Acórdão nº 043497 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 17 de Fevereiro de 1993
Magistrado Responsável | FERREIRA DIAS |
Data da Resolução | 17 de Fevereiro de 1993 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça 1- Acusado pelo Excelentíssimo Magistrado do Ministério Público, respondeu, em processo comum e com a intervenção do Tribunal Colectivo da comarca de Celorico de Basto, o arguido A, solteiro, trolha, de 24 anos, com os demais sinais dos autos, tendo sido condenado: - pela prática de um crime de homicídio previsto e punível pelo artigo 131 do Código Penal: na pena de nove anos de prisão; e - pela prática de um crime previsto e punível pelo artigo 26 do Código Penal: na pena de quatro meses de prisão, substituídos por igual tempo de multa à taxa de 200 escudos diários, na alternativa de 80 dias de prisão. Efectuado o cúmulo, foi o arguido condenado na pena única de nove anos de prisão e na multa de 24000 escudos, multa essa na alternativa de 80 dias de prisão. Quanto ao pedido cível deduzido por B, foi ele julgado parcialmente procedente e, consequentemente, o arguido condenado a pagar-lhe a indemnização de 3953199 escudos e 80 centavos, bem como a pagar ao Centro Regional de Segurança Social do Porto e ao Centro Nacional de Pensões, respectivamente, 24420 escudos e 290680 escudos. Foi ainda condenado na parte fiscal e declarada perdida a arma examinada a folhas 14 a favor do Estado. 2- Inconformado com tal decisão, dela interpôs o presente recurso o arguido, motivando-o nos seguintes termos: - Ao não indicar as provas que serviram para formar a convicção de que o arguido quis disparar contra a vítima e tirar-lhe a vida, quando a única prova que tinha ia no sentido de que o arguido quis disparar contra a mão da vítima, o tribunal "a quo" violou o artigo 74 n. 2 do Código Penal, pelo que a sentença é nula; - julgando com base no princípio "in dubio contra reo", violou o tribunal o princípio "in dubio pro reo"; - Ao concluir que o arguido deveria ter fugido ao agressor e não ido buscar a arma para se defender, o Tribunal impôs ao arguido um facto desonroso e aviltante e não lhe concede o direito de legítima defesa; - Ao concluir que o arguido só tinha o direito de legítima defesa após ter sido agredido pela vítima e não quando a agressão era iminente, o Tribunal nega a figura jurídica da agressão iminente e interpreta mal o conceito de agressão actual e viola o disposto no artigo 32 do Código Penal; - Ao ter dado como provado que a vítima entrou na cozinha onde o arguido se encontrava a jantar, logo lhe tenha chamado "filho da puta", "ladrão", "gatuno" e "é hoje que te mato", empunhando de seguida uma chave de fendas em atitude de ameaça, dirigindo-se com ela na direcção do arguido, e ao não considerar estes factos como uma provocação para efeitos da atenuação especial da pena, o Tribunal errou na interpretação da provocação injusta e violou o artigo 73 n. 2 alínea b) do Código Penal; - Ao impedir o recurso sobre matéria de facto para o Supremo Tribunal de Justiça, os artigos 432 e 410 n. 2 do Código de Processo Penal, negam as garantias de defesa do arguido e são materialmente inconstitucionais por violação do artigo 32 da Constituição; - Assim, deve: - o arguido, com base na legítima defesa, ser absolvido; ou então - a pena ser atenuada especialmente; e ou - ser declarada a inconstitucionalidade dos artigos 433 e 410 n. 2 do Código de Processo Penal e ordenada a repetição do julgamento em 1 Instância com redução a escrito das declarações do arguido. Contra-motivaram o Ministério Público e a assistente, entendendo em tais doutas peças processuais que o recurso não é merecedor de provimento, devendo manter-se a decisão recorrida. 3- Subiram os autos a este Alto Tribunal e, lavrado o despacho preliminar, concedeu-se prazo para as alegações escritas, que se mostram juntas a folhas 141, 142 e 146, cujos conteúdos se dão como inteiramente reproduzidos e se têm como presentes. Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir: Vejamos antes de mais quais os factos que o douto Tribunal Colectivo deu como firmados. São eles os seguintes: - No dia 12 de Abril de 1992, o C, durante a tarde, tinha ido a casa da sua mãe, sita no lugar de Alijão, freguesia de Agilde, desta comarca, com quem residia o arguido, seu irmão, e tinha discutido com aquela por causa de umas batatas, dizendo que o arguido a podia ajudar na sementeira e dizendo-lhe ainda que, se convidasse os filhos para a Páscoa e não o convidasse a ele, punha uma bomba na garagem e mandava a casa pelos ares; - Nesse mesmo dia, por volta das 22,30 horas, o C dirigiu-se novamente a casa da sua mãe, encontrando-se esta cá fora, junto de um cancelo, a conversar com seu filho D e mulher deste; - De seguida o C pediu licença à sua mãe e entrou na cozinha da casa onde o arguido, seu irmão, se encontrava a jantar; - De imediato e após ter dito "filho da puta", "ladrão", "gatuno", "é hoje que te mato", expressões estas que dirigia contra o arguido, o C empunhou a chave de fendas examinada a folhas 11 e, em atitude de ameaça, dirigiu-se com ela na direcção do arguido; - Então o arguido levantou-se, foi ao quarto que fica ao lado da cozinha, tomou a arma examinada a folhas 14 - pistola de defesa adaptada para calibre 6,35 mm, marca FN-Browing, sem número - voltou à cozinha, empunhou-a e com ela a uma distância de um metro, disparou dois tiros, de forma seguida, contra o seu irmão C; - Os projécteis disparados pelo arguido atingiram o C no cavado clavícular direito e no terço superior do hemitórax direito e vieram a provocar-lhe as lesões descritas e examinadas a folhas 37 - relatório de autópsia, que aqui se dá por inteiramente reproduzido para todos os efeitos legais, ferimentos esses que lhe determinaram, directa e necessariamente, a morte; - A vítima foi transportada pelos Bombeiros Voluntários da Lixa ao Hospital de...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO