Acórdão nº 07A2381 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 22 de Janeiro de 2008

Magistrado ResponsávelMOREIRA ALVES
Data da Resolução22 de Janeiro de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Relatório No Tribunal Judicial da Comarca de Angra do Heroísmo.

AA, intentou a presente acção declarativa de condenação, com processo ordinário, contra Estado Português Pedindo a condenação do R. a pagar-lhe: - a quantia de 250.000,00€ a titulo de indemnização por danos não patrimoniais.

- a quantia de 92.253,43€ a título de danos patrimoniais, e - a quantia que venha a ser reputada apropriada para a compensação do dano decorrente da não concretização do projecto "BB - Exploração Hoteleira, Ldª.

Em resumo, alegou em fundamento: - O A. foi detido em 22/2/2000, e, após sujeição a 1º interrogatório de arguido detido, foi sujeito à medida de coação de prisão preventiva no âmbito do processo de inquérito nº 644/00.OJAPRT; - Após acusação, foi o A. submetido a julgamento que, a final, redundou em acórdão absolutório, na medida em que o processo se encontrava viciado desde a fase do inquérito; - De facto, a entidade que procedeu à investigação obteve prova legalmente inadmissível, decorrente da violação de correspondência determinando a nulidade de tudo quanto foi processada em consequência da valoração daquela prova; - O juiz de instrução, ao valorar aquele meio de prova proibida, aquando da apreciação dos pressupostos que determinaram a sua prisão preventiva, incorreu em erro grosseiro e violação da lei; - De igual modo, no mesmo vício incorreram todos aqueles magistrados (juízes de instrução e do julgamento) que mantiveram aquela medida de coação e que, num primeiro momento, condenaram o arguido (só em segundo julgamento realizado na sequência da anulação, em sede de recurso, do primeiro, é que o arguido - A. veio a ser absolvido); - Em consequência da privação de liberdade a sua vida privada e profissional, sofreu substanciais e anómalas alterações, atenta a repercussão negativa daqueles detenção e prisão preventiva no meio comunitário em que o A. se insere; - Alias, a própria privação da liberdade constitui um dano grave, na medida em que lhe causou enorme sofrimento; - Assim, apenas uma indemnização no valor de 250.000€ poderá compensar o sofrimento por que passou; - A detenção e prisão em causa traduziram-se, ainda, num prejuízo económico e financeiro, presente e futuro, que se projectava na esfera patrimonial do A; - É que a desconfiança gerada na comunidade determinam uma redução do número de clientes da sua empresa de prestação de serviços, para além de que surgiram encargos e compromissos durante o período de privação da liberdade que, por se encontrar preso, não pôde cumprir; - Da mesma forma, por estar preso, o A. não pôde concretizar o projecto denominado "BB - EXPLORAÇÃO HOTELEIRA, LDª, o que lhe originou um dano que se torna impossível de quantificar; - Os danos patrimoniais sofridos ascendem a 92.253,43€; - Incorrem, assim, o Estado Português em responsabilidade civil, por acto praticado no exercício da função jurisdicional, ao abrigo do disposto no Art. 225 do C.P.P.

Citado regularmente o R, devidamente representado pelo MºPº, veio contestar excepcionando a caducidade do direito do A., e a sua ilegitimidade quanto aos danos patrimoniais (sofridos pelas sociedades da qual o A. é sócio).

Impugnou a versão apresentada pelo A., concluindo: - pela procedência da excepção peremptória de caducidade com a consequente absolvição do R. do pedido.

- caso assim não se entenda, pela procedência da excepção dilatória de ilegitimidade activa, absolvendo-se o R. da instância, na parte pertinente; - não sendo assim, pela improcedência da acção e consequente absolvição do R. do pedido; - Caso se entenda verificados os pressupostos da responsabilidade civil, se julgue excluído o direito de indemnização do A. e - Caso não se entenda deste modo se decida pela limitação da indemnização a um montante meramente simbólico, e nunca superior ao mês de salário mínimo nacional.

Replicou o A. pugnando pela improcedência das excepções arguidas.

Nesse mesmo articulado o A. pretende alterar a causa de pedir. Assim, alega que a sua pretensão indemnizatória assenta, não em detenção e prisão preventiva manifestamente ilegal, mas antes na existência de erro grosseiro de todos os magistrados judiciais que intervieram no processo crime e que, com base na valoração de meios de prova proibidos; aplicaram e mantiveram a prisão preventiva e julgaram pela condenação do A.

Requer ainda o desentranhamento dos autos de todas as afirmações não provadas e contrárias ao direito fixado para o caso concreto pelo Ac. de 15/7/2001 do T da Relação, já que contém em si mesmas conotações desonrosas e ofensivas da dignidade do A.

Pode finalmente, a condenação do R. como litigante de má-fé, na medida em que, pretende, nesta acção "recorrer" de uma decisão já transitada, com a qual se conformou.

Triplicou o R.

Proferiu-se o despacho saneador-sentença, em que se conheceu da excepções arguidas pelo R.

