Acórdão nº 02591/06.3BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 23 de Outubro de 2008

Magistrado ResponsávelDr
Data da Resolução23 de Outubro de 2008
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.

RELATÓRIO M…, devidamente identificada a fls. 02, inconformada veio interpor recurso jurisdicional da decisão do TAF do Porto, datada de 03/11/2007, que indeferiu a providência cautelar pela mesma deduzida contra o “MINISTÉRIO DO AMBIENTE, DO ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO E DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL” (vulgo MAOTDR) e outros, na qual peticionava a suspensão de eficácia do acto que determinou “… a demolição da construção identificada no art. 1.º do … requerimento inicial …” e o deferimento do “… pedido de embargo de obra nova e, …, seja mandado suspender a construção, no local onde se encontra implantada a construção identificada no art. 1.º, de escadas de acesso ao areal …”.

Formula, nas respectivas alegações (cfr. fls. 410 e segs. e correcção de fls. 562 e segs.

- paginação processo em suporte físico tal como as referências posteriores a paginação salvo expressa indicação em contrário), as seguintes conclusões que se reproduzem: “...

  1. É evidente e manifesta a ilegalidade do acto e a procedência da acção principal (art. 120.º, n.º 1, al. a) do CPTA), pelas seguintes razões, a saber: a) Em face da matéria dada como provada (vide itens 3, 4 e 7) a Recorrente é titular do direito de superfície (cfr. art. 1528.º e seguintes do Código Civil) sobre a parcela de terreno do domínio público marítimo com a área de 67,50 m2; b) Por outro lado, continuando, como contínua (vide art. 7.º da matéria dada como provada), a Recorrente a pagar a taxa anual de 795,43€, devida pela concessão do uso privativo do domínio público marítimo, em relação à referida parcela de terreno, ainda mantém, por isso, a Recorrente o direito ao respectivo uso privativo para os fins de exploração do Bar/Restaurante da Recorrente.

  2. Para o caso de se entender (conforme entendeu a Mm.ª Juiz a quo), o que não se concede, de não ser evidente e manifesta a ilegalidade do acto, nem a procedência da acção principal [nos termos do art. 120.º, n.º 1, al. a) do CPTA], verifica-se, no presente caso, o preenchimento cumulativo dos necessários três requisitos, a que se reportam o art. 120.º, n.º 1, al. b) e n.º 2 do CPTA: a) O do “fumus boni iuris” (art. 120.º, n.º 1, al. b) do CPTA): Continuando, como continua, a Recorrente a pagar (vide item 7.º da Matéria Assente) a taxa devida pela concessão do uso privativo da referida parcela, ainda mantém, por isso, o direito ao respectivo uso privativo, para os fins supra referidos, b) O de “periculum in mora” (art. 120.º, n.º 1, al. b) do CPTA): A imediata execução do acto poria, seriamente, em risco a satisfação das necessidades básicas da Recorrente (de avançada idade) e seu agregado familiar, pois, dessa maneira ficariam sem habitação e sem o único meio de subsistência (cfr. arts. 13 e 14 da matéria provada), e constituiria uma situação de facto consumado, c) O da proporcionalidade (art. 120.º, n.º 2, do CPTA), porquanto: 1 - Atenta a factualidade provada (cfr. item 13 e 14), ponderando os interesses públicos e privados em presença, os danos que resultam da concessão de providência são inferiores aqueles que resultam da sua recusa para os interesses privados que a Recorrente pretende acautelar com a presente providência e que são os dados como provados nos itens 13 e 14 da Matéria Assente, 2 - A concessão da suspensão do acto acarretará, no caso de improcedência da acção principal, um adiamento da sua execução (que já dura há mais de seis anos), mas não a ineficácia dele, inexistindo, por conseguinte, grave lesão para o interesse público.

  3. Sem prescindir, acresce ainda ao concluído em 2.º o seguinte: Na oposição, os Recorridos não alegaram, nos termos do art. 120.º, n.º 5, do CPTA, que a adopção da providência cautelar pedida pela aqui Recorrente causa grave lesão ao interesse público, sendo que, conforme se colhe do P.A., os Recorridos ao autorizarem, através da demolição da construção da Recorrente, que a contra-interessada, “O..., Lda.”, passe a aumentar a área da sua construção à custa da demolição da construção da Recorrente, pretendem, assim, beneficiar aquela em detrimento desta.

  4. Parte da construção - cerca de 40 m2 (cfr. item 6 da Matéria Assente) encontra-se fora do domínio público marítimo, e, por conseguinte, fora da determinação do POOC, 5.º A decisão recorrida violou e interpretou, erroneamente, designadamente o art. 1528.º e seguintes do Código Civil, arts. 120.º, n.º 1, al. a) e b) e n.º 2 do CPTA e o POOC …”.

Conclui no sentido do total provimento ao recurso jurisdicional com revogação da decisão judicial recorrida e deferimento da pretensão cautelar requerida.

O ente público requerido, ora recorrido, apresentou contra-alegações (cfr. fls. 431 e segs. e fls. 582 e segs.

