artigos 65°,nº1, alíneas c) e d) do Código de Processo Civil.

    Contestou, ainda, a autora o pedido reconvencional, concluindo que o mesmo deve ser julgado improcedente.

    A ré treplicou, concluindo como na reconvenção.

    Seguidamente, conhecendo-se da excepção da incompetência do tribunal, foi proferida decisão do seguinte teor: " Por tudo o exposto, julga-se procedente a excepção dilatória de incompetência relativa por preterição do pacto privativo de jurisdição, declarando-se a jurisdição portuguesa, e esta Vara em concreto, incompetente para o presente pleito, pelo que, ao abrigo do disposto nos artigos 111º, nº3, 494º, alínea a) e 493º, nº2, todos do Código de Processo Civil., absolvo a ré, AA SPA da instância." Inconformada, a autora agravou para o Tribunal da Relação de Lisboa, e com êxito, já que aquele tribunal decidiu conceder provimento ao agravo, revogando a decisão recorrida e declarando competente para conhecer do objecto da acção a 11ª Vara Cível de Lisboa.

    Inconformada, desta vez a ré, agravou em 2ª instância.

    Alegou e concluiu: Não existe no caso "sub judice" qualquer dúvida que nos encontramos perante um litígio privado internacional.

    -As ora Recorrente e Recorrida, decidiram livre e conscientemente na cláusula 28ª do contrato invocado reservar exclusivamente à jurisdição italiana a competência para dirimir a presente questão, com atribuição exclusiva, dentro da jurisdição italiana, ao Tribunal da Comarca de Verbania.

    -O pacto atributivo de jurisdição que está expresso naquela cláusula 28ª, mostra-se celebrado com confirmação escrita por ambas as partes, de boa-fé e livremente, aliás, com aceitação expressa dessa cláusula 28ª.

    -O pacto atributivo de jurisdição estipulado pelas partes tem pois, de considerar-se válido "para qualquer controvérsia relativa ao presente contrato" (cláusula 28ª).

    -O nº 1 do artigo 23º do Regulamento, a que correspondia o § 1º do artigo 17º da Convenção, prevê que os pactos atributivos conferem competência exclusiva, a menos que as partes convencionem em contrário.

    -Convencionada a competência pelas partes, como é o caso, é irrelevante que uma delas, contra a vontade da outra, venha, posteriormente, denunciar unilateralmente o estipulado.

    -É exclusiva, a competência resultante de pactos atributivos de jurisdição, previstos pelo artigo 23º, nº1, com as limitações do nº 3 e do nº 5, do Regulamento nº 44/2001 do Conselho, de 22 de Dezembro de 2000, que corresponde ao artigo 17º, º§,1º com as limitações do § 2º e do § 4º, da Convenção de Bruxelas, de 27 de Setembro de 1968, relativa à competência judiciária, reconhecimento e execução de decisões, em matéria civil e comercial.

    -O Acórdão da Relação na sua conclusão, ítems de folhas penúltima do Acórdão, e identificados nestas alegações por ítems 1 - e 2-, entra em contradição, pois no item 1 - refere que os pedidos de indemnização formulados pela Autora são externos à relação contratual, afastando, por isso, a aplicação do pacto de jurisdição constante da cláusula 28ª e de seguida, no item 2 -, diz que se trata de matéria contratual.

    -Ora sendo matéria contratual, como é, e como muito bem o qualificou o Juiz da 1ª instância, ter-se-á de aplicar o estipulado pelas partes relativo ao pacto de jurisdição, constante da cláusula 28ª, em aplicação do artigo 1º (matéria civil e comercial) e artigo 23º (competência) do Regulamento (CE) 44/2001.

    -A denúncia unilateral não invalidou a escolha, sob pena de frustrar o fim comum visado pelas partes, quanto à eleição do foro.

    -A denúncia, ou qualquer outra forma de fazer extinguir unilateralmente obrigações contratuais, levada a cabo por qualquer das partes, seria uma forma tortuosa de subtracção ao negociado, maxime, à cláusula de eleição do foro, depois de se haver acordado na escolha do Tribunal. Os efeitos não são exteriores ao contrato, mas derivam e são parte incindível do próprio contrato.

    -Consequentemente, uma parte, sem consentimento da outra, mudaria as regras do jogo, quando este estava a ser jogado.

    -Fugia-se da razão da escolha comum, numa ocasião em que ela mais se faria sentir; ora, exactamente para tanto - para evitar a fuga - é que houve escolha .

    -A causa de pedir assenta fundamentalmente no contrato de agência, tratando-se de um litígio (controvérsia) ainda relacionado (relativo) com o mesmo contrato.

    -A Directiva Comunitária nº 86/653 transposta obrigatoriamente para a nossa ordem jurídica pelo Decreto-Lei 118/93, de 13/04 e para a ordem jurídica Italiana tem por vista harmonizar o contrato de agência na União Europeia relativamente às relações - Direitos e Deveres - de agente e comitente, em pleno pé de igualdade, clarificando e uniformizando essas relações em toda a U.E.

    -Tal transposição implica igual tratamento em todos os Estados-Membros. E estes não tratam de forma mais ou menos vantajosa o agente, mas todos o tratam de igual forma, por imposição da Directiva, nos termos do artigo 249º do Tratado de Roma.

    -A Directiva e o Decreto-Lei que a transpõe não impõem qualquer norma relativa à escolha do foro, deixando à liberdade das partes tal escolha. E foi o que aconteceu no caso "sub judice". As partes estipularam na cláusula 28ª do contrato que o Tribunal de Verbania - Itália seria o competente.

    -As Convenções Internacionais subscritas por Portugal, caso da Convenção de Bruxelas de 1968, têm valor superior ao das próprias leis nacionais.

    -O Regulamento Comunitário (CE) 44/2001, como todos os regulamentos comunitários, têm primazia sobre as leis nacionais.

    -O Regulamento tem carácter geral. É obrigatório em todos os seus elementos e directamente aplicável em todos os Estados-Membros, nos termos do artigo 249º do Tratado de Roma.

    -O Acórdão da Relação, ao não aplicar, no caso "sub judice", nomeadamente o artigo 23º do Regulamento (CE) 44/2001...

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