Julgou-se, então, improcedente a excepção de caducidade, mas procedente a excepção de ilegitimidade activa, declarando-se o A. parte ilegítima "na parte referente à relação material controvertida que se prende com os prejuízos patrimoniais, presentes e futuros, verificados na esfera jurídica patrimonial das sociedades "Centro de Educação e Reabilitação da Ilha Terceira, Ldª" e "BB" . Exploração Hoteleira, Ldª.".

Quanto à pretendida alteração da causa de pedir, entendeu-se que o requerimento do A. nesse sentido, não alterava a causa de pedir, simplesmente alterava a fundamentação jurídica do pedido.

Por se entender estarem presentes todos os elementos necessários ao conhecimento do mérito conheceu-se do fundo no âmbito do saneador, concluindo-se pela improcedência da acção, com a consequente absolvição do R. do pedido.

Inconformado recorreu o A. para o Tribunal da Relação de Lisboa, o qual, por mera remissão para a sentença recorrida (Art. 713 nº 5 do C.P.C) julgou improcedente a apelação, confirmando aquela decisão.

Novamente inconformado, volta a recorrer o A., agora de revista e para este S.T.J.

Conclusões Apresentadas tempestivas alegações, formulou o A. recorrente as seguintes conclusões: Conclusões de Revista do A.

1. Ao manter a douta sentença em crise, o douto acórdão de que se recorre interpreta erroneamente o disposto nas nos artigos 265.°, 266.° - B e 508.°, todos do C.P.C., ao não ter ordenado (i) o aperfeiçoamento dos articulados do Recorrente (por forma a inteligir a causa de pedir na acção; (ii) ao não ter convidado o Recorrido ao aperfeiçoamento do seu articulado, expurgado das identificadas irregularidades; 2. Interpretou ainda de forma deficiente o regime legal resultante do preceituado pelas disposições conjugadas dos artigos 225.° e 226.° do C.P.P., 22.°, 27.°, n.° 5 e 62.° da Constituição, da República Portuguesa, 17.° da Declaração Universal dos Direitos do Homem, art. 1.° do protocolo adicional à Convenção Europeia para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, artigo 17.° da Carta de Direitos Fundamentais da União Europeia e art. 26.° do C.P.C. ao julgar o Recorrente como parte ilegítima relativamente ao pedido de indemnização por danos-patrimoniais por si deduzido; 3. Interpretou incorrectamente o preceituado nos artigos 264.°,-265.°, 508.°, 653.° e 657.° do C.P.C., ao manter a decisão que impunha ao A., ora Recorrente a obrigação de expor de forma exaustiva nos seus articulados a qualificação jurídica dada por si aos factos nos quais assentou a sua pretensão, desta forma condicionando todo o processo, impedindo desde logo qualquer produção de prova testemunhal ou pericial, bem como a discussão jurídica dos aspectos da causa e a sua aplicação à factualidade provada bem como quanto à que se viesse a provar; 4. O douto acórdão em crise, mantendo a douta sentença recorrida e para a mesma remetendo em sede de fundamentação, interpretou incorrectamente o disposto no artigo 225.° do C.P.P., o qual deve ser interpretado à luz das disposições conjugadas dos artigos 22.°, 27.°, n.° 5 da Constituição da República Portuguesa, dos princípios e disposições constitucionais materiais vertidos no Código de Processo Penal, da Declaração Universal dos Direitos do Homem e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem [designadamente do parágrafo 5.° do artigo 5.°, na interpretação restritiva que faz de tal artigo. Violando frontalmente a Constituição da República Portuguesa bem como .as acima citadas normas imperativas de direito internacional.

5. Deveria outrossim ter decidido que os vícios, que enfermaram o processo crime e conduziram à prisão preventiva ilegal e injustificada do A., ora Recorrente, eram manifestos e estavam ao alcance do senhor Juiz de Instrução Criminal, bem como de todos os digníssimos Magistrados que vieram a ter intervenção nas reapreciações da medida de coacção aplicada e na sentença proferida. Vícios esses que, fruto de uma nulidade insanável, jamais poderiam ter valorado a apreensão de produto estupefaciente, de onde decorreu a inexistência de qualquer hipótese legalmente admissível de vir a ser aplicada ao A., ora Recorrente, qualquer pena ou medida de segurança; 6. Deveria ter concluído que, face ao disposto pelos artigos 118.°, 1.26.°, 174.°, 179.°, 252.° e 31.1.° todos do C.P.P. e 26.° e 34.° da Constituição da República Portuguesa, seria obrigatória na fase de inquérito, a detecção da nulidade da apreensão de correspondência, ou, no limite, no saneamento do processo, após acusação, a qual não poderia ter sido aceite; 7. Deveria ter apreciado e concluído pela não existência de base para concluir que a liberdade do Recorrente constituía (i) um perigo de perturbação do decurso do inquérito ou para a instrução do processo, (ii) implicasse a continuação da actividade criminosa (o que pressupõe uma certa reiteração, ou, no mínimo, repetição, e não um acto isolado como poderia resultar de uma leitura, ainda que incorrecta, dos factos), (iii) constituísse uma perturbação para a ordem pública, e, por último, (iv) perigo de fuga de uma ilha localizada a meio do Oceano Atlântico, como é o caso da...

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