) nas quais sustenta a manutenção do julgado concluindo da seguinte forma: “… 1.ª A douta sentença recorrida não merece qualquer reparo ou censura e, designadamente, não está ferida dos erros ou vícios que a Recorrente lhe aponta nas suas alegações e conclusões; 2.ª Visto que a mesma apreciou devidamente e com ponderação a matéria factual convocada e procedeu à sua correcta subsunção jurídico-legal, aplicando de forma acertada o direito correspondente; 3.ª Não se encontram, assim, violadas quaisquer normas do CPTA, nomeadamente o artigo 120.º do mesmo código ou qualquer outra disposição legal …”.

O Ministério Público (MºPº) junto deste Tribunal notificado nos termos e para efeitos do disposto nos arts. 146.º e 147.º ambos do CPTA veio apresentar parecer no qual conclui pelo provimento do recurso (cfr. fls. 509/512), parecer esse que notificado às partes mereceu resposta discordante do aqui recorrido (cfr. fls. 525 e segs.

) e concordante da recorrente (cfr. fls. 536).

Na sequência do despacho de fls. 556/557 dos autos, proferido ao abrigo do disposto no art. 146.º, n.º 4 do CPTA, foi a recorrente convidado a apresentar conclusões das alegações corrigidas, o que fez nos termos insertos a fls. 562/566, peça essa que, entretanto, foi objecto de impugnação por parte do aqui recorrido (cfr. fls. 579 e segs.

).

Sem vistos, dado o disposto no art. 36.º, n.ºs 1, al. e) e 2 do CPTA, foi o processo submetido à Conferência para julgamento.

  1. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela recorrente sendo certo que pese embora, por um lado, o objecto do recurso se ache delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos arts. 660.º, n.º 2, 664.º, 684.º, n.ºs 3 e 4 e 690.º, n.º 1 todos do Código de Processo Civil (CPC) “ex vi” arts. 01.º e 140.º do CPTA, temos, todavia, que, por outro lado, nos termos do art. 149.º do CPTA o tribunal de recurso em sede de recurso de apelação não se limita a cassar a sentença recorrida, porquanto ainda que declare nula a sentença decide “sempre o objecto da causa, conhecendo de facto e de direito”, pelo que os recursos jurisdicionais são “recursos de ‘reexame’ e não meros recursos de ‘revisão’” [cfr. J.C. Vieira de Andrade in: “A Justiça Administrativa (Lições)”, 8.ª edição, págs. 459 e segs.

    ; M. Aroso de Almeida e C.A. Fernandes Cadilha in: “Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos”, 2.ª edição revista, págs. 850 e 851, nota 1; Catarina Sarmento e Castro em “Organização e competência dos tribunais administrativos” - “Reforma da Justiça Administrativa” in: “Boletim da Faculdade de Direito Universidade de Coimbra - Stvdia ivridica 86”, págs. 69/71].

    As questões suscitadas e de que cumpre decidir resumem-se, em suma, em determinar se na situação vertente a decisão judicial recorrida ao indeferir a pretensão cautelar peticionada pela recorrente violou ou não o disposto nos arts. 1528.º e segs. do CC, 120.º, n.ºs 1, als. a) e b) e 2 do CPTA e o POOC [cfr. alegações e conclusões supra reproduzidas].

  2. FUNDAMENTOS 3.1.

    DE FACTO Resulta da decisão recorrida como assente a seguinte factualidade: I) O... e marido A... foram donos e possuidores de uma construção composta por rés-do-chão, destinada a comércio e de cave, destinada a habitação, situada na Av...., Vila do Conde, confrontando do Nascente e Sul com Avenida dos Banhos, Norte e Poente com a Praia, inscrita na matriz urbana de Vila Chã e não descrita na Conservatória do Registo Predial, desde 1982 até 1991; II) Em 1991 a referida O... requereu ao Director-Geral dos Portos autorização para venda da referida construção a M... e M..., a ora requerente, o que lhe foi deferido; III) Por requerimento de 08 de Outubro de 1991, M... e M... pediram autorização ao Director Geral dos Portos para que o licenciamento da referida construção passasse a ser feito em seu nome, o que lhes foi deferido; IV) A partir do ano de 1991 as referidas licenças foram passadas anualmente em nome de M... e M... e pagas por esta; V) A referida construção ocupa o terreno do domínio público marítimo numa área de 67,5 m2; VI) Encontrando-se parte dessa construção em cerca de 40 m2 fora do domínio público marítimo; VII) A requerente paga de taxa anual à Direcção Regional do Ambiente do Norte a quantia de 795,43€; VIII) Pelo ofício n.º 813 da Direcção Regional do Ambiente do Norte foi a requerente notificada de que: “… A entrada em vigor do Planos de Ordenamento da Orla Costeira (POOC) vem afectar a situação jurídica de todos os utilizadores titulados no domínio hídrico.

    Considerando que o POOC (Resolução do Conselho de Ministros n.º 25/99 de 07 de Abril) entrou em vigor no dia 1 de Outubro de 1999 abrangendo a área onde se localiza a utilização correspondente à licença n.º 197/97 de que V. Ex.ª é titular, cumpre-nos informar o seguinte: Face ao disposto no art. 17.º do Decreto-Lei n.º 309/93 de 2 de Setembro com a redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 218/94 de 20 de Agosto e pelo Decreto-Lei n.º 113/97 de 10 de Março, todas as licenças existentes à data da entrada em vigor do POOC caducaram nesta data.

    Considerando que o POOC não prevê a possibilidade desocupação da área...

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